Poder Judiciário Tribunal Regional Federal da 5ª Região Gabinete do Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho

Transcrição

1 (Relatório) O Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho: Apelação de sentença que, em sede de mandado de segurança impetrado pela Fundação Edson Queiroz contra ato do Inspetor-Chefe da Alfândega do Aeroporto de Fortaleza, no Estado do Ceará, denegou a ordem que objetiva seja determinada à autoridade coatora liberar a mercadoria importada pela impetrante, sem o pagamento do Imposto de Importação, do Imposto sobre Produtos Industrializados e das contribuições sociais vinculadas a importação, bem como de, posteriormente, proceder qualquer cobrança das exações citadas. Historia a impetrante ser entidade dedicada ao ensino público superior e à assistência social, sendo reconhecida como de utilidade pública por lei em esfera municipal e estadual e por decreto de âmbito federal, e ainda teve acolhido o direito à imunidade de contribuição previdenciária mediante declaração judicial com sentença transitada em julgado, f. 04, e ter importado equipamentos para desempenhar suas atividades. Entretanto, o referido material encontra-se retido na alfândega, em razão do não recolhimento do Imposto de Importação, do Imposto sobre Produtos Industrializados e das contribuições sociais vinculadas a importação. Sustenta que o ato é ilegal e arbitrário, afrontando os arts. 150, inciso VI, alínea c, e 195, 7º, da Constituição Federal. Liminar deferida em parte, ante o depósito do crédito tributário com a finalidade de suspender sua exigibilidade, f Parecer do Ministério Público sobre a ausência de interesse público a justificar sua intervenção, f Irresignada, a impetrante apela, atroando estar equivocada a sentença, porque a não renovação do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social, concedida pelo Conselho Nacional de Assistência Social, está sendo contestada na seara administrativa. Aduz que os documentos trazidos aos autos comprovam a condição da recorrente, inclusive, confirmada no julgamento da AMS , a qual reconheceu o direito à imunidade ora reclamada. Contrarrazões, f É o Relatório. AMS 99614/CE MAPG Pág. 1

2 (Voto) O Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho: O ponto primordial da apelação repousa na incerteza quanto ao enquadramento da impetrante com Entidade Beneficente de Assistência Social, o que lhe beneficiaria com a imunidade tributária prevista no artigo 195, 7º, da Constituição Federal. Conforme posto pela impetrada, o Conselho Nacional de Assistência Social, por meio da Resolução 178, de 08 de dezembro de 2004, indeferiu o pedido de renovação do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social da apelante, f. 95. A apelante, por sua vez, alega que recorreu administrativamente dessa decisão, aguardando que o referido Conselho reaprecie seu pedido. Quanto ao argumento da apelante de que possui direito adquirido è renovação incondicional de seu Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social, vejamos o mais recente posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, inclusive o enunciado da Súmula 352: [1] Tributário. Mandado de segurança. Contribuição previdenciária. Entidade filantrópica. Imunidade. Direito adquirido. Inexistência. Legalidade do art. 3º, VI, do decreto 2.536/98. Necessidade de observância do percentual de 20% de gratuidade. Impossibilidade de dilação probatória. Precedentes. Segurança denegada. 1. A jurisprudência mais recente do STJ assentou o entendimento de que (a) inexiste direito adquirido a regime jurídico-fiscal, de modo que a isenção (que, a rigor, é imunidade) da contribuição previdenciária patronal assegurada às entidades filantrópicas, prevista no art. 195, 7º da Constituição, tem sua manutenção subordinada ao atendimento das condições previstas na legislação superveniente; e de que (b) é legítima a exigência prevista no art. 3º, VI, do Decreto 2.536/98, no que se refere à demonstração de aplicação de um mínimo de 20% da receita bruta anual em gratuidade (MS /DF, 1ª Seção, Min. José Delgado, julgado em ; MS /DF, relator designado para acórdão Min. Teori Albino Zavascki, julgado em , MS /DF, Min. Luiz Fux, DJ de ). 2. Por demandar produção adicional de prova, não é cabível, na via do mandado de segurança, dirimir matéria de fato controvertida entre as partes, a respeito de ter a impetrante efetivamente aplicado o mínimo de 20% de suas receitas em gratuidade. 3. Segurança denegada [MS 9210, min. Teori Albino Zavascki, julgado em 27 de junho de 2007]. [2] A obtenção ou a renovação do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (Cebas) não exime a entidade do cumprimento dos requisitos legais supervenientes. [Súmula 352, do Superior Tribunal de Justiça]. AMS 99614/CE MAPG Pág. 2

3 Portanto, não possui a apelante direito adquirido à renovação de seu Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social sem o consequente enquadramento na legislação reguladora superveniente. Segundo a impetrante, em sede de mandado de segurança julgado por esta Corte, cuja decisão transitou em julgado, lhe foi reconhecido o direito à manutenção da imunidade constitucional genérica deferida nos termos do artigo 195, 7º, da Constituição Federal. Trata da AMS 77854, da lavra da eminente des. Margarida Cantarelli, na qual a ora apelante buscava se eximir do pagamento da contribuição previdenciária incidente sobre sua folha de salários. Naquele feito, onde figurava como impetrado o INSS, o voto condutor posicionou-se no sentido de que adquirido o direito à isenção da contribuição patronal, não pode a lei dispor de forma diversa, sob pena de ver-se contrariado Principio constitucional vigente. Assim, consignou-se no acórdão a determinação de que deveria prevalecer a imunidade constitucional genérica deferida às entidades beneficentes de assistência social, nos termos do 7º do art. 195 da CF/88 [DJU- II de 25 de janeiro de 2002, p. 694]. Ocorre que a decisão em tela fez coisa julgada entre as partes daquele processo e sobre aquela matéria, ou seja, entre a ora apelante e o INSS e quanto à imunidade no pagamento da cota patronal. O presente feito, por outro lado, tem partes distintas, vez que é a Fazenda Nacional que figura como impetrada, e trata de matéria diversa, qual seja a imunidade em relação aos impostos de importação e sobre produtos industrializados e às contribuições sociais vinculadas à importação. Aquele decisório, no qual ficou reconhecida a imunidade genérica quanto à cota patronal da apelante, não tem a força de obstar qualquer nova discussão sobre esse benefício constitucional em processo distinto, notadamente quando a imunidade que agora se busca ver reconhecida não repousa sobre os mesmos fundamentos daquela. Inclusive, na AMS 99260, também da lavra da eminente des. Margarida Cantarelli, a impetrante buscou, como agora o faz, importar mercadorias sem o recolhimento dos respectivos tributos, sob os mesmos argumentos aqui sustentados: é imune, possui direito adquirido e há decisão transitada em julgado lhe garantindo o benefício. No entanto, não se reconheceu que a decisão transitada em julgado alcançaria a imunidade sobre os tributos e contribuições sociais relativas à importação, pois manifestou a relatora o entendimento de que restou demonstrada ser a Fundação detentora da isenção conferida às entidades beneficentes de assistência social apenas com relação à Contribuição Social Cota Patronal (Lei nº 8.212/91), quando do julgamento da AMS CE por este Tribunal, que analisou especificamente as determinações da Lei nº 9.732/98 [DJU-II de 02 de outubro de 2007, p. 531]. Assim, também não se sustenta o segundo argumento da apelante. Finalmente, no esteio do entendimento do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar questão similar entendeu que a exigência de renovação periódica do CEBAS não ofende os artigos 146, II, e 195, 7º, da Constituição. Precedente [RE n , Relator o Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de ]. 5. Hipótese em que a recorrente não cumpriu os requisitos legais de renovação do certificado. Recurso não provido. A exigência de renovação periódica do CEBAS não ofende os artigos 146, II, e 195, 7º, da Constituição. Precedente [RE n , Relator o Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de ]. 5. Hipótese em que a recorrente não cumpriu os AMS 99614/CE MAPG Pág. 3

4 requisitos legais de renovação do certificado. Recurso não provido [RMS27093, min. Eros Grau, julgado em 02 de setembro de 2008]. Por tudo isso, a pretensão da impetrante carece de prova pré-constituída, que o direito perseguido não foi comprovado de plano, o que prejudica sua apreciação por meio do writ, pois que a concessão da segurança é incompatível com a necessidade de dilação probatória durante o procedimento, e, na situação vivida nestes autos, não há como se posicionar quanto à imunidade da impetrante sem a certeza de que é, ou não, Entidade Beneficente de Assistência Social. O mandado de segurança, conforme dispõem os arts. 5º, LXIX, da Constituição Federal, e 1º, da Lei /09, será concedido para amparar direito líquido e certo, ou seja, o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os seus requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa, se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais [Mandado de Segurança, Hely Lopes Meirelles, 28ª edição, Editora Malheiros, 2005, p ]. Por todo o exposto, nego provimento à apelação. É como voto. AMS 99614/CE MAPG Pág. 4

5 (Ementa) Tributário e administrativo. Mandado de segurança a perseguir direito à imunidade tributária sobre importação de equipamentos, realizada por Entidade Beneficente de Assistência Social, bem como a determinação do despacho aduaneiro. Sentença que denega a ordem em razão de não ter sido renovado o certificado emitido pelo Conselho Nacional de Assistência Social. Despacho autorizado em sede liminar, ante o depósito, pela impetrante, valor referente aos impostos exigidos. 1. Consoante posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, as entidades filantrópicas, para gozar da imunidade tributária prevista nos arts. 150, VI, e 195, 7º, da Constituição Federal, sujeitam-se às condições previstas na legislação superveniente, não havendo direito adquirido à obtenção do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social. 2. Na decisão proferida na AMS 77854, não se reconheceu que a decisão transitada em julgado alcançaria a imunidade sobre os tributos e contribuições sociais relativas à importação, pois manifestou a relatora o entendimento de que restou demonstrada ser a Fundação detentora da isenção conferida às entidades beneficentes de assistência social apenas com relação à Contribuição Social Cota Patronal (Lei nº 8.212/91), quando do julgamento da AMS CE por este Tribunal, que analisou especificamente as determinações da Lei nº 9.732/98 [DJU-II de 02 de outubro de 2007, p. 531]. 3. O direito líquido e certo alegado pela impetrante carece de prova pré-constituída, exigida em sede de mandado de segurança. Apelação improvida. (Acórdão) Vistos, etc. Decide a Egrégia Terceira Turma do, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas constantes dos autos. Recife (PE), 22 de outubro de (Data do julgamento) Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho Relator AMS 99614/CE MAPG Pág. 5