PRÁTICAS COMPLEMENTARES COMO FORMA DE ASSISTÊNCIA INTEGRAL À SAÚDE



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Transcrição:

Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões 75 PRÁTICAS COMPLEMENTARES COMO FORMA DE ASSISTÊNCIA INTEGRAL À SAÚDE COMPLEMENTARY PRACTICES AS A FORM OF INTEGRAL HEALTH ASSISTANCE Jaqueline Barbieri Signor 1 Janaína Sena 2 RESUMO: Desde o início, as práticas complementares de saúde vêm sendo utilizadas pelas pessoas. No entanto, com o passar do tempo, as mesmas foram sendo legitimadas como ciência e identificadas como provedoras de benefícios à saúde. Com ênfase à fitoterapia, destaca-se a grande incidência de usuários da mesma, porém as equipes de saúde muitas vezes encontram-se despreparadas para lidar com esta forma de assistência à saúde. O objetivo deste artigo é fazer um resgate teórico referente às práticas complementares de assistência à saúde utilizadas 1 Acadêmica do VI semestre do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões - Campus de Frederico Westphalen. 2 Enfermeira. Mestre em Enfermagem - FURG; Professora do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões - Campus de Frederico Westphalen. Revista de Enfermagem Frederico Westphalen v.2/v.3 p. 75-86 2006-2007

76 Revista de Enfermagem pela população, bem como respaldá-las num contexto atual, reconhecidas como ciência, aplicadas no cotidiano da população e incorporadas ao Sistema Único de Saúde - SUS. Entende-se dessa forma, que os serviços de saúde devem procurar formas de adequar sua assistência conforme a demanda apresentada pela população, revelando os saberes populares, resgatando valores e crenças e, sobretudo, fazendo uso da educação popular em saúde. Palavras chave: Saber Popular. Fitoterapia. Educação em Saúde. INTRODUÇÃO As práticas complementares de saúde vêm sendo utilizadas pelo homem desde seus primórdios. No entanto, a visão que se tem sobre as mesmas mudou com o passar do tempo, levando em conta a busca por sua legitimação, enquanto ciência provedora de saúde. O tema práticas complementares como forma de assistência integral à saúde está diretamente interligado à nossa atuação enquanto enfermeiros. Ressalta-se o papel desses profissionais no que diz respeito à promoção da saúde e prevenção de doenças como sendo nosso objetivo maior. Desta forma, justifica-se a ampliação de saberes relacionados às práticas complementares, partindo do pressuposto de que as pessoas fazem uso das mesmas constantemente, e, muitas vezes, sem nenhuma orientação. Concomitante com a proposta do governo em incorporar aos serviços ofertados pelo SUS, através da Política Nacional de Medicina Natural e Práticas Complementares e, segundo Matos (2000), a utilização de plantas medicinais cujas propriedades terapêuticas tenham sido comprovadas cientificamente pode ser um recurso terapêutico muito útil nos programas de atenção à saúde. A elaboração deste artigo partiu de uma afinidade particular com o tema, já que se constitui como uma prática constantemente realizada pelas pessoas para cuidar da sua saúde, e no que se refere à saúde coletiva, releva-se a questão de ser inerente ao profissional

Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões 77 enfermeiro a prática da educação em saúde, partindo do pressuposto que os profissionais de saúde não se encontram preparados para lidar com esta demanda; ainda, a elaboração do texto também vem ao encontro da proposta do governo em incorporar as referidas práticas complementares aos serviços ofertados pelo SUS. Nesse sentido, tem por objetivo fazer um resgate teórico referente às práticas complementares de assistência à saúde utilizadas pela população, bem como, respaldar estas práticas num contexto atual, reconhecidas como ciência e aplicadas no cotidiano da população, bem como, sua incorporação no contexto do Sistema Único de Saúde. Na mesma direção, o conhecimento sobre as diferentes formas de práticas complementares usadas pela população, com ênfase à fitoterapia, é entendida como instrumento de trabalho, com possibilidade de contribuir na área da saúde, suprindo necessidades básicas. Assim, o enfermeiro como profissional, voltado para o cuidado, tem responsabilidade de se engajar neste programa, fazendo com que, essas práticas sejam qualificadas e exercidas de maneira segura e eficaz. Por fim, tendo em vista que é inerente ao trabalho do profissional enfermeiro a educação em saúde, o mesmo pode ser um veículo de informação e orientação, sendo capaz de estimular a utilização mais correta de tais práticas. REFLEXÃO TEÓRICA O tema práticas complementares na Atenção Básica à Saúde está diretamente interligado à nossa trajetória profissional enquanto enfermeiros que atuam de forma holística, vendo o cliente como um todo. Segundo Lopes, (1999) holismo é a integração das dimensões biológicas, psicológicas, sociais e espirituais de um indivíduo para formar uma soma maior do que as suas partes. Dessa forma, destaca-se aqui o caráter inerente ao enfermeiro com seu papel de educador, quando se fala em educação em saúde. A grande busca de outras possibilidades terapêuticas, entre elas a fitoterapia, para resolução dos problemas de saúde, e o fato dessa ação terapêutica ter sido comprovada, representa que a cultura do povo

78 Revista de Enfermagem deve ser valorizada, deixando implícita a questão de que as práticas complementares dão resultado se a população realmente as acredita e, em função disto, atualmente, planejadores do setor da saúde estão incorporando este recurso nas políticas públicas de saúde, estimulando a implantação destes programas de uso de fitoterápicos na atenção básica à saúde. No que se refere ao âmbito cultural, se busca a valorização do conhecimento humano. Segundo Noronha (1990, p.154), a frustração do homem em resolver novos conflitos, novos distúrbios orgânicos ou psicológicos através dos recursos consagrados pela ciência, leva-o a procurar alternativas na nossa sociedade. Desta forma, ao abordar os aspectos culturais, há a necessidade de trazer uma abordagem do que possa ser considerado como cultura, e, de acordo Vaitsman (2000), que apresenta a cultura fazendo referência à tradição, ou seja, à reprodução de significados e padrões de comportamentos através do tempo. A tradição é transmitida pela cultura e sua persistência reside no fato de ser incorporada inconscientemente por intermédio da história social e individual, traduzindo-se nas reproduções sociais. Assim, acredita ser função da equipe de saúde assistir a comunidade, planejando a assistência com base na cultura da população. A medicina tradicional 3 tem sido difundida pelo mundo e reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), órgão das Nações Unidas. Este reconhecimento se deu em maio de 1978, por meio de uma resolução da XXIX Assembléia Geral desse organismo, que determinou o início de um programa mundial cuja finalidade era utilizar os métodos da chamada medicina tradicional (AKERELE, 1988). A medicina tradicional tem ainda sido reconhecida como um pilar essencial nos cuidados primários de saúde, sendo que sua principal contribuição tem sido com referência à descoberta de plantas medicinais 3 A medicina tradicional conceitua-se como práticas baseadas em crenças, sendo parte da tradição de cada país, onde passa de uma geração para outra. (NORONHA, 1999).

Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões 79 (AKERELE, 1988). Este mesmo autor diz ainda que a OMS tem estimulado os países a identificar e explorar os aspectos da medicina tradicional que fornecem remédios ou práticas seguras e eficazes para sua utilização em cuidados primários de saúde. Tendo em vista que a medicina tradicional trata de práticas baseadas nas crenças das pessoas, sendo parte delas próprias, da tradição de cada país, de cada origem, tradições, estas que vão passando de uma geração para outra, sendo então aspectos subjetivos de cada um que vem consigo por toda sua trajetória de vida e deve ser levado em consideração. A história do uso de plantas medicinais tem mostrado que elas fazem parte da evolução humana e foram os primeiros recursos terapêuticos utilizados. As antigas civilizações têm suas próprias referências históricas às plantas medicinais e, muito antes de aparecer qualquer forma de escrita, o homem já utilizava as plantas e, entre estas, algumas como alimento e outras como remédio (DORTA, 1998). Quanto ao uso de plantas com fins medicinais, a população se apresentando insatisfeita com o sistema convencional de saúde, devido à percepção de suas limitações e às reações adversas comumente causadas pelos medicamentos, e, ainda, buscando descobrir soluções alternativas para as doenças, continua fazendo uso de plantas, demonstrando que esta prática no cuidado à saúde é atual, e contribui para o crescente uso das terapias alternativas. Dessa forma, a utilização de plantas medicinais cujas propriedades terapêuticas tenham sido comprovadas cientificamente pode ser um recurso terapêutico muito útil nos programas de atenção primária à saúde (MATOS, 2000). A identificação precoce das condições de risco às quais as famílias estão inseridas constitui-se numa maneira de adequar o modelo de atenção dos serviços de saúde. Dessa forma, a ênfase está nos aspectos preventivos dos agravos à saúde. Para o Ministério da Saúde esta estratégia deve ser entendida como forma de universalidade e equidade da atenção e da integralidade das ações e, acima de tudo, voltada à permanente defesa da vida do cidadão (BRASIL, 2001).

80 Revista de Enfermagem Entende-se, dessa forma, que os serviços de saúde, a partir do princípio de descentralização devem procurar meios, formas de adequar sua assistência, buscando uma atenção voltada à necessidade da sua população. De acordo com a lei 8080/90, que define no capítulo I que os objetivos do SUS são voltados à formulação da política de medicamentos, equipamentos imunológicos e outros insumos de interesse para a saúde e a participação na sua produção, e sendo princípios doutrinários, a integralidade da assistência, entendida como um processo conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos exigidos para cada caso, de acordo com as suas necessidades, e princípios organizativos, a participação da comunidade, é neste sentido que se propõe valorizar as vontades da população e investir nela conforme sua necessidade especificada por ela própria (BRASIL, 2001). A Organização Mundial da Saúde (OMS) acredita que, atualmente, a prática do uso de plantas medicinais é tida como a principal opção terapêutica de aproximadamente 80% da população mundial (ALVES; SILVA, 2002). Ainda, o aumento do consumo de plantas medicinais em todo o mundo tem sido atribuído aos diversos fatores e justificado de forma diferenciada. Para Lorenzi e Matos (2002), a preocupação com a diversidade e as idéias de desenvolvimento sustentável despertou um novo interesse e o uso das plantas é visto como forma de cooperar para a melhoria da qualidade de vida da população. Os mesmos autores ainda relatam que, este crescente mercado espelha, de certa forma, a busca da população mundial por uma melhor qualidade de vida e procura por métodos mais naturais e saudáveis de manutenção da saúde. Certamente, o que ocorre é a tendência dos consumidores em utilizar produtos de origem natural. Nos países em desenvolvimento, entre eles o Brasil, assim como em países desenvolvidos, a partir da Segunda metade dos anos 70 e década de 80 tem-se verificado o crescimento das medicinas alternativas e entre elas a fitoterapia (LUZ, 1997). Já no Brasil, a história da

Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões 81 utilização de plantas, no tratamento de doenças apresenta influências da cultura africana, indígena e européia (MARTINS, 2000). Porém, além da crença sobre o poder desta ou daquela planta, a fitoterapia evoluiu e sofisticou-se, sua ação tem sido comprovada em várias pesquisas e o aumento no consumo dessas é verificado tanto em países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Portanto, o conhecimento sobre o poder das plantas não é simplesmente considerado empírico, mas sim, uma ciência que vem sendo estudada, aperfeiçoada e aplicada (ELDIN; DUNFORD, 2001). Contextualizando alguns dos eventos históricos que culminaram na legitimação da fitoterapia e outra práticas complementares de saúde, bem como, sua introdução nos serviços públicos, na 8ª Conferência Nacional de Saúde, em 1986, ocasião em que se recomendou a introdução das práticas tradicionais de cura popular no atendimento público de saúde (BRASIL, 1986). Também, a 10ª Conferência Nacional de Saúde, que aconteceu em setembro de 1996, em Brasília, propôs, em suas deliberações, incorporar no SUS as terapias alternativas e práticas populares. Incentivou, ainda, a fitoterapia e a homeopatia na assistência farmacêutica pública, propondo o emprego de normas para a sua utilização após ampla discussão com os profissionais de saúde e especialistas (ELDIN; DUNFORD, 2001). Sendo a Atenção Básica à Saúde voltada à prevenção de doenças e promoção da mesma, e, sendo este o melhor ambiente para se fazer educação em saúde, procurando respaldo frente às práticas realizadas pela população, legitimando-as esse coloca a saúde e a segurança em primeiro plano, através do instrumento que se tem enquanto enfermeiros, o qual diz respeito ao diagnóstico comunitário, possibilitando colocar em prática, ações condizentes com cada realidade, promovendo educação em saúde. Dessa forma, no cumprimento das atribuições do Sistema Único de Saúde e de estabelecimento de políticas para garantir a integralidade na atenção à saúde, o Ministério da Saúde apresenta a Política Nacional da Medicina Natural e Práticas Complementares - MNPC - no SUS,

82 Revista de Enfermagem cuja implementação envolve justificativas de natureza política, técnica, econômica, social e cultural. Esta política atende, sobretudo, à necessidade de se conhecer, apoiar, incorporar e implementar experiências que já vêm sendo desenvolvidas na rede pública de muitos municípios e estados, entre as quais destacam-se aquelas no âmbito da medicina tradicional chinesa-acupuntura, da homeopatia, da fitoterapia e da medicina antroposófica (POLÍTICA, 2005). Essa política tem por objetivo incorporar e implementar a MNPC no SUS, na perspectiva da prevenção de agravos e da promoção e recuperação da saúde, com ênfase na atenção básica, voltada para o cuidado continuado, humanizado e integral em saúde, contribuir para o aumento da resolutividade do sistema e para a ampliação do acesso à práticas complementares de saúde, garantindo qualidade, eficácia, eficiência e segurança no uso, promover a racionalização das ações de saúde, estimulando alternativas inovadoras e socialmente contributivas para o desenvolvimento sustentável de comunidades e estimular as ações referentes ao controle/participação social, promovendo o envolvimento responsável e continuado dos usuários, gestores e trabalhadores, nas diferentes instâncias de efetivação das políticas de saúde, contribuindo para o fortalecimento dos princípios fundamentais do SUS (POLÍTICA, 2005). Contudo, percebe-se a crescente utilização de práticas complementares de assistência à saúde para a população. Levando em conta a legitimação das mesmas, concomitante à proposta de sua incorporação como instrumento de trabalho aos profissionais da saúde, no cumprimento das atribuições do sistema vigente, vem sobretudo a relevar os saberes populares, resgatando valores e crenças, com respaldo num sistema que integra as práticas. CONSIDERAÇÕES FINAIS Mediante aos aspectos gerais abordados podemos considerar relevante a questão da importância do profissional da área da saúde possuir capacitação adequada para saber lidar com os usuários que fazem uso das práticas complementares, profissionais estes que devem

Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões 83 ter por objetivo promover educação em saúde, direcionando as práticas das pessoas de modo que se promova qualidade de vida. Afinal, estamos nos referindo a questões que dizem respeito à saúde da população, a práticas que podem auxiliar e muito na recuperação ou na prevenção, mas que também podem estar agravando situações. A busca pela segunda hipótese acima citada depende muito de nós profissionais enfermeiros influentes e nos quais as pessoas confiam. A educação popular pode ser um instrumento auxiliar na incorporação de práticas por profissionais e serviços de saúde. A partir de sua concepção teórica, valorizando o saber do outro, entendendo que o conhecimento é um processo de construção coletiva que deve ser utilizado pelos serviços, buscando a visão de um novo entendimento das ações de saúde como ações educativas. Entende-se que as ações em saúde devem incluir em seus pressupostos, as crenças, os valores, conhecimentos e práticas vivenciadas pelos indivíduos, dessa forma, leva-se em conta o conceito subjetivo, particular e peculiar de cada indivíduo e grupo, fatores intimamente relacionados à qualidade de vida. Frente a isto, seria importante que se pensasse na utilização de práticas complementares nos próprios serviços de saúde, em função de a população fazer uso destas práticas em seu dia-a-dia, muitas vezes de forma inadequada, e também pela questão de as mesmas, se usadas de forma certa, trazerem benefícios (SENA, 2004). Desta forma, a existência de ações que relevem a utilização de fitoterápicos poderiam, além de oferecer essa possibilidade medicamentosa de fácil acesso, com ação terapêutica comprovada, contando com um menor risco de ocorrências de usos indevidos ou incorretos das plantas, e indo ao encontro das necessidades da comunidade, converte-se em uma excelente alternativa de incremento de renda para pequenos agricultores locais, sem falar na valorização do conhecimento das pessoas, além de ser um instrumento de trabalho economicamente viável.

84 Revista de Enfermagem ABSTRACT: Since the beginning, complementary health practices are being used by people. However, as the time goes by, they were legitimated as a science and identified as suppliers of benefits to health. With emphasis on fitotherapy, the great incidence of their users is highlighted here. Nevertheless, health teams are, many times, unprepared to deal with that form of health assistance. This article aims at making a theoretical study regarding complementary practices of health assistance used by people, as well as at endorsing them in a current context, recognized as a science, applied on people s daily life and incorporated to SUS Sistema Único de Saúde. It is understood, this way, that health services must look for forms of adjusting their assistance to the demands required by the population, revealing popular knowledge, acknowledging values and beliefs and, most of all, making use of popular health education. Key words: Popular knowledge. fitotherapy. health education. REFERÊNCIAS ALBUQUERQUE, P. C.; STOTZ, E.N. Popular education in primary care: in search of comprehensive health care, Interface Comunic., Saúde, Educ., n.15, p.259-74, mar/ago 2004. AKERELE,O. Revista de Fitoterapia, n. 5. p. 355-363, 1988. ALVES D. L.; SILVA C. R. Fitohormônios: abordagem natural da terapia hormonal. São Paulo: Atheneu, 2002. BRASIL. Anais 8ª Conferência Nacional de Saúde. Brasília: MS, 1986. BRASIL, Ministério da Saúde. Secretaria de Assistência à Saúde. Norma Operacional Básica de Assistência a Saúde. Brasília, 2001. BRASIL. Conselho de Saúde. Diretrizes e Normas Regulamentadoras

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