Pós-Graduação em Direito Tributário Disciplina: Sistema Constitucional Tributário: Impostos em Espécie LEITURA OBRIGATÓRIA AULA 1
IMPOSTO ESTADUAL: Imposto sobre a propriedade de veículos automotores HUGO DE BRITO MACHADO 3. Imposto sobre a propriedade de veículos automotores 3.1 Competência A Emenda Constitucional n. 27, de 28.11.1985, atribuiu aos Estados e ao Distrito Federal competência para instituir imposto sobre "propriedade de veículos automotores, vedada a cobrança de impostos ou taxas incidentes sobre a utilização de veículos". A vigente Constituição manteve esse imposto na competência dos Estados e do Distrito Federal. Não permaneceu, porém, no dispositivo constitucional a vedação à cobrança de impostos ou taxas incidentes sobre a utilização de veículos. Quanto às taxas, a vedação era dispensável, posto que o fato gerador das taxas está sempre ligado à atuação estatal, não se compreendendo mesmo uma taxa sobre o uso de um veículo particular. Com ou sem a vedação expressa, infelizmente a cobrança de taxas no licenciamento de veículos continuou e continua a ser praticada, em flagrante violência à Constituição. Ninguém a isto se opõe, talvez em virtude do valor relativamente pequeno cobrado de cada proprietário de veículo. Quanto aos impostos, parece-nos que a vedação somente seria importante em face da competência dita residual, posto que o sistema tributário brasileiro é rígido, discrimina as competências delimitando o âmbito de cada imposto, de sorte que não seria mesmo possível, a não ser no exercício da competência residual, instituir um imposto sobre o uso de veículos automotores. 3.2 Função O IPVA, como é conhecido esse imposto, tem função predominantemente fiscal. Foi criado para melhorar a arrecadação dos Estados e Municípios. Tem, todavia, função extrafiscal, quando discrimina, por exemplo, em função do combustível utilizado. Do ponto de vista da justiça fiscal, melhor seria que o IPVA tivesse alíquotas acentuadamente progressivas em função da utilidade e do valor do veículo, onerando mais pesadamente os automóveis de luxo. 2
3.3 Fato gerador O lançamento desse imposto é feito, em princípio, por declaração. O contribuinte oferece ao fisco os elementos necessários ao respectivo cálculo. O fato gerador do IPVA é a propriedade do veículo automotor. Não é a sujeição ao poder de polícia, como acontecia com a taxa rodoviária única, por ele substituída. Mas a propriedade, sem o direito de uso do veículo na finalidade para qual é produzido, não consubstancia o fato gerador do imposto. A não ser assim as fábricas e as empresas revendedoras seriam obrigadas a pagar o imposto na condição de proprietárias de veículos automotores. Para consubstanciar o fato gerador do IPVA é necessário que na propriedade esteja incluído o direito de uso regular do veículo, isto é, o direito de uso deste na finalidade para a qual foi produzido. E como tal uso está submetido ao controle do Estado, exigindo-se o competente licenciamento, esse instrumento de controle tem sido utilizado para controlar também o cumprimento da obrigação tributária, embora o licenciamento não seja essencial para a configuração do fato gerador do imposto. As leis estaduais, em geral, dizem que em se tratando de veículos novos o fato gerador do IPVA ocorre na data da aquisição do veículo pelo consumidor final, ou quando de sua incorporação ao ativo permanente da empresa. Consumidor final, neste contexto, é qualquer pessoa física ou jurídica que não se dedica ao comércio de veículos automotores. A aquisição que desencadeia o fato gerador do imposto é aquela feita com a finalidade de uso do veículo pelo adquirente finalidade de uso que se presume sempre que o adquirente não seja empresário regularmente inscrito como contribuinte do ICMS, dedicado ao comércio de veículos. Tal presunção ocorre também quando o veículo é incorporado ao ativo permanente da empresa que o fabrica ou comercializa. Quando o veículo é produzido ou adquirido pela empresa para o comércio, ele integra o seu ativo realizável ou circulante. No ativo permanente, ou fixo, estão os bens de uso da empresa. Por isto é que a incorporação ao ativo permanente gera a presunção de que o veículo está sendo destinado ao uso e, portanto, tal incorporação equivale à aquisição pelo consumidor final, para o fim da configuração do fato gerador do imposto. O fato gerador é anual. Considera-se ocorrido na data da aquisição, ou da incorporação, como já explicamos. Daí em diante, ocorre em 1 de janeiro de cada ano. E como o direito ao uso regular do veículo integra o fato gerador do imposto, se em 1 de janeiro o pro- 3
prietário do veículo encontra-se privado deste direito, o fato gerador do imposto não se configura. Registramos, todavia, decisão do TJMG em sentido oposto, ao fundamento de que enquanto não decretada a pena de perdimento do veículo o imposto é devido. É mais um ato de arbítrio do fisco chancelado pelo Judiciário. 3.4 Alíquota e base de cálculo A alíquota do IPVA é fixa. Não é indicada em porcentagem, pelo menos em alguns Estados, mas em valor determinado, em referência ao ano de fabricação, à marca e ao modelo do veículo. A base de cálculo é o valor do veículo, ao qual se chega indiretamente, pelo seu ano de fabricação, marca e modelo. Aliás, a rigor, em referência ao IPVA é inadequado falar-se de alíquota e de base de cálculo. Esse imposto tem o seu valor estabelecido em tabela divulgada pelos Estados. Não há cálculo a fazer-se. Tendo-se em vista a marca, o modelo e o ano de fabricação do veículo, localiza-se na tabela o valor do imposto a ser pago. A jurisprudência vem rejeitando a tributação diferenciada de veículos em razão da o- rigem, com a distinção entre nacionais e importados. Realmente, embora se admita a utilização desse imposto com fins extrafiscais, tributando-se mais pesadamente veículos mais sofisticados, em se tratando de comércio exterior os instrumentos adequados são os impostos federais sobre importação e exportação, em virtude da competência da União nessa matéria. Neste sentido orientou-se a jurisprudência do STF. 3.5 Contribuinte O contribuinte do IPVA é o proprietário do veículo, presumindo-se como tal a pessoa em cujo nome o veículo esteja licenciado pela repartição competente. Embora o licenciamento do veículo não seja, do ponto de vista rigorosamente jurídico, uma prova de propriedade, o certo é que como tal vem sendo admitido na prática. Para fins de tributação, aliás, não há qualquer problema em considerar-se o licenciamento como prova da propriedade do veículo. Há quem afirme que, tratando-se de veículo adquirido com alienação fiduciária em garantia, contribuinte do IPVA é a instituição financeira credora, até que ocorra a quitação. Assim, o imposto somente seria devido por quem adquire o veículo automotor com alienação fiduciária em garantia depois da quitação. 4
Não obstante respeitável, esse ponto de vista não nos parece correto. O fato gerador do IPVA, na verdade, é a propriedade do veículo; mas como tal se há de entender o direito de usar e gozar desse bem, ainda que limitado esteja o direito de dispor do mesmo, em razão da denominada alienação fiduciária em garantia. 3.6 Lançamento O lançamento do IPVA é feito de ofício. A repartição competente para o licenciamento do veículo remete para a Secretaria da Fazenda as informações necessárias e esta emite o documento com o qual o proprietário do veículo é notificado para fazer o pagamento. BIBLIOGRAFIA AMARO, Luciano: Direito Tributário Brasileiro, 4a ed., Saraiva, São Paulo (Brasil), 1999. BONILHA, Celso B., Da Prova no Processo Administrativo Tributário, 2a ed., Dialética, São Paulo (Brasil), 1997. BONILHA, Paulo Celso Bergstrom: Da Prova no Processo Administrativo Tributário, 2a ed., Dialética, São Paulo (Brasil), 1997. CABRAL, Antônio da Silva: Processo Administrativo Fiscal, Saraiva, São Paulo (Brasil), 1993. COELHO, Sacha Calmon Navarro: Teoria Geral do Tributo e da Exoneração Tributária, Ed. RT, São Paulo (Brasil), 1982. --------------: Infrações Tributárias e suas Sanções, Resenha Tributária, São Paulo (Brasil), 1982. --------------: Comentários à Constituição de 1988 Sistema Tributário, 2a ed.,forense, Rio de Janeiro (Brasil), 1990. CRETELLA JÚNIOR, José: Curso de Direito Tributário Constitucional, Ia ed., Forense Universitária, Rio de Janeiro (Brasil), 1993. DENARI, Zelmo: Curso de Direito Tributário, 8a ed., Atlas, São Paulo, 2002. GODÓI, Marciano Seabra de: Justiça, Igualdade e Direito Tributário, Dialética, São Paulo (Brasil), 1999. GRAU, Eros Roberto: Internet e Direito, Dialética, São Paulo, 2000. --------------: Contribuições (uma figura "suigeneris"), Dialética, São Paulo, 2000. 5
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HUGO DE BRITO MACHADO Professor Titular de Ciência das Finanças, Direito Financeiro e Direito Tributário da Faculdade de Direito da universidade Federal do Ceará, onde leciona nos cursos de especialização e de mestrado. É Juiz aposentado do Tribunal Regional Federal da 5 a Região, com sede em Recife, Pernambuco. Foi Procurador da República e Juiz Federal em Fortaleza, Ceará. É, também, membro da Academia Brasileira de Direito Tributário. Como citar este texto: MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário 30 a edição Revista, atualizada e ampliada. Ed. Malheiros. Material da 1ª aula da Disciplina Sistema Constitucional Tributário: Impostos em Espécie, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual de Direito Tributário REDE LFG. 7