TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo

Transcrição

1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA São Paulo ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Reexame Necessário nº , da Comarca de Campinas, em que é recorrente JUIZO EX OFFÍCIO, é recorrido ADRIANO PAULO DA SILVA. ACORDAM, em 6ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores SIDNEY ROMANO DOS REIS (Presidente) e REINALDO MILUZZI. São Paulo, 11 de dezembro de LEME DE CAMPOS RELATOR Assinatura Eletrônica

2 APELAÇÃO CÍVEL Nº CAMPINAS. RECTE: JUÍZO EX OFFICIO. RECDO.: ADRIANO PAULO DA SILVA. INTERESSADAS: SECRETARIA MUNICIPAL DE TRANSPORTE DE CAMPINAS E OUTRA. JUIZ DE 1º GRAU: MAURO IUJI FUKUMOTO. VOTO Nº Mandado de segurança Exercício da atividade de transporte individual de passageiros por meio de aplicativos Uber Possibilidade Atividade que não se confunde com aquela de natureza pública, exercida pelos taxistas (art. 731 do CC) Lei Municipal n /10 Inaplicabilidade ao transporte privado, que é regido por contrato típico (art. 730 do CC) e descrito nos arts. 3º e 4º da Lei Municipal nº /12 Precedentes Segurança concedida Manutenção da sentença. Negado provimento ao reexame necessário. Cuida-se de mandado de segurança preventivo impetrado por ADRIANO PAULO DA SILVA em face do Sr. Secretário Municipal de Transporte de Campinas, objetivando exercer atividade vinculada ao aplicativo UBER e demais plataformas semelhantes, sem que receba qualquer sanção. A r. sentença de fls. 291/294, cujo relatório adoto, concedeu a segurança para: [...] determinar à autoridade impetrada que se abstenha de impedir ou restringir de qualquer modo o exercício da atividade de transporte privado individual de passageiros pelo impetrante

3 [...] necessário. Sem condenação em honorários. Determinado o processamento do reexame É o relatório. Trata-se de mandado de segurança, visando a determinar que a autoridade coatora abstenha-se de restringir ou impossibilitar o exercício de atividade de motorista parceiro junto à plataforma UBER ou outras semelhantes. A sentença mostra-se irretocável. Com efeito, o serviço de transporte privado individual de passageiros não se confunde com aquele de caráter público, que é exercido pelos taxistas, seja por meio de autorização, permissão ou concessão (art. 731 do CC). No caso do Município de Campinas, o serviço é executado sob o regime de permissão e possui regulamentação específica na Lei Municipal n /10. Referido ato normativo, vale dizer, não se aplica à atividade individual privada, que, por sua vez, conta com previsão legal nos arts. 3º e 4º da Lei Municipal nº /12 e rege-se por contrato típico especificado no art. 730 do CC. Daí, a conclusão de que o transporte privado individual não pode ser coibido com base na Lei Municipal n /10 e tampouco pode ser tratado como clandestino, sob pena de violação de bases estruturais da CF, como: os valores sociais do trabalho e da livre

4 iniciativa; o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão; o princípio da livre concorrência; a defesa do consumidor; e a liberdade de acesso e livre exercício de qualquer atividade econômica. Conforme já se decidiu em caso semelhante, cujas elucidações adoto como razão de decidir: [...] O Município tem autorização constitucional para legislar sobre transporte de passageiros dentro de seu território (artigo 30, inciso V, da CF/88). A Lei Municipal n /10 elegeu a atividade de transporte individual de passageiros como serviço público, ou seja, tomou para si a titularidade da atividade, delegando-a a permissionários [...] Assim, considero que o serviço de táxi atende a uma necessidade de interesse geral, uma necessidade coletiva, razão pela qual se enquadra na categoria de transporte público individual de passageiros. Isto significa que os permissionários atuantes em nome do Município atuam em conformidade com os princípios que informam a função administrativa, notadamente no que tange à impessoalidade. É dizer, o serviço deverá ser prestado a qualquer um que o requeira, desde que pago ao final do transporte a tarifa devida. A tarifa varia conforme o grau de utilização do serviço, atendidas às regulamentações envolvendo os critérios adotados pela Administração. De outro lado, não há dúvida de que o serviço de transporte de passageiros prestado pelo 'Uber' está disciplinado pelo regime de direito privado. Trata-se de serviço convencionado entre os credenciados da rede virtual e passageiros previamente cadastrados.

5 Assim, é adequado considerar que o valor do serviço oscila conforme a demanda, sendo possível a rejeição de passageiros e motoristas através de sistema de atribuição de notas, dentre outras características distintas que parecem subsumir a atividade ao contrato de transporte, cujas regras são delimitadas pela autonomia da vontade das partes consoante as previsões do Código Civil. Não há, portanto, a efetiva concorrência entre os serviços, mas convivência paralela, cada qual atendendo as regras dos regimes jurídicos que lhes toca. Assim, entendo que a atividade exercida pelo impetrante não se subsome à regra contida no art. 17 da Lei Municipal n /10, de modo a tornar infundada qualquer medida restritiva da atividade por parte do Município em sede do exercício do Poder de Polícia. [...] (Ap. nº , Rel. Des. JOSÉ MARIA CÂMARA JUNIOR, j. de ). Nesse mesmo sentido: APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA. PODER DE POLÍCIA. APREENSÃO DE VEÍCULO E IMPOSIÇÃO DE MULTA PELO EXERCÍCIO DE TRANSPORTE INDIVIDUAL DE PASSAGEIROS ATRAVÉS DO APLICATIVO UBER. Comprovação dos pressupostos da impetração. Certeza material e certeza jurídica. Atendimento. Município de Campinas. Lei Municipal /10. Fiscalização e imposição de penalidades ao exercício clandestino da atividade de taxi. Lei municipal que elegeu a atividade como serviço público, passível, portanto, de fiscalização e

6 controle de seu exercício no desempenho da função administrativa. O serviço não configura atividade clandestina de táxi. Incidência das regras constantes do regime jurídico de direito privado, informado pela autonomia das partes em pactuar contrato de transporte individual de passageiros. Incidência do Código Civil. Não se caracteriza a efetiva concorrência entre os serviços, mas convivência paralela, cada qual atendendo as regras dos regimes jurídicos que lhes toca. Não atendimento dos princípios que informam a Administração Pública, como a impessoalidade, dado que é possível a rejeição de passageiros, e a modicidade da tarifa, dado que o preço do serviço oscila conforme a demanda. Ofensa ao princípio da livre iniciativa e livre concorrência. Precedente do Órgão Especial que reconheceu a inconstitucionalidade de norma municipal de São Paulo que determinava as mesmas restrições previstas na Lei Municipal n /2010, de Campinas. Sentença reformada. (Ap. nº , Rel. Des. JOSÉ MARIA CÂMARA JUNIOR, j. de ) Apelação Mandado de Segurança com pedido liminar Transporte privado de passageiros - UBER Município de Campinas Pretensão de abstenção, pelos órgãos públicos municipais, da prática de atos que restrinjam ou impossibilitem o livre exercício pelos impetrantes da atividade profissional de transporte privado de passageiros, como parceiros do Uber ; e da aplicação das sanções previstas na lei nº /10, notadamente quanto ao artigo 22, caput e 1º - Admissibilidade Lei Federal nº /2012 prevê a modalidade de prestação de serviços de transporte urbano de natureza privada, sem

7 qualquer restrição Violação ao direito líquido e certo - Precedentes deste Egrégio Tribunal de Justiça Sentença denegatória de segurança reformada Recurso provido para conceder a segurança. (Ap. nº , Rel. Des. MARCELO L THEODÓSIO, j. de ) Veja-se, por fim, que o Órgão Especial deste Tribunal também partilhou do entendimento ora esposado quando do julgamento do ADI nº (Rel. Des. Francisco Casconi, j. de ), que tratava de situação análoga. Assim, a concessão da segurança é medida que se impõe no caso em apreço, devendo permanecer inalterado o r. decisum monocrático que, bem motivado, atentou para os fundamentos acimas citados, aplicando-os de maneira correta. Já é entendimento pacífico de que não está obrigado o julgador a citar todos os artigos de lei e da Constituição Federal para fins de prequestionamento. Nessa esteira, ficam consideradas prequestionadas todas as matérias e disposições legais discutidas pelas partes. Isto posto, nega-se provimento ao reexame necessário. LEME DE CAMPOS Relator