HABILIDADES MOTORAS BÁSICAS: FUNDAMENTOS PARA O MERGULHADOR *



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Transcrição:

HABILIDADES MOTORAS BÁSICAS: FUNDAMENTOS PARA O MERGULHADOR * Por Roberto Trindade 1 INTRODUÇÃO Toda aprendizagem resulta em alguma mudança de comportamento daquele que aprende. Essas mudanças são observadas na maneira de agir, no fazer, pensar, gostar, expressar... Qualquer atleta, em qualquer esporte, precisa estar a par de todos os fundamentos, da base daquilo que ele deverá fazer com perfeição. A perfeição só chega com treino e muito treino. Treinar, treinar e treinar para obter bons resultados, já dizia nosso querido João do Pulo. Porém atualmente faltam treinos de fundamentos. Na ânsia de formar o esportista atropelam-se etapas e matam o desempenho futuro. O que eu quero dizer é que em todos os esportes os fundamentos são básicos. O arremesso, no basquete, a manchete no volibol, o jab no boxe, são tão importantes como é o passe no futebol. Shaquille O`Neal, o atual craque do Miami Heat, quando jogava pelo Lakers, errava quase todos os lances livres. Seu aproveitamento era ridículo, mas ele em um determinado momento passou a treinar lances livres, e consequentemente, seu aproveitamento melhorou. O aproveitamento de quem treina é sempre melhor. Oscar, o "mão santa", cansou de explicar a razão do seu sucesso nos arremessos. Treino! E foi assim que ele acabou sendo um dos maiores cestinhas do mundo. Tiger Woods, o campeão especializado em golf costuma dizer que quanto mais eu treino, mais sorte eu tenho. È importante entender que a aquisição de habilidades motoras para atividade de mergulho também é por si só um processo dinâmico e complexo, mas que também se baseia em fundamentos. Ao contrário do que se tem praticado, o princípio básico que devemos levar em conta é o de oferecer uma ampla rede de atividades motoras básicas durante todo o treinamento que permita a cada candidato vivenciar experiências múltiplas de movimentos no âmbito das habilidades * Artigo disponível on line via: http://www.pdic.com.br/pdic2005/biblioteca/habilidades_motoras_aquaticas.asp

motoras locomotoras, das habilidades motoras não-locomotoras e das habilidades motoras manipulativas, indispensáveis ao vocabulário motor de todo ser humano e em especial na formação de mergulhadores. Não podemos admitir, porém que um processo de aprendizagem motora, conforme afirma Korsakas (2002), privilegie apenas a exigência pela perfeição do gesto técnico imediato, ignorando as potencialidades e limitações individuais. Ou seja, sem compreender os mecanismos que regem o gesto motor, fica difícil aprender e consequentemente ensinar, concordam? Baseado em Roth (2003) podemos afirmar que quem dispõe de uma plataforma ampla de experiências, percepções e emoções tem a vantagem de poder recorrer e procurar em um grande repertório criativo, respostas motoras adaptadas às mais diversas situações que o mergulho impõe, fornecendo um tipo de solo fértil para a formação de um mergulhador hábil. Os atuais estudos da aprendizagem motora e do desenvolvimento motor e psicomotor nos ensinam que as habilidades motoras básicas ( leia-se aqui fundamentos) são um pré-requisito para a aquisição, a posteriori, de habilidades mais complexas e específicas. Da mesma forma, assim são também as habilidades do mergulho livre e do mergulho scuba. A justificativa para tal fato é que, segundo Robertson, Seefeldt e Haubenstricker, (1982) o processo de desenvolvimento inter-habilidades se dá por fases, numa seqüência previsível de mudança qualitativa. Outros importantes estudos (Gallahue, 1982) nos afirmam que essa sequência de desenvolvimento é universal e invariante, já que todo ser humano passa pelas mesmas fases e na mesma ordem, numa progressão qualitativa segundo o ritmo de desenvolvimento específico de cada indivíduo. Esta concepção teórica é conhecida como a Teoria dos Estágios, baseada no modelo epistemológico de Jean Piaget (1965). Assim sendo, as mudanças observáveis de estágio para estágio devem ser entendidas como uma "reorganização" seletiva do sistema nervoso, onde cada mudança de estágio será compreendida como a integração de um estágio com o seu anterior, em um processo conhecido como síntese epigenética.(piaget, 1966). Isto significa que a passagem de um determinado estágio para outro, representa a incorporação do nível anterior de execução pelo nível subseqüente, muito mais amplo.

Um outro aspecto a ser considerado no estudo da aprendizagem motora diz respeito ao crescente fluxo de informações vem sendo gerado a respeito dos mecanismos intrínsecos à aquisição de novos padrões motores. Nesse contexto, aprendizagem e memória mostram-se fortemente associadas entre si. A aquisição de novos conhecimentos que trazem como conseqüência uma modulação do comportamento é peculiar à aprendizagem, enquanto que a retenção desse conhecimento implica aspectos da memória. Assim, ambos os processos compartilham mecanismos neurais similares, que igualmente participam do controle da atenção, integração sensorial e percepção. A memória de procedimentos é resultante do aumento da performance e, proporcionalmente, do incremento da precisão do gesto motor. Pode ser entendida como a habilidade motora ou sensorial que normalmente chamamos de "hábito", tendo relação com os procedimentos motores responsáveis pela aquisição daquele tipo de memória. O aprendizado gradualmente produz diminuição no erro embutido na tarefa, aumento da coordenação e maior agilidade e velocidade na execução do movimento. A compreensão de modelos experimentais relacionados ao arquivamento de informações motoras é norteada pelo fenômeno de acomodações plásticas neurais do sistema nervoso. As atuais pesquisas a respeito do processo de aprendizagem motora afirmam que a combinação entre memória sensorial (estímulos sensoriais), memória de curto prazo (memória de trabalho) e memória de longa duração representada no sistema nervoso através da consolidação e a execução do gesto motor levaria a um novo ordenamento na configuração neural. Em especial, durante o aprendizado de uma tarefa motora, essa representação interna produziria um incremento na eficácia ("força") sináptica de neurônios em áreas corticais e subcorticais. A elaboração de um modelo interno, a partir da aprendizagem motora, sustenta-se na conectividade e organização de uma nova rede neural. No modelo tradicional de Donald Hebb são postuladas idéias sobre reverberações sinápticas, ou seja, seqüências de cadeias neuronais são formadas a partir da aprendizagem. Tais cadeias representam informações distintas distribuídas ao longo do córtex, responsáveis por mecanismos de habituação, retenção de memória e recuperação de lesões (neuroplasticidade).

2 O DESENVOLVIMENTO DAS HABILIDADES MOTORAS Segundo Gallahue (1982) o desenvolvimento das habilidades motoras pode ser representado por uma pirâmide, colocando-se na base, ou seja, no primeiro estágio, os movimentos reflexos, característicos dos recémnascidos do período sensório - motor, e apresentando no topo os movimentos desportivos. Nos patamares intermédiários o indivíduo passa por um estágio de movimentos conhecidos como rudimentares e como movimentos fundamentais. No entanto, devemos citar Moreno e Sanmartín (1998) quando os mesmos afirmam que o desenvolvimento das habilidades motoras quer no meio terrestre, quer no meio aquático, é sempre o resultado das contínuas interações entre determinados fatores genéticos somados às experiências prévias do sujeito com o meio ambiente. No caso particular do mergulho livre e do mergulho scuba, podemos também afirmar baseados em Langendorfer e Bruya,(1995); em Moreno e Garcia,(1996); em Crespo e Sanchez,(1998); e em Moreno e Sanmartín,(1998), que o sucesso dessa apropriação também dependerá da prévia aquisição de determinadas habilidades aquáticas básicas somadas a fatores genéticos. Entretanto, as teorias correntes de aprendizagem motora explicam apenas uma parte desse processo, qual seja, a estabilização da "performance" que se caracteriza por um processo homeostático (equilíbrio) alcançado via "feedback" negativo (Adams, 1971; Schmidt, 1975). Sabemos que o comportamento motor passa por um processo caracterizado por ciclos de estabilidade-instabilidade resultando em aumento de complexidade. Na literatura científica, diversos autores, baseados em um modelo de não-equilíbrio da aprendizagem motora, pesquisaram o efeito do tipo de prática na aquisição de uma habilidade na adaptação a uma nova tarefa. Baseados em Garganta (2001) concluímos que quando consideramos as exigências do mergulho se faz necessário pensar na formação de um mergulhador que seja capaz de adaptar o seu comportamento motor às necessidades colocadas pela situação de cada mergulho, assim como também estar capacitado para provocar, intencionalmente, alterações que lhe sejam adequadas e favoráveis. Assim sendo, devemos entender que como princípio pedagógico básico devemos ter a compreensão que antes da abordagem de habilidades motoras aquáticas específicas será necessário ao educando, adquirir e consolidar um conjunto de habilidades aquáticas básicas. O objetivo deste artigo é o de apresentar uma sugestão de um conjunto de habilidades aquáticas básicas, que deverão ser abordadas ainda

durante o processo de adaptação ao meio líquido, enquanto ferramenta facilitadora da aquisição e assimilação de habilidades específicas do mergulho livre e do mergulho scuba. 3 AS HABILIDADES MOTORAS AQUÁTICAS Já sabemos que no meio aquático a aquisição de habilidades motoras mais complexas e específicas dependem da prévia aquisição, apropriação e domínio de habilidades mais simples. Segundo Langendorfer e Bruya (1995) et all, a adaptação do modelo de desenvolvimento das habilidades motoras proposto por Gallahue (1982), pode ser sugerido para as atividades realizadas no meio aquático. 3.1 Objetivos 1. Promover a familiarização do sujeito com o meio aquático (Catteau e Garoff, 1988; Mota, 1990; Carvalho, 1994; Navarro, 1995; Crespo e Sanchez, 1998; Moreno e Sanmartín, 1998); 2. Promover a criação de autonomia no meio aquático (Catteau e Garoff, 1988; Mota, 1990; Carvalho, 1994; Crespo e Sanchez, 1998; Moreno e Sanmartín, 1998) e; 3. Criar as bases para posteriormente aprender habilidades motoras aquáticas específicas (Langendorfer e Bruya, 1995; Crespo e Sanchez, 1998; Moreno e Sanmartín, 1998). 3.2 As Habilidades Motoras Aquáticas Básicas Vasconcelos Raposo (1978), apenas se refere ao equilíbrio e à respiração, como elementos a abordar no processo de adaptação ao novo meio. Todavia, tradicionalmente são consideradas como componentes da adaptação ao meio aquático, ou seja, como sendo habilidades aquáticas básicas: a respiração, o equilíbrio - que inclui as rotações e os saltos - e a propulsão (Catteau e Garoff, 1988; Mota, 1990; Carvalho, 1982; 1994). Contudo, a estas habilidades aquáticas básicas, Moreno e Garcia (1996) acrescentaram os lançamentos e as recepções, o ritmo, os reboques, a flutuação e a familiarização inicial com o meio. Mais tarde, Moreno e Sanmartín (1998) procuraram uma melhor sistematização destas habilidades. Assim, propuseram a abordagem das rotações, dos deslocamentos (que incorporam a propulsão e os saltos), das manipulações (que incluem os

lançamentos e as recepções) e dos equilíbrios (envolvendo também as flutuações e a respiração). Por sua vez, Navarro (1995), sugere a abordagem nesta fase dos saltos, das rotações, dos deslocamentos, do equilíbrio e dos lançamentos e das recepções. No entanto, entendemos que para o mergulho também são fatores essenciais para a posterior prática a configuração e adaptação ao equipamento. Sugerimos as habilidades aquáticas básicas a serem abordadas nos programas de adaptação ao meio aquático voltado a mergulhadores: 1.Equilíbrio, incluindo a flutuação e as rotações; 2.Propulsão, onde se integram os saltos; 3.Respiração; 4.Manipulações, que também abrangem os lançamentos e as recepções; 5.Configuração e adaptação ao equipamento. 3.2.1 Equilíbrio O domínio do equilíbrio no meio aquático está intimamente ligado com o domínio da propulsão (Mota, 1990). Isto porque a posição mais vantajosa para o deslocamento neste meio é a horizontal. Assim, será necessário que o indivíduo refaça um conjunto de referências neuromotoras, procurando adaptar-se à nova situação. No meio aquático, o equilíbrio de um corpo depende da inter-relação das Forças de Empuxo e de Gravidade (Abrantes, 1979). Recordemos também que o equilíbrio é alterável através da respiração e da modificação da posição relativas dos segmentos corporais (Abrantes, 1979). Ou seja, ao aumentar-se o volume de ar inspirado, aumenta-se o volume corporal imerso, pelo que também se aumenta o volume de água deslocada e, portanto, a intensidade da Força de Empuxo. Por outro lado, alterando a posição relativa dos diversos segmentos corporais, altera-se a localização do centro de massa e do centro de impulsão e, portanto, a relação entre as forças envolvidas na determinação do equilíbrio. Intimamente relacionado com este fenómeno está um outro: a flutuação. A flutuação é a expressão mecânica entre a densidade de um corpo e a densidade do líquido onde esse corpo se encontra mergulhado (Vilas-Boas, 1984).

Pode-se dizer que a flutuabilidade é determinada pela inter-relação entre as intensidades da Força da Gravidade e da Força de Empuxo. Assim, um corpo apresenta uma flutuabilidade positiva quando a sua densidade é inferior à densidade do líquido. Por outro lado, a flutuabilidade é negativa quando a densidade do corpo é superior à densidade do líquido onde se encontra mergulhado. Ou então, que a flutuabilidade é positiva quando a intensidade da Força de Empuxo for superior à magnitude da Força da Gravidade e ao contrário, que a flutuabilidade é negativa quando a intensidade da Força de Empuxo é inferior à intensidade da Força da Gravidade. A abordagem da flutuação nesta fase é importante, para criar nos alunos uma conscientização dessa possibilidade no meio aquático, a qual não é "vivenciável" no meio terrestre (Mota, 1990; Moreno e Garcia, 1996). Aquacidade de um mergulhador é igual ao seu equilíbrio hidrostático, diz o Instrutor de mergulho Mauricio de Carvalho. Chamamos de trim o ponto de equilíbrio horizontal do mergulhador, que gera menor resistência hidrodinâmica frontal e de esteira e consequentemente menor consumo de gás, menor perda de calor e menor risco de contato com o fundo. 3.2.2 Propulsão Como já foi referido, as alterações em termos de equilíbrio, devemse a diferenças no mecanismo propulsor utilizado no meio aquático. A Força de Propulsão em condições de escoamento estável, decorre da componente na direção do deslocamento da resultante entre a Força de Arrasto Propulsivo e da Força Ascensional (Schleihauf, 1979). Já em condições de escoamento instável, a propulsão explica-se devido à produção de vórtices (Colwin, 1992). Acresce-se que quanto menor for a intensidade da Força de Arrasto Hidrodinâmico oposta à direcção de deslocamento do mergulhador, maior será a velocidade de propulsão para uma dada intensidade de Força Propulsiva. Assim, a eficiência de propulsão decorre do aumento da intensidade da Força Propulsiva e da diminuição da intensidade das diversas componentes da Força de Arrasto Hidrodinâmico oposta à direcção do deslocamento do sujeito, isto é, do Arrasto de Fricção, do Arrasto de Pressão e do Arrasto de Onda. Os saltos serão considerados como o método de deslocamento de um indivíduo do meio terrestre para o meio aquático. Isto porque, nas

atividades aquáticas, os deslocamentos não são necessariamente efetuados sempre em contato com a água. Daí a sua inclusão neste grupo de habilidades, embora alguns autores refiram que os saltos deverão fazer parte do equilíbrio (Vasconcelos Raposo, 1978; Catteau e Garoff, 1988; Carvalho, 1982; 1994). 3.2.3 Respiração Uma das principais limitações impostas pela passagem à posição horizontal, relaciona-se com a necessidade de imersão da face, a qual se constitui como uma limitação da função ventilatória (Holmér, 1974). Ou seja, o mecanismo respiratório sofre algumas alterações quando o sujeito se encontra no meio aquático, devido à face se encontrar temporariamente imersa e das características físicas desse mesmo meio, já que a água é 800 vezes mais densa que o ar. Logo, o trabalho de aperfeiçoamento da respiração pressupõe a criação de um processo respiratório consciente, necessariamente diferente do automatismo inato (Mota, 1990). 3.2.4 Manipulações As manipulações consistem em manter uma relação de interação entre o indivíduo e um ou vários objetos, permitindo explorá-lo(s) e, simultaneamente, explorar todas as suas possibilidades (Moreno e Sanmartín, 1998). No caso concreto das atividades subaquáticas, esses objetos são usualmente materiais auxiliares como por exemplo, as carretilhas, as pranchetas, as máquinas de fotografar e filmar. Finalmente, serão também incluídas nesta categoria de habilidades aquáticas básicas as rotações. O motivo para a sua inclusão neste tipo de habilidades justifica-se pelo fato das rotações não serem mais do que alterações momentâneas do equilíbrio adquirido, ou seja, de alterações esporádicas do equilíbrio atingido. Essas rotações poderão ser efetuadas sobre diferentes tipos de eixos (internos e externos) e sobre diversos planos (sagital, frontal e transverso).

3.2.5 Configuração do Equipamento O equipamento também é parte importante do equilíbrio do mergulhador e assim sendo, é muito importante saber como o mesmo se comporta. Cilindros possuem características diferentes (tamanho, volume hidrostático, tipo de material, etc) e consequentemente diferente flutuabilidade. Roupas, sejam secas ou úmidas, são as grandes responsáveis pela necessidade de lastro para equilibrar o mergulhador e variam de acordo com o seu material de fabricação e espessura( neoprene de baixa ou alta densidade, trilaminadas, uso de undergarment). O lastramento também exige bastante atenção por parte do mergulhador, em especial em função do excesso de lastros e posicionamento inadequado. È fundamental que mergulhadores aprendam desde o início a ajustarem seus lastros 4 CONCLUSÕES No decurso do processo de adaptação ao meio aquático deverão ser abordadas diversas habilidades motoras aquáticas básicas, as quais permitirão a posterior aquisição e assimilação de habilidades motoras aquáticas específicas de diversas atividades aquáticas. Além do mais, nesta etapa devemos ter em mente que nenhuma habilidade ou grupo de habilidades deve ser super ou subvalorizada em detrimento das restantes. Finalmente, dada a inter-relação que se verifica entre diversas habilidades, será possível combiná-las de múltiplas formas. Especialmente no período de consolidação de uma ou de várias habilidades e/ou em momentos mais avançados do processo de adaptação ao meio aquático. È este o desafio que enfrentam os verdadeiros educadores. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRANTES, J. (1979). Biomecânica e Natação. Ludens. 4(1). pp. 30-34. BENDA, Rodolfo Novellino., XAVIER, Aquiles Johnson Milhomem., MARTINI, Cristiane Oliveira Pisani. Treinamento de velocidade: um bom goleiro reage rapidamente. [on line] Disponível na Internet. URL: http://www.eeffto.ufmg.br/pablogreco/arquivos/capítulo 15 - Caderno do Goleiro.pdf. 10.nov.2003.

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