AS COMPETÊNCIAS NO PROJETO EDUCATIVO, NOS PROGRAMAS E NAS PRÁTICAS ESCOLARES



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Transcrição:

AS COMPETÊNCIAS NO PROJETO EDUCATIVO, NOS PROGRAMAS E NAS PRÁTICAS ESCOLARES RESUMO Luis Carlos de Menezes 1 Promover o processo de ensino e de aprendizagem com vistas a ultrapassar o treinamento simplesmente disciplinar e conteudista para envolver o desenvolvimento de competências mais abrangentes ou transversais tem se mostrado um desafio para os professores. O presente artigo se propõe a discutir essa perspectiva e servir de inspiração para se conceberem outros exercícios, em outras disciplinas e áreas do conhecimento, de forma a contemplar o percurso formativo dos alunos, a partir de uma educação humanista e crítica.o projeto educativo das escolas da educação básica deve promover o desenvolvimento de conhecimentos, valores humanos e também competências, que não se restringem e não se limitam à preparação para o trabalho. Palavras-chave: Projeto educativo. Redes de conhecimento e de habilidades. Percurso formativo. 1 Doutor, e-mail: menezes@if.usp.br 59

1 INTRODUÇÃO É possível conceber maneiras de se organizar o processo de ensino e aprendizagem, de forma a articular conhecimentos, valores humanos e competências, na concepção de todo o percurso formativo dos alunos e no planejamento de cada atividade escolar. Não é difícil apresentar, inicialmente, algumas das características ou diretrizes gerais para um projeto educativo de uma escola comprometida com uma educação humanista e crítica, na qual o papel das competências esteja explicitado ou tacitamente presente, no conjunto das ambições e procedimentos formativos: a) aperfeiçoamento de valores humanos nas relações pessoais e comunitárias, ao lado do desenvolvimento de qualidades culturais e técnicas; b) promoção do aprendizado permanente dos professores e o acompanhamento da opção profissional dos alunos, como parte do projeto educativo escolar; c) percepção da sociedade como espaço regular de investigação, de crítica e de proposição da escola, em contrapartida ao envolvimento da comunidade com a responsabilidade de educar; d) apresentação do conhecimento como um direito, como valor cultural e prazeroso, a ser aprendido sem um ordenamento linear único, mas em rede conceitual de múltiplos trajetos; e) ética e estética não como discurso, mas como ação nas práticas escolares, no respeito à singularidade de cada ser humano e na construção de sua autonomia responsável; f) educação não restrita ao desenvolvimento cognitivo, mas também de elementos expressivos e sócio-afetivos, como criatividade, solidariedade e autoestima; g) aprendizado escolar como processo interativo, participativo, crítico e dialógico, inseparável da vida e dos projetos de vida de educandos e educadores; h) aprendizado em contextos reais, não separando a promoção de conhecimentos do desenvolvimento de competências, nem dissociando a razão prática da razão crítica. Princípios gerais, como esses, podem ser compartilhados por sistemas ou redes escolares, mas cada escola deve ter um projeto educativo próprio, ou mesmo um projeto para cada diferente nível e modalidade de ensino que mantiver. 60

Vale enfatizar que a idéia de se promover aprendizado significativo é tão antiga como pouco praticada. Veja-se por exemplo, já do começo do século 20, a obra de Whitehead, publicada há décadas no Brasil, (WHITEHEAD,1969). Já a idéia de competência em associação com a educação básica é mais recente, e teve entre nós mais visibilidade na última década a partir do surgimento do Exame Nacional do Ensino Médio, o ENEM, e em seguida também por conta da publicação no Brasil de obras de Perrenoud, o educador suíço contemporâneo (PERRENOUD, 1999). 2 AS COMPETÊNCIAS NO PROJETO EDUCATIVO Um ponto de partida para cada projeto educativo é definir o que se deseja para os alunos e para os professores, estabelecendo quais características, competências se pretende desenvolver. O passo seguinte é conceber atividades para que alunos e professores desenvolvam as qualidades pretendidas, e adequar para isso os recursos disponíveis. Em qualquer nível escolar, o desenvolvimento de qualidades como solidariedade, disciplina, capacidade de trabalho em equipe, gosto por esportes, artes e cultura, seria feito em atividades nas quais elas sejam exercidas, não como discurso ou preleção. Aliás, artes e esportes coletivos podem ser oportunidades privilegiadas para desenvolver conjuntamente todas essas qualidades. Para desenvolver a capacidade de observar e tomar dados, as atividades extra-escolares individuais ou coletivas podem ser mais apropriadas do que explanações em classe. A aula pode, por outro lado, ser um bom momento para se sistematizarem as observações. Por exemplo, no ensino médio ou no fim do ensino fundamental, dados observados em atividades de campo, anotados em tabelas, transpostos para gráficos cartesianos, cujo comportamento matemático será então analisado e comentado, seria algo que contribuiria para o desenvolvimento da competência de traduzir informações de uma linguagem para outra. Alguns conhecimentos e competências podem estar mais diretamente relacionados a determinadas disciplinas, e seu desenvolvimento delegado à formação disciplinar específica. Mas competências gerais, como a transposição de linguagens, juntamente com a promoção de valores humanos, devem ser trabalhadas em aulas de diferentes disciplinas, o que deve ser objeto previsto no projeto educativo. Por exemplo, as habilidades de realizar observações, de selecionar as variáveis relevantes ou mais significativas de um processo, de colher seus dados numéricos e de organizá-los em tabelas, de reordenar estes dados em um gráfico cartesiano e de interpretar a evolução da relação entre as variáveis envolvidas, podem ser pensadas como articuladas em uma rede, digamos, de uma competência de representação. Essa competência será tão essencial para investigar e representar processos sociais ou econômicos, quanto para descrever fenômenos naturais ou promover desenvolvimentos tecnológicos. Uma organização curricular ampla contemplaria competências transdisciplinares, tanto quanto as de saberes disciplinares. 61

Quando o sentido educacional de uma disciplina se reduz à transmissão dos conhecimentos disciplinares, a retenção deste conhecimento corre o risco de se tornar finalidade única do aprendizado. A organização do conhecimento em disciplinas precisa, pelo contrário, ser meio para o desenvolvimento do aprendizado como instrumento de ação ou como fruição cultural. Quando se amplia dessa forma o sentido do aprendizado, organizar um currículo e preparar aulas passa a envolver outras dimensões, pois além de percorrer tópicos disciplinares de uma rede de conhecimentos, considerará atividades que promovam competências, ou seja, que desenvolvam redes de habilidades. Não há uma única rede de habilidades compondo competências, nem uma única rede de conhecimentos compondo uma disciplina, mas para facilitar a compreensão de como compor essas redes no planejamento de uma atividade escolar, como mostrado no diagrama, apresentam-se a seguir exemplos dessas redes: DISCIPLINAS Redes de conhecimentos Figura 1: Diagrama de redes Currículo ou Atividade Escolar Fonte: Do autor COMPETÊNCIAS Redes de habilidades 62

3 O ENSAIO Competências Representar, Comunicar-se e Conviver Investigar e Intervir em Situações Reais Estabelecer Conexões e Contextualizar Quadro 1: Rede de competências e habilidades Possível Rede de Competências e Habilidades Habilidades Ler e se expressar Registrar medidas com textos, ícones, e observações; cifras, gráficos, descrever situações; tabelas e fórmulas; planejar e fazer converter uma entrevistas. linguagem em outra. Formular questões; Interpretar, propor e realizar observações; fazer experimentos; selecionar variáveis; fazer e verificar estabelecer relações. hipóteses. Relacionar Identificar dimensões informações e sociais, éticas e processos com seus estéticas em questões contextos e com técnicas e científicas e diversas áreas de vice-versa. conhecimento. Fonte: Do autor Sistematizar dados; elaborar relatórios; participar de reuniões; argumentar; trabalhar em grupo. Diagnosticar e enfrentar problemas individualmente ou em equipe. Analisar o papel da ciência e da tecnologia nas transformações sociais ao longo da história e viceversa. 63

Eixos Conceituais Números e Funções Formas e Medidas Dados, Médias eprevisões Quadro 2: Rede de Conhecimentos em matemática Possível Rede de Conhecimentos em Matemática Representação 1 a Série 2 a Série 3 a Série numérica e gráfica de funções práticas - não analíticas, lineares e quadráticas - e suas variações. Relações métricas nos triângulos retângulos; figuras planas e determinação de áreas. Representação numérica e gráfica de dados, médias e suas interpretações. Usos práticos de funções trigonométricas, exponenciais e logarítmicas. Caracterização de sólidos regulares e outros e medida de volumes. Fonte: Do autor Análise estatística de dados sociais e técnicos e científicos. Representações algébricas e cartesianas de funções e de suas taxas de variação. Representação analítica de figuras, de sólidos e de suas intersecções. Cálculo de probabilidades e elaboração de previsões. Um exercício que se pode fazer é a proposição de uma atividade, digamos, para uma primeira semana de aulas de matemática, no ensino médio, que explicite as competências e conhecimentos a serem promovidos: 64

Conhecimentos Disciplinares: Médias aritméticas; Funções não analíticas; Taxa de variação percentual; Escala e proporção. Habilidades e Competências: Tomar medidas; Compor tabelas; Elaborar e interpretar gráficos; Trabalhar em grupo; Comparar dados com bservação artística. Quadro 3: Proposição de uma atividade Orientações para atividades formativas: Medir alturas de crianças 17 crianças e jovens de 1 a 17 anos e colocá-las em uma tabela. (extra-classe) Repetir as medidas, agora envolvendo os perímetros do crânio, acima dos olhos, no mesmo grupo de crianças e jovens e fazer outra tabela. (extra-classe). Elaborar gráfico, com as idades no eixo horizontal e as alturas no vertical. Idem para os perímetros. (em classe) Comparar seu gráfico com o feito por quatro outros colegas de classe, comentar diferenças e semelhanças e fazer um gráfico com os valores médios obtidos pelos cinco(em classe) Comparar o gráfico dos valores médios com outro gráfico equivalente feito por outro grupo de cinco colegas e comentar semelhanças e diferenças. (em classe). Determinar em que intervalo anual é maior o crescimento relativo ou percentual e em qual é maior o crescimento absoluto para a altura. (em classe) Comparar a evolução do crânio e da altura com o que pode observar, em diferentes escalas, em gravuras e desenhos de crianças e de adultos, em termos de proporções cabeça/corpo. (em classe e extra-classe) Fonte: Do autor 65

4 CONSIDERAÇÕES Atividades como essas, de caráter introdutório ao ensino médio, exigiriam unicamente conhecimentos adquiridos no ensino fundamental e ocupariam alunos de 15 a 17 anos ao longo de algumas aulas. Elas, mobilizariam habilidades relativamente simples, como de realizar uma medida usando uma fita métrica, ou habilidades relativamente complexas, como montar uma tabela e transpor seus resultados para um gráfico, mas que convergem para competências complexas como, por exemplo, cotejar resultados em trabalho coletivo, elaborar médias e avaliar taxas de variação. Ao comparar observações e proporções médias obtidas de pessoas reais, com representações artísticas, se inicia uma conexão com disciplinas de outras áreas, como artes e História. Um professor poderia sugerir aos seus estudantes que elaborassem desenhos de crianças e de adultos fazendo uso das proporções obtidas nas medidas que realizaram, e depois fazendo uso de outras proporções cabeça/tronco, por exemplo, de crianças representadas em revistas de quadrinhos em pinturas medievais e renascentistas. Uma questão interessante daí decorrente, para ser transferida a professores de arte e de história, seria o porquê ser tão frequente que crianças em representações da idade média - como o Cristo menino - tenham essas proporções semelhantes às de adultos, e porque isso não mais acontece a partir da renascença. Outra questão seria cogitar porque os quadrinhos exageram em certas proporções. Essas são simples ilustrações de como promover um ensino que transborde do treinamento simplesmente disciplinar para envolver competências mais abrangentes ou transversais. Talvez ela sirva de inspiração para se conceberem outros exercícios, em outras disciplinas e áreas do conhecimento, de forma a buscar por em prática propostas e princípios gerais apresentados na introdução deste breve artigo. 66

SKILLS IN EDUCATIONAL PROJECT, PROGRAMS AND SCHOOL PRACTICES ABSTRACT Promoting the process of teaching and learning, to transcend the training only content and disciplinary oriented and to involve the broader skills development, has been a challenge for teachers. This article aims to discuss this perspective and inspire others to devise exercises in other disciplines and areas of knowledge, in order to contemplate the formative path of students, startin from a humanistic and critic education. The educational project of schools of basic education should promote the development of knowledge, human values and also skills, which are not restricted and are not limited to preparation for work. Keywords: Educational Project. Networks of knowledge and skills. Training path. REFERÊNCIAS PERRENOUD, P. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre: Artes Médicas do Sul, 1999. VERGNAUD, Gerard. Lev Vygotski: pedagogo e pensador do nosso tempo. Porto Alegre: GEEMPA, 2004. WHITEHEAD, A.N. Os fins da educação. São Paulo: Cia Editora Nacional, 1969. 67

Luis Carlos de Menezes SOBRE O AUTOR Docente do Instituto de Física da Universidade de São Paulo, com graduação na USP, mestrado em nos EUA e doutorado na Alemanha, onde foi professor. Tem sido consultor do Ministério da Educação, sendo co-autor das matrizes do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), e coordenador dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN e PCN+) para as Ciências da Natureza e Matemática. Seu campo de interesse atual é a concepção de uma educação para a sociedade pós-industrial. É consultor da UNESCO para a elaboração Currículos integrados de Ensino Médio e Profissional e membro do Conselho Técnico Científico da CAPES/MEC para a Educação Básica. Publicou livros sobre Física, Formação de Professores, Poemas e sobre a Universidade no Brasil, assim como diversos textos didáticos para a Educação Básica. 68