Distopias genitais. Julio Cesar Rosa e Silva Departamento de Ginecologia e Obstetrícia FMRP - USP 2014

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Transcrição:

Distopias genitais Julio Cesar Rosa e Silva Departamento de Ginecologia e Obstetrícia FMRP - USP 2014

Definição O que é distopia genital ou prolapso de órgão pélvico? Protusão de qualquer um dos órgãos pélvicos para o canal vaginal ou para o exterior da vagina ACOG Bulletin nº 85: Pelvic organ prolapse. Obstet Gynecol (2007); 110(3):717-29. National Association for continence (2013). http://www.nafc.org/prolapse/ Classificando os prolapsos em uma graduação de 0 a 4 e considerando 2 ou maior significante (sintomático x assintomático). 2

Definição Definição de distopia genital Qualquer projeção descendente do útero ou da parede vaginal anterior ou posterior ou apical para dentro do espaço potencial da vagina (sintomático x assintomático). Classificando os prolapsos em uma graduação de 0 a 4 e considerando 2 ou maior significante (sintomático x assintomático). 3

Relevância clínica Prevalência (depende da definição e do desenho do estudo) 2-3% são sintomáticos 22% entre 18-83 anos 50% entre 50-83 anos WHI: 41% entre 50-79 anos tinham algum tipo de prolapso, sendo 34% parede anterior, 19% parede posterior e 14% do útero Women s Health Iniciative. Hendrix et al. (2002) 4

Relevância clínica 300.000 procedimentos cirúrgicos ao ano 1,5 a 5 casos por 1.000 mulheres/ano 58% em mulheres <60 anos 13% nova cirurgia em menos de 5 anos 29% nova cirurgia 1 bilhão de dólares de custo annual 20% das mulheres em fila de espera para cirurgia ginecológica 5

LIG.SACRO-ESPINHOSO LIG. ÚTERO-SACRO FÁSCIA PUBO CERVICAL LIG. CARDINAL ARCO TENDÍNEO

ESTRUTURAS DE SUSPENSÃO E SUSTENTAÇÃO PÉLVICA APARELHOS DE SUSTENTAÇÃO - Localizados entre o assoalho pélvico e a região perineal - Tecido muscular e fáscias (aponeurose) - Diafragma pélvico, urogenital com a fáscia endopélvica como tecido de permeio - Principal aparelho é o pélvico e o principal músculo é o levantador do ânus

Anel pericervical Lig. cardinal + lig.útero-sacro + lig. Pubo-cervical Ligamento cardinal Ligamento Útero sacro

Arco tendíneo m.levantador do ânus m. Íleo coccígeo m. Pubo retal + m. Pubo coccígeo DIAFRAGMA PÉLVICO -m. levantador do ânus + -m. coccígeo m.ísqueococcígeo ou m.coccígeo

Diafragma urogenital DIAFRAGMA UROGENITAL m. transverso profundo e superficial do períneo + esfincter estriado do ânus + bulbo e isquio cavernoso

m. Isquio cavernoso m.transverso Superficial do períneo m.bulbo cavernoso Esfíncter interno Do ânus

Epidemiologia Fatores de risco mais significativos Idade (75% na pós-menopausa) Parto vaginal (lesão muscular e neuropatia) / macrossomia 4-5x (2,5x após um parto a 12x após 4 ou mais partos) Apenas 2% ocorrem em nulíparas Hipoestrogenismo Baixo nível educacional Cirurgias prévias (histerectomia) História familiar / deficiência de colágeno e elastina Fatores de risco menos significativos Constipação/tosse crônica, obesidade, tabagismo, esforço físico intenso e crônico Fatores de risco controversos Defeitos congênitos, raça, atividades de impacto, espinha bífida

Sintomas Sensação de peso ou bola ou abaulamento na vagina Incontinência urinária associada Necessidade de manobras de redução manual do prolapso Sensação de esvaziamento incompleto (urinário ou fecal) Frouxidão vaginal Flactus vaginalis Incontinência coital Dor perineal ou pélvica

Exame físico Mulheres assintomáticas x relevância clínica (?) Exame físico deve ser realizado com manobra de esforço (posição ginecológica e ortostática) Histerômetro e espéculo (uma das abas) para quantificar o prolapso Prolapso apenas se deslocamento de ao menos 2cm da projeção habitual do órgão genital Maioria dos defeitos são combinados

Classificações Baden-Walker (1968) POP-Q (Pelvic Organ Prolapse Quantification System) (1996) International Continence Society, American Urogynecology Society, Society of Gynecologic Surgeons

Baden-Walker Grau 0 Sem prolapso Grau 1 Pelo menos até a metade da distância entre o local inicial e a carúncula himenal Grau 2 Quando chega à carúncula himenal sem ultrapassá-la Grau 3 Quando ultrapassa a carúncula parcialmente Grau 4 Quando ultrapassa a carúncula em todo o seu conteúdo

POP-Q

POP-Q Hg Hiato genital Distância (cm) entre o meato uretral até a fúrcula vaginal Cp Corpo perineal Distância (cm) da fúrcula vaginal até o esfíncter anal externo CVT Comprimento vaginal total Medido em repouso. Se paciente com prolapo, reduzir e aferir Prolapsos internos à carúncula Sinal negativo Prolapsos externos à carúncula Sinal positivo

POP-Q Aa parede anterior da vagina, 3cm proximal ao introito Ap parede posterior da vagina, 3cm proximal ao introito Ba parede anterior da vagina, ponto de maior prolapso Bp parede posterior da vagina, ponto de maior prolapso C apical, útero D apical, fórnice posterior da vagina (não existe caso seja histerectomizada) Aa e Ap sem utilidade clínica significativa para o prolapso

POP-Q

POP-Q

POP-Q Grau 0 Sem prolapso Grau 1 Ba, Bp, C ou D está a menos de -1cm da carúncula himenal Grau 2 Ba, Bp, C ou D está no mínimo em -1cm, mas não mais que +1cm da carúncula himenal Grau 3 Ba, Bp, C ou D está a mais que +1cm, mas menos que a diferença (CVT-2)cm Grau 4 Ba, Bp, C ou D está no mínimo em +1cm e maior ou igual que a diferença de (CVT-2)cm

Classificações

Tipos de prolapsos Defeito do compartimento anterior Cistocele (defeito central ou lateral ou transverso) Defeito do compartimento posterior Retocele Defeito do compartimento central ou apical Prolapso uterino, de cúpula vaginal e enterocele Defeito do compartimento distal Rotura perineal xxxxxx

xxxxxx Cistocele

Cistocele

Cistocele

Retocele

Prolapso uterino

Prolapso uterino Diagnóstico diferencial do prolapso uterino x alongamento hipertrófico do colo do útero Medida com histerômetro do canal endocervical Suspeitar se canal endocervical maior que 5cm Em pacientes jovens discutir amputação do colo ou cirurgia de Manchester (amputação + fixação anterior do paramétrio) xxxxxx

Prolapso de cúpula

Rotura perineal Grau 1 Quando atinge pele e mucosa Grau 2 Quando atinge plano muscular ou a meio caminho do esfíncter externo do ânus Grau 3 Quando atinge o esfíncter externo do ânus sem secciona-lo ou prejudicar seu funcionamento Grau 4 Quando comunica-se com o esfíncter externo do ânus e mucosa retal** xxxxxx

Rotura perineal

Rotura perineal