MILTON JOERI FERNANDES DUARTE



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Transcrição:

MILTON JOERI FERNANDES DUARTE * A MÚSICA E A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO EM AULA As representações históricas construídas pelos alunos, incentivadas pela música, podem ajudar na construção do conhecimento histórico propiciando a identificação dos diferentes significados dos elementos definitivos e provisórios contidos nas representações históricas dos alunos, que podem ser compreendidos e trabalhados de maneira diagnóstica pelo professor através da linguagem musical e assim se transformar em uma ponte entre a realidade atual e o passado histórico. A música não é apenas uma combinação de notas dentro de uma escala, mas também ruídos de passos e bocas, sons eletrônicos, ou ainda uma vestimenta e gestos do cotidiano de determinados indivíduos que gostam de um tipo de som. A música hoje é o resultado de tudo isso como produto de longas e incontáveis vivências coletivas e individuais com as experiências de civilizações diversas ao longo da história. Portanto, não podemos nos espantar ao depararmos com novas experiências que nos revelam as várias facetas concretas e abstratas de que a música é constituída. (...) o antropólogo americano Alan P. Merriam formulou uma teoria da etnomusicologia, na qual reforçou a necessidade da integração dos métodos de pesquisa musicológicos e antropológicos. Música é definida por Merriam como um meio de interação social, produzida por especialistas (produtores) para outras pessoas (receptores); o fazer musical é um comportamento aprendido, através do qual sons são organizados, possibilitando uma forma simbólica de comunicação na interrelação entre indivíduo e grupo (PINTO, 2001, p. 224). Quando se fala em ouvir e entender música, fala-se da percepção musical. Entende-se como percepção o processo através do qual o ser humano organiza e vivencia informações, estas basicamente de origem sensória. Longe de existir um consenso, música e sua percepção cognitiva são assuntos que já causaram polêmica entre representantes de diversas disciplinas. Assim, há psicólogos que acreditam em processos cognitivos como universais de natureza, pois cada ser humano dispõe de um sistema nervoso. A visão oposta, que essa pesquisa procurará seguir, já enxerga na diversidade cultural a predisposição para uma preferência e seleção naturais dos padrões visuais e auditivos, fazendo de cada processo cognitivo um caso específico e culturalmente impregnado (PINTO, 2001, p: 236-237). Todas essas questões sobre a essência da música acabam por ser respondidas a partir das especificidades culturais de cada povo, grupo social e indivíduos. De acordo com essa visão de que é como * Mestre e doutorando pela Faculdade de Educação (FE) da Universidade de São Paulo (USP).

arte e conhecimento sociocultural que a música deve ser entendida é que pretendo desenvolver esse trabalho de pesquisa. Como a música é linguagem devemos expor o jovem à linguagem musical e dialogar com ele sobre e por meio da música. Como acontece com qualquer outra linguagem, cada povo, grupo social e indivíduo, tem sua própria expressão musical. Portanto, cabe ao professor, antes de transmitir sua própria cultura musical, no caso, relacionada ao conhecimento histórico, deve pesquisar o universo musical a que o jovem pertence, e encorajar atividades relacionadas com a descoberta e com a construção de novas formas de conhecimento através da música. Qualquer que seja nosso comportamento diante da música, de alguma maneira nos apropriamos dela e criamos algum tipo de representação sobre a mesma. Sabemos da alegria que os jovens encontram em comunicar-se com outros jovens e pessoas, graças as suas músicas, executadas ou simplesmente ouvidas, pois vivem, acolhem e levam em conta a diversidade cultural, o que lhes parece com freqüência ser o valor essencial na escuta e na atividade musicais. Com isto, conseguem dividir e se respeitar, pois cada um pode ter a sua parte de colaboração na música, como executor ou audiência, fazendo parte de um movimento cultural e criando uma identidade para o grupo. Outro aspecto fundamental na relação entre História, música e o processo de aprendizagem é a articulação entre texto e contexto para que a análise histórica não seja reduzida e limitando assim a própria importância do objeto analisado. O grande desafio do pesquisador é mapear os sentidos embutidos numa obra musical, bem como suas formas de inserção na sociedade e na história. O problema da recepção cultural tem sido um dos grandes desafios dos estudos culturais, e se torna ainda mais difícil no caso da história cultural da musica, na medida que o objeto se encontra distante no tempo, construído a partir de uma diacronia que implica na impossibilidade de reconstruir ou mapear a experiência cultural dos agentes que tomaram parte no processo estudado. Como mapear e compreender os usos e apropriações (CERTEAU, 1994, p. 40) que os alunos fazem da música é um dos principais desafios desta pesquisa? O aluno, mesmo sem conhecimento técnico, possui dispositivos, alguns inconscientes, para dialogar com a música. Estes dispositivos, verdadeiras competências de caráter espontâneo ou científico, não são apenas fruto da subjetividade do ouvinte diante da experiência musical, mas também sofrem a influência de ambientes sócio-culturais, valores e expectativas político-ideológicas, situações específicas de audição, repertórios culturais socialmente dados. O diálogo-decodificação-apropriação dos ouvintes não se dá só pela letra ou só pela música, mas no encontro, tenso e harmônico a um só tempo, dos dois parâmetros 2

básicos e de todos os outros elementos que influenciam produção e a apropriação da canção (vestimentas, comportamento e dança). Tudo isso gera o que podemos chamar de consciência musical. A visão clássica que separa músicos e ouvintes em dois blocos estanques e delimitados deve ser revista. Um compositor ou músico profissional é, em certa medida, um ouvinte, e sua escuta é fundamental para a sua própria criação musical. Por outro lado, os ouvintes não constituem um bloco coeso, uma massa de manipulados pela indústria cultural e nem um agrupamento caótico de indivíduos irredutíveis em seu gosto e sensibilidade. O ouvinte opera num espaço de relativa liberdade influenciado por estruturas objetivas (comerciais, culturais e ideológicas) que lhe organizam um campo de escutas e experiências musicais (NAPOLITANO, 2002, p. 82). Na verdade, os agentes e instituições formadoras do gosto e das possibilidades de criação e consumo musicais formam um contexto imediato, cujo pesquisador deve articular ao contexto histórico mais amplo do período estudado com as músicas apresentadas aos alunos. Trata-se de uma maneira de problematizar a escuta musical do aluno em relação ao processo de construção do conhecimento histórico. Segundo Arnaldo Contier: Os sentidos enigmáticos e polissêmicos dos signos musicais favorecem os mais diversos tipos de escuta ou interpretações verbalizadas ou não- de um público ou de intelectuais envolvidos pelos valores culturais e mentais, altamente matizados e aceitos por uma comunidade ou sociedade. A partir dessas concepções, a execução de uma mesma peça musical pode provocar múltiplas escuta (conflitantes, ou não) nos decodificadores de sua mensagem, pertencentes às mais diversas sociedades, de acordo com uma perspectiva sincrônica ou diacrônica do tempo histórico (CONTIER, 1991, p. 151). Todas estas questões de ordem histórica, sociológica e antropológica não negam o nível da experiência estética subjetiva da música, mas também colocam uma outra ordem de reflexões ligadas às questões cognitivas do processo de construção do conhecimento histórico em sala de aula. Levando em conta a História Cultural, a relação entre conhecimento histórico e a música se resolve no plano epistemológico, mediante aproximações e distanciamentos, entendendo-as como diferentes formas de expressar o mundo, que guardam distintas aproximações com o real. Ambas são formas de explicar o presente, inventar o passado, imaginar o futuro. Valem-se de estratégias retóricas, estetizando em narrativa os fatos dos quais se propõem falar. São ambas formas de representar inquietudes e questões que mobilizam os homens em cada época de sua história, e, nesta medida, possuem um público destinatário (leitor e ouvinte), atuando como aproximações que unem o conhecimento histórico e a música. 3

As representações históricas construídas pelos alunos, incentivadas pela música, podem ajudar na construção do conhecimento histórico propiciando a identificação dos diferentes significados dos elementos definitivos e provisórios contidos nas representações históricas dos alunos, que podem ser compreendidos e trabalhados de maneira diagnóstica pelo professor através da linguagem musical, podem se transformar em uma ponte entre a realidade atual e o passado histórico. Já os alunos, tal como os historiadores, precisam compreender por que motivos as pessoas atuaram no passado de uma determinada forma e o que pensavam sobre a forma como o fizeram, mesmo que não entendam isto tão bem quanto nós professores de história. Desde o final da década de 60 que se vem desenvolvendo uma área de investigação relacionada com o pensamento histórico dos alunos, fazendo com que essas representações possam ser analisadas enfatizando-se o contraste entre o sentido do provisório e do definitivo, no pensamento do adolescente, que introduz um elemento de incerteza nas conclusões históricas. Essa visão geral do processo cognitivo de aprendizagem da História, pois depois dos 11-12 anos, o conceito de probabilidade torna-se organizado: há uma síntese entre acaso e operações, e estrutura-se um sistema de probabilidades (BARCA, 2000, p. 35). Nesse sentido, é salutar a utilização da linguagem musical no ensino de História com o objetivo de estimular os alunos a buscar compreender por quais motivos as pessoas atuaram no passado de uma determinada forma, e o que pensavam sobre a maneira como o fizeram (ainda que não tenham maturidade suficiente para a total apreensão do objeto estudado - lembremos que os historiadores ao pesquisar tais fontes realizam semelhante operação mental). Portanto, uma das principais preocupações desse artigo foi mostrar, de maneira simplificada, como professores e seus alunos utilizam modelos definitivos ou provisórios de explicação histórica e, ao mesmo tempo, como esses modelos são estimulados pela linguagem musical, partindo do pressuposto que a progressão das idéias é algo comprovado nos alunos no que tange à compreensão do processo histórico. Portanto, a elaboração de uma pesquisa sobre a música e a construção do conhecimento histórico em aula terá como principal objetivo relacionar a prática do ensino de História em sala de aula com a utilização da música, procurando entender de que forma a linguagem musical contribui na construção do conhecimento histórico, o que também deve levar a outras questões como: 1) quais os elementos destacados por professores e alunos em relação à linguagem musical no âmbito da sala de aula? 2) como esses elementos formam uma consciência musical em professores e alunos? 4

3) quais os diferentes significados dos elementos definitivos e provisórios contidos nas representações históricas destes jovens estimulados por essa consciência musical? Referências Bibliográficas ABUD, Katia Maria. A construção curricular em sala de aula. História & Ensino. Revista do Laboratório de Ensino de História / UEL, v. 9, p. 171-184, out. 2003. Processos de construção do saber histórico escolar (artigo digitalizado a ser publicado na Revista do Laboratório de Ensino de História da UEL). Registro e representação do cotidiano: a música popular na aula de História (artigo digitalizado a ser publicado nos Cadernos CEDES). ALVES-MAZZOTTI, Alda Judith. Representações sociais: aspectos teóricos e aplicações à educação. In: Em Aberto. Brasília: INEP, n o 61, p. 60-78. 1994. BARCA, Isabel. O pensamento histórico dos jovens. Braga: Centro de Estudos em Educação e Psicologia Instituto de Educação e Psicologia Universidade do Minho, 2000. BRANDÃO, Antonio Carlos & DUARTE, Milton Fernandes. Movimentos Culturais de Juventudes. São Paulo: Moderna, 1990. (Coleção polêmica). CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1. artes de fazer. 5 a ed. Petrópolis: vozes, 2000. CHARTIER, Roger. A história cultural entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990.. O mundo como representação. In: Revista Estudos Avançados. São Paulo, Instituto de Estudos Avançados da USP, vol. 5, n o 11, p.173-191. 1991. CHERVEL, André. História das disciplinas escolares sobre um campo de pesquisa. In: Teoria e educação, n o 2. Porto Alegre, p.117-229. 1990. CONTIER, Arnaldo Daraya. Edu Lobo e Carlos Lyra: o nacional e o popular na canção de protesto (os anos 60). In: Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 18, n o 35, p. 13-52. 1998. Música no Brasil: história e interdisciplinaridade algumas interpretações (1926-80). In: História em debate: problemas, temas e perspectivas. Anais do XVI Simpósio da Associação Nacional dos Professores de História. Rio de Janeiro, 22 a 26 de julho de 1991, p. 151-189. DUARTE, Milton Joeri Fernandes. Representações dos movimentos político-culturais da década de 60 nos jovens de ensino médio. Dissertação de mestrado, FEUSP, 2005. FERREIRA, Martins. Como usar a música na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2001. (Coleção Como usar na sala de aula). 5

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