Polidez/Cortesia/Descortesia: noção de face positiva e negativa
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1 Polidez/Cortesia/Descortesia: noção de face positiva e negativa Introdução aos Estudos de Língua Portuguesa II Prof. Dr. Paulo Roberto Gonçalves Segundo Aula 14
2 A noção de face O termo face pode ser definido como um valor social positivo que uma pessoa reclama para si mesma através daquilo que os outros presumem ser a linha tomada por ela durante um contato específico. Face é a imagem do eu delineada em termos de atributos sociais aprovados (...) (GOFFMAN,1967:5) Para o autor, toda interação é potencialmente ameaçadora, o que leva os interlocutores a realizarem, continuamente, um trabalho de monitoramento do comportamento verbal de todos os participantes, incluindo o seu, de modo a realizar, sempre que possível, os reparos necessários para a manutenção da imagem pública e da harmonia social. Tentativa de manutenção do equilíbrio: 1. evitar comportamentos que ameacem a face; 2. corrigir atos verbais de ameaça à face.
3 Noções auxiliares para a compreensão da dinâmica de faces A noção de linha (enquadre interacional) está ligada ao modo como os interactantes concebem a interação em termos de ação, de papéis sociais e de relações intersubjetivas de poder e de solidariedade. Leva em conta, portanto: 1. gênero discursivo; 2. grau de intimidade e de familiaridade; 3. hierarquia social; 4. localização na dinâmica de grupos (nós x eles); 5. contexto situacional (dinamicamente atualizado). A combinação de gêneros de oralidade concepcional, a graus altos de intimidade e de familiaridade e diferença hierárquica mínima, em contextos em que os atores se vejam como nós leva à emergência de um padrão interacional de fundo ou de bastidor. A combinação de gêneros de escrituralidade concepcional, a graus baixos de intimidade e de familiaridade, alta diferença hierárquica, em contextos nos quais a divisão nós x eles seja mais estrita leva à emergência de um padrão interacional de frente ou de fachada. A preocupação com a imagem pública é bem maior nas interações de frente/fachada.
4 A elaboração da noção de face Brown e Levinson (1987) 1. Face positiva: desejo de aceitação e aprovação social, de ser reconhecido. Vontade de ser valorizado. 2. Face negativa: desejo de liberdade, de não ser coagido e de não sofrer imposição. Vontade de que o universo pessoal não seja exposto. O processo interacional pode gerar situações em que uma das faces é ameaçada. Tais atos verbais são chamados de atos de ameaça à face (AAF), mais conhecidos pelo termo inglês face threatening acts (FTA). É possível relacionar às distintas faces as noções de autonomia e afiliação, ambas relacionadas à dinâmica de grupos, e desenvolvida por Bravo (1999). A afiliação diz respeito à nossa tendência de adquirir valores e comportamentos (linguísticos e não linguísticos) que permitam que nos identifiquemos com um dado grupo, o que está ligado ao desejo de ser reconhecido como membro dessa comunidade e, portanto, com a face positiva. A autonomia refere-se à nossa tendência de querer ser reconhecido como um indivíduo com contornos próprios no âmbito do grupo, com direito a liberdade e a posicionamento, o que se relaciona à face negativa.
5 Atos de ameaça à face Ameaça à face positiva Ouvinte Desaprovações, insultos, censuras, críticas, ironia. Falante Autoconfissões, pedidos de desculpas (?), autocríticas. Ameaça à face negativa Elogios, ofensas, pedidos, ordens, conselhos, perguntas íntimas. Agradecimentos, aceitação de ofertas, promessas. Deve-se considerar que o grau de ameaça à face de um ato depende do contexto e de uma série de fatores de ordem psicossocial e interacional. Os principais fatores, segundo Brown e Levinson (1987), seriam: a. Distância social entre os interlocutores (D). b. Diferença de poder entre os interlocutores (P). c. Imposições culturais e situacionais no que tange a serviços e produtos (R). Peso de um FTA = Distância Social + Diferença de Poder + Imposições Culturais
6 Leech (1983) Cortesia (Leech e Kerbrat-Orecchioni) 1. Máxima de tato: diminui o custo para o outro e aumenta o benefício para o outro ; 2. Máxima de generosidade: diminui o benefício ao eu e aumenta o custo ao eu ; 3. Máxima de aprovação: diminui o desagrado ao outro e aumenta o agrado ao outro ; 4. Máxima de modéstia: diminui o agrado ao eu e aumenta o desagrado ao eu ; 5. Máxima de concordância: diminui discórdia entre eu e outro e aumenta concórdia entre eu e outro ; 6. Máxima de simpatia: diminui antipatia entre eu e outro e aumenta simpatia entre eu e outro. Kerbrat-Orecchioni (2006) Face Flattering Acts (Atos de valorização da face): agradecimento, elogio, apoio, pedido de desculpas.
7 Caracterização dos Atos de Ameaça à Face (FTA) Brown & Levinson (1987) fta FTA- TYPE on-record Falante assume o FTA, deixando explícita a ameaça à face. Responsabilização enunciativa pelo ato. off-record Falante não assume o FTA, deixando implícita a ameaça. Trata-se de uma estratégia baseada na geração de um subentendido. Derresponsabilização enunciativa pelo ato. ON-RECORD- TYPE sem-polidez-(bald-on-record) Falante é direto e claro no que concerne à ameaça. Potencialmente conflitivo, embora dependa da combinatória entre D, P e R. com-polidez COM- POLIDEZ-TYPE positiva Orientada para a face positiva do ouvinte. Destaca a proximidade, familiaridade, solidariedade e coesão intra-grupo. Projetam-se desejos em comum. negativa Orientada para a face negativa do ouvinte. Destaca a formalidade, o distanciamento, o tato. Projeta-se respeito pela liberdade de ação do ouvinte.
8 Cortesia/Polidez Positiva construir-território-comum CONSTRUIR- TERRITÓRIO-COMUM-TYPE demonstrar-interesse-e-admiração Atender aos interesses e necessidades do ouvinte. Exagerar a aprovação, simpatia ou interesse em relação ao ouvinte. cortesia_positiva CORTESIA_POSITIVA- TYPE construir-cooperação CONSTRUIR- COOPERAÇÃO-TYPE fazer-a-vontade-do-ouvinte pertencimento-a-grupo convergência-discursiva Buscar concordância, evitar discordância. Reforçar pontos de vista comuns. Valer-se de bom humor. indicar-conhecer-a-vontade-do-ouvinte demonstrar-reciprocidade Oferecer e prometer. Ser otimista. Incluir o ouvinte na atividade. Dar ou pedir explicações.
9 Cortesia/Polidez Negativa não-presumir Perguntar. Modalizar. não-coagir-ouvinte NÃO-COAGIR- OUVINTE-TYPE dar-opções-para-não-agir Ser indireto. Perguntar. Não assumir que o ouvinte pode ou deseja fazer algo. Ser pessimista quanto ao ouvinte desejar realizar algo. cortesia_negativa CORTESIA_NEGATIVA- TYPE minimizar-ameaça Minimizar a imposição R. Agir com deferência tendo em vista P e D. comunicar-desejo-de-não-coagir-ouvinte COMUNICAR-DESEJO-DE- NÃO-COAGIR-OUVINTE-TYPE não-colocar-ouvinte-em-débito desculpar-se impessoalização Evitar pronomes pessoais de primeira e segunda pessoa. Expressar o FTA como uma regra. Nominalizar. Passivizar.
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