A polidez nos relatos jornalísticos. Palavras-chave: Jornalismo. Meio ambiente. Polidez. Estratégias discursivas.
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- Sérgio Conceição Caires
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1 A polidez nos relatos jornalísticos Juliana da Rocha PEDROSO 1 Resumo Este artigo faz parte de um estudo que busca entender como conteúdos sobre o meio ambiente são proporcionados ao leitores da mídia de revista, apoiado em perspectivas teóricas da pragmática para realização da investigação. Diante das diversas formas de estratégias que podem ser utilizadas nos discursos para interação do jornalista com o público e considerando-se a relevância da temática ambiental, esse trabalho analisa como a polidez pode se apresentar em reportagens jornalísticas, como uma estratégia para se averiguar o comprometimento que os jornalistas apresentam acerca do meio ambiente. Palavras-chave: Jornalismo. Meio ambiente. Polidez. Estratégias discursivas. Introdução É por meio da linguagem que as pessoas conseguem interagir entre si e com o mundo. O jornalismo, pelo seu caráter performativo, ou seja, capaz de produzir efeitos ao que transmite, pode ajudar a construir formas de pensar e agir. Ao tratar de um tema de relevância, como o meio ambiente, os conteúdos produzidos apresentam um compromisso maior que o simples relato, precisando serem construídos sob um propósito de envolvimento do interlocutor, permitindo-lhe que possa reagir e se posicionar diante das informações e conhecimentos obtidos. Nesse sentido, a maneira como os discursos são elaborados é determinante quanto ao sentido das informações. No cenário atual, permeado por tecnologias digitais, as informações tornam-se disponíveis a todo o momento e de diversas maneiras, cabendo ao interessado optar pela forma que lhe agrada para se atualizar. O presente trabalho dá atenção ao jornalismo de 1 Mestre em Comunicação pela Universidade Federal do Paraná. Integrante do grupo Mídia, Linguagem e educação MEDUC (UFPR/CNPQ).
2 revista, tendo em vista que a palavra escrita é o meio mais eficaz para transmitir informações complexas. Quem quer informações com profundidade deve, obrigatoriamente, buscá-las em letras de forma (SCALZO, 2003, p. 13). Em meio à multiplicidade de informações que circulam e tendo-se em vista a emergência da temática ambiental, um olhar atento às produções jornalísticas, merece atenção, pois ações cooperativas de jornalistas e leitor podem contribuir em atitudes e comportamentos conscientes em relação ao planeta. Ao se produzir um texto jornalístico, independentemente da especificidade de cada produto, o jornalista utilizará estratégias em seus enunciados que sinalizarão a interpretação dos leitores para um determinado sentido/efeito que se deseja alcançar com a veiculação de determinada mensagem. Muitos são os tipos de estratégias que podem ser adotadas nos relatos jornalísticos, na busca pela interação com o leitor. Da mesma forma, existem várias abordagens teóricas para se analisarem os discursos produzidos. Adotando a concepção da linguagem como uma forma de ação ou a realização de atos visando ao alcance de determinados efeitos, este trabalho apoia-se na pragmática, pela sua dedicação às intenções comunicativas e aos contextos que circundam o uso das palavras, conforme proposta defendida por Mey (1993). Vista a construção dos discursos jornalísticos dirigido ao alcance de certos objetivos, os usos linguísticos atuam como mecanismos também de interação. A pragmática, nesse sentido, é entendida como uma perspectiva de uso da linguagem na comunicação. 1 A estratégia para a polidez Ao falar em polidez, o sentido mais comum do termo apresenta-se relacionado às formas de tratamento (verbal e não verbal) das pessoas. Porém, devido a necessidade dos indivíduos em se interrelacionar para se viver em sociedade, neste trabalho a polidez verbal é entendida enquanto uma atividade social, capaz de amenizar conflitos que possam surgir quando usuários não compartilham dos mesmos interesses de modo a contribuir para que os eventos comunicativos fluam da melhor forma possível.
3 Dentre as diferentes formas utilizadas pelos jornalistas para levar informações e conhecimentos aos seus públicos, e visto o caráter intencional de ação sobre o outro, a polidez está presente nos relatos jornalísticos, pois considerando-se a função social que o jornalismo desempenha, compreende-se que os produtos de mídia precisam estabelecer uma relação harmoniosa com seu interlocutor para seus conteúdos serem aceitos. Em vista disso, cada produto midiático utilizará de estratégias buscando a adesão de interlocutores ao seu discurso. O modelo de polidez seguido nesse trabalho é o de Brown e Levinson (1987), que enquanto um fenômeno pragmático centra-se ao uso que é feito da linguagem pelos falantes e o contexto social. Para os autores, todas as pessoas possuem faces, uma positiva e uma negativa, que ora tem-se o desejo de preservação e em outras ocasiões, almejam que as mesmas sejam aceitas, exaltadas pelo outro. Cutting (2002) afirma que essas estratégias podem demonstrar proximidade salientando os objetivos comuns entre falantes (polidez positiva) ou mostrar um distanciamento (polidez negativa). Essas imagens dizem respeito à imagem que falante faz de si e também do outro. Quando a imagem sofre ameaça por atos linguísticos, Brown e Levinson (1987) identificam como Face Threatening Acts. Ao relacionar com o jornalismo, a imagem que um produto tem para as pessoas é que delimitará sua credibilidade, sendo, portanto, essencial que os veículos de comunicação almejem manter suas faces positivas, utilizando de estratégias verbais para tanto. Considerando que as interações verbais (seja na oralidade ou na escrita) são sempre ameaçadoras, Brown e Levinson (1987, p. 15) desenvolvem as estratégias da polidez com base em três princípios sociológicos que determinam a polidez entre falantes: O poder relativo do ouvinte sobre o falante (P); a distância social ou grau de familiaridade existente entre os falantes (D); e o grau de imposição (R) do ato comunicativo. O primeiro princípio que aborda a relação de poder entre os envolvidos no evento comunicativo é associado neste trabalho à competência que o falante (jornalista) possui em apresentar as informações e conhecimentos às pessoas. O ouvinte, por sua vez, detém o poder pela leitura (ou não) das matérias e de acreditar (ou não) na sua credibilidade. A manifestação do poder do ouvinte sobre o falante pode ser visível no
4 contato disponibilizado pelo produto (como , telefone, espaço dentro da publicação, entre outros) para o retorno do seu público quanto as suas produções. A mídia de revista, geralmente dispõe de um espaço em que os leitores podem fazer elogios, críticas, sugestões, entre outros, com relação às matérias apresentadas. O segundo princípio, da distância social, pode ser relacionado ao acordo préexistente entre jornalista e leitor sobre o jornal ismo, de modo que os leitores têm para si que o jornalismo deve passar uma credibilidade no trato às informações. Tal relação de confiança no que o jornalismo apresenta diminui, de certa forma, a distância social existente. O grau de imposição do ato comunicativo (terceiro princípio) pode estar relacionado ao fato de o jornalismo ditar sobre o que possa ser de interesse e importância em o leitor tomar conhecimento. Em princípio, isso pode soar impositivo, como forma de agredir a imagem do ouvinte. Contudo, à medida que o jornalismo apresenta soluções e caminhos para enfrentamento das questões apresentadas (função pedagógica), a ameaça às faces de ouvinte e falante podem amenizar-se. Ao pensar no jornalismo e na necessidade que possui em estabelecer uma interação com o público, a ponto de torná-lo fiel aos seus produtos, pressupõe-se que o uso do recurso da polidez positiva pode ser uma estratégia bem-vinda se os participantes (jornalista e leitor) compartilharem de um mesmo universo contextual. Oliveira (1999), ao desenvolver um estudo da cooperação no jornalismo afirma que: obedecer às máximas conversacionais de Grice é um caminho para a manutenção do decoro e para resguardar a imagem pessoal, pois eventuais violações ao princípio de cooperação podem ser justificadas pela necessidade de manutenção da polidez (OLIVEIRA, 1999, p. 44). Com relação às estratégias, os fatores de distância social e relação de poder (hierarquia social) entre participantes são os principais delimitadores das estratégias a serem utilizadas em cada interação. Com base nisso, Brown e Levinson (1987) teorizaram quatro categorias (e subcategorias) de estratégias para a polidez, que se dividem conforme a intenção com que os falantes desejam realizar o ato de ameaça à face. Essas podem ser realizadas de maneira direta, com ação reparadora ou implicitamente. Assim, quando os atos de ameaça são feitos diretamente, os autores denominam estratégia do tipo Bald on Record; quando utilizam atenuadores pode ser
5 polidez positiva e polidez negativa; e quando realizada de maneira indireta, Brown e Levinson as chamam de estratégia do tipo Off Record. As estratégias da polidez são identificáveis facilmente em situações de interação por meio da utilização da fala coloquial. No jornalismo, esse processo interacional pode ocorrer partindo do fato de que o jornalismo dialoga com seu interlocutor, ao transmitir assuntos que aponta ser de seu interesse ou importante tomar conhecimento. Os jornalistas podem produzir seus enunciados voltando-se a estabelecer uma proximidade com o interlocutor/leitor de suas mensagens ou distanciando-se deste e do que se diz. Com relação às produções sobre meio ambiente, Bueno (2007) cita três funções básicas: informativa, pedagógica e política que infere que o jornalismo que dedica-se a essa temática deve desempenhar para que as matérias primem a função social a que se destinam. Entende-se que as tais funções apontadas pelo autor se relacionam com as estratégias da polidez de Brown e Levinson (2007) no sentido de que o jornalista levará em consideração - ou assim deve ser - essas funções ao produzir uma matéria. A partir do rumo que o jornalista deseja dar para sua produção ou o efeito que almeja alcançar que definirá as estratégias a serem utilizadas nos enunciados. A utilização de imagens, quadros, infográficos, entre outros, são recursos utilizados pelo jornalismo de revista que podem auxiliar e melhorar o entendimento de conteúdos e questões que envolvem o tema. Aos jornalistas levarem à informação para o mais próximo possível do seu interlocutor, transformando termos e expressões científicos da área em uma linguagem compreensível deste público, acabam atuando na formação das pessoas. Nesse sentido, Lage (2011), sublinha o papel que a mídia desempenha ao fazer referência que ao informar, complementa e atualiza conhecimentos, e neste sentido, educa; ao transmitir conhecimento, atua sobre a sociedade e cultura, determinando escolhas econômicas e, no fim, opções políticopedagógicas (LAGE, 2011, p. 122).
6 2 Análise das reportagens de meio ambiente Analisando a revista Planeta 2, que destina um espaço mensal para abordagem do meio ambiente, observamos maneiras como estratégias da polidez podem aparecer nos discursos jornalísticos. a) Estratégia Off Record: Essa estratégia é um convite à produção de inferências, pois a maneira como os enunciados são produzidos rompem com as máximas de conversação teorizadas por Grice 3 e entendidas na visão do autor, como norteadoras para que as comunicações ocorram eficientemente. Trecho (1): As imensas dificuldades previstas e o custo mínimo de U$ 100 milhões assustaram até os megamilionários sauditas e o projeto não foi adiante (ed Nº 1, p. 42). Trecho (2): Milhares de pessoas vêm abandonando o hábito de comer carne em busca de um estilo de vida alternativo inspirado pela rejeição étnica ao consumo de alimentos de origem animal (ed. 467, p. 25). Nos enunciados apresentados, há a presença da subestratégia exagere que desrespeita a máxima da quantidade (relacionada ao número de informação fornecida). Ao jornalista fazer uso de tais expressões, permite uma série de possibilidades de interpretação para o ouvinte ao não expressar o número exato das coisas. Além disso, o exagero nos enunciados é uma característica do mau texto (GARCIA, 1999). Por outro 2 Revista de atualidades, Segundo categorização do Instituto Verificador de Circulação (IVC), multitemática, com um público de faixa-etária ampla. Conforme os dados levantados pela editora com base no público assinante, os leitores da revista se dividem em: 42% de idade entre 10 a 29 anos, 29% entre 30 a 49 anos e 29% dos leitores possuem mais de 50 anos. Disponível em < acesso em: 28/01/ Grice denominou quatro máximas conversacionais, sendo elas: Máxima de quantidade, qualidade, relação e modo.
7 lado, entende-se que o jornalista atua de modo cooperativo para com o ouvinte (leitor) ao não violar a máxima da qualidade (não dizer o que não pode confirmar). Enunciado (3): Iceberg no copo (ed Nº 1, p. 40). Enunciado (4): A carne é fraca (ed. 467, p. 25). Nos títulos das reportagens acima, o jornalista faz uso da linguagem de modo indireto, além de utilizar de expressões metafóricas como a subestratégia empregada. No enunciado (3), particularmente, tem-se em vista que, de modo normal, não se tem evidências de que um iceberg possa ser inserido dentro de um copo. Sob esse aspecto, o enunciado soa como falso. Para compreender o porquê do título desse enunciado é necessário que o leitor realize a leitura na íntegra da matéria, caso seja de seu interesse. A não permissão da interpretação correta do sentido da reportagem em um primeiro instante e a utilização da estratégia em que utiliza metáfora, quebra a máxima griceana da qualidade. Já no enunciado (4), o jornalista opta por utilizar um dito popular que refere a dificuldade do homem em resistir a certas tentações, como estratégia para abordar sobre o crescimento do número de adeptos da ética vegetariana, ou seja, pessoas que não consomem e nem utilizam produtos originados de animais. O leitor inserido em um mesmo grupo em que a expressão utilizada é conhecida, normalmente, compreenderá que o texto abordará algo relacionado à dificuldade do ser humano em viver sem o consumo/uso de produtos de derivado animal. Entretanto, sem esse conhecimento, o indivíduo necessitará buscar outras pistas que o levem a compreensão da mensagem. Um aspecto considerável com relação à quebra da máxima da qualidade ocorre em momentos em que os repórteres optam por apresentar no decorrer de seus relatos, perguntas retóricas para expor suas opiniões. Aliás, quando se trata de matérias que envolvem o meio ambiente é pertinente que o jornalista intervenha, já que se trata de um intelectual que elabora e produz seu próprio discurso, que contextualiza as falas das fontes, que as contrapõe, que tem a sua própria opinião (BUENO, 2007a, p. 48).
8 O uso de perguntas retóricas é outro tipo de estratégia indireta utilizada pelo repórter quando há, principalmente, o desejo de criticar alguma situação tratada em uma matéria, sem colocar em risco a sua imagem e da publicação e de certa forma, não realizar um ato ameaçador à imagem do interlocutor. Em alguns momentos, os jornalistas optam pela sua adoção: Enunciado (5): Se os animais têm interesses e direitos, por que os vegetais não deveriam ter? (ed. 467, p. 30). Enunciado (6): Mas diante dos riscos nucleares e da abundância de alternativas, cabe perguntar: será que precisamos? (ed. 463, p. 25). Enunciado (7): Como produzir energia para 9 bilhões, energia renovável, sem queimar combustíveis fósseis e gerar efeitos estufa? (ed Nº 1, p. 28). Essas perguntas formuladas pelos jornalistas nas reportagens não vêm acompanhadas de respostas, pois como se mencionou anteriormente, elas possuem a função de proporcionar a reflexão dos leitores sob o que está sendo abordado na matéria. Ao emitir a sua opinião, indiretamente, o jornalista a faz supondo que esteja se aproximando do interlocutor, o que o mesmo deseja. Dependendo da maneira como a pergunta é elaborada dentro do texto, permite com que o leitor se posicione de modo a concordar com que indaga o repórter. Nesse sentido, observa-se que mesmo ao utilizar estratégias indiretas o repórter pode estar querendo praticar a polidez positiva. Por outro lado, a teoria de Brown e Levinson (1987, p. 223) infere que ao fazer perguntas retóricas o falante quebra uma condição de sinceridade, pois essas devem ser feitas quando se deseja obter uma resposta do ouvinte. Ao observar o jornalismo e sua função se compreende neste trabalho que uma incursão desse tipo não rompe com a sinceridade, pois a resposta do interlocutor ocorre, mas vêm posteriormente a partir dos efeitos que a matéria ocasionará. A estratégia de pressupor, de acordo com as máximas griceanas, é uma forma de transgressão à máxima de relação (relevância). Em qualquer comunicação verbal e
9 principalmente no discurso jornalístico, que tem a função de levar as informações importantes e relevantes à sociedade, entende-se que essa estratégia é a única que não pode ser violada, pois a mensagem perde todo o sentido e importância em ser proferida. b) Estratégia Bald on Record A estratégia bald on Record, que não possui subdivisões, em geral é usada quando um falante deseja fazer um ato de ameaça à face com máxima eficiência, respeitando às máximas griceanas da cooperação. As expressões são produzidas geralmente no imperativo, correspondendo a ordens, desejos, convites, entre outras pretensões do falante. Em se tratando do discurso jornalístico, a forma imperativa não se visualiza claramente como em situações de oralidade, mas, entende-se que ao jornalismo fazer menção a fala de alguma fonte entrevistada, por meio do discurso direto, ele pode estar utilizando da estratégia bald on Record. Jornalisticamente, trata-se de expressões que dizem respeito à 3ª pessoa do plural, como: diz (ele), confirma (ele), aponta (ele). Porém, o contexto em que envolve o enunciado é empregado é que vai dizer se condiz com esse tipo de estratégia. Enunciado (8): Estamos garantindo recursos estratégicos no futuro, afirma Kaiser Gonçalves de Souza (ed Nº 2, p. 45). A matéria ao qual faz parte esse enunciado, diz respeito a uma solicitação que o Brasil fará a ONU (Organização das Nações Unidas) para poder realizar expedições em águas internacionais com o objetivo de identificar o potencial mineral de regiões de importância econômica e político-estratégica. O enunciado retrata uma promessa do falante da mensagem para com o interlocutor dela, no caso, entendido como os leitores da matéria. Ao inserir no texto o que a fonte entrevistada diz a respeito do assunto, o repórter diminui sua responsabilidade com o conteúdo, o que pode ser visto como um
10 fato positivo pelo interlocutor em razão de o jornalista não parecer estar manipulando o conteúdo mencionado por alguma fonte. Essa pode ser entendida como uma vantagem que a utilização da estratégia bald on record pode dar. Ao proporcionar uma comunicação mais direta, digamos assim, entre fonte e leitor, entende-se que o repórter está sendo cooperativo. Assim, a maneira como os enunciados são elaborados é compreendido nesse trabalho não como um motivo de preocupação quando os jornalistas fazem uso dessa estratégia, pois suas atenções estão voltadas para o que está sendo apresentado. A inserção da citação direta da fonte, nesse sentido, pode ser vista também como uma forma de o jornalista transmitir maior credibilidade ao interlocutor quanto ao conteúdo apresentado, diminuindo possíveis interferências. b) A polidez positiva Conforme preza o modelo de Brown e Levinson (1987) as estratégias para a polidez positiva realçam os desejos comuns existentes entre os usuários por meio do compartilhamento de crenças e conhecimentos de mundo. O discurso jornalístico não chega a mostrar uma baixa formalidade por conta desse compartilhamento nos usos das expressões linguísticas como acontece na vida cotidiana, mas é possível visualizar as estratégias desse tipo. Pode aparecer de 15 4 maneiras. Trecho (9): Não tenha medo do fim do mundo, ele não acabará. Grandes acontecimentos estão por vir se mantivermos nosso amor pelo planeta (ed. 471, p. 45). A contextualização situacional em que o trecho acima está inserido é de que com o desenvolvimento das cidades, os sons urbanos causados pelo trânsito, só pra citar um exemplo, tomaram os espaços. Os sons emitidos pela natureza, no caso, acabam não 4 Observe o outro. Seus interesses, desejos, necessidades; Exagere; Intensifique o interesse pelo outro; Use marcadores de identidade do grupo; Procure acordo; Evite desacordo; Pressuponha e afirme pontos em comum; Faça piadas; Afirme e pressuponha os conhecimentos sobre os desejos ao outro; Prometa; Seja otimista; Inclua O ouvinte na atividade; Dê ou peça razões ou explicações; Assuma ou afirme reciprocidade; Dê agrados ao ouvinte (simpatia, entendimento, cooperação).
11 sendo percebidos pelas pessoas. Para reverter essa situação e preservar a natureza e a paisagem sonora a reportagem apresenta o trabalho de um ecologista acústico. Em dado momento da reportagem o jornalista infere que o destino das paisagens sonoras está em poder dos moradores, apresentando na sequência o enunciado (9). Com base nisso, percebe-se que ele tenta aproximar-se das emoções, anseios e aflições que fazem parte do universo em que está inserido o interlocutor da mensagem. O compartilhamento dos desejos mútuos é percebido não só pelo uso linguístico, mas também no contexto da afirmação. O jornalista faz uso da subestratégia seja otimista como forma de incluir-se, aproximar-se com quem interage. Além disso, a subestratégia que visa incluir o falante e o ouvinte na atividade pode se percebida pela expressão mantivermos nosso, em que o falante se inclui na atividade do mesmo modo que inclui o ouvinte. Considerando-se as subestratégias utilizadas, pode-se compreender que o repórter está atuando de maneira cooperativa para com o ouvinte, aliás, respeitando as máximas de conversação. No caso desse enunciado, a proposição é que ambos ajam em prol do meio ambiente. De modo semelhante ocorre no enunciado a seguir: Trecho (10): Com certeza há um par de jeans no seu armário (ed. 462, p. 32). Neste enunciado, o jornalista pressupõe que o leitor possua uma peça de roupa do tipo jeans em virtude de ser um artefato popular. A estratégia remete à polidez positiva, pois insinua a aproximação entre falante e ouvinte visualizada por meio da subestratégia de pressupor e declarar pontos em comum, utilizada quando se quer indicar que o falante sabe sobre os hábitos do ouvinte (BROWN e LEVINSON, 1987). No caso, em razão da popularidade desse tipo de roupa, permite ao jornalista insinuar ao produzir o enunciado que as pessoas responderão positivamente à afirmação. Observa-se também em alguns momentos o teor pedagógico nas matérias publicadas pela revista. O discurso de ensinar relaciona-se com a função pedagógica explicitação das causas e soluções para os problemas ambientais e à indicação de caminhos para sua superação retratada por Bueno (2007) como um dos princípios
12 básicos que o jornalismo deve desempenhar ao tratar de matérias que abordam a temática ambiental. Abaixo, apresenta-se um trecho de uma reportagem em que foi possível visualizar nitidamente a presença da função pedagógica. Trecho (11): Eventos extremos são aquelas ocorrências que ficam 10% acima ou abaixo de uma variável particular. Por exemplo, um volume de chuvas pode ser inferior a 10% da média, o que configura seca severa, ou 90% acima da média, o que vai resultar numa enchente histórica (ed. 466, p. 28). A postura do jornalista em procurar explicar o que é tal fenômeno, ao invés de só informar o acontecido e trazer fontes que falem sobre o assunto, torna possível de associar a estratégia dê ou peça razões ou explicações da polidez positiva. Conforme a teoria de Brown e Levinson (1987, p. 128) as palavras utilizadas para justificar ou explicar, por exemplo, é uma maneira de implicar Eu posso ajudar você ou Você pode me ajudar. Esse comportamento assume a solidariedade entre falantes. No contexto dessa investigação, entende-se que isso ocorra em casos como do fragmento (11) em que jornalista se dedica a ajudar o leitor, esclarecendo certas informações nas matérias, que são pertinentes para o conhecimento do leitor. Assim, demonstra a cooperatividade do repórter. Pode-se pensar que por se tratar de uma reportagem, o repórter tenha que necessariamente explicar cada frase empregada para uma boa abordagem do assunto. Mas, uma grande quantidade de verbalização pode tornar o texto cansativo e desagradável e afastar o interlocutor do produto. Portanto, quando o jornalista deseja ter sua face e a imagem da revista apreciada pelo leitor, utiliza das estratégias da polidez positiva que rompem às máximas da Cooperação. d) A polidez negativa As estratégias para a polidez negativa se pautam a conservar a liberdade do interlocutor da mensagem, mantendo a distância social e expressando assim, o
13 distanciamento entre falantes. Na produção discursiva da revista Planeta, pode-se observar que o uso de estratégias desse tipo para levar conhecimentos e informações sobre meio ambiente aos interlocutores, apareceu timidamente. Brown e Levinson estabeleceram 10 formas 5 de como pode aparecer a polidez negativa. Enunciado (12): Bem-vindo ao Antropoceno (ed Nº 1). Neste enunciado que intitula a reportagem, observa-se pelo discurso do jornalista assim como os enunciados apresentados por ele das fontes entrevistadas, uma intenção do mesmo em diminuir a imposição sobre o interlocutor, a respeito do Antropoceno ser a nova era geológica do planeta. Essa postura é marcada pela presença das expressões: surgiria (p. 26), permitiria (p.28), ficaria (p. 30), deveria (p. 30) e encorajaria (p. 31). Jornalisticamente, a adoção desse tempo verbal é também uma maneira do jornalista distanciar-se da responsabilidade ao que está sendo apresentado, sendo no caso dessa reportagem, a afirmação de o planeta estar adentrando em uma era que é marcada por impactos ambientais. A subestratégia utilizada pelo repórter foi seja pessimista, que conforme Brown e Levinson (1987, p. 173) pode ser realizada pelo uso do subjuntivo. No caso do idioma português, é possível pelo uso do futuro do pretérito para fazer afirmações. O ato demonstra dúvida do falante em relação à resposta/reação do seu interlocutor. No caso do discurso jornalístico, essa subestratégia é aqui compreendida e utilizada quando o repórter tem receio da aceitação do leitor ao que lhe é apresentado. Como as estratégias da polidez negativa evitam imposição, pode-se entender que essa subestratégia ameniza a face negativa do interlocutor. Levando em conta o contexto da reportagem, uma novidade, normalmente instiga o leitor que está atrás de conhecimentos diversos, perfil este que se encaixa aos leitores da Planeta, como foi possível constatar por algumas informações fornecidas 5 Seja convencionalmente indireto; Questione, pergunte; Seja pessimista; Minimize a imposição; Mostre deferência (apreço/respeito); Peça desculpas; Impessoalize o falante e o ouvinte (evite os pronomes eu e você ); Declare o FTA como uma regra geral; Nomine; Mostre diretamente como se estivesse assumindo um débito (de agradecimento) com o ouvinte.
14 pela editora. Sob esse aspecto, o enunciado utilizado pelo repórter pode ser considerado bem conveniente para a ocasião. Além de informar o leitor de que se trata de algo que ele não tem conhecimento, o enunciado é produzido em um tom convidativo do jornalista sem soar-se impositivo, dando poder de escolha ao interlocutor em sua leitura. Considerações finais No objeto empírico dessa investigação foi percebida a utilização, principalmente, de estratégias do tipo Off Record, que são atos comunicativos realizados de uma maneira em que não é possível identificar a intenção clara do repórter. Logo, os enunciados são de uso indireto, permitindo que ocorram implicaturas conversacionais. Uma forma de o jornalista evitar se comprometer com seus enunciados e de realizar atos de ameaça à face de maneira implícita. As estratégias que tornam evidente a polidez positiva também se apresentaram em alguns momentos nos textos e marcam a intenção do jornalista em aproximar-se do seu interlocutor. Nesse sentido, uma aproximação com o leitor se torna essencial, sobretudo, quando se trata de matérias que envolvem questões ambientais e que precisam atender às três funções básicas do jornalismo ambiental. A utilização de estratégias para a polidez é compreendida como relacionada à característica performativa da comunicação verbal, e por sua vez, do jornalismo. Mesmo que o discurso jornalístico não manifeste seu interesse em persuadir o interlocutor como acontece na publicidade, pelo fato de possuir efeitos ao que transmite, produz ato de ameaça à face. Na análise da revista Planeta se pode perceber que a mesma opta em transmitir os conteúdos de maneira indireta ao seu interlocutor, rompendo com as máximas griceanas e realizando ameaça à face do interlocutor de modo implícito. Visto que as estratégias para a polidez negativa tem a função de minimizar imposições, compreendese assim o fato do pouco uso no discurso da revista. É conveniente mencionar também que o emprego das estratégias da polidez pode ser perceptível no espaço destinado nas publicações jornalísticas para o retorno do público. Trata-se de uma parte do periódico em são publicadas os relatos dos leitores em
15 relação à revista. Suas insatisfações em relação ao produto/matérias apresentadas, apontamentos a algo que possa ter sido publicado erroneamente, sugestões, entre outros. A publicação da resposta dada pelo jornalista/revista nas edições posteriores demonstra a postura da revista em praticar a polidez. Por conta disso, a face tanto do jornalista como do interlocutor/leitor podem se preservar. Referências BUENO, W, C. Comunicação, jornalismo e meio ambiente: teoria e pesquisa. São Paulo: Mojoara, BUENO, Wilson da Costa. Jornalismo ambiental: explorando além do conceito. In: Revista desenvolvimento e meio ambiente, V. 15, n. 1, Curitiba: UFPR, BROWN, P., LEVINSON, S. Politiness: some universals in language usage. Cambridge: Cambrige University Press, p. (Studies in interactional sociolinguistics, 4). CUTTING, J. Pragmatic and discourse: A resourse book for students. USA: Routledge, GARCIA, L. (org). Manual de redação e estilo. 26 ed. São Paulo: O globo, LAGE, N. A reportagem: teoria e técnica de entrevista e pesquisa jornalística. 9 ed. Rio de Janeiro: Record, MEY, J. Pragmatic in Introductions, p. OLIVEIRA, J. As dimensões pragmáticas da cooperação jornalística. 197f. Tese (Doutorado em Comunicação) Departamento de Jornalismo e editoração da Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, SCALZO, Marília. Jornalismo de revista. São Paulo: Contexto, p.
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