SUPORTES PARA A ATUAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA EDUCACIONAL

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Transcrição:

726 SUPORTES PARA A ATUAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA EDUCACIONAL Supports for the speech therapists performance in the school Jáima Pinheiro de Oliveira (1), Ana Cândida Schier (2) A TRAJETÓRIA DA FONOAUDIOLOGIA NO CONTEXTO EDUCACIONAL E SUPORTES PARA A ATUAÇÃO NESSA ÁREA A Fonoaudiologia é uma ciência aplicada e, essencialmente, influenciada por uma diversidade de áreas científicas, ao longo de sua formação e, principalmente, ao longo de seu crescimento. Isso a tornou dinâmica, pois a sua expansão conquistou e, ainda conquista vários campos de atuação, acompanhando os avanços científicos e tecnológicos, relacionados à comunicação humana. Dentre as maiores influências, destacam-se: a medicina, a psicologia, a linguística, a odontologia, a física, dentre outras. A dimensão que essa profissão tomou, nos últimos anos, é espantosa. E, esse crescimento, tem exigido, cada vez mais, posicionamentos, no que se refere a essas influências, pois são estas posições que ajudam a compreender e atuar de modo mais efetivo, nas alterações de comunicação. A atuação clínica, sem dúvida, foi a maior responsável pela consolidação da Fonoaudiologia. No entanto, o crescimento dessa profissão ultrapassou os limites da clínica. Prova disso, é o avanço da Fonoaudiologia Educacional. A escola, local no qual a Fonoaudiologia surgiu, sem dúvida, contribuiu muito para o avanço da Fonoaudiologia Educacional, hoje, também reconhecida como área. Há muito se discute essa atuação e o perfil do fonoaudiólogo escolar/educacional e, finalmente, chegou-se a um consenso: os subsídios para essa atuação não devem ter relação (1) Docente do Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Estadual do Centro Oeste, UNICENTRO, Irati, PR, Brasil; Doutora em Educação pela Universidade Estadual Paulista, UNESP, Marília, SP, Brasil; Mestre em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos, UFS- Car, São Carlos, SP, Brasil; Especialista em Fonoaudiologia Educacional pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia CFFa, Brasília, DF, Brasil. (2) Fonoaudióloga da Secretaria Municipal de Educação de Mallet, PR; Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Fonoaudiologia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP, Marília, SP, Brasil. Conflito de interesses: inexistente com a clínica fonoaudiológica, pois a escola é uma instituição com dinâmica própria e peculiar, responsável pela mediação do processo de construção do conhecimento. Muito embora a linguagem, especialmente, a escrita, seja o foco dessa atuação, o Fonoaudiólogo Educacional se vê diante de várias situações- -problema na escola, que envolvem conhecimentos de outras áreas, como a audição, a linguagem, a motricidade orofacial e a voz. Além disso, esse profissional precisa lidar com questões que envolvem, fundamentalmente, aspectos de gestão escolar, pois o seu planejamento de atuação não pode ser desarticulado do projeto político pedagógico da escola, na qual ele está, exatamente, tentando estabelecer um vínculo. Mesmo diante dessas situações, a definição de áreas de atuação, dentro da profissão, foi um dos fatores que auxiliaram na compreensão dessas práticas, embora a exigência dos níveis de especialização implique, também, na perda do caráter interdisciplinar de atuação. Por falar em exigências, no âmbito do ensino e da pesquisa, estas também acabam sendo inexoráveis, em relação a esses níveis de especialização. Dentro desse contexto, será abordado, nesse artigo de opinião, os principais suportes que, do ponto de vista ora exposto, possibilitam a atuação do Fonoaudiólogo Educacional. Diante disso, esse texto tem como principal objetivo indicar alguns conceitos, dentre eles, o de promoção da saúde e o de construção do conhecimento, como fundamentais para a essa atuação. A especialidade em Fonoaudiologia Educacional foi recentemente criada e reconhecida pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia (CFFa) 1 e tem como base, para a atuação, as recomendações das Resoluções n 309, do ano de 2005. Nessa Resolução, observa-se que os aspectos da promoção de saúde assumem uma dimensão maior, em detrimento daqueles preventivos, embora ambos venham da medicina. Nesse sentido, esses avanços, originados de reflexões anteriores acerca das concepções que devem permear o trabalho do fonoaudiólogo em ambiente escolar 2, contribuíram e, ainda contribuem, para pensar formas mais

Atuação em fonoaudiologia educacional 727 coerentes de atuação na escola. Esses novos fazeres devem considerar não apenas as manifestações fonoaudiológicas, mas, fundamentalmente, questões particulares dessa comunidade e da instituição escolar, começando pela sua função. Considera-se de extrema importância para esse entendimento, o conceito de promoção de saúde. Esse conceito está vinculado ao crescimento das políticas de saúde, que se desprenderam um pouco de aspectos da medicina preventiva, voltando-se para um olhar mais abrangente acerca do desenvolvimento humano. Dentro desse contexto, foi um dos que permitiu um maior avanço de todas as ações de saúde coletiva. Promover saúde, hoje, significa, fornecer condições aos indivíduos para que eles mesmos adquiram saúde, por meio de recursos de sua própria comunidade 3. Por outro lado, a grande dimensão desse conceito nos indica que a saúde não é algo a ser buscado, pois as condições satisfatórias de vida devem estar presentes em toda a comunidade e não apenas nos grupos de risco ou grupos doentes. Isso implica em mudanças nas condições sociais, ambientais, culturais, econômicas, dentre outras. Ou seja, trata-se de um olhar que integra aspectos de educação e de saúde, para fins de melhores condições de vida e de sustentabilidade dessas condições adquiridas 3. Isso explica o crescimento das ações de educação em saúde, compreendidas como processos educativos essenciais para a melhora da qualidade de vida da população, dentro de suas possibilidades e particularidades. Outro ponto a ser destacado, trata-se da função da instituição, na qual está se adentrando. A função da escola é, fundamentalmente, promover e mediar a construção de conhecimentos (aprendizagem) dos indivíduos. Esse conceito, também é fundamental para nortear o trabalho nesse local. O processo de aprendizagem é mais um dos destaques dessa discussão, ou seja, a contribuição das bases da Psicologia do Desenvolvimento para o trabalho do Fonoaudiólogo Educacional. Destaca-se a Psicologia do Desenvolvimento, porque ela está preocupada com os vários aspectos do processo de desenvolvimento, ao longo de toda a vida do indivíduo. Portanto, é possível que esse conhecimento auxilie nas ações dos profissionais, de acordo com fases específicas desse processo, em interação com o meio no qual o indivíduo está inserido e opera. Ao processo de aprendizagem estão ligados elementos cognitivos, socioculturais, sociofamiliares, dentre outros. Alerta-se, portanto, para o fato de que alguns destes aspectos são, também, objetos da Psicologia Cognitiva. Na visão de alguns autores 4, o psicólogo cognitivo se preocupa com os estudos de atividades cognitivas, a saber: percepção, memória, imagem mental, pensamento, raciocínio, aprendizagem, dentre outras. De maneira geral, estes conteúdos são conscientes e considerados como produtos de elaborações conduzidas pelo indivíduo, a partir de informações advindas do seu conhecimento 4. Por isso, essa investigação acerca de como o indivíduo adquire o conhecimento recai sobre aspectos de interesse educacional. No entanto, ao contrário da Psicologia do Desenvolvimento, os psicólogos cognitivos não estudam o desenvolvimento de um fenômeno ao longo de um período da vida, mas sim as suas bases constitutivas, bem como a influência destas sobre outros elementos da consciência. Portanto, a preocupação com o desenvolvimento de uma determinada habilidade, parece mais abrangente no que se refere à sua compreensão. Importante, também, ressaltar que, ao se falar em desenvolvimento de habilidades relacionadas à aprendizagem, é preciso se reportar a dois teóricos que, sem dúvida, foram os que mais influenciaram a área da Educação nas últimas décadas: Piaget 5 e Vygotsky 6. Convém ressaltar que as suas teorias não se referiram às questões de aprendizagem, mas sim de constituição do pensamento e/ou construção do conhecimento. Piaget 5, por utilizar o método clínico, em suas investigações, influenciou bastante a Psicologia Cognitiva, embora nem todos os psicólogos cognitivistas sejam piagetianos. É ainda mais inegável a sua contribuição para a Psicologia do Desenvolvimento. Destacam-se, em sua obra, os conceitos de assimilação e acomodação. Para Piaget 5, o indivíduo constrói o seu conhecimento, por meio da interação com o meio. Nessa interação, esse indivíduo se depara com situações novas que o levam a atuar sobre esse ambiente, construindo hipóteses, por meio do uso dos processos de assimilação e acomodação. Isso deixa claro que não são os estudos piagetianos que contribuem para a compreensão das dificuldades de aprendizagem ou do fracasso escolar, mas sim os estudos sobre a maneira pela qual a criança adquire o conhecimento. Vygotsky 6, por sua vez, em seus pressupostos, acrescenta a noção de social a essa construção do conhecimento, dando a ideia de que entre a atuação do indivíduo e o meio, existe uma mediação. Essa mediação seria proporcionada pelos aspectos socioculturais. Ao mesmo tempo, essa relação (indivíduo, meio, aspectos socioculturais) não é linear. Ela é dialética, ou seja, existe uma interdependência entre estes aspectos considerados, que é o que

728 Oliveira JP, Schier AC possibilita a compreensão de toda essa relação. Nestes pressupostos, Vygotsky 6 deu ênfase, ainda, ao papel da linguagem na constituição das funções mentais superiores. Para ele, a linguagem, além de ser fundamental na comunicação, fornece suporte para a organização e a estruturação do conhecimento. Novamente, observa-se uma ênfase no tocante às funções cognitivas. Em relação às contribuições mais específicas para a Educação, Vygotsky 6 indicou, também, uma noção de que o bom ensino é aquele que se adianta ao desenvolvimento. A essa noção está vinculado o conceito Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) que se trata da distância entre as habilidades que o aluno consegue realizar sozinho e aquelas que ele só conseguiria fazer com a ajuda de um mediador (um indivíduo mais experiente). Esses pressupostos auxiliaram e, ainda auxiliam, muito, as relações de contextos escolares inclusivos. Nestes conceitos de zonas de desenvolvimento está implícita a valorização das interações entre alunos diferentes, desmistificando a ideia de homogeneização de turmas 7. Nas situações de interações heterogêneas, todos se beneficiam, pois, aqueles alunos mais experientes têm que reelaborar, a todo instante, suas contribuições, quando auxiliam os alunos menos experientes, em tarefas que estes, por sua vez, só conseguem com a ajuda daqueles. Nessas interações, será considerado outro objeto que, sem dúvida, é o que mais produz situações-problema, em âmbito educacional: a linguagem. Tanto as alterações de linguagem oral, quanto de linguagem escrita estão presentes, com frequência, no cenário escolar. Sobre isso, novamente, é possível reportar-se às influências para a atuação com esse objeto. Tanto a Psicologia do Desenvolvimento, como a Linguística estarão presentes nesse momento. As contribuições dessas áreas serão para compreender os fatores que interferem no processo de aquisição e desenvolvimento dessas habilidades e problematizar questões sobre as concepções de linguagem, o ensino da Língua Portuguesa, as variações sociolinguísticas, os gêneros textuais, usos e funções da linguagem. Por fim, não se pode esquecer que a Educação envolve políticas públicas. Portanto, a compreensão dessas políticas será crucial para o entendimento da dinâmica escolar. Após, essa breve exposição acerca de conceitos fundamentais nessa atuação, é possível arriscar, ainda, a sugestão de uma forma de trabalhar com todas essas questões. Trata-se de um método adotado em estágio curricular, voltado para a área de Fonoaudiologia Educacional, cuja dinâmica foi descrita em estudo anterior 8. Nesse estudo, foram destacados pontos importantes dessa atuação 8. Um destes pontos foi a opção pelo uso da metodologia da problematização. Essa metodologia se traduz num modelo de ensino fundamentado numa educação renovada ou progressista 9 e tem se mostrado como uma alternativa adequada para os cursos que tem como foco a prestação de serviços à comunidade. Essa metodologia foi consolidada por meio do Método do Arco de Charles Maguerez, representado por Pereira 10. Nesse esquema de arco são representadas cinco etapas: observação da realidade; ponto-chave; teorização; hipótese de solução e aplicação à realidade 9. Adaptando-se o esquema proposto pelos autores, em relação às ações desenvolvidas pela Fonoaudiologia na escola, poderia ser suposto o seguinte ciclo.

Atuação em fonoaudiologia educacional 729 Figura 1 Sugestão de esquema de atuação do fonoaudiólogo em ambiente escolar, com base nos passos do processo de ensino-aprendizagem da pedagogia da problematização. Neste ciclo destaca-se a importância da postura profissional do fonoaudiólogo na instituição escolar. Essa postura deve transmitir disponibilidade articulada com aspectos de interdisciplinaridade, de acordo com a estrutura e a rotina, encontradas na escola. É importante lembrar que essa instituição possui uma dinâmica própria e a equipe escolar deve estar envolvida em qualquer mudança que possa ocorrer nessa dinâmica. CONSIDERAÇÕES FINAIS Observa-se que as influências de conceitos de outras ciências estão, cada vez mais, presentes na atuação do fonoaudiólogo. Na área de Fonoaudiologia Educacional não é diferente. No entanto, estudos e pesquisas acerca dessas áreas tornam-se fundamentais para um exercício profissional eficiente e coerente com a realidade institucional na qual esse profissional pode se deparar. Considera-se de fundamental importância, o conhecimento de pressupostos teóricos relacionados ao processo de aprendizagem escolar, articulados aos de desenvolvimento infantil, para essa atuação. No que se refere ao conceito de promoção de saúde, estes também são de extrema importância para compreender aspectos de saúde da comunidade na qual se está lidando. Além disso, a compreensão da Educação e de suas políticas públicas é crucial para o entendimento da dinâmica escolar. A metodologia da problematização possibilita o conhecimento da instituição escolar e a proposição de intervenções que sejam condizentes com essa realidade. Diante disso, o fonoaudiólogo que pretende atuar em ambiente escolar, de maneira satisfatória, precisa considerar o papel desempenhado pelos contextos socioculturais, nos quais os indivíduos estão inseridos e operam, adotando pressupostos não só psicológicos, mas também as contribuições de outras teorias, a exemplo das sociopolíticas. REFERÊNCIAS 1. CFFa. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Resolução n 309, de 1º de abril de 2005. Disponível em: www.fonoaudiologia.org.br, acessada em 10 de dezembro de 2009. 2. Cavalheiro MTP. Reflexões sobre a relação entre a Fonoaudiologia e a Educação. In: Giroto CRM. Perspectivas atuais da fonoaudiologia na escola. São Paulo: Plexus Editora. 2001. 11-23. 3. Souza EM, Grundy E. Promoção da saúde, epidemiologia social e capital social: inter-relações e perspectivas para a saúde pública. Cadernos de Saúde Pública. [periódico na internet]. 2004.

730 Oliveira JP, Schier AC [acesso em 13 de setembro de 2006]; 20(5): 1354-60. Disponível em: www.scielo.br. 4. Spinillo AG, Roazzi A. A atuação do psicólogo na área cognitiva: reflexões e questionamentos. Psicologia: ciência e profissão. [periódico na internet]. 1989. [acesso em 10 de abril de 2010]; 9(3): 20-5. Disponível em: www.scielo.br. 5. Piaget J. A equilibração das estruturas cognitivas. Rio de Janeiro: Zahar; 1976. 6. Vygotsky LV. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes. 1991. 7. Cruz MRDF. Desmistificando o mito da turma homogênea: caminhos duma sala de aula inclusiva. Revista Educação Especial. [periódico na internet]. 2010. [acesso em 02 de agosto de 2011]; 23(36): 27-42. Disponível em: www.ufsm.br/ revistaeducacaoespecial. 8. Aspilicueta P, Oliveira JP, Zaboroski AP. Estágio em Fonoaudiologia Educacional: conhecendo e intervindo na realidade escolar. In: Pietrobon SRG. Estágio Supervisionado Curricular na Graduação: experiências e perspectivas. Curitiba: CRV Editora. 2009. 85-96. 9. Berbel NAN. A problematização e a aprendizagem baseada em problemas: diferentes termos ou diferentes caminhos? Interface comunicação, saúde e educação. [periódico na internet]. 1998. [acesso em 12 de dezembro de 1998]; 2(2): 139-54. Disponível em: www.scielo.br. 10. Pereira ALF. As tendências pedagógicas e a prática educativa nas ciências da saúde. Cadernos de Saúde Pública. [periódico na internet]. 2003. [acesso em 12 de dezembro de 2002]; 19(5): 1527-34. Disponível em: www.scielo.br. Recebido em: 16/11/2011 Aceito em: 18/06/2012 Endereço para correspondência: Jáima Pinheiro de Oliveira Universidade Estadual do Centro-Oeste UNICENTRO Setor de Ciências da Saúde SES/I Departamento de Fonoaudiologia PR 153 km 07 Riozinho Caixa Postal 21 Irati PR CEP: 84.500.000 E-mail: jaimafono@gmail.com