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Transcrição:

MUNDO DO TRABALHO, REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E GESTÃO DE PESSOAS: elementos de debate Priscila Monick de Araújo Barbosa Dantas 1 RESUMO Este trabalho apresenta como objetivo compreender as mudanças no mundo do trabalho, lançadas a partir da Reestruturação Produtiva, e suas repercussões para a gestão de pessoas. Assim, de início, empreendemos uma análise acerca do trabalho na sociedade capitalista. Em seguida, buscamos trazer um breve contexto sobre as mudanças dos processos produtivos até chegar à acumulação flexível. Posteriormente, vislumbramos as consequências da Reestruturação Produtiva a classe trabalhadora. Finalmente, trazemos à repercussão desse contexto a gestão de pessoas. Para isso, realizamos uma pesquisa bibliográfica, e os resultados apontam para mudanças políticas no controle da força de trabalho, repercutindo para a classe trabalhadora. Palavras-Chave: Trabalho; Mundo do Trabalho; Reestruturação Produtiva; Gestão de Pessoas; Classe Trabalhadora. ABSTRACT This paper presents the objective of understanding the changes in the working world, released from the Productive Restructuring and its implications for the management of people. So, initially, we undertook a review about labor in capitalist society. Then we try to bring a brief background on changes of productive processes until you reach the flexible accumulation. Later, we glimpse the consequences of Productive Restructuring the working class. Finally, we bring into context the impact of people management. To this end, we conducted a literatures search, and the results point to policy changes in control of the work force, affecting the working class. Keywords: Work; World of Work; Productive Restructuring; People Management; Working Class. 1 Estudante de Pós-Graduação. Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). E-mail: priscilamonick@yahoo.com.br

I INTRODUÇÃO O modo de produção capitalista na sua forma atual tem suscitado implicações para a sociedade, impondo novas formas de exploração ao proletariado. Assim, a Reestruturação Produtiva e suas inflexões sobre o mundo do trabalho demarcam um processo de acentuada flexibilização, precarização, fragmentação e terceirização das forças produtivas. Com a crise dos modelos de produção taylorista e fordista a partir da década de 1960, fez-se necessário à adoção de um novo modelo de organização produtiva, de circulação e de divisão dos processos de sistematização do trabalho. É nesse contexto que se insere a Reestruturação Produtiva, pautado no modelo de flexibilização no qual o trabalhador passa a ser considerado como polivalente, demandando uma maior qualificação para ele, evidenciando as novas formas de exploração do trabalhador pelo capital. Sendo assim, este trabalho apresenta como objetivo compreender as mudanças no mundo do trabalho, acentuada com a Reestruturação Produtiva, associada as mudanças nas formas de gestão de pessoas. Para isso, recorreu-se a uma pesquisa de caráter bibliográfica e documental, de modo a formar as bases conceituais da análise proposta. II O TRABALHO NA SOCIEDADE CAPITALISTA O trabalho sempre foi uma atividade inerente da condição humana. Em outras palavras, o que caracteriza o ser humano em sua identidade é o trabalho, como expressão de sua condição ontológica inalienável. Logo, segundo Netto e Braz (2008, p. 29), além de estar na base da atividade econômica, (...) faz referência ao próprio modo de ser dos homens e da sociedade. Portanto, é um conjunto de atividades intelectuais e manuais, organizadas pela espécie humana e aplicadas sobre a natureza, visando assegurar sua subsistência, podendo ser definido então como. [...] um processo de que participam igualmente o homem e a natureza, e no qual o homem espontaneamente inicia, regula e controla as relações materiais entre si próprio e a natureza. [...] Atuando assim sobre o mundo exterior e modificando-o, ao mesmo tempo ele modifica a sua própria natureza. Ele desenvolve seus poderes inativos e compele-os a agir em obediência à sua própria autoridade. (MARX, 1985, p. 197-198).

Isto é, o trabalho humano consiste em uma atividade pensada, empreendida a partir da transformação da natureza. Nesse sentido, tem-se que o trabalho (...) implica mais que a relação homem/natureza: implica uma interação no marco da própria sociedade, afetando os seus sujeitos e a sua organização (NETTO; BRAZ, 2008, p.34). A expansão do capitalismo a partir da permanente revolução de seus meios de produção desencadeia um processo inerente de transformação das relações de produção, ou seja, permite a transformação das formas de trabalho para adequá-las à sua expansão. Desse modo, em cada momento de desenvolvimento de suas forças produtivas, as relações de trabalho sofrem alterações, contribuindo para a intensificação das formas de opressão, mas também de resistência da classe trabalhadora. III AS TRANFORMAÇÕES NO MUNDO DO TRABALHO: DO TAYLORISMO A ACUMULAÇÃO FLEXÍVEL Durante a primeira metade do século XX, imperou um modelo de produção que revolucionou o universo fabril automobilístico (pioneira na organização da produção industrial. No início, artesanal e individualizada, a produção de automóveis ganharia logo a massificação): o taylorismo e o fordismo. O taylorismo surgiu a partir das concepções de Frederick Wislow Taylor (1856-1915), que introduziu nas indústrias o sistema da divisão de tarefas com o objetivo de promover a divisão técnica do trabalho humano dentro da produção industrial. Nessa perspectiva, a ideia fundamental desse sistema de organização do trabalho reside na especialização extrema de todas as funções e atividades, cujas consequências para o trabalhador se expressam no controle do ritmo de trabalho, na intensificação do trabalho e no aumento da extração da mais-valia 2. Valendo-se das formulações de Taylor, Henry Ford (1862-1947) aperfeiçoou a divisão de tarefas através da linha de montagem móvel, com o intuito de tornar a produção de unidades de veículos em uma grande produção e objeto de consumo em massa. Do mesmo modo que as técnicas do taylorismo, a ideia principal do fordismo é a elevação da especialização das atividades do trabalho a um plano de simplificação. Antunes (2006, p. 25) sublinha como elementos básicos do fordismo 2 A mais-valia corresponde a forma típica do excedente econômico no sistema de produção capitalista, que incide sobre o valor do produto e o lucro obtido pela exploração da mão-de-obra (NETTO; BRAZ, 2008, p. 102).

[...] a produção em massa, através da linha de montagem e de produtos mais homogêneos; através do controle dos tempos e movimentos pelo cronômetro taylorista; pela existência do trabalho parcelar e pela fragmentação das funções; pela separação entre elaboração e execução no processo de trabalho; pela existência de unidades fabris concentradas e verticalizadas e pela constituição/consolidação do operário-massa, do trabalhador coletivo fabril, entre outras dimensões. A partir da década de 1970, com o aperfeiçoamento da tecnologia, bem como com as sucessivas crises do Petróleo (em 1973 e em 1979) gerou-se grandes variações nas taxas de câmbio da economia, acentuando a internacionalização e o crescente volume de investimentos em capitais financeiros, o incremento do avanço tecnológico, acarretando uma instabilidade macroeconômica nos investimentos produtivos industriais. Com isso, os modelos produtivos presentes no taylorismo e no fordismo tiveram que ser totalmente reestruturados, sem, contudo, transformar as bases fundamentais do modo de produção capitalista daí a nomenclatura de Reestruturação Produtiva passando ao atual estágio de acumulação flexível 3. Com o declínio dos modelos taylorista e fordista, outro sistema de produção emerge: o toyotismo. Baseado nas concepções de Toyoda Kiichrõ (1894-1952) e desenvolvido pelo engenheiro Taiichi Ohno (1912-1990), esse modelo tem como objetivo aumentar a eficiência da produção pela eliminação consistente e completa de desperdícios. De acordo com Ohno (1997, p. 10), todos os tipos de desperdícios ocorrem quando tentamos produzir o mesmo produto em quantidades grandes, homogêneas. No fim, os custos se elevam. É muito mais econômico produzir cada item de cada vez. Antunes (2006, p. 36) ainda realça outro aspecto essencial do toyotismo é que (...) para a efetiva flexibilização do aparato produtivo, é também imprescindível à flexibilização dos trabalhadores. Nesses termos, ao considerar o processo de Reestruturação Produtiva como resposta a crise de acumulação capitalista, esse encerra uma estratégia de reorganização da produção e de mercadorias. Assim, ele interfere diretamente na organização da sociedade e no conjunto das relações que se estabelecem entre o capital, o trabalho e o Estado, uma vez que apresenta como consequências inseridas no aprofundamento da questão social conforme supracitado. Nesse sentido é absolutamente vital ao Capital e aos capitalistas (...) redesenhar não apenas sua estruturação econômica, mas, sobretudo, 3 O conceito de acumulação flexível, segundo Harvey (1994) remonta a passagem do modelo fordista de acumulação capitalista que predominou de 1920 a 1970 para um modelo flexível como forma de superar a crise do capital, instaurada a partir da década de 1970.

reconstruir permanentemente a relação entre as formas mercantis e o aparato estatal que lhe da coerência e sustentação (DIAS, 1997, p. 14). IV AS CONSEQUÊNCIAS DA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA PARA A CLASSE TRABALHADORA Há, portanto, consequências da Reestruturação Produtiva para a população no mercado de trabalho as quais, de acordo com as formulações de Amaral e Mota (2003) determinam novas formas de domínio do capital sobre o trabalho, realizando uma verdadeira reforma intelectual e moral, visando à construção de outra cultura do trabalho e de uma nova racionalidade política e ética compatível com a sociabilidade requerida pelo atual projeto do capital. Para essa nova organização é preciso ter uma maior agilidade na adaptação do maquinário e dos instrumentos para que os produtos sejam elaborados, justificando essa nova organização. Conforme destaca Antunes (2006, p. 24), Novos processos de trabalho emergem, onde o cronômetro e a produção em série e de massa são substituídos pela flexibilização da produção, pela especialização flexível, por novos padrões de busca de produtividade, por novas de adequação da produção à lógica do mercado. Nesse contexto, predominam mudanças societárias em curso no mundo do trabalho, pensadas no interior das profundas modificações que o capitalismo vem sofrendo, tanto na sua estrutura produtiva, quanto no que se refere ao conjunto de ideias e valores que a perpassa. Enquanto respostas do sistema de capital em torno da realização de seu constante desejo de obtenção de lucro, a Reestruturação Produtiva produz como resultado o desemprego estrutural, a precarização, a polivalência, rebaixamento de salários e desregulamentação do trabalho que revelam um forte incremento da exploração da força de trabalho. Sendo assim, Andrade (2011) nos destaca que o capitalismo contemporâneo vem assumindo nas últimas décadas, uma configuração que acentuou sua lógica concentradora e destrutiva. A conjuntura de pauperização da população enquanto desdobramento da questão social que se delineia mundialmente explicita os caminhos perversos da atual etapa de desenvolvimento do sistema econômico capitalista.

Isso porque, Castels (1997) nos elucida que se tem agora uma forma de seguridade ligada ao trabalho, e não somente a propriedade, sendo fortemente hierarquizada, onde permanecem as desigualdades, injustiças, e a grande exploração. Conflituosa, onde diferentes grupos sociais são concorrentes, e os indivíduos desfrutam de um mínimo de garantias e de direitos. Por esse motivo, de acordo com as formulações de Iamamoto (2008, p. 54), na sociedade capitalista, o trabalho é esvaziado de historicidade, culminando com a criação de processos de trabalho reduzidos a sua dimensão técnico-material. Cabe ressaltar, conforme nos destaca Silva (2011, p. 32), que o trabalho se institui enquanto determinante das relações sociais. Atualmente, de acordo com Antunes (2006, p. 49) temos que as repercussões do mundo do trabalho em meio à sociabilidade capitalista se caracterizam com uma múltipla processualidade: há uma diminuição da classe operária industrial tradicional ao passo em que ocorre uma expressiva expansão do trabalho assalariado, vivencia-se uma subproletarização intensificada e um aumento do desemprego estrutural (aquele resultante da substituição do trabalho humano pelo emprego de máquinas, resultando na redução da mão de obra). Vale salientar, que de acordo com as formulações de Castels (1997), o trabalho assalariado característica fundamental da sociedade capitalista, devido segundo Iamamoto (2008, p. 31) o capital e o trabalho assalariado serem uma unidade de diversos, onde um se expressa no outro foi sempre uma condição, simultaneamente, íntima e miserável, indispensável a todos e, que fazia parte dos valores cultural e socialmente adquiridos pelas pessoas. Desse modo, conforme nos destaca Freire (2006), foi sendo ditada uma nova cultura e ações políticas de inspiração neoliberal no mundo do trabalho, que buscam flexibilizar ao máximo, não somente as estratégias de produção e racionalização, através de novas tecnologias, políticas, processos de trabalho, estoques, tempo de giro do capital, produtos, padrões de consumo, como também as condições de trabalho, os direitos e os compromissos do Estado para a população. V A GESTÃO DE PESSOAS NO ÂMBITO DA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA A partir das transformações vislumbradas com as mudanças na produção, observase que a sociedade capitalista é marcada como sendo uma sociedade salarial, na qual a maioria dos sujeitos sociais tem sua inserção social relacionada ao lugar onde ocupam na

sociedade, definida também pelo trabalho, o qual é algo inerente a pessoa humana. Logo, o trabalho consiste em um conjunto de atividades intelectuais e manuais, organizadas pelo homem e aplicadas sobre a natureza, com o intuito de assegurar a sua subsistência. Conforme já assinalado, as repercussões dessa conjuntura para a classe trabalhadora são desastrosas, uma vez que a desproletarialização e a precarização das formas de trabalho acarretaram a complexificação da classe trabalhadora, e o enfraquecimento da sua unidade. Um sistema de trabalho flexível necessita de um sistema de regulação flexível, com novas formas de estruturação (IAMAMOTO, 2003, p. 31). Partindo da concepção da relação de simbiose existente entre a empresa e o funcionário, onde os seus interesses se assemelham, houve um redirecionamento da centralidade nas tarefas (segmentadas, segundo a rigidez dos modelos de produção fordista e taylorista), para a ênfase nos processos e nas relações no ramo empresarial brasileiro, sobretudo a partir do final da década de 1980, como pré-requisito para manter a integração econômica proposta pela dinâmica do capitalismo mundial. Para isso, novas formas de gestão e de relações de trabalho ancoradas na participação e na colaboração dos funcionários começaram a emergir. Nesses termos, Chiavenato (1999) nos destaca que as pessoas constituem a força motriz responsável pelo desenvolvimento das organizações. Assim, são as pessoas que pensam bens e serviços para depois produzi-los e comercializa-los, que compram e vendem produtos, dentre outros. Desse modo, Chiavenato (1999, p. 8) ressalta-nos que a administração da gestão de pessoas é (...) o conjunto de políticas e práticas necessárias para conduzir os aspectos da posição gerencial relacionados com as pessoas ou recursos humanos, incluindo recrutamento, seleção, treinamento, recompensas e avaliação de desempenho. Com o intuito de garantir a colaboração efetiva dos trabalhadores (...) é necessário que sejam consideradas as suas necessidades fisiológicas, sociais, de segurança, estima e autorrealização (AMARAL; CESAR, 2009, p. 418). Os propósitos da gestão de pessoas estão relacionados a ajudar a organização a alcançar seus objetivos; aumentar a satisfação; desenvolver e manter a qualidade de vida no trabalho; administrar a mudança; favorecer o envolvimento com metas; desenvolver capacidades e habilidades para as necessidades da produção; reconhecer o desempenho; atender supostas satisfações do trabalho para amenizar os conflitos; dentre outros. Logo, o modelo de gestão de pessoas busca interligar a iniciativa individual e a motivação para

empreender ações requeridas na empresa. Para isso, segundo César (2012), as empresas buscam criar condições de valorização de seus colaboradores. Sendo assim, de acordo com Dutra (2002, p. 101), independentemente dos possíveis cenários futuros, tanto as organizações, quanto os funcionários, caminham para a maior complexidade tecnológica e das relações. VI CONSIDERAÇÕES FINAIS No âmbito das relações e dos processos de trabalho, ocorrem mudanças substantivas a partir da construção de novas formas de organizar a produção. As mudanças que ocorreram nessa esfera com a Reestruturação Produtiva possibilitam um novo ordenamento dos modos de gerir o trabalho, caracterizada pela substituição da fragmentação do processo produtivo que marca os paradigmas taylorista e fordista em direção a uma nova organização do sistema produtivo na qual a força de trabalho interage diretamente com o sistema de automação flexível. Portanto, as exigências do processo de Reestruturação Produtiva, desencadeadoras das mudanças no mundo do trabalho, afetam rapidamente o processo de trabalho bem como o controle da força de trabalho realizada pelo modelo de gestão de pessoas, operando mudanças de ordem técnica, mas amparadas em práticas essencialmente políticas. Assim, o que se verifica atualmente é o acirramento da questão social e o surgimento de novas problemáticas na esfera ocupacional. REFERÊNCIAS AMARAL, Ângela Santana do; CESAR, Mônica. O trabalho do assistente social nas empresas capitalistas. In: Serviço Social: direitos e competências profissionais. Brasília: CFESS, 2009. ANDRADE, Fabrício Fontes de. Reestruturação Produtiva: dos novos padrões de acumulação capitalista ao novo parâmetro de políticas sociais. Revista Urutagua. Nº 10. Quadrimestral Ago/Set/Out/Nov. Paraná, 2011. ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do Mundo do Trabalho. São Paulo: Cortez, 2006.

CASTELS, Robert. As transformações da questão social. In: WANDERLEY, Mariângela Belfiore; BOGÚS, Lúcia; YASBEK, Maria Carmelita (Orgs.). Desigualdade e a questão social. São Paulo: EDUC, 1997. CESAR, Mônica de Jesus. Serviço social e reestruturação industrial: requisições, competências e condições de trabalho profissional. In: MOTA, Ana Elizabete (org.). A nova fábrica de consensos. São Paulo: Cortez, 2010. CHIAVENATO, Idalberto. Introdução à moderna gestão de pessoas. Rio de Janeiro: Campos, 2009. DIAS, E.F. A liberdade (Im) possível na ordem do capital: Reestruturação Produtiva e passivização. Campinas: IFCH/UNICAMP, 1997. DUTRA, Joel Souza. Desenvolvimento de pessoas. In: Gestão de pessoas: modelo, processo, tendências e perspectivas. 1 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2002. FREIRE, Lúcia M. B. O serviço social na Reestruturação Produtiva: espaços, programas e trabalho profissional. 2 ed. São Paulo: Cortez, 2006. IAMAMOTO, Marilda Vilela. O Serviço Social em tempos de capital de fetiche. São Paulo: Cortez, 2008. MARX, K. O Capital. Livro segundo. São Paulo: Abril Cultural, 1985. NETTO, José Paulo; BRAZ, Marcelo. Economia política: uma introdução crítica. 4 ed. São Paulo: Cortez, 2008.