SNPTEE SEMINÁRIO NACIONAL DE PRODUÇÃO E TRANSMISSÃO DE ENERGIA ELÉTRICA Versão 1.0 GCE 063 16 a 21 Outubro de 2005 Curitiba Paraná GRUPO XIV GRUPO DE CONSERVAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA GCE Gestão eficiente de Energia na indústria de energia elétrica estudo de caso da Nestlé Brasil Ltda Fernando Amaral de Almeida Prado Jr * Gilberto Tonim ** * Sinerconsult Consultoria Treinamento e Participações Ltda / Escola Politécnica da USP **Nestlé Brasil Ltda 1.0 RESUMO Este artigo tem por objetivo registrar as ações de gestão energética eficiente nas unidades da indústria alimentícia, particularmente com um estudo de caso da Nestlé Brasil ltda. A Nestlé Brasil Ltda é uma das maiores empresas do ramo alimentício do Brasil e uma das maiores fabricantes de alimentos na escala mundial. Até o racionamento de 2001 a gestão energética da Nestlé era desenvolvida de forma descentralizada, com pouca normatização e centralização. A crise de abastecimento chamou a atenção para a questão estratégica relacionadas à segurança do fornecimento, mas também propiciou o entendimento que essa questão tornara se de tal importância no Brasil que o acompanhamento das principais questões deixara de ser operacional e passara para um plano estratégico. A percepção que o mercado de energia vinha se alterando de forma rápida também propiciou a alteração do posicionamento da Nestlé Brasil ltda perante seus fornecedores tendo em vista a possibilidade de migração ao mercado livre. Esta possibilidade abriu portas de negociação de energias especiais, bem como outras alternativas, disponíveis no mercado, incluindo contratos de desempenho de eficiência energética e mercado livre. 2.0 PALAVRAS CHAVE Eficiência gerenciamento indústria Alimentícia 3.0 INTRODUÇÃO Durante décadas o mercado de energia elétrica das concessionárias de distribuição foi marcado pelas características de monopólio natural. O atendimento não era opcional e a própria lucratividade era definida em legislação. Nestas condições ao cliente havia pouco o que atuar em termos de gestão. Mesmo em funções óbvias como a adequação de contratação de demandas as regras não eram claras e o consumidor ficava na dependência de boa vontade das concessionárias. *Rua Paulo Orozimbo, 675 10 o andar Conjunto 101 01535 001 Cambuci São Paulo tel: (11) 3399 2444 e mail: sinerconsult@uol.com.br
2 Esta situação começou a mudar em função da profunda reestruturação iniciada no setor elétrico brasileiro já a partir de 1993 quando da edição da lei 8631 que promoveu um grande ajuste de resultados e representou o divisor de águas de uma nova base regulamentar. Posteriormente o projeto RESEB lançou as bases para a nova estrutura do setor elétrico brasileiro com a criação de novos agentes que representam uma maior dinâmica e modernização dessa indústria, A criação da ANEEL representou um marco na modernização do setor elétrico com seu papel de entidade reguladora que se propõem ao equilíbrio de interesses e de transparência em suas decisões em prol da sociedade brasileira. Nesse contexto surgem uma série de resoluções, que estabelecem um maior equilíbrio de forças entre consumidores e concessionárias de distribuição. Pode se destacar nesses avanços o papel representado pela descentralização do poder regulador através de agências estaduais e a edição das resoluções das condições gerais de fornecimento 456/2000, bem como outros regulamentos que estabeleciam condições de regulação técnica com direitos e deveres das partes. Em que pesem os avanços, a tecnicidade do processo pouco repercutiu na percepção dos consumidores. O racionamento de 2001, apesar de sua gravidade e de suas conseqüências econômicas ainda pouco estudadas trouxe para uma série de empresas a percepção que o tema energia elétrica possuía outra dimensão que não simplesmente a contabilização de R$ e de MWh gastos ao final de cada mês. A identificação que já não havia a certeza da disponibilidade energética abundante e que os preços subiam em velocidade maior que a inflação alteraram o paradigma de gestão do contábil para o estratégico. Os itens subseqüentes apresentam a experiência da Nestlé nessa caminhada para um patamar de gestão mais otimizado no uso de energia elétrica em suas unidades. Este artigo tem por objetivo registrar as ações de gestão energética eficiente nas unidades da indústria alimentícia, particularmente com um estudo de caso da Nestlé Brasil ltda. A Nestlé Brasil Ltda é uma das maiores empresas do ramo alimentício do Brasil e uma das maiores fabricantes de alimentos na escala mundial. Até o racionamento de 2001 a gestão energética da Nestlé era desenvolvida de forma descentralizada, com pouca normatização. A crise de abastecimento chamou a atenção da empresa das questões estratégicas relacionadas à segurança do fornecimento, mas também propiciou o entendimento que essa questão tornara se de tal importância no Brasil que o acompanhamento das principais questões deixara de ser operacional e passara para um plano estratégico. Outro ponto a ressaltar nessa nova percepção dizia respeito aos custos de energia elétrica que vem tendo seus preços reajustados em níveis superiores à inflação nos últimos 5 anos. Nesse contexto o processo de centralização foi inevitável para que um novo posicionamento ocorresse no nível corporativo, ficando claro que uma vez redirecionadas as ações nova descentralização ocorreria junto às unidades industriais. O processo passou pela readequação dos contratos e pela elaboração de um modelo de acompanhamento que tornava transparente os custos operacionais de cada unidade, permitindo os ajustes das grandezas elétricas contratadas com a rapidez necessária. Nessa modelagem a busca de fatores de carga mais levados, a eliminação de penalidades e a busca de um custo unitário adequado foram as prioridades definidas. A percepção que o mercado de energia elétrica vinha se alterando de forma muito rápida também propiciou a alteração do posicionamento da Nestlé Brasil ltda perante seus fornecedores tendo em vista a possibilidade de migração ao mercado livre. Esta possibilidade abriu portas de negociação de contratos de fornecimento de energias especiais para substituição de geradores operando no horário de ponta e programas de eficiência energética. A qualidade do fornecimento também foi fator priorizado nesse processo de reposicionamento como um cliente de energia elétrica com inserção corporativa em nível nacional. Particularmente neste último segmento a possibilidade de execução de programas de eficiência energética lastreados em contratos de desempenho promoveu uma importante alteração de cultura no relacionamento das unidades industriais com as concessionárias de distribuição. Foram desenvolvidos projetos de substituição de motores por outros de alto rendimento, projetos de iluminação eficiente e modernização de sistemas de compressores, todos projetos com elevados níveis e atratividade para a indústria e para as concessionárias que implementaram os projetos, a maior parte com utilização dos recursos da lei 9991/00. Finalmente o artigo aborda ainda as ações decorrentes de adequação dos níveis de tensão de fornecimento com investimentos em subestações para elevação das tensões de conexão e conseqüente elegibilidade para novos
3 patamares tarifários mais competitivos. Não e pode esquecer que esta opção ainda qualifica as unidades industriais aonde esta alternativa era adequada para optarem pelo mercado livre se for julgado conveniente. Para finalizar o artigo apresenta um quadro resumo das ações desenvolvidas e dos principais resultados obtidos quer em termos de energia conservada quer nos aspectos econômicos e financeiros. 4.0 GESTÃO DA INFORMAÇÃO A consciência da necessidade um maior aprofundamento da gestão resultou do racionamento de 2001. Ficou claro a necessidade de uma maior centralização das informações visando permitir a compreensão do todo para uma posterior nova descentralização de atividades. A concentração da autoridade pressupunha não uma ação autoritária mas um diagnóstico que levasse a compreensão do problema inclusive identificando se necessidades de treinamento para as unidades industriais descentralizadas. Esses treinamentos envolveram aspectos relacionados com regras básicas comerciais, renovação de contratos, contratação e alteração de demandas e as possibilidades presentes de projetos de eficiência energética. Um dos aspectos mais importantes diz respeito ao fato que as tarifas de energia vem sendo reajustadas acima da inflação. As figuras 1 e 2 apresentam esta tendência em duas concessionárias que servem de referência. Reajuste Eletropaulo X IPCA ( 1999 base 100 ) % 250,00 200,00 150,00 100,00 114,97 106,65 134,07 114,32 165,26 123,97 183,36 141,55 217,50 152,10 50,00 0,00 2000 2001 2002 2003 2004 Figura 1. Reajustes da Eletropaulo comparados com IPCA Reajuste Light X IPCA ( 1999 base 100 ) 250,00 % 200,00 150,00 100,00 114,92 106,65 149,53 114,32 175,12 182,38 123,97 141,55 207,03 152,10 50,00 0,00 2000 2001 2002 2003 2004 Figura 2. Reajustes da Light comparados com IPCA
4 A lógica que norteou este processo era a criação de um mecanismo ágil de controle das variáveis que envolvem o custo da energia em uma unidade e o incentivo para que cada planta industrial priorizasse suas oportunidades de otimização de custos a partir de referenciais unitários como: Custos unitários. Custos teóricos (menor desembolso unitário que uma unidade industrial possa ter tendo um fator de carga unitário). Custos unitários associados a produção, visando dar materialidade aos montantes de energia consumidos e aos custos incorridos. A figura 3 seguinte mostra um modelo da gestão onde o aproveitamento de recursos gráficos era priorizado visando facilitar o posicionamento e o entendimento de cada unidade em relação ao próprio uso de energia. Como é fácil depreender da figura a busca da otimização pressupunha a assunção de riscos, pois se contava com os limites de tolerância estabelecidos nas resoluções para a contratação da s demandas. 3.500 3.000 2.500 Dem anda Contratada Ponta x Demanda Efetiva Ponta kw 2.000 1.500 1.000 500 Dem. Contr. Ponta kw Demanda Faturada Ponta kw Tolerância Figura 3. Exemplo de uma unidade com adequado gerenciamento da demanda Vencida a etapa de conhecimento, e treinamento, o acompanhamento e atuação das unidades passou a ser realizado de forma descentralizada, cabendo a unidade central um gestão global e a introdução de outras práticas que paulatinamente puderam ser aplicadas em cada uma das unidades onde esta posição se mostrou favorável. 5.0 ENERGIA DE SUBSTITUIÇÃO TÉRMICA. Como conseqüência do racionamento, muitas concessionárias passaram a dispor de montantes de energia contratados com geradoras para os quais não havia mercado, pois os consumidores como aprendizado do racionamento tinham apreendido a eliminar desperdícios (pelo menos os mais gritantes). Dessa forma, a ANEEL passou a permitir a comercialização de excedentes para substituição de geração térmica nas unidades onde havia disponibilidade de auto produção. Na maior parte das vezes esta geração ocorria apenas nos horários de ponta. Embora esta comercialização se de na forma de uma energia temporária, os excedentes criados pelo racionamento ainda perduram passados 3 anos de seu encerramento. Considerando se também o viés formador de excedentes que o novo marco regulatório brasileiro definido no decreto 5.163 de julho d e 2004, acredita se que esta oferta de energia continuará por mais alguns anos embora não se espere a formatação de contratos de longo prazo com as concessionárias. Considerando se esta oferta logicamente as demandas contratadas são repactuadas representando um ganho econômico substantivo.
5 Atualmente este tipo de contratação está sendo realizado em 12 unidades industriais da Nestlé e os ganhos ultrapassam a casa dos R$ 300 mi / mês quando se consideram as tarifas de consumidor cativo como referencial. 6.0 MIGRAÇÃO DE TENSÃO. Além de tarifas mais econômicas, a conexão de energia em níveis mais elevados de tensão propicia uma melhoria importante nos níveis de qualidade das diversas unidades industriais. Estima se que a redução de perturbações elétricas provenientes de oscilações de tensão e desligamentos seja reduzida a 1 décimo daquelas que são registradas na classe de tensão A 4. Embora a ANEEL tenha projetado um descruzamento tarifário os próximos anos (eliminação de subsídios cruzados), mesmo em 2007 a diferença tarifária deverá ser da ordem de 15 a 17 % para consumidores que elevarem seus níveis de tensão da classe A 4 para a classe A 2. Embora esta mudança represente a necessidade de investimentos que podem ultrapassar a casa de R$ 4 milhões, o retorno do investimento se dá usualmente em menos que 24 meses. Nessas vantagens não se está computando a otimização que ocorre quando várias unidades localizadas em uma única localidade podem compartilhar a contratação e otimizar a diversidade do uso da demanda. Nesta providência não se está levando em conta que a migração de tensão pode tornar as unidades compartilhadas elegíveis para o mercado livre. Mesmo que esta iniciativa não se configure como viável é inequívoco que a concessionária terá melhor facilidade para discutir e negociar necessidades específicas dessa unidade em relação a demandas comerciais. 7.0 EFICIÊNCIA ENERGÉTICA Desde a edição da lei 9991/00 as concessionárias, em que pese o fato de serem obrigadas pelo contrato de concessão a empregarem recursos em eficiência energética, passaram a ter uma obrigação legal desta mesma natureza. A possibilidade de migração ao mercado livre de uma empresa com a reputação da NESTLÉ possibilita a negociação de recursos de investimentos em programas de eficiência energética a fundo perdido ou com base em contratos de desempenho, onde os recursos investidos são remunerados com base nos ganhos efetivamente ocorridos em ações de eficiência energética. Mais de R$ 4, 4 milhões em recursos forma negociados com diversas concessionárias, sendo que R$ 1, 6 milhões forma destinados a projetos a fundo perdido. Nesse projeto 9 unidades foram beneficiadas. 8.0 MERCADO LIVRE A iniciativa de migração ao mercado livre também propiciou ganhos importantes em uma unidade de grande porte e outras unidades encontram se em estudos por ocasião do fechamento deste artigo. Os ganhos projetados superam nestas unidades mais de R$ 10 milhões referentes a o Valor Presente Líquido do projeto. Além dos ganhos é evidente que a Nestlé aumentou seu poder de negociação, além é claro de ampliar sua percepção sobre riscos e sobre seu posicionamento estratégico em relação a energia elétrica.
6 9.0 COMENTÁRIOS FINAIS Os ganhos representados pelo projeto de gestão energética da Nestlé são representativos e devem servir de exemplo para outras empresas com configuração corporativa. A interpretação coorporativa deve ser considerada como uma alternativa a ser avaliada por outras empresas com características semelhantes.