REPOSIÇÃO VOLÊMICA. Dr. Adriano Carvalho Médico do CTI HC UFMG Especialista em Medicina de Cuidados Intensivos

Documentos relacionados
Reposição Volêmica. Paulo do Nascimento Junior. Departamento de Anestesiologia da Faculdade de Medicina de Botucatu

Coloides Prós e Contras Prós Paulo do Nascimento Jr Departamento de Anestesiologia Faculdade de Medicina de Botucatu UNESP

CONHECIMENTO ESPERADO

Tabela 33 Uso de albumina no paciente grave. Resumo das publicações encontradas. Amostra Intervenção / Desfechos. 641 cristalóides em.

CASO CLÍNICO. O fim do mundo está próximo José Costa Leite Juazeiro do Norte Ceará

FLUIDOTERAPIA E HEMODINÂMICA EM CÃES E GATOS

Nobre Educação LIDER DE MERCADO EM TODO TERRITÓRIO NACIONAL REPOSIÇÃO VOLÊMICA

ESTUDO COMPARATIVO ENTRE COLÓIDES E CRISTALÓIDES NA RESSUSCITAÇÃO HEMODINÂMICA DURANTE SEPSE - REVISÃO DE LITERATURA

Choque hipovolêmico: Classificação

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM TERAPIA INTENSIVA MÓDULO DE INSUFICIÊNCIA CIRCULATÓRIA AGUDA CHOQUE Prof.: ALESSANDRO MÁRCIO TEIXEIRA CAVALCANTE

VOLUVEN 6% hidroxietilamido + cloreto de sódio. FORMA FARMACÊUTICA E VIA DE ADMINISTRAÇÃO Solução para infusão intravenosa

21/07/14' ! Dinâmica da água e eletrólitos no organismo! Água x Peso

Choque circulatório. Maria Auxiliadora-Martins

Processo de colapso circulatório ocorrendo uma perfusão tecidual inadequada. Complicação de uma doença que desencadeou, sempre grave, se não

Fluidoterapia. Vias de Administração. Fluidoterapia. Fluidoterapia. Fluidoterapia. Fluidoterapia. Enteral Via oral Via intra retal

artéria renal arteríola aferente capilares glomerulares artéria renal capilares glomerulares veia renal

Seminário ME3: Choque. Orientador: Gabriel MN Guimarães

Reposição volêmica Existe solução ideal? O debate continua!!!

FLUÍDOS, ELECTROLITOS E ÁCIDO-BASE FLUÍDOS E SÓDIO. Maria do Rosário Barroso - Pós graduação em medicina de emergência

Conduta médica na Anemia Aguda. Luciana Carlos

26/10/2018. A osmolaridade pode ser entendida como a proporção entre solutos e água de uma solução.

artéria renal arteríola aferente capilares glomerulares artéria renal capilares glomerulares veia renal

Material Educacional Uso de VOLUVEN 6% (hidroxietilamido 130/0,4%) de acordo com as informações atualizadas da bula do produto

Edema OBJECTIVOS. Definir edema. Compreender os principais mecanismos de formação do edema. Compreender a abordagem clínica do edema

Sepse Professor Neto Paixão

Caixa de Primeiros Socorros

CONCEITO FALHA CIRCULATÓRIA HIPOPERFUSÃO HIPÓXIA

FISIOLOGIA GERAL INTRODUÇÃO

Albumina Humana Baxter AG

Disciplina Fisiologia veterinária I (VET 302)

Abordagem da sepse na emergência Rodrigo Antonio Brandão Neto

1 - Excreção de substâncias. 2 - Regulação do equilíbrio eletrolítico. 3 - Regulação do equilíbrio ácido-básico

O PACIENTE COM EDEMA

Cerca de 60% do peso de um homem adulto e de 50% do de uma mulher adulta são constituídos de água (42 L em um homem de 70 kg). Desse total, 2/3 (28

Desequilíbrio Hidroeletrolítico. Prof.º Enfº. Esp. Diógenes Trevizan

Transfusão Em Cirurgia

PROTOCOLO MÉDICO SEPSE E CHOQUE SÉPTICO

Curso de Urgências e Emergências Ginecológicas. Choque Hipovolêmico

PERFUSATO. USO DE SANGUE NOS PROCEDIMENTOS DE ECMO

Programa de Residência Médica em Pediatria - HMIB. CHOQUES Andersen O. R. Fernandes

Fisiologia Renal. Arqueada. Interlobar. Segmentar. Renal

FOLHETO INFORMATIVO. HyperHAES Solução para perfusão

Diretrizes Clínicas Sepse grave e choque séptico

ALBIOMIN. Biotest Farmacêutica Ltda. Solução injetável 200 g/l

Urgência e Emergência

Abordagem ao paciente em estado de choque. Ivan da Costa Barros Pedro Gemal Lanzieri

16/03/2017. A difusão é um movimento de moléculas que depende de sua própria energia e que tende a deslocá-las de

Alburex 20. (albumina humana) CSL Behring Comércio de Produtos Farmacêuticos Ltda. Solução para infusão 20%

Hidratação em Anestesia Pediátrica: Conceitos Atuais

RESIDÊNCIA MÉDICA 2016

METABOLISMO DE ÁGUA E ELETRÓLITOS NA SAÚDE E NA DOENÇA

5/6/2009. Pr ofa Mar ia Clor inda EV/UFG. Pr ofa Mar ia Clor inda EV/UFG

METABOLISMO DE ÁGUA E ELETRÓLITOS NA SAÚDE E NA DOENÇA

VOLUVEN 6% hidroxietilamido 130/0,4

Água o componente fundamental!

Disciplina: Clínica Médica de Pequenos Animais

BULA PACIENTE POLISOCEL HALEX ISTAR

Processo pelo qual os fármacos abandonam, de forma reversível, a circulação sistêmica e se distribuem para os Líquidos Intersticial e Intracelular.

DESIDRATAÇÃO E FLUIDOTERAPIA

COORDENAÇÃO DE ESTUDOS CLÍNICOS

artéria renal arteríola aferente capilares glomerulares artéria renal capilares glomerulares veia renal

Exames Complementares:

INSTITUTO LATINO AMERICANO DE SEPSE CAMPANHA DE SOBREVIVÊNCIA A SEPSE PROTOCOLO CLÍNICO. Atendimento ao paciente com sepse grave/choque séptico

APROVADO EM INFARMED

CONTROLE HIDROELETROLÍTICO

Alterações Circulatórias Edema, Hiperemia e Congestão, Hemorragia, Choque e Hemostasia

BIOQUÍMICA II SISTEMAS TAMPÃO NOS ORGANISMOS ANIMAIS 3/1/2012

2º ENCONTRO DE ENFERMAGEM DE EMERGÊNCIA Organização dos cuidados em Trauma

1. Resumo da avaliação científica das soluções para perfusão contendo hidroxietilamido pelo PRAC

Definição Sepsis 3.0 Sepse: Choque séptico:

Avaliação Clínica do Paciente Crítico monitorização hemodinamica. Profª Dra Luciana Soares Costa Santos 2º semestre 2017

10ª edição do Curso Continuado em Cirurgia Geral do CBCSP. Estado Atual do Tratamento da Hemorragia Digestiva Alta devida a Hipertensão Portal

RESIDÊNCIA MÉDICA 2016

Definições importantes

Biofísica renal. Estrutura e função dos rins

Manejo clínico da ascite

ESTADO DE CHOQUE HEMORRAGIA & CHOQUE 002

Agua total Corporal (60%) Intracelular 40% Extracelular 20%

Marcos Barrouin Melo, MSc CURSO DE EMERGÊNCIAS EV UFBA 2008

Fluidoterapia em animais domésticos. Clínica das doenças carencias, endócrinas e metabólicas. Aulus Carciofi

Excipientes: cloreto de sódio, ácido clorídrico, hidróxido de sódio e água para injetáveis.

Distúrbios da Circulação Edema. - Patologia Geral

DISTÚRBIOS HÍDRICOS: TIPOS, PATOGENIA E TERAPIA 1

Substitutos do Sangue

A SÍNDROME DO CHOQUE CIRCULATÓRIO

PROTOCOLO GERENCIADO DE SEPSE PACIENTE COM CONDUTA PARA SEPSE (OPÇÃO 2 E 3 - COLETA DE EXAMES/ANTIBIÓTICO)

DROGAS VASODILATADORAS E VASOATIVAS. Profª EnfªLuzia Bonfim.

Fluidoterapia É vital no manejo clínico do doente.

VOLUVEN 6% (hidroxietilamido)

Distúrbios hemodinâmicos

Fluidoterapia em animais domésticos. Clínica das doenças carencias, endócrinas e metabólicas

BULA PROFISSIONAL DE SAÚDE

BLAUBIMAX. Blau Farmacêutica S.A. Solução injetável 0,2 g/ml. Blau Farmacêutica S/A.

Filtração Glomerular

IDENTIFICAÇÃO DO MEDICAMENTO Alburex 20 albumina humana

Cristalóides e Colóides na prática clínica. Farm. Isabela Miguez de Almeida

I Curso de Choque Faculdade de Medicina da UFMG SÍNDROME DA RESPOSTA INFLAMATÓRIA SISTÊMICA SIRS

Denominação do medicamento HEMOHES 10% Composição qualitativa e quantitativa das substâncias activas. Hidroxietilamido (HEA) Cloreto de sódio

Transcrição:

REPOSIÇÃO VOLÊMICA Dr. Adriano Carvalho Médico do CTI HC UFMG Especialista em Medicina de Cuidados Intensivos

Objetivo: Manter Débito Cardíaco adequado, mantendo pressões de enchimento dos ventrículos acima de níveis críticos. Depleção do volume intravascular reduz o débito com prejuízo da perfusão de órgãos alvo.

Situações de depleção intravascular : Choque hipovolêmico Sínd. Resposta Inflamatória Sistêmica (Aumento da permeabilidade capilar) Portanto: Na grande maioria das situações de choque são necessárias infusões de grandes volumes para o suporte hemodinâmico.

FISIOLOGIA Homem 70 Kg Água corporal 42 litros Fluido intracelular 28 litros Fluido extracelular Interstício 11 litros Plasma 3 litros

Membrana Celular: Permeável à água mas não eletrólitos (bomba Na+/K+). Membrana Capilar: Permeável a solutos, exceto proteínas: plasma teor protéico maior que interstício.

Osmolalidade: 280 mosm/l em cada compartimento. Fluido intersticial & plasma: 80% da osmololalidade por Na+ e Cl- Pressão Oncótica: 28 mmhg.exercida por proteínas no plasma (Albumina)

HIPOVOLEMIA GRAVE Conseqüências: Queda débito cardíaco Hipoperfusão celular Queda liberação O² Acidose lática Falência bomba-membrana Perda função celular Falência orgânica / morte

Objetivos Minimizar nº células danificadas Restaurar perfusão tecidual e liberação O² com presteza

Momento da Reposição no Trauma Ressuscitação antes do controle da hemorragia: elevação da PA e deslocamento trombo formado.

Hipotensão permissiva: reposição volêmica mínima até controle do foco sangrante. Considerar: Rapidez do transporte. Não é aceitável em TCE, trauma fechado, idosos, patologias crônicas.

Avaliação da Hipovolemia: FC, PA, perfusão capilar, FR, diurese, nível de consciência não são confiáveis (perda 20-30% volume circulante sem taquicardia significativa). Deve-se contar com monitorização invasiva.

SOLUÇÕES DE REPOSIÇÃO VOLÊMICA CRISTALÓIDES Soluções de pequenas partículas - iônicas/aniônicas. Hipotônicas (SGI-5%); isotônicas (Ringer, SF-0,9%); hipertônicas (NaCl 7,5%). Distribuem-se livremente no meio extracelular (atravessam membrana vascular): 3/4 interstício, 1/4 espaço vascular (1ª fase).

Ex.: 1,5-2,0 L fluido repõe 0,45 L perda sangüínea. Requerida reinfusão 4-6 X déficit vascular (perda para interstício).

Reposição interstício: ressuscitação eficaz. Ringer Lactato superior a SF-0,9%: composição eletrolítica similar ao plasma; lactato fonte de NaHCO³- (controle acidose). SF-0,9% - excesso de Cl-: acidose hiperclorêmica. SGI distribui-se por toda água corporal: ineficaz na reposição volêmica.

Solução Hipertônica NaCl: Solução 7,5% = 2.400 mosm/l. Aumento volume vascular muito superior ao volume infundido: água intracelular para extracelular.

Estimula contratilidade miocárdica; reduz resistência vascular periférica. Eficácia estabelecida: TCE; queimados. Caso hemorragia ainda nãocontrolada: aumento do sangramento. Monitorizar hipernatremia: habitualmente transitória, grave na desidratação intensa.

COLÓIDES Soluções de partículas de tamanho suficiente para exercer pressão oncótica pela membrana capilar. Maior persistência vascular. Mais usados: Albumina; amido hidroxietílico; dextran; gelatina. Partículas < 5 kda: difusão livre; > 25-30 kda não atravessam membrana.

Princípio de Starling: soluções coloidais deslocam água extravascular para espaço vascular. Expansão volêmica maior que o volume infundido (3 X superior a igual volume de cristalóide). Menor edema tecidual.

Riscos/inconveninentes: anafilaxia, coagulopatias, imunossupressão, agravamento deficit intersticial, maior custo.

Albumina: - Extração pool plasma humano esterilizado. PM uniforme: 65-69 kda. Custo muito elevado. Solução 5% isooncótica; 20-25% hiperoncóticas: expansão espaço vascular. Hiperpermeabilidade capilar (sepse): interstício.

Indicações limitadas: 1) pós-tx hepático com hipoalbuminemia - controle ascite e edema. 2) Indicada solução coloidal e intolerância a outros colóides.

Colóides Sintéticos Polímeros ampla faixa PM: moléculas maiores - pequeno poder oncótico; moléculas menores - perdem-se por filtração renal / difusão intersticial. Menor custo que albumina.

Indicação básica: resposta hemodinâmica insatisfatória > 2 L cristalóides.

Dextran: - Longos polímeros de glicose; PM variado. Dextran 70 / 6%; Dextran 40 / 10% (solução salina ou SGI). Dextran 40: hiperoncótico - maior expansão vascular / excreção renal mais rápida que Dextran 70. Estável a temperatura ambiente.

60% Dextran 40 excretado 6 horas; 70% 24 horas. Aumenta viscosidade urinária: risco de lesão tubular na desidratação grave ou IRA. Efeitos antitrombóticos: papel profilático de TEP e terapêutico em processos isquêmicos. Mais de 1,5 g/kg: distúrbio hemorrágico; limitar a 1-1,5 L/24 H em quadros hemorrágicos ou perioperatório.

Reações anafilactóides: leves (raras reações graves).

Amido Hidroxietílico Polímeros de amilopectina (derivado de D-glicose: maior resistência à amilase). PM variável. Apresentação típica no Brasil: solução AHE 6% PM médio - 200 kda - em SF0,9%; 309 mosm.

Depuração plasmática plena em 2 dias (1/2 vida = 17 H). Excreção renal: 50% (restante: interstício). AHE alto PM (450 kda): coagulopatia. AHE médio PM: menor efeito sobre coagulação - administra-se até 33ml/Kg/dia. Não é antigênico: raras reações, leves. Sem efeito adverso sobre função renal.

Aumento volume plasmático: 70-230% volume infundido. Pressão coloidosmótica elevada: 2-5 dias. Ação hemodinâmica equivalente ou superior à albumina (elevação PVC, DC, VS).

Gelatinas: Polipeptídeos derivados de colágeno bovino, com modificações químicas. PM suficiente para retenção intravascular. 80% moléculas < 20 kda: rápida excreção renal; persistência vascular apenas 2-3 horas. Maior freqüência reações anafiláticas que demais colóides. Pequeno efeito sobre a coagulação

CRISTALÓIDES VERSUS COLÓIDES Polêmica há mais de meio século. Consenso: Cristalóides requerem maior volume para ressuscitação e não têm reações anafilactóides.

Pró-cristalóides: 1) Repõe volume intersticial, junto com volemia 2) Na hiperpermeabilidade capilar - comum no doente crítico - colóides podem passar para o interstício. 3) Custo muito inferior ao das soluções coloidais.

Pró-colóides: 1) Hemodiluição com cristalóides (proteínas plasmáticas, fatores da coagulação, eritrócitos): risco de maior sangramento. 2) Maior persistência vascular dos colóides seria o maior benefício.

Falta estudo prospectivo controlado, aleatório, demonstrando diferenças relevantes entre 2 grupos de soluções - em sobrevida. Bom estudo de metaanálise (revisão de literatura) considerou sobrevida e edema pulmonar: não demonstrou diferenças significativas entre cristalóides e colóides. Pacientes de trauma, porém, tiveram menor mortalidade ressuscitados com cristalóides.