O RAFCAL EM UMA PERSPECTIVA CENTRADA NA PESSOA



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Transcrição:

O RAFCAL EM UMA PERSPECTIVA CENTRADA NA PESSOA Segundo sua criadora, a psicóloga Maria Marta Ferreira, o Programa RAFCAL (Reeducação Afeto Cognitiva do Comportamento Alimentar) é uma proposta que, enfatiza a mudança de padrões de comportamento, visando com isso alterar o estilo de vida que produz obesidade, ansiedade, entre outros desconfortos comportamentais (FERREIRA, 2009, p.54). Tal metodologia de trabalho sustenta-se em dois pilares: a Reeducação Cognitiva e a Educação Afetiva. O primeiro tem como fundamentação a Experiência da Aprendizagem Mediada, de Reuven Feuerstein, enquanto o segundo consiste em Psicoterapia com ênfase em comportamento alimentar. Um dos questionamentos mais comuns dentre os interessados em filiar-se ao RAFCAL diz respeito à corrente psicológica que lhe dá sustentação. Na maior parte das vezes, imagina-se que, em se partindo do próprio nome, a metodologia sirva apenas àqueles que trabalham com Psicologia Cognitiva hipótese refutada por sua criadora, que salienta ser o programa capaz de empregabilidade dentro de diferentes abordagens teóricas. No processo de capacitação em RAFCAL, vivenciado com psicólogos de diferentes orientações teóricas, foi possível constatar a viabilidade de conciliá-lo com diferentes linhas de trabalho em Psicologia Clínica. Neste artigo, compartilha-se algumas reflexões acerca de sua convergência com as perspectivas humanistas, em especial a Abordagem Centrada na Pessoa, de Carl Rogers. Ressalta-se que o tema deste artigo não foi algo preestabelecido, surgindo naturalmente a partir do contato com conceitos da Experiência De Aprendizagem Mediada, modelo de aprendizagem proposto por Reuven Feuerstein em sua Teoria da Modificabilidade Estrutural Cognitiva. INTRODUÇÃO Inicialmente, cabe mencionar a controvérsia quanto aos termos referentes aos indivíduos em díade na relação terapêutica: para fazer referência ao profissional psicólogo empregar-se-á aqui o termo terapeuta ou mediador, cabendo ainda o termo terapeuta-mediador. Quanto ao sujeito que busca atendimento, é preciso considerar que, enquanto Rogers considera cliente a melhor denominação, visando diferenciar a relação de ajuda psicológica daquela presente no modelo médico; Reuven Feuerstein trabalha com o termo mediado na Experiência de Aprendizagem Mediada. Por sua vez, Ferreira e Méier (2004) optam pelo termo paciente, baseados em uma perspectiva de que paciência diverge de passividade, abarcando a capacidade de investimento e espera, habilidade essencial ao processo terapêutico. Visando evitar confusão com o emprego de ambos os termos ou a priorização de um deles, em detrimento ao outro, opta-se pelo emprego neste artigo do termo paciente em função de ter sido a escolha da idealizadora do programa em análise. Entretanto, não haverá substituição dos termos quando houver citação de autores. Para quem conhece a Abordagem Centrada Na Pessoa - aqui compreendida como o conjunto de trabalhos de Carl Rogers nas áreas de Educação, Psicologia Clínica

e Relações Humanas, cujo cerne é a não-diretividade, deve soar estranha a proposta de aproximação com uma metodologia, o RAFCAL, com princípios pré-estabelecidos, regras a serem aprendidas pelo paciente e destaque à intencionalidade do terapeuta. Com base na crença de que a postura esperada do terapeuta é um elo consistente entre as referidas teorias, defender-se-á a possibilidade de conciliação das perspectivas. Para tanto, a seguir serão relacionados os parâmetros universais de mediação estabelecidos por Reuven Feuerstein aos conceitos de Rogers. Note-se que o referido autor estabeleceu doze critérios para a mediação, mas optou-se aqui por trabalhar com os quatro considerados universais: DESENVOLVIMENTO MEDIAÇÃO DA INTENCIONALIDADE E DA RECIPROCIDADE Ferreira e Méier (2004, p.59) referem-se a este atributo do mediador como sendo a intencionalidade de fazer com que os estímulos do meio em que o paciente vive sejam percebidos de forma diferente do que se o sujeito estivesse exposto de maneira direta a esses estímulos. Tal consideração decorre da defesa empreendida por Feuerstein no sentido de que o mediador deve ter uma postura clara e coerente durante a mediação da aprendizagem, apoiada na firme determinação de alcançar as metas claras e específicas, estabelecidas para o processo em andamento (MEIER; GARCIA, 2007). Já Rogers (1989, p.16) afirma que a função prioritária da terapia não está relacionada a induzir o indivíduo a fazer algo sobre si mesmo, mas à busca por libertálo para o crescimento e o desenvolvimento normal, de remover obstáculos, de modo que possa novamente caminhar para frente. Entende-se, entretanto, que não há uma impossibilidade de conciliação das posições, mesmo que sejam aparentemente contraditórias, pois o mediador no RAFCAL irá trabalhar com intencionalidade sem, contudo, trazer objetivos externos à relação, ou seja, as metas e os objetivos do processo terapêutico são construídos em conjunto com o paciente. Ressalte-se,a ainda, que a referida construção conjunta entre paciente e terapeuta, exige que o mediador esteja empático e congruente condições defendidas por Rogers como fundamentais ao processo terapêutico. Neste sentido, Rogers (1997, p.325) define como congruência ou autenticidade a capacidade do terapeuta mostrar-se como realmente é na relação com o cliente, não por meio de uma fachada, um papel ou uma ficção. Também no RAFCAL tal habilidade é valorizada, como se percebe nas palavras de Ferreira e Méier (2004, p.87), ao defender a necessidade de integridade do mediador, sua capacidade de vivenciar o que deseja transmitir. Já a reciprocidade de Feuerstein (apud MEIER;GARCIA, 2007) diz respeito à cumplicidade entre mediado e mediador, fenômeno também valorizado na perspectiva rogeriana, em que é considerada fruto da empatia e consideração positiva incondicional

que o paciente vivencia na relação. Referindo-se à abordagem Centrada na Pessoa, Graziottin (2001) afirma que, se é fornecida uma relação permeada de compreensão e segurança e de uma aceitação da pessoa como ela é, então o cliente abandonará suas defesas e utilizará este espaço para ir em busca de seu autoconhecimento. MEDIAÇÃO DA TRANSCENDÊNCIA Com base nas idéias de Feuerstein, Méier e Garcia (2007) apontam que o paciente deve ser favorecido a generalizar as aprendizagens obtidas com a mediação, visando garantir que seja autônomo e independente, capaz de aplicar o que vivenciou em outros momentos e situações de sua vida. Tais objetivos são idênticos àqueles referenciados por Carl Rogers em sua obra, na qual defende constantemente a necessidade de mudança para a vida e não efêmera ou para o terapeuta. Objetivo semelhante tem-se com o emprego do RAFCAL, pois segundo Ferreira e Méier (2004, p.55) objetiva-se uma real transformação, ou seja, a mudança não é apenas local, é estrutural, permanente e significativa. Assim, apesar de estabelecer uma direção para o processo terapêutico, o RAFCAL, de forma análoga à Abordagem Centrada na Pessoa, objetiva a autonomia do paciente. As palavras de Ferreira e Méier (2004, 71) comprovam: Todo o programa.. é um aprender, um aprender sobre sua própria alimentação, seu ambiente psicológico e físico e suas influências no comportamento. Explorar essas vias e reconduzi-las de acordo com as necessidades reais do paciente é fundamental, pois o objetivo é desenvolver sua autonomia por meio de um aprendizado significativo. MEDIAÇAO DO SIGNIFICADO Segundo Feuerstein (apud MEIER;GARCIA, 2007), ao propiciar a atribuição de diferentes elementos à experiência do paciente, o mediador tem como objetivo que este desenvolva a capacidade de significar seus atos futuramente. Esse mesmo movimento de deparar-se com significações diferentes, refletir sobre elas e ampliar sua percepção é mencionado por Rogers, como capaz de propiciar ao cliente a atualização de seu autoconceito. Neste ponto, Ferreira e Méier (2004, p.50) sugerem como ferramenta de trabalho ao mediador refletir o sentimento ou comportamento do paciente para que este possa conscientizar-se dele. Os autores salientam que este refletir equivale a devolver uma imagem, noções muito às presentes na Terapia Centrada no Cliente, em que considerase papel do terapeuta devolver os pensamentos e os sentimentos ao cliente, de forma a clarear e facilitar a apreensão da sua experiência. Tal devolução pode ser realizada através das ferramentas propostas por Rogers e Kinget (1975), tais sejam, as respostas-

reflexo, que são a materialização da atitude não-diretiva na relação terapêutica. Tais respostas podem ser de três tipos: Na reiteração o terapeuta dirige-se ao conteúdo estritamente manifesto da comunicação, sendo geralmente breve e consistindo em resumir o que foi expresso verbalmente pelo cliente ou em assinalar um elemento significativo desse. Tem como objetivo criar uma atmosfera de acolhida e de compreensão que ajuda a diminuir as barreiras defensivas, facilitando com que o cliente sinta-se compreendido e acompanhado pelo terapeuta Por sua vez, o reflexo de sentimentos é a intervenção através da qual o terapeuta comunica ao cliente os sentimentos que ele percebe nas entrelinhas de suas palavras, procurando ampliar, diferenciar ou deslocar o centro da percepção do cliente, evidenciando certos elementos. Por fim, a elucidação visa tornar evidente sentimentos e atitudes que não decorrem diretamente das palavras do indivíduo, mas da compreensão do terapeuta acerca de sentimentos e significados que ainda não foram apreendidos pelo cliente. Ressalta-se que, apesar de parecerem técnicas simples demais, a reiteração e o reflexo de sentimento exigem muito do terapeuta: uma profunda sensibilidade empática e uma aceitação incondicional do movimento do cliente (TAMBARA;FREIRE, 1999, p.132). MEDIACAO DA CONSCIENCIA DE MODIFICABILIDADE A crença de que o indivíduo é capaz de modificar-se, na medida de suas potencialidades e dos estímulos que recebe, está na base das teorias de Feuerstein e implícita na própria definição de Ferreira e Méier (2004, p.99): O Programa RAFCAL é um instrumento que visa resolução de problemas, através das técnicas psicológicas aliadas ao método da aprendizagem mediada. Esta consciência nasce da experiência de transformação, a qual decorre do desejo de mudança. Considera-se aqui que a aceitação é a atitude que embasa este processo, na medida em que o início de qualquer mudança é a consciência da situação atual: A aceitação é o passo para a mudança... não se modifica o que nos se reconhece como passível de mudança (FERREIRA; MEIER, 2004, p.31) Esta aceitação profunda de sua condição só é possível, segundo os preceitos de Carl Rogers, através da experiência do cliente de sentir-se incondicionalmente aceito pelo terapeuta. Trata-se, portanto, de uma atitude positiva e aceitadora, frente ao que quer que o cliente esteja vivenciando no momento e visa facilitar o autoconhecimento. Nas palavras de Tambara e Freire (2000, p.43): O cliente é considerado como uma pessoa de valor exatamente pelo que ele é, simplesmente por ser. Não há condições para a aceitação. O cliente não precisa mudar ou ser diferente para ser aceito pelo terapeuta. Assim, não resta dúvida de que, para ser capaz de transmitir ao paciente a convicção de que ele possui recursos que lhe possibilitam resolver os desafios de sua vida é necessário que o psicoterapeuta tenha, além de certas habilidades, uma profunda crença no potencial de modificabilidade do ser humano.

CONCLUSÃO A partir do exposto, defende-se a similaridade entre os pressupostos teóricos de Carl Rogers e de Reuven Feuerstein, o que implica na possibilidade produtiva de conciliação entre o Programa RAFCAL e a Terapia Centrada no Cliente. Tal convergência repousa, especialmente, no papel atribuído e na postura esperada do terapeuta-mediador, cujas atitudes devem proporcionar o crescimento e a autonomia do paciente, que aprende a aprender, ou ainda, aprende para a vida. Defende-se, ainda, que tal similaridade sustenta-se na visão de homem como um ser de infinito potencial, que possui dentro de si vastos recursos para o autoconhecimento e para a modificação de seus conceitos, atitudes e de seu comportamento autônomo, visão que embasa amas as perspectivas referenciadas. Por fim, ratifica-se a afirmação da idealizadora do RAFCAL, Maria Marta Ferreira: É possível acoplar o RAFCAL ao processo terapêutico independentemente da linha psicológica adotada (FERREIRA E MEIER, 2004, p.99). Lúcia Helena Martins da Silva CRP: 08/11156 luciahms@hotmail.com REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FERREIRA, Maria Marta; MEIER, Marcos. Psicologia do Emagrecimento. Revinter: Rio de Janeiro, 2004. FERREIRA, Maria Marta. Emagrecimento Sustentável: o desafio de manterse magra(o). Curitiba: Juruá, 2009. GRAZIOTTIN, Tiane. A atitude não-diretiva na Terapia Centrada no Cliente. Porto Alegre: Trabalho de Conclusão de Curso pela Pontifícia Universidade Católica PUC/RS, 2001. MEIER, Marcos; GARCIA, Sandra. Mediação da Aprendizagem: contribuições de Feuerstein e de Vygotsky. Curitiba: Edição do Autor, 2007 ROGERS, Carl R.; KINGET, G. Marian. Psicoterapia e Relações Humanas. Belo Horizonte: Interlivros, 1975. V.2.

ROGERS, Carl R.. Tornar-se Pessoa. São Paulo: Martins Fontes, 1997. ROGERS, Carl R.. Sobre o Poder Pessoal. São Paulo: Martins Fontes, 1989. TAMBARA, Newton; FREIRE, Elizabeth. Terapia Centrada no Cliente: Teoria e Prática Um caminho sem volta. Porto Alegre: Delphos, 1999.