Capítulo 2 - Hidrodinâmica

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Transcrição:

Capítulo 2 - Hidrodinâmica Para se descrever o escoamento de um fluido usa-se, comumente, o método de Euler que fixa um ponto do fluido e acompanha a evolução da velocidade com o tempo Chamamos de linha de corrente à tangente ao vetor velocidade. Dizemos que o escoamento é Estacionário quando o campo de velocidades não depende mais explicitamente do tempo, isto é, Neste regime estacionário, as linhas de corrente coincidem com as trajetórias das partículas do fluido. Equação da Continuidade Consideremos um escoamento estacionário. A massa do fluido que atravessa com velocidade um tubo de área num intervalo de tempo tem que passar pelo tubo com velocidade, área no mesmo intervalo de tempo. Logo, A equação (1) é chamada de Equação da Continuidade (válida para escoamento estacionário). Se o fluido é incompressível então e Se o escoamento não é estacionário, temos que considerar um volume fixo do fluido limitado por uma superfície fechada. Seja o versor normal externo num ponto cuja área innifinitesimal é. 1

A massa que atravessa para fora num intervalo de tempo é O fluxo de massa de fluido por unidade de tempo através da superfície fechada é então A massa total de fluido contida no volume num dado instante de tempo é A massa contida no volume pode variar no tempo, mas como a massa não pode ser criada nem destruída, essa variação da massa só pode ser resultante do fluxo através da superfície fechada que envolve. Se aumenta (diminui), então entra (sai) mais fluido do que sai (entra) através dessa superfície.ou seja, onde o sinal negativo aparece pois quando o fluxo para fora é positivo, a massa diminui, isto é, A equação (3) é a equação da continuidade no formato integral. No formato, diferencial ela se escreve 2

onde é o operador divergente de um vetor,, definido por Fluido em Movimento Um elemento infinitesimal de massa com volume infinitesimal tem seu movimento descrito pela 2ª. Lei de Newton onde somamos vetorialmente as contribuições superficiais e volumétricas. Inicialmente, desprezaremos entre as forças volumétricas aquelas oriundas do atrito entre camadas que correspondem a existências de forças viscosas. Chamaremos de fluido ideal ou fluido perfeito ao fluido com viscosidade nula. Equação de Bernoulli Vamos supor um fluido ideal e incompressível num escoamento estacionário. Consideremos um tubo de corrente muito estreito (para podermos definir energia potencial gravitacional) limitado pelas secções transversais nos pontos 1 e 2, onde as pressões são e as velocidades. Durante um intervalo de tempo o fluido se desloca para os pontos 1 e 2. Da equação da continuidade, temos A variação da energia cinética será 3

Pelo teorema de trabalho-energia, a variação da energia cinética é igual ao trabalho realizado pela força resultante que, neste caso, é a soma de 2 fo rças: a de pressão e a gravitacional. Para empurrar o fluido para dentro do tubo de corrente o trabalho realizado sobre o sistema (isto é, sobre o elemento infinitesimal de fluido de massa ), na extremidade de entrada, vale:. O trabalho realizado pelo sistema (para empurrar o fluido que está adiante) na extremidade de saída vale: :. Logo, o trabalho da pressão para movimentar o fluido será O trabalho realizado pela força gravitacional é o contrário da variação de energia potencial ( Logo, Utilizando (5), temos Logo, A equação acima é a chamada Equação de Bernoulli, derivada por Daniel Bernoulli em 1738. A Fórmula de Torricelli Seja um reservatório de área muito maior do que a área no orifício de saída (ponto O) e que está a uma altura deste ponto O. Tanto a área aberta quanto o orifício em O estão abertos para a atmosfera. 4

Como e, podemos desprezar o termo em. Donde, a velocidade de saída pelo orifício O será Tubo de Pitot Muito utilizado para medir a velocidade de um avião. Na figura abaixo vemos o que acontece quando um objeto, com boa aerodinâmica como uma asa de avião, está imerso num fluido que escoa num regime estacionário. A velocidade sobre o perfil é e no ponto O a velocidade é praticamente zero, o ponto O é chamado ponto de estagnação. Abaixo vemos um esquema do tubo de Pitot. Se a pressão em A é p e em O é p 0 a velocidade em A é v e em O é v 0 =0 e ambos estão praticamente à mesma altura então Acoplado ao manômetro com um fluido de densidade que sobe uma altura Donde obtemos a velocidade do avião 5

Fenômeno de Venturi Consideremos um fluido incompressível escoando estacionariamente por uma canalização horizontal (veja fig.). Há um estrangulamento do tubo no ponto 2. Desprezando as pequenas variações de altura, teremos Se e forem as áreas dos tubos em 1 e 2, teremos, da eq. da continuidade,. logo, Ou seja, pode-se utilizar o fenômeno de Venturi para se calcular a velocidade de escoamento de um fluido num tubo. A diminuição da pressão no estrangulamento é o mesmo efeito que soprar entre 2 folhas de papel: elas tenderão a grudar uma na outra. Circulação Uma grandeza importante para caracterizar um escoamento de um fluido é a Circulação ao longo de uma integral de linha ou de circuito fechado, definida por 6

1) Um recipiente cilíndrico em rotação com velocidade angular logo, 2) Se para um círculo com um raio qualquer então bem diferente do caso anterior quando É o que acontece, aproximadamente, quando um fluido escoa pelo ralo de uma banheira. Usando a eq. de Bernoulli em cuja superfície isobárica, teríamos o que geraria uma singularidade em No mundo real, a isobárica tem forma de um Funil!! 7

Escoamentos Rotacionais e Irrotacionais A circulação tem propriedades aditivas. Na fig 2.17 abaixo, temos De maneira que podemos pensar em subdividir o circuito Γ como a soma de microcircuitos (fig 2.18) e a circulação se transforma em cálculo num ponto! Na fig 2.19 vemos o circuito ABCDA. Ambos os casos estudados acima 1) e 2) tem. Nos 2 casos, nos trechos AB e CD. No trecho BC temos e no trecho DA. Para o caso 1) como é a área infinitesimal do circuito Γ=ABCDA, então Para o caso 2) e Note que a circulação calculada acima não incluiu a origem r = 0!! (mas ) Portanto se o escoamento é irrotacional pelo teorema de Stokes 8

Efeito Magnus Na figura (a) vemos o escoamento uniforme de um fluido através do cilindro. A velocidade é maior onde as linhas de corrente estão mais juntas (eq. da continuidade...área menor velocidade maior). Se o cilindro começa a rodar, o ar começa a girar como mostra a fig (b). O resultado da composição é mostrado na fig (c). Como a velocidade é maior na parte de cima do que em baixo do cilindro, há uma pressão empurrando o cilindro para cima. Se invertermos a rotação, também inverte o empuxo. Esse efeito foi estudado primeiramente por Magnus em 1853. Sobre uma esfera é o responsável pelo top spin, slice e side spin do tênis e pela folha seca e curva no futebol. O empuxo aerodinâmico é o responsável pela sustentação do avião. Na figura abaixo vemos um perfil de uma asa de avião Se o escoamento deixa de ser lamelar (altas velocidades), surgem turbilhôes e vórtices que desestabilizam o vôo. Em 1869, Lord Kelvin enunciou que: No escoamento de um fluido ideal homogêneo, sujeito apenas a forças conservativas, tem-se a conservação temporal da circulação Logo, se o escamento é iniciado a partir do repouso então o escoamento será sempre irrotacional. Num vórtice ou turbilhão a velocidade v é tipicamente Podem surgir ainda anéis de vórtices 9

Viscosidade A viscosidade é uma força volumétrica de atrito de deslizamento entre camadas de um fluido. Consideremos um fluido contido entre duas placas planas paralelas de área A e espaçamento d. A experiência mostra que se puxarmos a placa superior com força ela se desloca com velocidade constante de modo que a força viscosa é igual e contrária a. Também o experimento revela que o fluido em contacto com as placas (superior ou inferior) adere e se movimenta com a mesma velocidade. Assim, a placa superior (inferior) se movimenta com velocidade (zero). Então a velocidade depende linearmente de y, A lei de Newton da viscosidade é definida (em módulo) A constante é chamada coeficiente de viscosidade e sua dimensão é N.s/m 2 Usa-se o centipoiseque é um centésimo de 1 poise Essa constante varia de um fluido para outro, é maior para fluido mais espesso e depende fortemente da temperatura. A 20 0 C a água tem O escoamento viscoso é rotacional como pode ser visto na Fig.2.27 abaixo. No retângulo mostrado, a circulação nos lados verticais 2 e 4 é zero pois a velocidade é perpendicular ao deslocamento e nos lados 1 e 3 teremos e como então a circulação é positiva no sentido horário. 10

A lei de Hagen-Poiseuille Suponhamos um fluido escoando com velocidade não muito alta (regime lamelar) num tubo cilíndrico cuja secção transversal tem raio a. A velocidade do fluido na primeira camada em contacto com a parede do tubo é zero e cresce atingindo seu máximo no centro da secção transversal. Na figura abaixo, focamos uma camada cilíndrica de raio r e comprimento l. A diferença de pressão nos pontos 1 e 2 multiplicado pela área nos dá a força que movimenta horizontalmente o fluido A camada em questão provoca uma tensão superficial na área tangencial igual a Lembrando que escrevemos a Lei de Newton da viscosidade Donde Integrando e lembrando que, teremos O perfil de velocidades é parabólico! 11

A vazão pode agora ser calculada: ou seja, A equação acima é a lei de Hagen-Poiseuille. Efeitos da Viscosidade Importante lembrar que a equação de Bernoulli, efeito Magnus, etc foram analisados para um fluido ideal num escoamento estacionário. Pode-se demonstrar que um fluido escoando nestas circunstâncias é irrotacional. Teremos então a hidrodinâmica clássica. No mundo real, porém, há a inevitável a presença da viscosidade. Como vimos acima, isso leva ao escoamento rotacional. Quando um objeto se move num fluido real, forma-se, nas primeiras camadas de contacto entre o fluido e o objeto, uma camada limite no interior da qual o escoamento é rotacional e, afastando-se dessa camada limite, a descrição clássica irrotacional volta a ser uma boa aproximação. Na figura abaixo vemos uma esfera se movendo em alta velocidade num fluido. Vemos que a camada limite se descola da superfície formam vórtices. O regime entra então num regime turbulento de difícil descrição e análise. 12