PROC. Nº 2931/11 PLL Nº 127/11 EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS
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- Gabriella Franco Guterres
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1 EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS O desenvolvimento da Educação e as propostas de universalização e inclusão de jovens no sistema educacional constituíram-se, ao longo dos anos, em objeto de lutas promovidas por movimentos sociais, partidos políticos, sindicatos, mobilizando e pressionando governantes em torno da ampliação da rede pública. Essas lutas resultaram na positivação do direito universal ao acesso à escola, ou seja, todas as crianças, desde seu nascimento, possuem o direito de acesso a escolas, pré-escolas e instituições de ensino. A Constituição Federal trouxe aos cidadãos a liberdade de expressão, direitos na escolha de governantes, assegurou direitos fundamentais e, da mesma forma, proporcionou a ilusão de que a resolução de problemas envolvendo as desigualdades sociais e econômicas seriam rapidamente alcançadas 1. Destarte, passados 22 anos, o desemprego, a violência urbana, a pobreza, o analfabetismo e outras mazelas permanecem presentes na sociedade brasileira, afastando o ideal de cidadania trazido pelas constituições modernas 2. Assim, o Estado brasileiro está distante da resolução completa dessas complexas demandas e do ideal de cidadania prometido pelo constituinte. Sob essa óptica, torna-se possível colocar em diálogo a educação com aspectos pertinentes à construção da cidadania proposta por nossa carta de direitos. Um dos autores clássicos, T. H. Marshall, ao analisar o caso inglês e o lento processo de desenvolvimento da cidadania na Inglaterra, dividiu a cidadania em três dimensões: direitos civis, políticos e sociais 3. Os direitos civis consistem em direitos fundamentais à vida, à liberdade, à igualdade perante a lei, desdobrando-se na liberdade de expressão e nos direitos de ir e vir expressos como garantias. Os direitos políticos podem ser exemplificados, sinteticamente, por meio do direito de votar e de ser votado, de escolher o governo e de participar desse processo. Já os direitos sociais podem ser identificados no direito à saúde, ao trabalho, à aposentadoria e à educação 4. A educação ocupa, assim, papel central na construção da cidadania. Evelina Dagnino ressalta a nova cidadania, acrescentando elementos importantes para essa reflexão: A nova cidadania é um projeto para uma nova sociabilidade: não somente a incorporação no sistema político em sentido estrito, mas um formato mais igualitário de relações sociais em todos os níveis, inclusive novas regras para viver em sociedade 5. Podemos extrair um elemento fundamental na análise acima: a necessidade de formatar processos igualitários de relações sociais em todos os níveis. Temos, assim, que enfrentar a tensão existente entre igualdade e liberdade, utilizando aspectos pertinentes ao individualismo e à sociedade de consumo. 1 CARVALHO, J. M. D. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 12. ed. Rio de janeiro: Civilização Brasileira, p A universalidade dos direitos fundamentais do ser humano não exprime apenas a ideia de igualdade para todos, mas também demonstra a positivação do pensamento da racionalidade moderna. 3 MARSHALL, T. H. Cidadania, classe social e status. Rio de Janeiro: Zahar Editores, CARVALHO, J. M. D. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 12. ed. Rio de janeiro: Civilização Brasileira, p DAGNINO, E. Cultura, cidadania e democracia: a transformação dos discursos e práticas na esquerda latinoamericana. In: Alvarez, S.E. et al (org). Cultura e política nos movimentos sociais latino-americanos. Belo Horizonte: UFMG, p.105
2 Com a Revolução Industrial, o homem moderno tornou-se o dominador da natureza, passou a pensar suas relações em padrões de produtividade que desencadearam, na contemporaneidade, uma exagerada competitividade, um mercado de trabalho excludente e a industrialização desenfreada. Fomentou, assim, disputas de mercado, desemprego, busca da concretização de projetos individuais, busca de vantagens pessoais, privilégios, padrões de lazer reestruturados em função desse processo, alterações de padrões de desejo e sobrevalorização dos ganhos materiais 6. Essa modernidade recente traz ao individuo a busca pela concretização de seus desejos individuais que promovem satisfação e reconhecimento na sociedade atual. O individualismo atinge uma proporção tal que é capaz de gerar a aniquilação do outro em detrimento de projetos pessoais. Vivenciamos, assim, a crise do encontro do eu com o outro. O ambiente estimulado por esse individualismo exacerbado é o ambiente do preconceito, da intolerância, do racismo, do machismo, enfim, da aniquilação do outro 7. O atual contexto social registra constantes mudanças. A era digital demonstra que as informações estão cada vez mais massivas e em maior número. A internet possibilita o acesso, ao mesmo tempo, de muitas pessoas de locais diferentes do Globo, e, assim, as relações modificam-se de forma rápida e dinâmica, e, nesse mesmo contexto, problemas e desafios novos surgem a todo momento. Vivemos, assim, uma época de transição e de intensas transformações. Por mais paradoxal que possa parecer, a pretensa conexão almejada pela moderna sociedade de redes e pelo desenvolvimento tecnológico produz e reproduz processos de desintegração jamais vistos. Com a mesma velocidade com que transformações sociais alteram o cotidiano, instituições tradicionais reconfiguram suas estruturas, causando impactos nas relações sociais e, por consequência, trazendo aos indivíduos sentimentos de insegurança. Instituições responsáveis pela socialização e pelo desenvolvimento de processos de conhecimento dos seres humanos ultrapassam momentos de incerteza quanto a seus significados, trazendo questionamentos em torno de sua eficácia, frente aos complexos desafios apresentados pelos dias atuais. Utilizando a relação entre família e escola, não é incomum detectar a presença de angústias múltiplas e de críticas constantes. Se, por um lado, encontramos professores relacionando as dificuldades de aprendizagem de alunos às fragilidades na formação familiar, por outro, encontramos duras críticas de pais e familiares quanto ao papel da escola na contemporaneidade. Essa ruptura contribui para o reforço de lacunas na formação completa das novas gerações e para a sensação de crise onipresente. Este Projeto pretende investir no material humano, aproximando professores e pais, buscando integrar suas ações para a concretização de uma educação pública de qualidade. Acredita-se que o desenvolvimento de relações de igualdade e respeito deve estar na agenda política das instituições públicas e que essas podem ampliar a qualidade da educação pública 6 AZEVEDO, Rodrigo G. de. Visões da sociedade punitiva: elementos para uma sociologia do controle penal. In: GAUER, Ruth Maria Chittó (Coord.). Sistema penal e violência. Rio de Janeiro: Lumem Júris, p Ibid. p. 47.
3 municipal. Para isso, a presente Proposta visa a conjugar ações de professores e pais na formação de jovens cidadãos. Os movimentos de integração entre processos educativos escolares e familiares objetivam despertar projetos criativos e solidários, bem como fomentar o interesse de alunos, pais e professores, constituindo novas configurações da relação entre família e escola. Nesse espectro, a percepção da ausência do Estado (municípios, estados e União) em políticas públicas direcionadas para integração entre processos educativos de qualidade e cotidiano familiar, bem como a insuficiência de projetos atrativos destinados a esses propósitos, registra fragilidades nessa relação. O crescimento demográfico entre a população de baixa renda da Capital, o ingresso crescente de mulheres no mercado de trabalho 8, a ausência de planejamento familiar e outros aspectos contribuíram, e ainda contribuem, para o aumento do hiato existente entre família e escola. É nesse cenário que surge a necessidade de integrar processos educativos ao ambiente familiar. A cultura escolar possui estreita relação com a cultura familiar, sendo totalmente possível promover a integração entre essas realidades. O presente Projeto foi pensado por meio da experiência positiva da Prefeitura de Taboão da Serra, em São Paulo 9, com objetivo de ampliar a rede de proteção à criança e ao adolescente. Entretanto, a realidade de Porto Alegre permite, preliminarmente, privilegiar ações preventivas relacionadas a alunos com possibilidade de evasão escolar, bem como àqueles que possuam dificuldades diagnosticadas pela escola. A Rede Municipal de Ensino possui atualmente 96 escolas distribuídas em regiões de alta vulnerabilidade social. Dentre essas, encontramos 41 escolas infantis e 55 escolas de ensino básico. Comprovando a viabilidade da presente Proposta, o corpo funcional da Secretaria Municipal de Educação conta com aproximadamente professores, sendo que, desses, 629 atualmente possuem carga horária de 20 horas. Esses profissionais poderão, a partir da aprovação deste Projeto, constituir-se como agentes de integração entre família e escola. Justifica-se a presente Proposta com a simples análise do número de alunos infrequentes nas escolas municipais, ou seja, até o dia , o Município possuía o expressivo número de alunos, conforme os registros das Fichas de Controle do Aluno Infrequente (Ficais). 8 O acesso das mulheres ao mundo do trabalho teve como efeito as crianças entrarem em contato, cada vez mais cedo, com outras pessoas como as babás, professoras de creches, isto é, cada vez as crianças vivem mais precocemente socializações secundárias. (BARBOSA, Maria Carmem Silveira. Culturas escolares, culturas de infância e culturas familiares: as socializações e a escolarização no entretecer destas culturas. Educ. Soc., Campinas, V.28, n.100 Especial. Out p. 1064). 9 O programa premiado, também conhecido como Professor Visitador, é desenvolvido na rede municipal de ensino desde Num projeto inovador, em Taboão da Serra os professores visitam a família de todos os seus alunos, em sua casa. Atuando com profissionalismo e sensibilidade nesse território de múltiplos afetos, nossos colegas educadores têm sido capazes de estreitar o relacionamento entre mães e pais com a escola, todos diante do propósito comum de melhorar a educação das crianças e jovens. (Disponível em:
4 Criar políticas públicas com o objetivo de garantir qualidade da educação pública, possibilitando que os alunos possam desenvolver projetos pessoais viáveis, é nosso dever como representantes da sociedade. Projeto. Pelo exposto, contamos com o apoio de nossos pares para a aprovação deste Sala das Sessões, 11 de agosto de VEREADOR MAURO ZACHER
5 PROJETO DE LEI Institui o Programa de Interação Família-Escola, destinado aos alunos e aos educadores da rede pública municipal de ensino, e dá outras providências. Art. 1º Fica instituído o Programa de Interação Família-Escola, destinado aos alunos e aos educadores da rede pública municipal de ensino. Art. 2º O Programa de Interação Família-Escola dar-se-á mediante a realização de visitas por educadores às casas dos alunos, independentemente da participação de seus professores de classe. Art. 3º São objetivos do Programa de Interação Família-Escola: I ampliar a rede de proteção social à criança e ao adolescente; II compreender o ambiente familiar do aluno, procurando identificar as raízes de suas dificuldades de aprendizagem, com o fim de ajustar a metodologia educacional da escola a essa realidade; III incentivar a participação dos pais no processo de desenvolvimento educacional dos alunos; IV esclarecer os pais dos alunos sobre as características, as atividades e a metodologia educacional da escola; V contribuir para a formação continuada dos educadores, oferecendo um espaço real para a observação de suas hipóteses de trabalho e para o pleno exercício do magistério além dos muros escolares; e VI preparar um conjunto de informações sobre os alunos, conforme a sua realidade, visando a contribuir para a diminuição da violência na escola e na sua comunidade. Art. 4º Para participar do Programa de Interação Família-Escola, o educador não poderá estar afastado de suas atividades e deverá preencher termo de adesão específico para esse fim. 1º Órgão competente do Executivo Municipal elaborará o termo de adesão de que trata o caput deste artigo e, após sua leitura e seu preenchimento pelo educador, o arquivará.
6 2º Em caso de o educador desistir de participar do Programa de Interação Família-Escola, esse deverá justificar a desistência, e o órgão competente do Executivo Municipal deverá registrá-la. Art. 5º Cada educador participante do Programa de Interação Família-Escola poderá realizar até 7 (sete) visitas por mês, em sábados, domingos, feriados e períodos de recesso escolar, desde que fora de sua jornada de trabalho e do período de férias escolares. Art. 6º As visitas realizadas por educador participante do Programa de Interação Família-Escola dependerão de autorização dos pais do aluno ou de seu responsável legal e deverão ser registradas em termo específico para esse fim, elaborado por órgão do Executivo Municipal, objetivando o levantamento para fins estatísticos, para futuros estudos e para aperfeiçoamento da política educacional municipal. Parágrafo único. Os casos de não concessão da autorização de que trata o caput deste artigo deverão ser registrados pela escola. Art. 7º Para fins de inclusão dos educadores no Programa de Interação Família- -Escola, órgão competente do Executivo Municipal formular-lhes-á critérios de valorização e desenvolvimento. Art. 8º Fica instituído abono por visita realizada por educador participante do Programa de Interação Família-Escola. Parágrafo único. O abono referido no caput deste artigo não será incorporado, para nenhum fim, à remuneração do educador. Art. 9º Regulamentação desta Lei disporá sobre a implementação do Programa de Interação Família-Escola, bem como sobre o valor do abono de que trata o art. 8º desta Lei. Art. 10. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. /CRK
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