PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO

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1 1 1 0 PODER JUDICIÁRIO RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE APELANTE : RAFAEL SOARES DE CARVALHO ADVOGADO : SP RAFAEL SOARES DE CARVALHO APELADO : INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS - IBAMA PROCURADOR : PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO (RELATOR): RELATÓRIO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE Cuida-se de apelação interposta de sentença proferida pelo Juiz da 3ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, Dr. Pedro Felipe de Oliveira Santos, nos autos do mandado de segurança impetrado por RAFAEL SOARES DE CARVALHO contra ato do Presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais IBAMA, objetivando a concessão de tutela jurisdicional no sentido de lhe garantir a realização de pesca subaquática, no período de defeso, nas bacias hidrográficas do Sudeste e do Rio Paraná, observados as limitações legais. quo, com estas letras: A controvérsia instaurada nestes autos restou resumida pelo juízo a Trata-se de mandado de segurança impetrado por RAFAEL SOARES DE CARVALHO em face de ato atribuído ao PRESIDENTE DO INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS. Apresenta os seguintes fatos e argumentos às ff. 06/07: No dia 01 de novembro de 2013 iniciou-se o período de defeso (período de proibição da pesca, para proteção da reprodução ou recrutamento) nas bacias hidrográficas do Sudeste - (IN 195/2008), bem como na bacia hidrográfica do Rio Paraná - (IN 194/2008 e IN 25/2009). No período de defeso ficam permitidos a captura e o transporte somente de espécies não nativas (alóctones e exóticas), de híbridos e de camarão gigante da Malásia (Macrobrachium rosembergii), Nº Lote: _2 - - TR301145

2 fls.2/8 sem limite de cota ao pescador profissional, e com limitação, ao pescador amador, de 10 kg mais um exemplar. - art. 8 da IN 195/2008 e art. 8 da IN 194/2008. Dentre as espécies permitidas estão os peixes apaiari (Astronotus ocelatus); bagre-afi-icano (Clarias sp.); black-bass (Micropterus sp.); carpa (todas as espécies); corvina ou pescada-do- Piauí (Plagioscíon squamosissimus); peixe-rei (Odontesthis sp.); sardinha-de-água-doce (Triportheus angulatus); piranha preta (Serrassalmus rombeus); tilápias (Oreochromis spp. e Tilapia spp.), tucunaré (Cichla spp.); zoiudo (Geophagus surinamensis e Geophagus proximus) e híbridos Instrução normativa n, 25, de 1 de setembro de Todavia, nesse período, não é permitida a pesca subaquática de qualquer espécie de pescado, sujeitando ao infrator às penalidades do artigo 25 e 34, da Lei n." 9.605/98: Verificada a infração, serão apreendidos seus produtos e instrumentos, lavrando-se os respectivos autos; "detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente". Desse modo, constata-se que é permitida a pesca no período de defeso das espécies alóctones, exóticas e híbridos na modalidade embarcada/desembarcada e a proibição dessas mesmas espécies quando realizada a pesca subaquática sem qualquer justificativa. Portanto, a citada Instrução estabeleceu tratamento diferenciado para situações fáticas semelhantes, com ofensa ao princípio da isonomia. Observe, Excelência, que não existe nenhum parâmetro legal para proibir a pesca subaquática no período de defensa. O que existe é uma permissão e uma proibição para os mesmos peixes, sendo que a permissão não abrange a modalidade subaquática. (sic, ff. 06/07) Pretende, em síntese, a expedição salvo-conduto, a fim de garantir a realização da pesca subaquática (sem utilização ou auxílio de equipamentos de respiração artificial) no período de defesa, nas bacias hidrográficas do Sudeste - (IN 195/2008) e do Rio Paraná (IN 194/2008 e IN 25/2009), desde que respeitem a cota estipulada, tamanhos mínimos de captura, listas de espécie proibidas, bem como os locais permitidos, sem que implique qualquer penalidade, sobretudo quanto à restrição da liberdade e apreensão dos equipamentos. O Juízo indeferiu o pedido liminar às ff. 81/86. A autoridade coatora prestou informações às ff. 97/100. Sustentou, em preliminar, a inadequação da via eleita. No mérito, pugnou pela denegação da segurança. O Ministério Público Federal manifestou-se pela denegação da ordem (ff. 110/112). Nº Lote: _2 - - TR301145

3 fls.3/8 O juízo monocrático denegou a segurança buscada, considerando que o princípio da precaução advoga contra o impetrante (fls. 126/131). Em suas razões recursais (fls. 136/141), insiste na concessão da segurança, alegando, em resumo, que inexiste proibição de pesca subaquática (sem utilização ou auxílio de equipamentos de respiração artificial) no período do defeso, desde que observada a cota estipulada, o tamanho mínimo de captura, a lista de espécies proibidas e o local. Requer, assim, o provimento do recurso com a concessão da segurança pleiteada. Com contrarrazões, vieram os autos a este egrégio Tribunal, manifestando-se a douta Procuradoria Regional da República pelo desprovimento do recurso. Este é o relatório. Nº Lote: _2 - - TR301145

4 fls.4/8 RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE APELANTE : RAFAEL SOARES DE CARVALHO ADVOGADO : SP RAFAEL SOARES DE CARVALHO APELADO : INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS - IBAMA PROCURADOR : PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO (RELATOR): VOTO O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE Não obstante os fundamentos declinados pelo impetrante, não merece prosperar a pretensão recursal, uma vez que a sentença monocrática apreciou e decidiu a questão com acerto, encontrando-se vazada nestas letras: (...). Reitero a decisão que indeferiu o pedido liminar, por concordar com seus termos e por esgotar a matéria: (...) Não está bem delimitada nos autos a motivação ambiental do ato esgrimido. Porém, é certo que o IBAMA tem competência para regulamentar e efetuar fiscalização da atividade que pretende desenvolver o impetrante, qual seja, a pesca recreativa, na modalidade subaquática, na conformidade do disposto na Lei nº /2009: Art. 3º Compete ao poder público a regulamentação da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Atividade Pesqueira, conciliando o equilíbrio entre o princípio da sustentabilidade dos recursos pesqueiros e a obtenção de melhores resultados econômicos e sociais, calculando, autorizando ou estabelecendo, em cada caso: I os regimes de acesso; II a captura total permissível; III o esforço de pesca sustentável; IV os períodos de defeso; V as temporadas de pesca; VI os tamanhos de captura; VII as áreas interditadas ou de reservas; VIII as artes, os aparelhos, os métodos e os sistemas de pesca e cultivo; IX a capacidade de suporte dos ambientes; X as necessárias ações de monitoramento, controle e fiscalização da atividade; Nº Lote: _2 - - TR301145

5 fls.5/8 XI a proteção de indivíduos em processo de reprodução ou recomposição de estoques. [...] Art. 6º O exercício da atividade pesqueira poderá ser proibido transitória, periódica ou permanentemente, nos termos das normas específicas, para proteção: I de espécies, áreas ou ecossistemas ameaçados; II do processo reprodutivo das espécies e de outros processos vitais para a manutenção e a recuperação dos estoques pesqueiros; III da saúde pública; IV do trabalhador. 1º Sem prejuízo do disposto no caput deste artigo, o exercício da atividade pesqueira é proibido: I em épocas e nos locais definidos pelo órgão competente; II em relação às espécies que devam ser preservadas ou espécimes com tamanhos não permitidos pelo órgão competente; III sem licença, permissão, concessão, autorização ou registro expedido pelo órgão competente; IV em quantidade superior à permitida pelo órgão competente; V em locais próximos às áreas de lançamento de esgoto nas águas, com distância estabelecida em norma específica; VI em locais que causem embaraço à navegação; VII mediante a utilização de: a) explosivos; b) processos, técnicas ou substâncias que, em contato com a água, produzam efeito semelhante ao de explosivos; c) substâncias tóxicas ou químicas que alterem as condições naturais da água; d) petrechos, técnicas e métodos não permitidos ou predatórios. Ora, o Administrador Público, orientado por limitações constitucionais e legais, preferiu a interdição de um método/técnica de pesca, em determinado período, visando a proteger o interesse ambiental, que envolve, inclusive, a questão da sobrevivência de gerações futuras, em desfavor do interesse individual e de simples recreação do impetrante. Em se tratando de ato administrativo predominantemente discricionário, o controle judicial de mérito está limitado à razoabilidade. Nesse contexto, o princípio da precaução advoga contra o impetrante. Segundo a doutrina: o direito ambiental atua em momento anterior à da consumação do dano o do mero risco. Ou seja, diante da pouca valia da simples reparação, sempre incerta e, Nº Lote: _2 - - TR301145

6 fls.6/8 quando possível, excessivamente onerosa, a prevenção é a melhor, quando não a única solução. (Milaré, Edis, Direito do Ambiente, 4ª ed. 2005, pág. 166). No que toca ao periculum in mora (risco de perecimento do direito), este é inverso. A medida liminar, caso deferida, teria o condão de legitimar uma possível degradação ambiental. Ante o exposto, NEGO A LIMINAR. Notifique-se a autoridade para prestar informações no prazo de 10 (dez) dias. Intime-se o órgão de representação da pessoa jurídica interessada. Publique-se. Depois, ao Ministério Público. Brasília, 18 de dezembro de TÁRSIS AUGUSTO DE SANTANA LIMA Juiz Federal Substituto da 16ª Vara Federal, respondendo pela 3ª Afastada, portanto, a controvérsia inaugural, deve ser reiterada a decisão que indeferiu a liminar. Ante o exposto, RATIFICO OS TERMOS DA DECISÃO LIMINAR E DENEGO A SEGURANÇA PLEITEADA. Declaro extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil. Custas ex lege. Sem honorários. Com efeito, não há que se falar em legalidade da pesca recreativa subaquática no período do defeso, tendo em vista que a atuação administrativa está respaldada, não apenas pela Constituição Federal e pela legislação ordinária, mas também pela Instrução Normativa nº 194/08, do IBAMA, que estabelece normas de pesca para o período de proteção à reprodução natural dos peixes, anualmente, de 1º de novembro a 28 de fevereiro, na bacia hidrográfica do rio Paraná, assim como pela Instrução Normativa nº 195/08, que se refere às bacias hidrográficas do Sudeste, nos estados do Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná. A propósito, a IN nº 194/2008 expressamente impõe a proibição da pesca subaquática, em seu art. 6º. Ademais, a conduta do IBAMA, notadamente por privilegiar a proteção ao meio ambiente, encontra-se em total sintonia com a tutela constitucional, que impõe ao Poder Público e a toda coletividade o dever de defender e preservar, para as presentes e futuras gerações, o meio ambiente ecologicamente Nº Lote: _2 - - TR301145

7 fls.7/8 equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, como direito difuso e fundamental, feito bem de uso comum do povo (CF, art. 225, caput). Registre-se, ainda, que, na ótica vigilante da Suprema Corte, a incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a "defesa do meio ambiente" (CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral (...) O princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações (ADI-MC nº 3540/DF Rel. Min. Celso de Mello DJU de 03/02/2006). Nesta visão de uma sociedade sustentável e global, baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura de paz, com responsabilidades pela grande comunidade da vida, numa perspectiva intergeneracional, promulgou-se a Carta Ambiental da França ( ), estabelecendo que o futuro e a própria existência da humanidade são indissociáveis de seu meio natural e, por isso, o meio ambiente é considerado um patrimônio comum dos seres humanos, devendo sua preservação ser buscada, sob o mesmo título que os demais interesses fundamentais da nação, pois a diversidade biológica, o desenvolvimento da pessoa humana e o progresso das sociedades estão sendo afetados por certas modalidades de produção e Nº Lote: _2 - - TR301145

8 fls.8/8 consumo e pela exploração excessiva dos recursos naturais, a se exigir das autoridades públicas a aplicação do princípio da precaução nos limites de suas atribuições, em busca de um desenvolvimento durável, o que se verificou na espécie dos autos. *** Com estas considerações, nego provimento à apelação da impetrante, para manter integralmente a sentença recorrida. Este é meu voto. Documento contendo 8 páginas assinado digitalmente pelo(a) DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, conforme MP nº , de 24/08/2001, que instituiu a infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileiras - ICP-Brasil e Res. nº 397, de 18/10/2004, do Conselho da Justiça Federal. A autenticidade do documento pode ser verificada no site informando o código verificador Nº Lote: _2 - - TR301145