OS SABERES DE PROFESSORES SOBRE DIDÁTICA: REFLEXÕES SOBRE O ENSINAR
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- Bernardo de Figueiredo Valgueiro
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1 OS SABERES DE PROFESSORES SOBRE DIDÁTICA: REFLEXÕES SOBRE O ENSINAR Tereza Cristina Leandro de Faria Universidade Potiguar - UnP Resumo Quando se questiona a qualidade da educação dispensada aos alunos, surge a questão da competência do professor e mesmo das instituições responsáveis por sua formação. O professor deve possuir um repertório de conhecimentos coerente e pertinente que corresponda aos saberes próprios da profissão. As pesquisas sobre os saberes docentes realizadas nos últimos anos no Brasil e em países como Portugal, Espanha e Estados Unidos afirmam que existe, hoje, um repertório de conhecimentos pedagógicos que possibilita ao professor ensinar melhor. Nesse contexto, o trabalho resulta de uma pesquisa qualitativa, que teve por objetivo geral investigar os saberes de professores sobre Didática : e, por objetivos específicos: a) saber o que para eles é ensinar; e b) identificar como a Didática ajuda o professor no seu fazer pedagógico. As informações, colhidas por meio de um questionário, foram categorizadas e analisadas utilizando-se a técnicaanálise de conteúdo (BARDIN, 1977).As respostas dos professores às questões de estudo me levam a afirmar que eles podem ter um conhecimento declarativo, também chamado descritivo ou factual, por meio do qual sabem expressar em forma de proposições o que acontece ou o que pensam sobre ensinar ao responder o que é e como ensinam, de forma descritiva. Esse tipo de conhecimento não oportuniza um saber-fazer pedagógico profissional, argumentado, necessário às demandas educativas da sociedade contemporânea. Podem também, para explicar o que estão fazendo, estar utilizando expressões popularizadas no meio educacional com um sentido muito diferente do que tinham originalmente, mostrando que estão se apoiando em ideias frágeis para ensinar. Palavras-chave: Formação de professores. Saberes docentes. Didática. Introdução No Brasil, o século XXI, no plano educacional, apresenta um panorama bastante complexo: de um lado, as escolas dispondo de vários modelos dos processos de ensino-aprendizagem e buscando pelo mais eficiente; de outro, a incontestável falta de aproveitamento das capacidades intelectuais, sociais e culturais dos alunos desde os primeiros anos de escolaridade. Os primeiros anos são fundamentais, pois, de acordo com o desenvolvimento psicológico, é nessa fase que surgem potencialidades extraordinárias. Se estas não tiverem a atenção educativa requerida, perder-se-ão, trazendo sérios danos e um possível estancamento do indivíduo no seu processo de crescimento intelectual, afetivo e social. A escola é a instituição explicitamente destinada a transmitir, sistematicamente, os conhecimentos. Qualquer que seja ela pública ou privada, tradicional ou moderna, de melhor ou pior qualidade possui uma característica 05166
2 inerente a esse tipo de instituição: o conhecimento é o objeto privilegiado de sua ação. Assim sendo, cabe às escolas promoverem um ensino capaz de desenvolver nos alunos uma aprendizagem que contribua parao desenvolvimento integral da personalidade, construída sobre a base dos contextos socioculturais nos quais esses alunos se desenvolvem. Ao mesmo tempo, é imprescindível que, a cada dia, o ensino propicie ao aluno a aquisição de procedimentos e estratégias que lhe permitam apropriar-se dos conhecimentos acumulados pelas gerações precedentes de uma forma mais ativa, reflexiva e independente de maneira tal que se convertam em mecanismos propulsores de seu próprio desenvolvimento e de instrumentos de ação e transformação no meio físico e social. Esse esforço procura romper com práticas de ensino baseadas na transmissão/acumulação de conhecimentos e pautadas pelo conhecimento fragmentado, descontextualizado e de limitado poder educativo. Nesse sentido, a educação se apresenta como uma ferramenta de cidadania, uma maneira de educar o indivíduo para participar de forma ativa na sociedade, e não exclusivamente como mecanismo de adaptação às novas exigências sociais, característica de projetos educativos que respondem de maneira acrítica à sociedade doconhecimento e às formas atuais de globalização da economia, manifestações de novas formas de organização do capitalismo. E como estão os saberes dos professores sobre Didática (as teorias do ensino)? O que estudaram em cursos de formação inicial e/ou continuada oportunizou a construção de saberes necessários a uma prática docente que realmente contribua para o desenvolvimento integral da personalidade do educando? Para responder as essas questões foi realizado esse estudo que teve por objetivo geral investigar os saberes de professores sobre Didática e por objetivos específicos: a) saber o que para eles é ensinar; e b) identificar como a Didática ajuda o professor no seu fazer pedagógico. Esperamos poder contribuir com reflexões teóricas e práticas que venham a ajudar os cursos de formação inicial e continuada de professores. Bases conceituais O termo Didática surgiu quando os adultos começaram a intervir na aprendizagem das crianças através de uma direção deliberada e planejada do ensino (LIBÂNEO, 1994). Em se tratando de Didática, faz-se necessária uma referência a João Amós Comênio, que, em meados do século XVII, escreveu a primeira obra clássica sobre o 05167
3 tema, a Didática Magna. A formação da teoria didática para investigar as ligações entre o ensino e a aprendizagem e suas leis foi obra de Comênio, bem como o primeiro registro de preocupação com um ensinodirigido a todos os povos, com uma escolapara a vida toda, que ensinasse tudo a todos totalmente (MANACORDA, 2000). Segundo Libâneo (1994), a Didática estuda os fundamentos, as condições e os modos de realização da instrução e do ensino. A elacabe converter objetivos sociopolíticos e pedagógicos em objetivos de ensino, selecionar conteúdos e métodos em função desses objetivos e estabelecer os vínculos entre ensino e aprendizagem, tendo em vista o desenvolvimento das capacidades mentais dos alunos. Conforme Danilov e Skatkin (1985, p. 34), Para Grossi (1990, p. 45), A Didática estuda o processo de ensino em cujo desenvolvimento tem lugar a assimilação dos conhecimentos sistematizados, o domínio dos procedimentos para aplicar ditos conhecimentos na prática, e o desenvolvimento das forças cognoscitivas dos educandos. A Didática é a parte da Pedagogia que se ocupa das aprendizagens complexas que requerem sistematização e organização.ela se ocupa do ambiente que possibilita as aprendizagens mais pontuais e específicas dos campos científicos, que configuram as disciplinas escolares. A Didática é a ciência que dá conta de fazer com que alguém, não tendo um certo conhecimento, passe a tê-lo; isto é, ela se ocupa da construção do conhecimento. Segundo Martins (2008, p. 176), a Didática vai além de compreender o processo de ensino em suas múltiplas determinações para intervir nele e reorientá-lo na direção política pretendida; ela vai expressar a ação prática dos professores, sendo uma forma de abrir caminhos possíveis para novas ações. A prática histórico cultural tem demonstrado que, de acordo com as aspirações da sociedade, a formação das novas gerações se produz, fundamentalmente, no processo de ensino-aprendizagem. Esse processo pode ser estudado por várias ciências, entretanto existe uma que o estuda considerando o encargo social. Isto é, a sociedade atribui à escola a responsabilidade pela formação integral da personalidade do aluno. Nesse contexto, concordamos com Zayas (1992) ao afirmar que a Didática é a disciplina científica que estuda o processo de ensino dirigido a resolver essa problemática que se apresenta para a escola: uma formação do indivíduo que responda 05168
4 aos anseios da sociedade. Assim, o processo de ensino converte-se no instrumento fundamental, dado seu caráter sistemático, para satisfazer essa necessidade. Baseado nos resultados das pesquisas da Psicologia Pedagógica, Davidov (1988) discute um grupo de princípios para o ensino que, nesse contexto emomento histórico, ele chamou escola do futuro. Entre esses princípios, destacam-se os seguintes: articulação entre teoria e prática, exequibilidade, caráter consciente, visualização e rigor científico. Na opinião de Davidov (1988), a aplicação desses princípios possibilitou pensar na escola do futuro, orientada para atender à sociedade socialista no contexto da revolução científica e tecnológica do século XX. No entanto, o conteúdo desses princípios tem uma atualidade notável para a escola de hoje. Os princípios didáticos são os elos entre a Didática, a Psicologia e a Pedagogia, expressos em teses que norteiam a instrumentalização do ensino. Para Danilov e Skatkin (1985, p. 25), os princípios didáticos são como categorias da Didática que definem os métodos de aplicação das leis do ensino, em correspondência com os fins da educação e do ensino. Os pedagogos soviéticos diferenciaram ensino de educação, mas reconheceram que ambas categorias constituíam uma unidade. Dessa forma, diferenciavam o processo docente (plano didático), do processo educativo (plano pedagógico). Para eles, o ensino tem como tarefa essencial dotar os alunos dosconhecimentos, habilidades e hábitos da formação dos fundamentos de uma visão dialético-materialista do mundo e o desenvolvimento das capacidades cognoscitivas. A educação está orientada à formação da moral e das normas de conduta. Dessa forma, apesar de serem categorias específicas, ensino e educação, nesse contexto, têm as mesmas finalidades. Para Makarenko(apudLUEDEMANN, 2002) a lógica do processo de ensino é específica em relação ao processo educativo. O processo de ensino pode ser caracterizado pelos seguintes aspectos (ZAYAS, 1992): os objetivos, o conteúdo e sua estrutura e o processo em si mesmo, que adota formas e métodos característicos nos quais se vinculam o professor e os alunos em um sistema docente dirigido para a formação integral da personalidade do aluno. Conforme Candau (2003), até o início dos anos de 1980 a Didática no Brasil tinha um caráter exclusivamente instrumental (fundamentada na psicologia condutista ou behaviorista). Era concebida como um conjunto de conhecimentos técnicos sobre o como fazer pedagógico, que eram apresentados de forma universal e, por esse motivo, 05169
5 desvinculados dos problemas relativos aos fins da educação, dos conteúdos específicos e do contexto sociocultural no qual foram gerados. Por essa visão, perpassa a questão da neutralidade científica, como se a ciência pudesse ser compreendida tendo como única referência a coerência interna, sem levar-se em consideração o contexto histórico da produção científica e suas implicações. Essa situação começa a ser questionada a partir da metade dos anos de O desafio é a superação da Didática instrumental pela Didática fundamental, e, para isso, é preciso assumir a multidimensionalidade do processo de ensino-aprendizagem (a competência técnica e humana e o compromisso político se exigem mutuamente e se interpenetram e, assim sendo, não podem se dissociar um do outro) e explicitar pressupostos. Isso implica analisar as diferentes abordagens metodológicas e explicitar o contexto em que foram geradas e a visão de homem, de sociedade e de educação que veiculam. É preciso, também, deixar claro o papel da Didática na formação inicial e continuada dos professores. Para Candau (1984), trata-se de conhecimento de mediação, portanto é importante que se baseie nas disciplinas da área de fundamentos: sua especificidade é garantida pela preocupação com a compreensão do processo de ensinoaprendizagem e a busca de formas de intervenção na prática educativa. Tem, pois, por objetivo o como fazer, mas este só tem sentido quando articulado ao para que fazer e ao por que fazer. Uma das tarefas didáticas dos professores é o planejamento de suas atividades de ensino. Planejar o ensino é buscar o equilíbrio entre meios e fins, entre recursos e objetivos à procura da qualidade educacional e, consequentemente,contribuir para o desenvolvimento integral da personalidade do aluno. Como processo, o planejamento de ensino não ocorre em um momento do ano, mas a cada dia. A realidade educacional é dinâmica. Como os problemas, as reivindicações não têm hora nem lugar para se manifestarem, as decisões vão sendo tomadas a cada dia, a cada momento. O planejamento do ensino-aprendizagem como uma hipótese de trabalho requer o domínio de uma série de saberes provenientes de disciplinas de sua formação profissional. São conhecimentos teóricos disciplinares e do contexto, tais como: as exigências dos planos e programas oficiais, as condições prévias dos alunos para a aprendizagem, os princípios e as condições do processo de transmissão e assimilação ativa da cultura, a organização e o funcionamento da escola, o meio social. E, entre esses saberes,ensinar e aprender são categorias-chave
6 O domínio dos saberes provenientes das disciplinas da formação profissional, dentre elas, a Didática, são referências epistemológicas para planejar e refletir sobre o planejado na dinâmica das experiências anteriores e futuras, caminho à construção/reconstrução de novos saberes, de forma explícita e consciente. Devido à importância que é atribuída, no âmbito deste trabalho, à categoria saber, faz-se necessário procedermos a algumas reflexões e esclarecimentos a esse respeito, porque, de acordo com Fiorentini et al. (1998), os textos em educação normalmente utilizam os termos saber e conhecimento sem distinção de significados. Os próprios autores enfatizam que, no artigo Saberes docentes: um desafio para acadêmicos e práticos (1998, p. 312), irão utilizá-los sem uma diferenciação rígida, apesar de concebê-los da seguinte forma: Conhecimento aproximar-se-ia mais com a produção científica sistematizada e acumulada historicamente com regras mais vigorosas de validação tradicionalmente aceitas pela academia; o saber, por outro lado, representaria um modo de conhecer/saber rigoroso e mais articulado a outras formas de saber e fazer relativos à prática não possuindo normas rígidas formais de validação. Grossi (1990), ao analisar a aprendizagem a partir dos produtos que deladerivam, concebe o conhecimento como resultante de uma aprendizagem sistematizada, é social, mais ligado à reflexão e à linguagem; o saber, por outro lado, é produto de uma aprendizagem não sistematizada, é pessoal, mais ligado à ação, às percepções e aos movimentos. Segundo Wellington e Pozo (apud FURIÓ, 1994), do ponto de vista filosófico, o conhecimento pode ser classificado em três grupos. O conhecimento declarativo, também chamado descritivo ou factual, por meio do qual sabemos expressar em forma de proposições o que acontece ou o que pensamos sobre um conceito, procura responder ao que é, ao que acontece, de forma descritiva. O conhecimento processual ou procedimental, relativo às habilidades que se dominam e que, em geral, se demonstram através da ação de um saber fazer, manifesta-se quando se responde ao como se faz uma coisa e, em geral, pode-se demonstrar fazendo-a. Existe também quando se expressam os argumentos de uma resposta em forma proposicional. Oconhecimento explicativo implica o domínio de teorias (compreendidas como construções dinâmicas de hipóteses entrelaçadas) que dão significado e profundeza aos dois tipos de conhecimentos anteriores e se caracteriza por seu poder preditivo. Este tipo de conhecimento responde 05171
7 ao porquê dos fatos e dos conceitos e pode ser considerado um pensamento causal. Nessa perspectiva, o saber representa um conhecimento processual-explicativo. Existem muitas outras definições de conhecimento e saber, mas, no geral, o que é dito aproxima conhecimento da produção científica sistematizada e acumulada historicamente e saber a um modo de conhecer/fazer menos sistematizado, dinâmico, ligado à prática. Com relação a saber e conhecimento, neste trabalho, optamos pelo significado adotado pelo grupo da base de pesquisa Formação e Profissionalização Docente, do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Ensino e Formação Docente, NEPED- UFRN: O saber representa uma ajuda ao pensamento necessário para a ação, mas não constitui um conhecimento abstrato, e sim um conhecimento incorporado ao fazer argumentado, consciente. Emerge de um conhecimento sistematizado, que é transformador potencialmente. É um tipo de conhecimento que pode teorizar a prática e orientá-la e éa base da reconstrução de novas teorizações. Entretanto, conhecer é um produto da aprendizagem, sistematizado ou não, de caráter descritivo e de limitadas potencialidades transformadoras da prática, que permite teorizar instrumentalmente de forma desvinculada da ação prática, profissional do professor. Saber e conhecer são produtos e processos da aprendizagem sistematizada no marco escolar, ou fora da escola (RAMALHO, NÚÑEZ, MORAIS, 1999,p.7). É este saber/fazer argumentado que se espera dos professores quando no exercício de sua profissão. Eles devem saber justificar a escolha e a utilização de determinadas estratégias de ensino-aprendizagem, tendo, como referência, os fundamentos científicos proporcionados pela Didática, dentre outras disciplinas. O saber/fazer argumentado emerge de uma formação inicial e continuada que tenha, por eixo norteador, a profissionalização docente e, consequentemente, a interação dialética do fazer com o conhecer, num contexto concreto onde os saberes são reconstruídos/construídos. Metodologia da pesquisa Esta é uma pesquisa qualitativa, que teve por objetivo geral: investigar os saberes de professores sobre Didática e, por objetivos específicos: a) saber o que para eles é ensinar; e b) identificar como a Didática ajuda o professor no seu fazer pedagógico. Tendo em vista os objetivos, foi aplicado,de forma individual, um questionário composto de uma parte de identificação e outra com6 perguntas abertas, a 05172
8 7 professores graduados em Pedagogia, atuando na educação básica. O questionário foi escolhido em função da especificidade do fenômeno estudado e as questões foram abertas a fim de colher o primeiro nível de elaboração dos discursos dos professores a respeito do que é ensinar. Como instrumento de coleta de informações, o questionário oportunizou aos professores exprimirem suas idéias pessoais, traduzindo-as com suas próprias palavras, conforme seus próprios sistemas de referência. As informações colhidas foram categorizadas com o fim de empreender um estudo minucioso de seu conteúdo, das palavras e frases que o compõem, procurando os sentidos e as intenções atribuídas pelos professores às questões de estudo. A técnica utilizada para a análise das informações foi a análise de conteúdo (BARDIN, 1977). Conversa com os professores sobre o ensinar Ao serem indagados sobre o que é ensinar, 1 professor afirmou que é compartilhar aprendizagens; 3 afirmaram que é conduzir o aluno a descoberta de novos conhecimentos; e 3 que é mediar o conhecimento. Em nenhum momento mencionou-se transmissão/assimilação ativa de conhecimentos e habilidades (LIBÂNEO, 1994). Verificou-se uma ênfase na aprendizagem, tudo indica que a questão central é que o aluno aprenda a aprender habilidades específicas, definidas como competências que são previamente definidas nos programas escolares em sintonia com o mercado de trabalho. Saviani (apudmartins, ROMANOWSKI 2010),esclarece que o lema aprender a aprender está ligado às idéiasescolanovistas, mas na perspectiva da constante atualização para ampliar as possibilidades de empregabilidade. À questão o professor tem por função ensinar, 2 professores afirmaram que sim; 4, que sua função é mediar o conhecimento; e 1, que tem a função de ensinar e aprender. Isso reflete a insistência, assim como a inconsistência, em se afirmar que a função do professor é facilitar a aprendizagem, ou que a função docente é mediar a aprendizagem num processo de coisificação do conhecimento. A função do professor é a elaboração do conhecimento, a disposição para recriá-lo, criticá-lo, situá-lo historicamente ao invés de transformá-lo em mercadoria a ser depositada nas cabeças de crianças e jovens. De acordo com Gadotti (2003), os humanos são seres inacabados e incompletos e têm consciência disso. Por isso, precisam aprender com. Aprende-se com porque 05173
9 se precisa do outro, fazem-se na relação com o outro, mediados pelo mundo, pela realidade em que vivem. Vale salientar que ensinar vem do latim insignare, que significa marcar com um sinal, indicar um caminho, um sentido. O professor deve ser um profissional do sentido. Portanto, a função do professor é ensinar mas ensinar não apenas para transmitir ou mediar conhecimentos, ou ainda facilitar a aprendizagem, mas ensinar para transformar o conhecimento do aluno em prol dele mesmo, em prol de um mundo melhor, mais democrático, justo e igualitário. Em se tratando de como o professor deve ensinar, as respostas foram muito variadas: 1 professor afirmou que não existe receita pronta mas compromisso e responsabilidade; 2 afirmaram que a partir dos conhecimentos prévios; 1, a partir de temas que despertem o interesse do aluno; 1, que o que deve fundamentar a ação do professor é o afeto; 1, que deve criar oportunidades de ensino a partir do que aprendeu na sua formação inicial e continuada; e 1, buscar estratégias para favorecer situações de conhecimento. Da totalidade de respostas, infere-se que o professor não se utiliza dos saberes provenientes da Didática (teorias sobre o ensino) para explicar a ação de ensinar. De acordo com Zayas (1992), o processo de ensino congrega os objetivos, o conteúdo e sua estrutura e o processo em si mesmo, que adota formas e métodos característicos nos quais se vinculam o professor e os alunos em um sistema docente dirigido para a formação integral da personalidade do aluno. Ao serem indagados sobre a disciplina e/ou disciplinas que no curso de formação ensinou-os a ensinar, 5 professores afirmaram que foi a Didática; 1, que foi a Didática e as Metodologias Específicas; e 1, a Didática e a Psicologia. Não restam dúvidas que a Didática, apesar das várias funções que desempenhou ao longo de seu desenvolvimento histórico, nos cursos de formação tende a priorizar aspectos específicos do fazer pedagógico em detrimento de sua dimensão de totalidade. O ensino da Didática está conduzindoa ênfase no aprender a aprender do aluno como sujeito intelectualmente ativo, criativo, produtivo, capaz de dominar os processos de aprender (MARTINS, ROMANOWSKI, 2010). Diante das respostas dos professores às questões acima,surgiu a necessidade de se indagar o que para eles é Didática. Dos 7 professores, 5 disseram que a Didática é a disciplina que ensina métodos e técnicas de como ensinar; para 1 professor é a arte de ensinar, de mediar o conhecimento; e para 1, é a disciplina que estuda o processo de 05174
10 ensino através dos seus componentes, dando embasamento teórico para desenvolver a capacidade crítica e análise da realidade do ensino. De acordo com Masetto (1997), a Didática possui três dimensões: a humana, a político e social e a técnica. Tudo indica que, para os professores, a dimensão técnica foi a que se sobressaiu.tudo bem que a definição de objetivos, seleção de conteúdos, técnicas e recursos de ensino e a organização do processo de avaliação é parte integrante e de importância para o processo de ensino-aprendizagem, mas não deve figurar como a mais significativa em detrimento das outras duas. Quando indagados sobre de que forma a Didática ajuda o professor a ensinar melhor responderam:4, quando os ajudam a organizar e sistematizar o processo de ensino; 1, quando estabelece os vínculos entre o como, o quê e por quê ensinar; 1, quando ajuda a transformar objetivos sócio, políticos e pedagógicos em objetivos de ensino; e 1, quando é o elemento norteador para dar vida, luz e encantamento ao trabalho pedagógico. Nas falas dos professores encontram-se termos próprios da Didática, porém tudo indica que utilizam determinadas expressões sem saber direito o que significam. Pelas respostas dos professores, verifica-seainda a valorização de procedimentos específicos, técnicos, vinculados às áreas de conteúdos e trabalhadas nas metodologias e didáticas específicas. Verifica-se também que a Didática Geral, enquanto área de conhecimento que tem como objeto de estudo o processo de ensino numa dimensão de totalidade, buscando compreendê-lo em suas múltiplas determinações para intervir nele e reorientá-lo na direção pretendida, pode ter tidoum espaço pouco significativo na formação dos professores. Pesquisa realizada pela revista Nova Escola e IBOPE (GENTILE, 2007) concluiu que a formação inicial é apontada pela maioria dos professores como excelente. Mas, ao mesmo tempo, reconhecem não estarem preparados para a realidade da sala de aula. No entanto, salienta-se que é imprescindível que os professores saibam efetivamente como se ensina, como se aprende, como se acompanha o aprendizado, o que e quem fundamenta o conjunto de suas ações e propostas formativas. Conclusão Educação de qualidade se faz com professores bem formados e comprometidos com a transformação social. Professores cujos conhecimentos se pautam nas dimensões 05175
11 humana, político e social e técnica do saber docente, para o qual devem se mobilizar reconhecendo-se como profissionais. Entretanto, as respostas dos professores às questões de estudo me levam a afirmar que eles podem ter um conhecimento declarativo, também chamado descritivo ou factual, por meio do qual sabem expressar em forma de proposições o que acontece ou o que pensam sobre ensinar ao responder o que é e como ensinam, de forma descritiva. Esse tipo de conhecimento não oportuniza um saber-fazer pedagógico profissional, argumentado, necessário às demandas educativas da sociedade contemporânea. Podem também, para explicar o que estão fazendo, estar utilizando expressões popularizadas no meio educacional com um sentido muito diferente do que tinham originalmente, mostrando que estão se apoiando em idéias frágeis para ensinar. De acordo com Libâneo (1994), os saberes sobre as bases teórico-científicas e técnicas, e sua articulação com as exigências concretas do ensino, permitem maior segurança profissional, de modo que o professor ganha base para pensar a prática e aprimorar sempre mais a qualidade do seu trabalho. REFERÊNCIAS BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, CANDAU, V. (Org.) A didática em questão. Petrópolis: Vozes, CANDAU, V. Rumo a uma nova didática. Petrópolis: Vozes, DANILOV, M. A.; SKATHIN, M. N. Didáctica de la escuela media. La Habana: Pueblo y Educación, DAVIDOV, V. La enseñanza escolar y el desarrollo psíquico: investigación psicológica teórica y experimental. Moscu: Progreso, FIORENTINI, D. ; SOUZA JR, A. J. ; MELO, G. F. A. de.saberes docentes: um desafio para acadêmicos e práticos. In:Cartografias do trabalho docente.campinas: SP, Mercado das Letras, FURIÓ, C.J. Tendencias atuales en la formación del profesorado de ciencias. Enseñanza de las ciencias, [S.l.], v.2,n., p ,1994. GADOTTI, M. Boniteza de umsonho: ensinar e aprender com sentido. Novo Hamburgo/RG: Feevale, GENTILE, P. A educação vista pelos olhos do profesor. Nova Escola, São Paulo, p , GROSSI, E. P. A contribuição da psicologia na educação. Em Aberto, Brasília, v. 9, n. 48, p , LUEDEMANN, C. S. Anton Makarenko vida e obra: a pedagogia na revolução. São Paulo: Expressão Popular, LIBÂNEO, J. C. Didática. São Paulo: Cortez, MANACORDA, M. A. História da educação: da antiguidade aos nossos dias. São Paulo: Cortez, MARTINS, P. L. O. Didática teórica/didática prática: para além do confronto. São Paulo: Loyola,
12 MARTINS, P. L. O.; ROMANOWSKI, J. P. Educação. Porto Alegre, v. 33, n. 3, p , set/dez MASETTO, M. Didática: a aula como centro. São Paulo, FTD, RAMALHO, B. L; NUÑEZ, I. B.; MORAIS, T. A Didática na formação continuada de professores (as). Um estudo centrado na reflexão da prática. [S. l.], EPEN, ZAYAS, M. A. de. La escuela en la vida.la Habana: Félix Varela,
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