ESCOLA DO ALGODÃO: METODOLOGIA PARTICIPATIVA DE PRODUÇÃO ORGÂNICA
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- Maria Luiza Camelo Azevedo
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1 ESCOLA DO ALGODÃO: METODOLOGIA PARTICIPATIVA DE PRODUÇÃO ORGÂNICA José Sales Alves Wanderley Júnior (Arribaçã / molejoufpb@yahoo.com.br), Melchior Naelson Batista da Silva (Embrapa Algodão), Manoel Francisco de Sousa (Embrapa Algodão), Isaías Alves (Embrapa Algodão), Fabiana do Nascimento Santos (Arribaçã) RESUMO - A lavoura do algodão (Gossypium hirsutum L.) tem sido deixada em segundo plano pelos agricultores familiares, pois os custos de produção convencional são altos e inviáveis para se inserirem na diversidade da agricultura familiar. No entanto, são notórios os esforços dos agricultores em entender e adaptar, para cada realidade, as tecnologias de produção do algodão. Essa perspectiva surge numa proposta ampla de inserção da lavoura do algodão na agricultura familiar de base agroecológica no Nordeste brasileiro. O projeto foi executado em dois Assentamentos do município de Remígio-PB. A metodologia utilizada foi inspirada na Escola de Campo Participativa que constou de uma parcela comunitária de cultivo de algodão, onde foram realizadas as capacitações na forma de oficinas temáticas, ministradas de acordo com as fases do ciclo da lavoura. A experimentação com base no conceito de agricultor/pesquisador foi extremamente valorizada, através da inserção de práticas agroecológicas para a construção de um conhecimento adaptado à realidade local. Dessa forma, o objetivo do projeto foi reconhecer as experiências (conhecimento tradicional) praticadas pelos agricultores familiares e junto com o conhecimento científico convencional promover o desenvolvimento de sistemas de produção diversificados, levando-se em consideração a efetiva participação das comunidades de agricultores(as) familiares. Palavras-chave: algodão, agricultura orgânica, agroecologia, semi-árido. INTRODUÇÃO A cultura do algodão (Gossypium hirsutum L.) é uma das mais importantes em valor econômico no grupo das fibras pelo seu volume e valor da produção. Seu cultivo também tem importância social pelo número de empregos diretos e indiretos gerados (EMBRAPA, 2001). No Nordeste, esta fibrosa é importante suporte financeiro da agricultura familiar, por isso, é denominada pelos agricultores como: a cultura de comprar a camisa. Além dessa importante função de formação da renda, o algodão também se configura como geradora e aproveitadora de mão-se-obra no campo no período seco. Em algumas regiões do Nordeste, como o Curimataú Paraibano, o algodão vem sendo plantado na segunda metade do período chuvoso. Essa estratégia permite a colheita em períodos secos, promovendo meios de ocupação em períodos extremamente inóspitos. Dessa maneira, o algodão serve como suporte social para manter o homem no campo com trabalho e renda, ambos numa proposta mais ampla de cidadania e dignidade (WANDERLEY JÚNIOR, 2006). Na década de 80, as áreas de algodão apresentaram uma queda significativa no Nordeste brasileiro principalmente pela chegada da praga do bicudo (Anthonomus grandis Boheman) e consequente aumento nos custos de produção; a modernização do sistema de produção baseado no
2 aporte de insumos externos (adubos minerais, sementes melhoradas, agrotóxicos, etc) dificultou a atividade para o agricultor familiar descapitalizado. Mesmo neste cenário desanimador, são notórios os esforços dos agricultores familiares em entender e adaptar, para cada realidade, as tecnologias de produção do algodão. O entendimento dessa capacidade de inovação dos agricultores em suas propriedades é condição primordial para o soerguimento do cultivo do algodão numa perspectiva agroecológica e para mercados especializados, como o orgânico. Dessa forma, o objetivo do trabalho foi reconhecer as experiências (conhecimento tradicional) praticadas por agricultores familiares e junto com o conhecimento científico convencional promover o desenvolvimento de sistemas de produção diversificados, sempre levando em consideração a efetiva participação das comunidades. A proposta foi baseada na metodologia participativa de Escola de Campo Participativa (ECP) inspirada no modelo Farmer Field School da FAO. MATERIAL E MÉTODOS O projeto foi executado em dois Assentamentos de reforma agrária do município de Remígio, Curimataú Paraibano. A metodologia utilizada foi inspirada nas ECP s - Escola de Campo Participativa (Farmer Field School, FAO). Para o conhecimento da realidade local, realizou-se um diagnóstico rápido e participativo (DRP) da situação agro-socioeconômica da comunidade e das famílias, observando todos os dados do problema (Verdejo, 2006). Utilizou-se o método de entrevistas semi-estruturadas com a aplicação de questionários. Além disso, oficinas para levantamento dos sistemas de produção locais e visitas técnicas in loco foram realizadas para complementar a tomada de dados. Daí, foi montada uma estratégia de intervenção baseada em oficinas temáticas, visitas de intercâmbio, visitas de campo, seminário e dia-de-campo, sempre numa perspectiva de capacitação continuada e horizontal. As capacitações abordaram temas como: Plantio e Tratos culturais, associativismo, certificação, mercado orgânico, Agroecologia, colheita e qualidade de fibra, etc. Este projeto foi denominado ESCOLA DO ALGODÃO, por se constituir num ambiente pedagógico favorável à aprendizagem do agricultor (Fig. 1). Figura 1. Oficina temática sobre plantio e conservação do solo no Assentamento Queimadas. Remígio PB, 2006.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO Principais Avanços do Projeto Processos de Experimentação No decorrer das atividades, o processo de experimentação com base no conceito de agricultor/pesquisador (SILVEIRA, 2002) foi incentivado. A inserção de praticas agroecológicas para a construção do conhecimento adaptado à realidade local foi importante fator na construção do conhecimento a partir do saber local e das tecnologias da Embrapa Algodão. O ataque da formiga cortadeira (Atta spp.) foi um problema sério no manejo das áreas e ao mesmo tempo estimulou os agricultores a buscarem mecanismos de controle e convivência com a praga. Foram realizadas algumas práticas de manejo agroecológico para controlar a praga como: utilização de nim (Azadirachta indica) a partir de folhas e torta lançados diretamente no formigueiro; folhas de maniçoba (Manihot glaziovii) como isca para despistar a formiga das culturas plantadas e utilização de cal virgem em formigueiros de pequeno porte. A partir dessas experiências os agricultores perceberam e entenderam que as formigas não desapareciam, mas que seria necessário e importante encontrar estratégias de convivência com elas e outras pragas. Já a praga do bicudo não causou danos consideráveis, pois estratégias de plantio tardio e no espaçamento de 1,20 m X 0,40 m foram importantes estratégias de convivência com a praga (WANDERLEY JÚNIOR, 2006). Visitas de intercambio Uma das estratégias utilizadas no processo de capacitação dos agricultores e entidades envolvidas foi à realização de visitas de intercâmbio visando conhecer e socializar experiências de agricultores a partir do conhecimento local. Em agosto de 2006 foi realizado uma visita de intercâmbio aos agricultores familiares do município de Choró-CE (Fig. 2), assessorados pelo Centro de Pesquisa e Assessoria - ESPLAR que atua no Semi-árido cearense desenvolvendo atividades voltadas para a agroecologia à serviço da Agricultura Familiar. Figura 2. Visita de intercâmbio de agricultores de algodão da Paraíba ao município de Choró CE, 2006.
4 Durante a visita foram observadas algumas experiências de extrema importância para os agricultores visitantes como: algodão cultivado em consórcio com culturas alimentares como milho, feijão, gergelim, fava entre outras, práticas conservacionistas do solo, e o manejo agroecológico das pragas com a utilização do nim (folhas e torta de sementes). Seminário Regional do Algodão Agroecológico O Seminário Regional do Algodão Agroecológico foi realizado pela Embrapa Algodão em parceria com as ONG's Arribaçã e ESPLAR em Lagoa Seca -PB, em outubro de O evento contou com a presença de 80 agricultores, técnicos e pesquisadores dos estados da Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Pernambuco. Nesse seminário aconteceu a socialização das experiências de produção de algodão agroecológico, realizadas pelos agricultores e instituições dos Estados descritos anteriormente. Durante o evento houve uma visita de campo para conhecer os sistemas de produção de algodão agroecológico no Assentamento Queimadas, Remígio-PB. Nessa visita foi proporcionado o encontro de diversos agricultores que trocaram experiências de produção agroecológica de algodão, controle de pragas com produtos naturais, discussão entre os sistemas de produção visualizados, criação animal e sua importância, além da manutenção das unidades de produção familiar no Curimataú paraibano. Ainda, durante o evento, foi acordado que as respectivas instituições envolvidas nas experiências de produção de algodão orgânico deveriam construir os canais de comercialização para os produtos dos agricultores envolvidos com o projeto com base na valorização do produto da agricultura familiar e respeitando os princípios agroecológicos nos seus sistemas de produção. Ficou encaminhado, ainda, por todos os participantes e suas respectivas instituições, a construção de uma rede de articulação de algodão agroecológico entre os Estados da Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Pernambuco. Essa Rede terá a função da socialização das experiências que estão acontecendo nos respectivos Estados. Essa rede, também, terá como função gerar elementos que subsidiem a construção de canais de comercialização para o algodão orgânico entre outros produtos da agricultura familiar e fortalecer os canais de comercialização já existentes. Comercialização Em 2005, a Embrapa Algodão iniciou, juntamente com parceiros locais como a Arribaçã, Emater-PB, AS-PTA, entre outros, um projeto no Assentamento Queimadas, município de Remígio PB, denominado de Escola do Algodão. Neste mesmo ano foram implantadas duas Escolas de Campo Participativa, uma no referido assentamento e a outro no assentamento corredor, ambas no município de Remígio PB, com o algodão cultivado de forma agroecológica. No ano de 2006 o projeto ampliou-se para 18 agricultores, perfazendo um total de 28 hectares plantados. Estes foram inseridos dentro de um processo de formação onde se discutia as questões agroecológicas. A comercialização foi acordada com uma empresa do setor têxtil do Estado de São Paulo para pagar o algodão orgânico ao preço mínimo de 25% acima do maior valor de mercado encontrado no estado da Paraíba, na época de venda. Um aspecto importante foi à qualidade do algodão orgânico, visto que todo o manejo foi realizado de forma manual ou com o auxílio da tração animal. Outro fator que merece destaque foi a colheita manual do algodão, pois esta, da maneira que foi realizada garantiu um produto isento de impurezas, o que aumentou a qualidade da fibra do algodão e o poder de negociação por melhores preços no momento da comercialização. O processo de certificação
5 aconteceu mediante inspeção do Instituto Biodinâmico (IBD), este acompanhado pelas instituições proponentes e parceiras do projeto em todo o processo. Treze agricultores envolvidos no projeto produziram cinco toneladas de algodão em caroço comercializado ao preço de R$1,25/kg. A média de produtividade foi em torno de 263 kg de algodão/hectare. O montante de algodão produzido e comercializado ao valor acima especificado gerou um total monetário de R$ 6.250,00, perfazendo uma média de R$ 481,00/agricultor. Dentro de todo esse processo de fortalecimento da cultura do algodão orgânico nas comunidades, ficou claro a descentralização das atividades, com base no acompanhamento das ações dentro das ECP's, como distribuição de mudas diversas, realização de visitas de intercâmbio dentro de um contexto mais amplo de formação dos agricultores familiares. Proposta de Ampliação Para o ano de 2007, espera-se aumentar o número de famílias para 50, a área plantada com algodão herbáceo para 50 hectares, a produtividade deverá ser otimizada nas condições de sequeiro, o número de municípios deverá subir para seis e a expectativa de produção deverá ficar entre 10 e 12 toneladas. de algodão em caroço (rama). CONCLUSÕES A partir do compartilhamento e união dos saberes dos agricultores e dos pesquisadores e técnicos envolvidos no projeto, os agricultores foram capazes de formular estratégias de produção do algodão para o convívio com as pragas e as adversidades climáticas através do manejo racional e agroecológico. Também, os agricultores foram capazes, a partir da metodologia participativa de Escola de Campo, de se apropriarem e adaptarem os conhecimentos na produção de algodão orgânico no Curimataú paraibano. CONTRIBUIÇÃO PRÁTICA E CIENTÍFICA DO TRABALHOS Inserção de agricultores no mercado orgânico; Construção coletiva e participativa de uma proposta metodológica para desenvolvimento comunidades, particularmente em assentamentos de reforma agrária; Levantamento in loco de demandas reais de pesquisa para sistemas de produção orgânicos do Semi-árido REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS EMBRAPA Agropecuária Oeste. Algodão: tecnologia de produção.. Dourados: Embrapa Agropecuária Oeste/Embrapa Algodão, p. SILVEIRA, L. M. da. Lógicas de Inovação e Desenvolvimento Territorial: Do Diagnóstico à Experimentação. In: SABOURION, E.; TEIXEIRA, A. O. Planejamento e desenvolvimento dos territórios rurais: conceitos, controvérsias e experiências. Brasília: Embrapa Informação Tecnológica, Cap.13. p VERDEJO, M. E. Diagnóstico rural participativo: guia prático DRP. Brasília, MDA/SAF, p. WANDERLEY JÚNIOR, J. S. A. Experiências para produção de algodão herbáceo em sistemas
6 agroecológicos familiares no curimataú paraibano. Areia: CCC/UFPB, p.
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