RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ TOURINHO NETO (RELATOR):



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Transcrição:

fls.1/6 RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ TOURINHO NETO (RELATOR): 1. Trata-se de apelação criminal interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra sentença prolatada pelo MM. Juiz Federal Substituto Eduardo Pereira da Silva, da Subseção Judiciária de Anápolis/GO, que julgou improcedente a pretensão punitiva estatal e absolveu ODILON PONCIANO DIAS JÚNIOR da acusação de prática do delito tipificado no art. 96, inciso II, da Lei 8.666/93. 2. A denúncia de fls. 02/04, datada de 11/09/2006 e recebida em 29/09/2006 (fls. 174) descreve os seguintes fatos: No dia 16 de dezembro de 2002 o denunciado ODILON PONCIANO DIAS JÚNIOR, na condição de administrador responsável pela firma W3 Informática Ltda, vendeu à Base Aérea de Anápolis trinta cartuchos, modelo 5164A, de impressora HP 800, após licitação em que foi vencedora a aludida empresa, conforme demonstra a nota fiscal n. 00162 de fls. 06. Por ocasião da entrega do material no setor competente da Base Aérea de Anápolis, o então gestor percebeu que os cartuchos entregues eram falsificados, razão pela qual solicitou exames por parte de técnicos da empresa Hewlett Packard, fabricante daqueles produtos, os quais confirmaram as suspeitas. Laudo de exame em material, realizado pelo SETEC/DPF/GO apontou tratar-se de material remanufaturado vendido como novo, em embalagens falsificadas, sendo a falsificação produzida por reaproveitamento de cartuchos vazios por meio de recarga. Além disso, afirmam os peritos que as embalagens dos cartuchos questionados diferem em vários elementos daquela enviada como padrão. Os peritos estimaram o prejuízo em mil seiscentos e cinquenta reais. O denunciado ODILON PONCIANO afirma que adquiriu os cartuchos falsificados de Cristiano Severino de Oliveira. Cristiano alega que vendeu os referidos cartuchos de impressora pensando que fossem originais e que não sabia que seriam fornecidos para a Base Aérea de Anápolis. Argumenta que ODILON conferiu as mercadorias e não opôs qualquer reclamação. Não pé crível que o denunciado ODILON, profissional com experiência no comércio de produtos de informática, compraria um produto falsificado sem o perceber. Ademais, o denunciado não apresentou qualquer nota fiscal referente à compra dos cartuchos, o que só reforça a idéia de que sabia da procedência ilícita dos mesmos. (...) 3. O Juiz a quo entendeu que, embora a materialidade delitiva esteja comprovada, o mesmo não ocorreu com a autoria, pois: a) a falsificação não é facilmente perceptível e nem foi possível determinar se o réu agiu de má-fé; b) o elemento subjetivo do tipo, o dolo, não se fez presente (fls. 278/283). 4. O Parquet sustenta, em razões recursais, que: a) cabe ao réu demonstrar fato ou circunstância que isente ou minimize a responsabilidade penal; b) a defesa não apresentou nota fiscal da aquisição regular dos cartuchos para afastar o desconhecimento do acusado quanto à contrafação; c) como profissional experiente no comércio de produtos de informática, o réu deveria ter um mínimo de aptidão para distinguir produtos originais, recondicionados e falsificados; d) a empresa de Cristiano, fornecedora dos cartuchos, estava irregular à época dos fatos; e) o réu, conquanto diagnosticada a contrafação dos produtos por ele adquiridos, não pediu ressarcimento do valor pago; f) as divergências consignadas pelos peritos não se resumem ao aumento de 80X para demonstração da diferença na qualidade da tinta e do selo holográfico das embalagens dos cartuchos padrão.

Requer o conhecimento e provimento da apelação, com a consequente condenação do réu (fls. 287/291). 5. Contra-razões às fls. 296/299, pugnando pela manutenção da sentença. 6. O parecer da lavra do Procurador Regional da República Franklin Rodrigues da Costa opina no sentido do provimento do recurso (fls. 305/311) 7. Recurso não sujeito a revisão, por força do art. 286 do RITRF 1ª Região. 8. É o relatório. fls.2/6

fls.3/6 VOTO O EXMO. SR. JUIZ TOURINHO NETO (RELATOR): 1. Como se extrai do relatório, o inconformismo ministerial se refere à absolvição de Odilon Ponciano Dias Júnior da imputação do delito previsto no art. 96, II, da Lei 8.666/93, que dispõe: Fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, licitação instaurada para aquisição ou venda de bens ou mercadorias, ou contrato dela decorrente: (...) II - vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada; Trata-se de crime próprio, material, vinculado, comissivo. O objeto da fraude in casu é o contrato administrativo decorrente da licitação. O tipo caracteriza-se pela demonstração do prejuízo para a Fazenda Pública, consubstanciado na ação dolosa do agente em obter lucro abusivo, consciente da falsidade do produto que vende. Protege os interesses da Administração Pública nos aspectos patrimonial e moral. 2. O Juiz a quo absolveu o réu por ausência de dolo, má-fé e pela dificuldade de comprovação da falsificação, sob o seguinte fundamento (fls. 280/283): a materialidade do delito é incontroversa e está demonstrada pelo Laudo de Exame em Material n. 403/05-SR/GO (fls. 91/96), submetido ao contraditório nesta ação penal. Quanto à autoria, é necessário que se faça a prova da existência do dolo na conduta do acusado para a configuração do crime previsto no art. 96, inciso II, da Lei n. 8.666/1993, já que não se pune a forma culposa. Verifica-se do Laudo de Exame em Material n. 403/05-SR/GO (fl. 96) que os peritos não afirmaram se a falsificação poderia ser facilmente detectada e constataram vários elementos divergentes entre o material questionado e o padrão (original). Infere-se das fotografias do laudo que vários elementos foram comparados, dentre eles o selo holográfico, que teve que ser aumentado 80 (oitenta) vezes para se perceber a diferença. Assim, não dá para afirmar ser a falsificação facilmente perceptível e que o acusado estava de má-fé. Até mesmo os militares encarregados de fazer a verificação dos cartuchos e treinados pela Hewlett-Packard HP tiveram dúvidas e acionaram a citada empresa para esclarecer o caso. (...) Por sua vez, na fase do interrogatório o acusado foi coerente ao afirmar que não sabia da falsidade dos cartuchos... (...) A alegação do Ministério Público de que o acusado trabalhava no ramo de venda de suprimentos de informática havia alguns anos e por isso tinha ciência da falsificação não prospera. Não se pode condenar o acusado apenas com suposição quando não resta evidenciada a má-fé. Não se demonstrou no curso do processo qualquer circunstância especial indicativa de que o acusado tivesse conhecimento da falsidade dos cartuchos. O acusado afirmara que comprara os cartuchos de um terceiro que, em sede policial, confirmara tais declarações e afirmara que também não sabia da falsidade (fls. 108/109). (...) 3. Pois bem, considero acertada a sentença.

Segundo consta da denúncia, o acusado, após sagrar-se vencedor em certame licitatório, vendeu para a Base Aérea de Anápolis/GO 30 (trinta) cartuchos de impressora HP, modelo 5164A, que vieram a ser declarados falsos. Informa a Nota Fiscal nº 00162/2004, às fls. 16, que o órgão aeronáutico adquiriu o material objeto de falsificação pelo preço total de R$ 3.450,00 (três mil quatrocentos e cinquenta reais). Ouvido primeiramente pela autoridade policial, o réu declarou (fls. 103/104): fls.4/6 QUE trabalha no ramo de informática desde 1999; QUE no ano de 2002, salvo engano, participou de uma licitação promovida pela Base Aérea de Anápolis/GO; (...) QUE sua empresa saiu vencedora no procedimento e, via de consequência, forneceu 30 (trinta) cartuchos HP 45, utilizáveis na impressora HP 840, salvo engano; QUE entregou os cartuchos na Base Aérea através de um emissário, o qual retornou com a informação de que a Base Aérea, via seus representantes, necessitava de um documento por escrito da W3 INFORMÁTICA estendendo a garantia dos cartuchos por mais um ano, posto que alguns estavam com o prazo de validade prestes a expirar; QUE atendeu a solicitação da Base Aérea, prorrogando o prazo de garantia de tais cartuchos; QUE recebeu o pagamento pelo material fornecido cerca de uns 60 (sessenta) dias após a entrega; QUE entregue o material, uma semana depois, salvo engano, recebeu um telefonema onde o interlocutor disse ser da Base Aérea e que o material entregue pela empresa do depoente era falsificado; QUE no mesmo diálogo o depoente se dispôs a fazer a troca do material, recebendo como resposta que os cartuchos já tinham sido encaminhados à Polícia Federal e que não teria mais jeito de contornar a situação; QUE adquiriu referidos cartuchos da empresa QUALITY CARTUCHOS, hoje situada na R. 7 de setembro, centro Shopping Center, sal. 20, à época administrada pela pessoa do Sr, CRISTIANO, que atende pelo telefone 3098-2710 ou 9628-5994; QUE na época adquiriu os cartuchos como se originais fossem e nesta condição os forneceu à Base Aérea de Anápolis; QUE não se recorda dos valores recebidos pela Base Aérea de Anápolis, uma vez que na época vendeu cartuchos da HP e da impressora EPSON; QUE se compromete a fornecer documentação, caso encontre, dos cartuchos adquiridos junto QUALITY CARTUCHOS; QUE ainda hoje a empresa do depoente é fornecedora de material de informática para a Base Aérea de Anápolis (...) Em depoimento judicial, disse ser falsa a acusação da denúncia. Eis os questionamentos feitos pelo Juízo e as respostas dadas (fls. 193/196): A empresa W3 Informática vendeu para a Aeronáutica os produtos descritos na nota fiscal de fl. 11? Sim. Onde a empresa W3 Informática LTDA adquiriu esses produtos? Aqui em Anápolis, da empresa RS Cartuchos, por meio de Cristiano. A empresa que o senhor dirige sempre comprava produtos da RS Cartuchos? Não foi a primeira vez. No fim de dezembro de 2002, a empresa W3 Informática LTDA trabalhava com cartuchos originais ou remanufaturados. Quando a empresa venceu a licitação na Base Aérea, fiz cotação e adquiri os cartuchos. Havia exigência na licitação que os cartuchos deveriam ser originais? Sim. O senhor verificou se os cartuchos entregues eram originais? Sim. Olhei cada um dos trinta cartuchos entregues e autentiquei a caixa com o carimbo da empresa W3 Informática LTDA. Ouvido sobre a necessidade de algum esclarecimento, o(a) representante do MPF, perguntou: - o senhor já participou de outras licitações para fornecimento de cartuchos? Antes desses fatos, foi a primeira vez. E posteriormente a esses fatos? Sim, mas não da marca HP. O senhor já havia trabalhado com cartucho HP antes da licitação? Não. Quando a empresa W3 habilitou na licitação, o senhor já tinha

a idéia de qual seria o fornecedor dos cartuchos? Não, porque esperava vencer com cartuchos da marca EPSON. Para não entrar com somente um item, a empresa entrou na concorrência com os cartuchos da marca HP e EPSON. Os cartuchos das duas marcas foram entregues e somente os da marca HP que deram problema. Como foi feita cotação para chegar ao fornecedor dos cartuchos? - A empresa estava iniciando as atividades, não tinha grandes fornecedores, fato que determinou a cotação no comércio local. Como já conhecia o Cristiano dele comprar cartuchos vazios e me oferecer os cartuchos da marca HP originais, resolvi comprar dele porque tinha o preço menor. Como o senhor teve segurança para atestar que os produtos eram originais, se não havia trabalhado anteriormente com eles? Na época, a HP usava como meio de identificação um selo de identificação na lateral do cartucho. O Cristiano informou para o senhor quem forneceu os cartuchos para ele? Não. Ele só falou que os cartuchos viriam de São Paulo e que precisaria de uns três dias para entregar a quantidade que adquiri dele. O Cristiano sabia que os cartuchos seriam fornecidos para a Aeronáutica? Não falei que seria para a Aeronáutica. Disse somente que havia vencido uma licitação. Ouvida sobre a necessidade de algum esclarecimento, a defesa perguntou: o carimbo da empresa W3 Informática foi colocado em cada um dos cartuchos ou somente na caixa que continha os trinta cartuchos? Era uma caixa grande que continha trinta caixas pequenas, onde havia um cartucho. Como a caixa pequena não podia ser aberta, o carimbo foi colocado em cada uma das caixas pequenas. Quem informou para o senhor que os cartuchos seriam falsificados? Foi uma pessoa que se identificou como sendo da Aeronáutica, uma semana depois, informando que os cartuchos seriam falsificados. Qual a providência pretendida pela Aeronáutica? Eles pediram que eu entregasse outros cartuchos, alegando que aqueles eram falsos. Eu condicionei a entrega de novos cartuchos à devolução dos primeiros, ou que eles demonstrassem que esses eram falsos. Eles falaram que não poderiam devolver os cartuchos porque eles já teriam sido enviados à Polícia Federal. Em razão desse impasse, não substituí os cartuchos. No ato da entrega, a Aeronáutica exigiu e foi atendida a extensão da validade do produto por doze meses, mesmo os que constavam uma validade menor na caixa. (destaques do original) Percebe-se, pois, inexistir qualquer discrepância entre tais declarações. Não vislumbro má-fé do acusado ao ter vendido os cartuchos à Base Aérea de Anápolis/GO. Como elemento subjetivo do tipo, o dolo de fraudar o procedimento licitatório deve estar evidenciado nos autos para fins de condenação. Consoante lição de Rui Stocco, em comentário ao art. 96 da Lei 8.666/93: fls.5/6...o erro escusável, o engano ou a troca não intencional de um produto por outro não são puníveis, pois lhes falta o elemento subjetivo fundamental. 1 De fato, o réu poderia ter trazido aos autos documento que comprovasse a aquisição regular dos cartuchos, como havia se comprometido a fazer, caso o encontrasse. Contudo, essa ausência, por si só, não conduz à responsabilidade delitiva, porque, na condição de fornecedor, não tinha obrigação de guardar o comprovante da aquisição do produto; sequer tinha em relação ao da venda, embora fosse prudente fazê-lo. Também não pode ser condenado apenas por trabalhar no ramo de informática, sob a justificativa de que a experiência o obriga saber distinguir produtos originais dos falsos. Admitir tal hipótese é dar azo à famigerada responsabilidade objetiva, porquanto inadmissível a acusação com base em presunção de culpa. 1 In: Leis Penais Especiais e sua Interpretação Jurisprudencial, Volume 2, Coordenação Alberto Silva Franco e Rui Stocco, 7. ed revista, atualizada e ampliada, p. 2.590).

Embora os peritos não tenham sido conclusivos ao afirmarem, por meio do Laudo de Exame de Material de fls. 91/96, que o nível de facilidade ou dificuldade para detectar a falsificação é uma questão subjetiva..., as fotos da embalagem de um dos cartuchos falsos, encartadas no citado documento, além do fato de ter sido necessária a ampliação de 80X (oitenta vezes) do selo holográfico para estabelecer diferenças entre o original e o adulterado, permitem concluir que a falsificação aparentemente é de boa qualidade e pode enganar o homem médio, inclusive o réu. Por isso, entendo que a dúvida milita a seu favor, até porque, na mesma licitação, forneceu à Base Aérea de Anápolis 10 (dez) cartuchos para impressora EPSON Stillus Color, modelo T017311, sem nenhum problema, o que, alinhado a seus depoimentos, afasta a hipótese de má-fé. Portanto, considero o inconformismo improcedente. 4. Diante do exposto, nego provimento à apelação. 5. É como voto. fls.6/6