Análise de fatores prognósticos relacionados à sobrevida de crianças portadoras de meduloblastoma

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Transcrição:

Artigo de revisão de literatura Análise de fatores prognósticos relacionados à sobrevida de crianças portadoras de meduloblastoma Bruna Lorena de Jesus Martins 1, Camila Faria Corrêa 2 e Mical de Melo Peres 3 1 Faculdade de Tecnologia do Amapá Meta, Brasil. Tecnóloga em Radiologia pela Faculdade de Tecnologia do Amapá Meta 2 Faculdade de Tecnologia do Amapá Meta, Brasil. Tecnóloga em Radiologia pela Faculdade de Tecnologia do Amapá Meta 3 Faculdade de Tecnologia do Amapá Meta, Brasil. Tecnóloga em Radiologia pela Faculdade de Tecnologia do Amapá Meta RESUMO: O meduloblastoma é o câncer no sistema nervoso central mais frequente em pediatria, apresentando significativa mortalidade e morbidade. Esta neoplasia progrediu expressivamente nos últimos anos em termos de sobrevida, alcançando taxas de 70%. Apesar dos avanços nas taxas de sobrevida para alguns pacientes, para outros, considerados de alto risco, essas taxas ainda são muito pequenas. Contudo, este estudo tem por objetivo identificar e analisar na literatura existente os fatores prognósticos que mais afetam a sobrevida de crianças portadoras de MBs. Para tanto, foi realizada uma busca não-sistemática da literatura por meio de consulta aos indexadores de pesquisa nas bases de dados eletrônicos especializados. Concluiu-se que os fatores prognósticos que mais influenciam na sobrevida destes pacientes foram ressecção cirúrgica, idade e disseminação da doença. Palavras-chave: neoplasia, câncer, SNC, PNET, MB, pediatria. ABSTRACT: Analysis of Prognostic Factors related to Survival of Children with Medulloblastoma. The medulloblastoma is the cancer in the central nervous system more frequent in children, presenting a significant mortality and morbidity. This cancer has progressed significantly in recent years in terms of survival rates reaching 70%. Despite advances in survival rates for some patients, for others considered at high risk, these rates are still very small. However, this study aims to identify and analyze existing literature on the prognostic factors that most affect the survival of children with MBs. To this end, we performed a no-systematic search of literature through consultation with research indexers of specialized electronic databases. It was concluded that the prognostic factors that most influence the survival of these patients were surgical resection, age and disease dissemination. Keywords: neoplasia, cancer, CNS PNET, MB, pediatrics.

Artigo de revisão de literatura 1 Introdução Os tumores no sistema nervoso central (SNC) representam a segunda neoplasia mais frequente em crianças, o que corresponde de 17 a 25% dos tumores pediátricos, e são excedidos somente pelas leucemias (ARGOLLO; LESSA, 1999; NEVES, 2006; RODRIGUES; CAMARGO, 2003). As neoplasias do SNC têm maior probabilidade de levar à morte (45%) do que o conjunto de todas as leucemias (42%) e os demais tumores sólidos (31%), representando a terceira causa de óbito nos Estados Unidos (ARGOLLO; LESSA, 1999; ARGOLLO; LESSA, 1999a; FERREIRA, 1999). Além de apresentarem importante causa de mortalidade, maior do que em qualquer outro tumor pediátrico, são responsáveis por morbidade superior aos demais, em decorrência de suas sequelas, causadas pela própria neoplasia e também pelos tratamentos a que a criança é submetida (FERREIRA, 1999). A maioria das neoplasias do SNC em pediatria são infratentoriais, correspondendo de 45 a 60% e aproximadamente 40% destas são tumores do neuroectoderma primitivo (PNET), ou seja, meduloblastomas (MBs). O MB é o câncer (CA) do SNC mais frequente em pediatria, responsável por 12 a 25% dos tumores intracranianos em crianças. É uma neoplasia rara em adultos, representa de 0,5 a 1% dos tumores do SNC nessa faixa etária (FERREIRA, 1999; NORDFORS et al., 2010). Trata-se de um tumor neuroepitelial maligno, correspondente ao grau IV na classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS), altamente invasivo e responsável por quase 10% das mortes por CA em crianças menores de quinze anos de idade (NEVES, 2006; FERREIRA, 1999; BELCHER, 2009). O sítio preferencial dos MBs é a linha média da fossa posterior, pois 94,4% dos casos envolvem o cerebelo, e destes, mais de 75% originam-se no vérmis cerebelar, comprimindo ou estendendo-se do quarto ventrículo. Sua maior incidência ocorre na primeira década de vida, principalmente entre os cinco e sete anos de idade, e é duas vezes mais comum no sexo masculino (REIS FILHO et al., 2000; SANTA ANNA et al., 2009). Dentre todas as neoplasias pediátricas no SNC, o MB progrediu expressivamente em termos de sobrevida nos últimos anos, apresentando atualmente 60 a 70% de sobrevida livre da doença. Este aumento deve-se aos avanços das técnicas de diagnóstico por imagem, às ressecções cirúrgicas mais agressivas, à irradiação do leito tumoral e do neuroeixo após a cirurgia, associadas ao advento da quimioterapia (QT), durante e após a radioterapia (RT) e à construção de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) especializadas em pacientes pediátricos (NEVES, 2006; RONDINELLI et al., 2004). Apesar do aumento das taxas de sobrevida para MBs, fato que se deve ao tratamento em longo prazo relacionado à significativa morbidade, para pacientes constituintes do grupo de alto risco, que foram submetidos à ressecção parcial com massa residual maior que 1,5 cm, com idade inferior a três anos e com doença disseminada,

Análise de fatores prognósticos relacionados à sobrevida de crianças portadoras de meduloblastoma 3 essa taxa permanece muito reduzida, em cerca de 40%. Para crianças menores de dezoito meses as taxas são ainda piores, com sobrevida de apenas 22% livre de progressão por três anos (FERREIRA, 1999; RONDINELLI et al., 2004; PAN et al., 2005). No decorrer das últimas décadas, estudos clínicos focados nos tumores do SNC em pediatria, trouxeram progressos significativos no entendimento do comportamento do tumor, no delineamento dos fatores prognósticos e no aumento da sobrevida (LAFAY-COUSIN; STROTHER, 2009). Apesar dos avanços no tratamento e de numerosos estudos, ainda existem muitos dados controversos, que limitam o conhecimento acerca do MB (FRANCO et al., 1999). É de ampla importância para os profissionais que assistem aos pacientes com MB, o estudo de fatores que possam ter valor prognóstico, permitindo analisar o risco e o tipo de evolução estimada para determinado paciente (NASCIMENTO et al., 2009). O estudo dos fatores prognósticos procura entender sua relação com as taxas de sobrevida final e se os resultados estão relacionados às várias combinações de fatores prognósticos. Este interesse está enfocado na identificação dos fatores que têm o maior impacto sobre o prognóstico (FERREIRA, 1999). Para tanto, esta revisão de literatura tem por objetivo identificar e analisar os fatores prognósticos que afetam a sobrevida de crianças portadoras de MBs, enfatizando os mais relevantes e verificando se estes são compatíveis com os critérios utilizados na classificação em grupos de baixo e alto risco. 2 Materiais e métodos Foi realizada uma busca nãosistemática da literatura por meio da consulta aos indexadores de pesquisa nas bases de dados eletrônicos (Google Acadêmico, Scielo e PubMed). O levantamento foi realizado com as seguintes palavras-chaves: medulloblastoma/meduloblastoma, children/crianças, prognostic/ prognóstico e survival/sobrevida. Foram incluídos no estudo: artigos de revisão, artigos originais, monografias e teses de língua portuguesa, inglesa e espanhola, publicados no período de 1999 a 2010 em periódicos especializados e indexados nas bases de dados. 3 Resultados e discussão 3.1 Fatores Prognósticos relacionados à sobrevida de crianças portadoras de Meduloblastoma A terapêutica do CA pediátrico objetiva principalmente o maior número de curas possíveis, com a intensificação do tratamento nos casos de alto risco e a redução de sua magnitude nos casos de baixo risco. Como também, visa minimizar a morbidade e as sequelas tardias devido à terapêutica e à própria doença. Todavia, sem reduzir o tempo de sobrevida já alcançado com as abordagens anteriores (FERREIRA, 1999). Esquemas terapêuticos são baseados em fatores clínicos prognósticos como idade ao diagnóstico, extensão da doença residual após a ressecção e a

4 Martins, Corrêa e Peres presença ou ausência de doença disseminada (PAN et al., 2005). Uma criteriosa ponderação de todos os fatores envolvidos na sobrevida final dos pacientes deve ser efetuada, sendo que as diferenças encontradas em sua evolução, não podem ser atribuídas isoladamente ao tratamento efetuado (FERREIRA, 1999). Em experiência de Neves (2006), a respeito de MBs, no Hospital Infantil Joana Gusmão, a taxa de sobrevida em cinco anos foi de 37,5% e em três anos de 47,8%. Em estudo de Ferreira (1999), que analisava os fatores prognósticos relacionados à sobrevida de tumores do SNC, a sobrevida de cinco anos para MBs foi de 42,92%. Eles apresentaram sobrevida inferior às citadas na literatura, provavelmente pela predominância de pacientes de alto risco. Em outro estudo, publicado numa revista mexicana por Sandoval e Santiago (2000) sobre a radioterapia no controle de tumores do SNC, os MBs obtiveram sobrevida de 56%. Na experiência de dez anos de Rondinelli et al. (2004) no Hospital do Câncer de São Paulo, a sobrevida foi de 51% em três anos. No Japão, o estudo de Liu et al. (2005) indicou taxas para três e cinco anos de sobrevida global de 68,8% e 55,7%, respectivamente. E as taxas de sobrevida livre da doença foram de 57,8% para três anos e de 51,4% para cinco anos. Em estudo realizado por Ferreira (1999), os tumores de fossa posterior que infiltravam o tronco encefálico apresentaram taxas de sobrevida inferiores às daqueles que não o infiltravam. Lembra-se que a infiltração por contiguidade do tronco restringe a possibilidade de ressecção cirúrgica dos mesmos. Não encontrou-se relações entre a sobrevida e o tamanho do tumor (LIU et al., 2005). Sabe-se que o tamanho tumoral, assim como a infiltração do tronco, está mais relacionado com a possibilidade de ressecção do que sua influência independente sobre o prognóstico, porque tumores de maior volume levariam a um pior prognóstico pela impossibilidade de ressecção cirúrgica (FERREIRA, 1999). Segundo Ferreira (1999); Sandoval e Santiago (2000), quanto à extensão cirúrgica, pacientes submetidos à ressecção completa apresentaram taxas de sobrevida superiores. Os pacientes submetidos à ressecção parcial tiveram seu risco aumentado em duas vezes em relação aos que foram submetidos à ressecção completa (NASCIMENTO et al., 2009). De acordo com Neves (2006) e Rondinelli et al. (2004), a ressecção parcial do tumor é o fator isolado de maior impacto na mortalidade, isto é, um fator de mau prognóstico. A cirurgia é o ponto mais importante do tratamento do MB e idealmente deve-se obter a ressecção completa do tumor. Somente em um estudo realizado por Ray et al. (2004), a extensão da ressecção não se apresenta como preditiva de sobrevivência em análise multivariada. A não realização do tratamento radioterápico foi um fator isolado de pior prognóstico para Neves (2006) e Ferreira (1999), e confirmou-se que os pacientes que não foram submetidos a este tratamento, tiveram risco de óbito 2,9 vezes maior do que aqueles que o receberam. A RT foi associada com a

Análise de fatores prognósticos relacionados à sobrevida de crianças portadoras de meduloblastoma 5 sobrevivência de modo a controlar os efeitos do tratamento (RAY et al., 2004). O MB é um tumor radiossensível, o que fez com que o tratamento radioterápico se tornasse padrão neste tipo de neoplasia cerebral, principalmente em focos metastáticos. Com o intuito de minimizar os efeitos nocivos da RT, alguns autores têm proposto a redução da dose de irradiação para o grupo de pacientes de baixo risco. Supõe-se que a diminuição da irradiação, em pacientes de baixo risco, resulta em menores complicações neurocognitivas a estas crianças sem que haja prejuízo no índice de sobrevida (NEVES, 2006). Mesmo considerando que o MB é um dos tumores mais quimiossensíveis, a QT só era e continua sendo indicada atualmente, somente para crianças menores de três anos de idade portadoras de tumores de alto grau de malignidade, com o objetivo de suprimir ou postergar a RT, que seria responsável por sequelas muito graves para esta faixa etária (NEVES, 2006). O uso de QT melhorou as taxas de sobrevivência em pacientes de alto risco, principalmente para os pacientes que terminaram a RT (RONDINELLI et al., 2004; CARDOSO et al., 2005). A presença de metástases em neuroeixo (M3 de Chang-Harisiardis) no momento do diagnóstico foi um fator preditivo de mau prognóstico (NEVES, 2006; RONDINELLI et al., 2004; RAY et al., 2004). A recidiva da doença em foco metastático, em M2 e M3 na classificação de Chang- Harisiardis, foi um fator preditivo isolado de mau prognóstico (NEVES, 2006). Não encontrou-se diferença significativa na sobrevida entre os pacientes do sexo masculino e feminino (FERREIRA, 1999; LIU et al., 2005). Para Rondinelli et al. (2004) e Ray et al. (2004), a idade muito jovem foi um fator preditivo de mau prognóstico. Há uma tendência a um pior prognóstico nos pacientes menores que três anos de idade (que irão corresponder a cerca de 20% dos casos) e não se sabe ainda se este fato deve-se ao comportamento clínico/biológico do tumor nessa faixa etária ou se devido ao fato de a RT, importante arma terapêutica, não poder ser utilizada de forma rotineira e nas doses adequadas (RONDINELLI et al., 2004). Mas outros estudos demonstram que a idade no momento do diagnóstico não é um fator preditivo de maior mortalidade, e justificam os piores prognósticos para pacientes com idade inferior a três anos ao fato de haver maior taxa de disseminação da doença e devido às consequências deletérias do uso da irradiação terapêutica em um sistema nervoso tão frágil, quadro que limita sua utilização (NEVES, 2006; FERREIRA, 1999; LIU et al., 2005). O mau prognóstico para crianças muito pequenas também pode estar relacionado ao tratamento inadequado dos jovens. Com tratamento adequado, a diferença entre as taxas de sobrevida relacionadas à idade pode ser menos significativa (LIU et al., 2005). O tempo transcorrido entre os primeiros sinais e sintomas e o diagnóstico, teve uma mediana de dois meses no estudo realizado por Ferreira (1999), o que parece muito longo para tumores tão agressivos. A precocidade do diagnóstico constitui a única estratégia utilizada pelos oncologistas pediátricos e outros profissionais que tratam de crianças e adolescentes

6 Martins, Corrêa e Peres portadoras de neoplasias, para uma intervenção satisfatória, uma vez que não dispõe-se de testes de rastreamento que ajudam no caso dos tumores do adulto. Neste mesmo estudo, comprovou-se que os pacientes que eram diagnosticados em tempo inferior a 12 meses de evolução apresentavam pior prognóstico, o que leva a constatação de que havia associação entre o tempo de demora para a realização do diagnóstico e o grau de diferenciação celular dos tumores (FERREIRA, 1999). Historicamente, os subtipos nodular e desmoplásico têm melhores taxas de sobrevivência, possivelmente porque são mais diferenciados, tem crescimento mais lento e são mais sensíveis à QT e RT (FANGUSARO et al., 2005). Como MBs de grandescélulas, os MBs não-desmoplásicos com anaplasia generalizada apresentam um pior prognóstico, se comparados com MB clássico (RAY et al., 2004). Quanto aos fatores biológicos, imunopositividade p53 e presença de ErbB2 foram marcadores de mau prognóstico, sendo que o primeiro é fator preditivo. Já o TrkC é um importante marcador de bom prognóstico, e sua apresentação num tumor parece compensar os efeitos deletérios de ErbB2. No entanto, seus efeitos favoráveis não são evidentes se houver doença metastática ou proteína p53 presentes (RAY et al., 2004). 4 Conclusões Logo, os fatores prognósticos de maior impacto na sobrevida das crianças portadoras de MBs foram ressecção cirúrgica, que deve ser completa sempre que possível, idade, sendo que os pacientes menores de três anos apresentam menor sobrevida, mas sem motivos conclusivos, e presença de doença disseminada no momento do diagnóstico. Portanto, esses fatores são compatíveis com os critérios clínicos utilizados na classificação em grupos de baixo e alto risco. Existem outros fatores de mau prognóstico que influenciam a sobrevida, todavia não com tanta expressão como os já citados: infiltração do tronco encefálico pela impossibilidade de ressecção completa, a recidiva da doença em foco metastático e a não realização da RT e da QT em pacientes de alto risco. Observou-se que, apenas os fatores clínicos, utilizados na classificação de grupos de baixo e alto risco não determinam precisamente a evolução do paciente. A precisão prognóstica seria dada pelos fatores biológicos. Ainda é pouco esclarecida a forma com que eles influenciam na evolução dos MBs, por conseguinte, são alvos promissores de estudos para elaboração de abordagens terapêuticas mais eficazes. Referências ARGOLLO, N.; LESSA, I. Aspectos clínico-epidemiológicos das neoplasias cerebrais na faixa etária pediátrica no Estado da Bahia, Brasil. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, Bahia, v. 57, n. 2b, 1999. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s 0004-282X1999000300016&script=sci_artte xt &tlng=en>. Acesso em: 21 jun. 2010. ARGOLLO, N.; LESSA, I. Estimativa da prevalência de neoplasia cerebral na

Análise de fatores prognósticos relacionados à sobrevida de crianças portadoras de meduloblastoma 7 faixa etária pediátrica pelo método de captura-recaptura. Arquivos de Neuro- Psiquiatria, Bahia, v. 57, n. 2b, jun. 1999a. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s 0004-282X1999000300015&script=sci_artte xt &tlng=in>. Acesso em: 04 jun. 2010. BELCHER, S. Blockade of estrogen receptor signaling to improve outlook for medulloblastoma sufferers. Future of Oncology, v. 5, n. 6, p. 751-754, ago. 2009. Disponível em: <http://www.futuremedicine.com/doi/fu ll/10.2217/fon.09.69>. Acesso em: 31 ago. 2010. CARDOSO, P. C. S.; MATEO, E. C.; BAHIA, M. O.; BURBANO, R. R.; MOTTA F. J. N.; TONE, L. G. Cytogenetics in pediatric medulloblastomas. Revista de Ciências Médicas, Campinas. v. 14, n. 4, p. 363-371, jul./ago., 2005. FANGUSARO, J. R. et al. Survivin, Survivin-2B, and Survivin-deItaEx3 expression in medulloblastoma: biologic markers of tumour morphology and clinical outcome. British Journal of Cancer, v. 92, n. 2, p. 359-365, jan. 2005. Disponível em: <http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/arti cles/pmc2361849/?tool=pubmed>. Acesso em: 09 set. 2010. FERREIRA, R. M. Tumores do sistema nervoso central: fatores prognósticos relacionados à sobrevida em crianças e adolescentes em duas coortes. 1999. 183 f. Tese (doutorado) Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 1999. FRANCO, C. M. R.; MALHEIROS, S. M. F.; GABBAI, A. A. Meduloblastoma em Adultos. Revista de Neurociências. v. 7, n. 3, p. 129-135, 1999. LAFAY-COUSIN, F.; STROTHER, D. Current treatment approaches for infants with malignant central nervous system tumors. The oncologist, v. 14, n. 4, p. 433-444, abr. 2009. Disponível em: <http://theoncologist.alphamedpress.or g/cgi/content/full/14/4/433>. Acesso em: 09 set. 2010. LIU, Y. et al. Radiation treatment for medulloblastoma: a review of 64 cases at a single institute. Japanese Journal of Clinical Oncology, v. 35, n. 3, p. 111-115, 2005. Disponível em: <http://jjco.oxfordjournals.org/content/ 35/3/111.long>. Acesso em: 09 set. 2010. NASCIMENTO, C. A.; MONTEIRO, E. M.; VINHAES, A. B.; CAVALCANTI, L. L.; RAMOS, M. B. O Câncer infantil (leucemia): Significação de algumas vivências maternas. Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, Fortaleza. v. 2, n. 33, abr./jun., 2009. NEVES, J. A. L. L. Meduloblastomas: Uma experiência de dez anos no Hospital Infantil Joana Gusmão. 2006. 33 f. Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) Curso de Medicina, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006. NORDFORS, K. et al. The tumourassociated carbonic anhydrases CA II, CA IX and CA XII in a group of medulloblastomas and supratentorial primitive neuroectodermal tumours: an association of CA IX with poor prognosis. BioMed Central Cancer, v. 10, p. 148, 2010. Disponível em:

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