XXV Encontro Nac. de Eng. de Produção Porto Alegre, RS, Brasil, 29 out a 01 de nov de 2005



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Transcrição:

O papel do CRM (Customer Relationship Management) na gestão da cadeia de suprimentos: uma apresentação de resultados de dois estudos de casos na indústria agro-alimentar Márcia Regina Neves Guimarães (EESC/USP) mr.neves@terra.com.br Maria Isabel Franco Barretto (EESC/USP) barrettobel@hotmail.com Resumo O cenário atual leva à busca constante por práticas de gestão que melhorem a situação competitiva das empresas. Entre essas práticas, tanto a gestão da cadeia de suprimentos quanto o CRM (Customer Relationship Management) têm ganhado relevância nos estudos e práticas organizacionais. Assim, o presente artigo mostra a importância do CRM na busca de ganhos para todos os agentes envolvidos na cadeia de suprimento. Conclui, pelos resultados de dois estudos de casos na indústria agro-alimentar, que empresas têm procurado administrar o relacionamento com clientes por meio de ferramentas do CRM, buscando estreitar e manter por um longo prazo, as relações com seus clientes e consumidores finais. Palavras-chave: gestão da cadeia de suprimentos, CRM, indústria agro-alimentar 1. Introdução O novo contexto econômico, marcado por profundas mudanças e incertezas no cenário das empresas, leva as organizações à constante busca por novas práticas de gestão, que favoreçam a adaptação e a manutenção da competitividade ao longo dos anos. Entre várias perspectivas difundidas nos estudos acadêmicos e nas práticas empresariais, a gestão da cadeia de suprimentos (supply chain management) ganha relevância e é apresentada como necessária para a obtenção de vantagem competitiva sustentável. Diversos trabalhos (FLEURY & FLEURY, 2000; HUTT & SPECH, 2001 e PIRES, 2001 e 2004) abordam a importância da integração entre os agentes que compõem determinada cadeia de suprimentos para redução de custos e acréscimos de valor nos produtos oferecidos ao consumidor final. Por outro lado, no Brasil, principalmente nas duas últimas décadas, observa-se uma crescente preocupação com o foco no cliente nas empresas. Ressalta-se que o foco no cliente passa a ganhar importância na Escola da Qualidade, representada por autores como Garvin (1988) e Juran (1980). Já no final dos anos 90, o CRM (Customer Relationship Management) surge como uma estratégia voltada para o entendimento e a antecipação das necessidades de clientes atuais e potenciais de uma organização. (GARTNER GROUP apud PEPPERS and ROGERS GROUP, 2000) No entanto, nota-se em Pires (2004), que o CRM pode ser entendido como um dos processos da gestão da cadeia de suprimentos. Esse autor apresenta o CRM como um processo importante quando se trata das relações no sentido jusante da cadeia de suprimentos. Dessa forma, o presente artigo tem como objetivo mostrar o papel do CRM na gestão da cadeia de suprimentos, abordando aspectos conceituais sobre os dois temas e apresentando, brevemente, resultados de dois estudos de casos realizados em um produtor de bebidas e em um produtor de açúcar. Enfatiza-se que esses resultados são parte de dois estudos mais amplos, realizados nessas duas unidades de produção. 2. A gestão da cadeia de suprimentos como vantagem competitiva ENEGEP 2005 ABEPRO 3714

Segundo Chopra e Meindl (2003), uma cadeia de suprimento engloba todos os estágios envolvidos, direta ou indiretamente, no atendimento de um pedido de um cliente. A cadeia de suprimento não inclui apenas fabricantes e fornecedores, mas também transportadoras, depósitos, varejistas e os próprios clientes. Dentro de cada organização, como por exemplo, de uma fábrica, a cadeia de suprimento inclui todas as funções envolvidas no pedido do cliente, como desenvolvimento de novos produtos, marketing, operações, distribuição, finanças e o serviço de atendimento ao cliente, entre outras. (CHOPRA e MEINDL, 2003, p.3) Cox, Sanderson e Watson (2001), no mesmo sentido dos autores acima, acrescentam que uma cadeia de suprimento pode ser descrita como uma rede ampliada de relacionamentos de permuta, que existe para a produção de qualquer produto ou serviço que será ofertado ao cliente final. O fornecimento de um produto ou serviço começa com determinada matériaprima e, então, passa por uma série de estágios de permutas entre clientes e fornecedores. Os autores observam que em cada um destes estágios deve ocorrer alguma forma de transformação ou intermediação, com o objetivo de ir agregando valor ao produto, de forma que isto seja reconhecido pelo consumidor final. Também para Porter (1985), a cadeia de suprimento se constitui fundamentada em vínculos de cooperação, e se caracteriza por uma divisão de atividades entre empresa e fornecedores, canais de distribuição e clientes. Pires (2004), por sua vez, ressalta a diferença entre as definições de cadeia de suprimento e cadeia de produção. De acordo com o autor, a cadeia de suprimento se refere a todos os elementos, ou seja, empresas que colaboram na agregação de valor ao produto oferecido ao cliente final. Já a cadeia produtiva é utilizada, em geral, quando se trata do conjunto de atividades que representam um determinado setor industrial, por exemplo, cadeia de produção da indústria alimentícia. A cadeia de suprimento, portanto, pode fazer parte de uma ou mais cadeias produtivas, dependendo das características dos produtos finais. Sobre a gestão da cadeia de suprimentos, Pires (2001) afirma que basicamente, ela procura maximizar e tornar realidade as potenciais sinergias entre todas as partes da cadeia produtiva, de forma a atender ao consumidor final mais eficientemente, tanto por meio da redução de custos, como pela adição de valor aos produtos finais (Vollman e Cordon, 1996). Redução dos custos tem sido obtida, pela diminuição do volume de transações de informações e papéis, dos custos de transporte e estocagem e da diminuição da variabilidade da demanda de produtos e serviços, entre outros. Valor tem sido adicionado aos produtos pela criação de bens e serviços customizados, desenvolvimento conjunto de competências distintas por meio da cadeia produtiva e dos esforços para que tanto fornecedores como clientes aumentem mutuamente a lucratividade. (PIRES, 2001, p. 211-212) O autor acrescenta que as práticas da gestão da cadeia de suprimentos geram uma unidade virtual de negócios através da cadeia de suprimento, proporcionando algumas vantagens da integração vertical e, ao mesmo tempo, eliminando desvantagens como custos mais altos e perda de flexibilidade. Tan (2001), por sua vez, observa que a questão chave para a evolução da gestão da cadeia de suprimentos é o foco no cliente, presente na visão da organização. É isso que deve dirigir as mudanças em todas as relações internas ou externas a uma firma. A figura 1, abaixo, mostra a idéia do autor, que enfatiza a boa comunicação entre as fases e a constante presença do foco no cliente desde o planejamento estratégico, gerando, por fim, a satisfação do consumidor. ENEGEP 2005 ABEPRO 3715

Resultados Satisfação do cliente Processos Planejamento Estratégico Visão da organização Fonte: Adaptado de Tan (2001, p. 41) Figura 1 Visão Estratégica do Supply Chain Management Enfatiza-se, assim, que o presente artigo considera a gestão da cadeia de suprimentos como um conjunto de processos de negócios que se integram para oferecer produtos e/ou serviços que adicionam valor ao cliente final. O CRM é visto como um desses processos, sendo reforçado pela observação de Tan (2001) de que a chave da gestão da cadeia de suprimentos está no foco no cliente. Nota-se que a gestão da cadeia de suprimentos inclui, a partir do agente que processa a matéria-prima (fabricante),todos os agentes anteriores e posteriores. Ainda sobre a gestão da cadeia de produção, ressalta-se a inclusão da idéia de customização em massa. Trata-se da necessidade de oferecer produtos e/ou serviços que atendam às especificidades de grupos de clientes. Nesse caso, procura-se manter a redução de custos por escala de produção, ao mesmo tempo em que produtos/serviços personalizados são oferecidos. Portanto, como será comentado abaixo, o CRM apóia também a gestão da cadeia de produção na busca pela customização. 2. O CRM como parte da gestão da cadeia de suprimentos O atual cenário das organizações impõe a necessidade de um atendimento personalizado e bens e serviços customizados que serão obtidos apenas por meio de um relacionamento estreito com consumidores. Kotler (1999) adverte, no entanto, que a empresa deve conhecer os clientes que podem receber essa personalização. Para o autor, as organizações devem desenvolver o relacionamento com clientes rentáveis, lutar pela conquista dos clientes potenciais e deixar os clientes que geram prejuízo migrarem para a concorrência. O CRM surge, assim, como um processo que administra o relacionamento com clientes. De acordo com Gartner Group apud Peppers and Rogers Group (2000), o CRM é uma estratégia de negócio voltada ao entendimento e à antecipação das necessidades dos clientes atuais e potenciais de uma empresa. Do ponto de vista tecnológico, CRM envolve capturar os dados do cliente ao longo de toda a empresa, consolidar todos os dados capturados interna e externamente em um banco de dados central, analisar os dados consolidados, distribuir os resultados dessa análise aos vários pontos de contato com o cliente e usar essa informação ao interagir com o cliente através de qualquer ponto de contato com a empresa. (GARTNER GROUP apud PEPPERS and ROGERS GROUP, 2000, p.35) Bretzke (2000) acrescenta que o CRM é a integração entre o Marketing e a Tecnologia de Informação, para prover a empresa de meios mais eficazes e integrados para atender, reconhecer o cliente e cuidar dele em tempo real. E, consequentemente, transformar esses dados em informações que, disseminadas pela organização, permitem que toda a empresa conheça e cuide do cliente. Segundo essa autora, a captura centralizada desses dados, num banco de dados de marketing, utilizando tecnologia de informação avançada, permite ENEGEP 2005 ABEPRO 3716

conhecer o perfil do cliente, detectar as ameaças e oportunidades sinalizadas por uma reclamação (ameaça), por um pedido de mais informações (oportunidade), por um pedido acompanhado de uma referência ao diferencial de um concorrente (ameaça), por uma insinuação de que o concorrente está prestando mais serviços (ameaça) ou de que o cliente está inaugurando mais uma unidade produtiva (oportunidade). Bretzke (2000), ao concluir, destaca o fato de que o CRM permite sustentar a vantagem competitiva pelo profundo conhecimento dos clientes atuais e potenciais, pela sistematização de uma série de atividades de comunicação, dirigida e integrada, e pelo uso de ferramentas tecnológicas e de marketing, na consecução dos objetivos do Marketing de Relacionamento. Portanto, para a autora, a estratégia de CRM é um diferencial competitivo. Peppard (2000) também ressalta o papel do CRM para o alcance e a sustentação da vantagem competitiva. Conforme o autor, as empresas praticam o CRM usando informações refinadas sobre os atuais e os potenciais clientes para antecipar suas respectivas necessidades e responder a elas. Essas organizações estão mudando seus processos organizacionais e construindo soluções de tecnologia que viabilizem adquirir novos clientes, reter os atuais e maximizar-lhes o valor do ciclo de vida. Para o autor, o CRM deve tornar mais fácil a negociação entre o cliente e a empresa. Já sobre negociação, Martinelli e Almeida (1997) citam várias abordagens sobre esse conceito, observando que ela deve ser um instrumento para atender às necessidades das partes envolvidas no processo. Assim, a negociação visa ao jogo do ganha-ganha e, consequentemente, todos os participantes devem receber benefícios que satisfaçam suas respectivas necessidades. Posteriormente, os mesmos autores observam outro aspecto dentro da negociação que, além de buscar atender às necessidades dos lados envolvidos, também se preocupa com o relacionamento duradouro que poderá abrir portas para outros relacionamentos e/ou negociações futuras. A partir dessa visão sobre negociação, pode-se considerar o CRM como um instrumento fundamental dentro do processo de negociação, visto que o CRM também prioriza o jogo do ganha-ganha, visando a um relacionamento duradouro que proporcione benefícios para as partes envolvidas. De fato, Thompson (2002) aborda a concepção do ganha-ganha, denominando-a de Collaborative Mindset (win-win). O autor resume esse conceito como sendo a filosofia da colaboração, afirmando que colaborar significa trabalhar juntos, com ambos os lados investindo no relacionamento e usufruindo os benefícios dessa relação. Ele observa a importância de criar valor para o cliente, com o intuito de também receber dele o valor, ou seja, um jogo de mão dupla que tem por objetivo a criação de ganhos mútuos. Thompson (2002) afirma que essa concepção é um requisito básico para o CRM, pois é necessário o investimento das partes. Todavia, o lucro também será uma recompensa tanto para a empresa quanto para o cliente. O mesmo autor finaliza dizendo que esse conceito, apoiado em processos organizacionais e sistemas de tecnologia corretos, viabiliza o CRM. Por outro lado, deve-se notar o conceito de gerência do relacionamento de parcerias (PRM) inserido na concepção do CRM. Nesse sentido, pode-se afirmar que PRM representa uma estratégia para selecionar e administrar parcerias, visando otimizar o valor de longo prazo para empresa, assegurando a satisfação dos parceiros e clientes finais. (GREENBERG, 2001). A partir do conceito de CRM e de negociação apresentados acima, percebe-se a importância desses instrumentos para a gestão da cadeia de suprimentos. Essa idéia pode ser observada nos sete princípios básicos, propostos por Anderson et al. (1997) e citados por Pires (2004). O primeiro princípio proposto pelo autores se refere à segmentação da base de clientes. De acordo com esse princípio, deve-se realizar uma refinada segmentação de clientes, detectando e procurando atender às necessidades específicas de cada um deles. Nesse caso, o CRM é ENEGEP 2005 ABEPRO 3717

considerado um dos instrumentos úteis na definição de uma política de segmentação e de gestão da base de clientes. (ANDERSON et al., 1997 apud PIRES, 2004) Dessa forma, o CRM se apresenta como um processo de negócio da gestão da cadeia de suprimentos, podendo ser parte importante da relação entre o fabricante e seus fornecedores, o fabricante e seus clientes ou entre esses clientes e o consumidor final. Pela gestão da cadeia de suprimentos, acredita-se que todos o agentes devem possuir processos integrados, que reduzam custos e adicionem valor aos produtos e/ou serviços. O CRM auxilia na manutenção do foco no cliente e na customização, possibilitando o conhecimento e a antecipação das necessidades dos clientes. Assim, a cadeia pode obter ganhos reais por meio da criação de valor que será reconhecido pelo cliente, que tende a manter uma relação duradoura com seu fornecedor. A vantagem competitiva pode então ser mantida por um longo prazo, tornando-se sustentável. Antes da apresentação dos casos, cabe ressaltar que para o desenvolvimento e a implementação do CRM é necessária uma infra-estrutura tecnológica. Entre as principais ferramentas pertencentes ao sistema de CRM, pode-se citar: a automação da força de vendas (SFA), a automação do marketing empresarial (EMA), o call center, o data warehouse, o data mining e o data mart. Essa infra-estrutura tecnológica representa a própria tecnologia inserida na estratégia do CRM. 4. Apresentação de resultados dos estudos de casos na Empresa A e na Empresa B Os resultados deste artigo são parte de dois estudos de casos mais amplos, realizados no ano de 2003 e início do ano de 2004. A Empresa A é uma fábrica de bebidas, franquia da marca Coca-Cola. A Empresa B pertence ao setor sucroalcooleiro, tendo como principais produtos, o açúcar tradicional, o açúcar orgânico e o álcool. Ressalta-se que nesta última empresa, o estudo de caso foi focalizado na apenas produção do açúcar, especificamente o açúcar orgânico. A produção de álcool não foi estudada por se tratar de pesquisas que evolvem a indústria agro-alimentar. Ambas as empresas se situam no interior de São Paulo e são os agentes da cadeia de suprimentos responsáveis pela fabricação dos produtos que são oferecidos aos clientes. A escolha das unidades foi feita com base, entre outros requisitos, na infra-estrutura de tecnologia de informação e na importância dada pelas empresas, para a adoção de novas práticas de gestão. Abaixo, mostra-se, de forma sintética, os resultados obtidos por meio de entrevistas, nas duas unidades estudadas. Empresa A A Empresa A foi fundada em 1948, para produzir e distribuir produtos da marca Coca-Cola. A organização possui por volta de 1200 funcionários, atuando em aproximadamente 30 cidades, que incluem mais de 30000 pontos de venda. Seu faturamento no ano de 2003, foi de 407 milhões de reais. A unidade passou por diversas mudanças no últimos anos sendo, uma delas, a mudança na razão social em 2001, para que pudesse refletir a necessidade de diferenciação de produtos imposta por pressões do cenário competitivo. A importância da gestão da cadeia de suprimentos foi percebida em diversas entrevistas realizadas, inclusive com trabalhadores do nível operacional. A idéia de cadeia de suprimento é bem difundida na organização. A unidade possui relações de parceria com os produtores de embalagem e relação contratual com o produtor de açúcar. Na arquitetura estratégica da organização (figura cedida pela unidade) observa-se a importância que é dada aos fornecedores e aos clientes e consumidores finais dos produtos fabricados. ENEGEP 2005 ABEPRO 3718

Sobre a busca pela manutenção de uma relação duradoura com seus clientes, observou-se que a empresa se preocupa com seus processos, e busca satisfazer e conseguir a confiança de seus clientes principalmente, através do contato direto. Além do diferencial já intrínseco à marca, a companhia investe bastante nas suas negociações para conseguir firmar uma relação duradoura. A organização armazena os seguintes dados sobre clientes: vendas nos últimos 7 anos, dados cadastrais e de contato, limite de crédito, pendências financeiras e características que definem quais produtos são mais apropriados. A unidade tem um sistema comercial próprio, não vinculado ao ERP, que dispõe todas essas informações ao consultor de vendas, para que ele possa fazer uma negociação de boa qualidade. Segundo o gerente de tecnologia de informação, é um sistema local, mas que funciona muito bem para o negócio em que atua. Ferramentas como data warehouse, data mart e data mining não são utilizadas pela empresa. Na empresa A, o consultor de vendas visita o cliente uma ou mais vezes por semana e pode ter um contato mais direto. A Internet não é um meio utilizado para vendas ou forma de adquirir dados e informações sobre clientes. Existe um link na página da companhia que leva o consumidor diretamente para o site da Coca-Cola Brasil, para possíveis comentários ou perguntas. Não está, portanto, ligado diretamente à Empresa A. A unidade possui um call center próprio que responde às duvidas, sugestões e reclamações tanto de cliente quanto dos consumidores finais (usuários dos produtos). No caso de produtos com defeito, é feito um rastreamento para saber se o problema foi da própria unidade, do transporte ou do distribuidor/varejista. Pesquisas de marketing são consideradas fontes importantes para a empresa. A unidade contrata um especialista que realiza pesquisas sobre desejos, satisfação e comportamento de clientes e usuários. Estas pesquisas incluem também a comparação de produtos da própria marca com produtos de outras marcas. O que contribui também para uma melhor relação e coordenação de atividades entre a Empresa A e seus clientes, é um espaço de 600m2, chamado de escola de Merchandising, em que o cliente tem uma espécie de treinamento. O espaço, fundado em dezembro de 1999, dispõe de padaria, supermercado, mercearia, bar, cantina escolar e loja de conveniência, para que os varejistas possam exercitar o que foi tratado no treinamento. O curso inclui orientações sobre armazenagem, limpeza, ordem das marcas, disposição de produtos, colocação de preços e uso de materiais publicitários para que o consumidor encontre facilmente o produto. Percebe-se a idéia de customização em massa quando se verifica o histórico do desenvolvimento de novos produtos da marca. Nos últimos anos, com a acirrada competição no mercado de bebidas, se verifica um grande aumento na diferenciação de produtos e a busca de nichos específicos de mercado. A empresa distribui produtos da marca Coca-Cola e Kaiser. No entanto, sua produção se refere apenas aos produtos da Coca-Cola. Neste caso, tem-se diversificado sabores para atender a públicos diferentes (por exemplo, o caso dos produtos da linha Fanta que são mais voltados para jovens e possuem diversos sabores), além de ter entrado em mercados diferentes (água mineral, sucos, energéticos, etc.). Procura-se oferecer também, uma grande variedade de embalagens. ENEGEP 2005 ABEPRO 3719

Empresa B A empresa B atua no mercado sucroalcooleiro desde 1946. O açúcar tradicional, o álcool e o açúcar orgânico representam os principais produtos que compõem o seu mix comercial. Essa organização exerce suas atividades com um quadro de funcionários de, aproximadamente, 2800 colaboradores, distribuídos entre as duas grandes plantas (industriais e agrícolas) que formam o complexo organizacional. O volume médio de sua produção anual corresponde aos seguintes números: 120.000 toneladas de açúcar tradicional, 40.000 toneladas de açúcar orgânico e 154.000.000 litros de álcool. Desse modo, no ano de 2003, esse grupo ocupou a décima sexta posição do setor no estado de São Paulo. No ano de 1986, o grupo deu início a um grande projeto para pesquisar e desenvolver um novo sistema de produção. Muitos investimentos foram feitos e os primeiros resultados desses trabalhos ocorreram em 1997, quando o grupo lançou-se no mercado internacional de açúcar orgânico, após obter essa certificação, e forneceu seus primeiros lotes de açúcar orgânico a granel, como insumo para outras indústrias. Em 2000, o grupo apresenta o açúcar orgânico para o mercado interno. Nessa ocasião, o grupo iniciou suas atividades de comercialização com o mercado de varejo. Desse modo, surge uma situação organizacional completamente diferente, exigindo novas estratégias de gestão, envolvendo distribuidores e consumidores finais. Todavia, deve-se observar que, anteriormente, as atividades comerciais do grupo resumiam-se à entrega da sua produção ao seu único cliente/distribuidor, a Cooperativa de Produtores de Cana, Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo Ltda, a Copersucar. A partir do novo segmento de produtos orgânicos, os processos organizacionais exigiam, cada vez mais, mudanças e adaptações ao mercado de varejo. Dessa forma, destacam-se alguns pontos: o acordo com a Copersucar, evitando que a comercialização de produtos orgânicos no mercado de varejo prejudicasse a distribuição do açúcar tradicional; a aquisição de mãode-obra especializada para o acesso às grandes redes de supermercados e distribuição do açúcar orgânico; a criação de novos processos administrativos para gestão do varejo; a instalação de um escritório na capital paulista, incluindo contratação e treinamento de força de venda e, por fim, a terceirização de serviços exclusivos de armazenagem e logística com um parceiro logístico. Sendo assim, o departamento de TI afirmou que algumas áreas exigiam modificações imediatas e mencionou a necessidade de um sistema integrado de gestão, com uma única base de dados, para gerenciar os novos processos organizacionais. Nota-se que, antes da adoção do sistema integrado, existiam vários aplicativos personalizados que serviam às diversas áreas, porém não existia comunicação entre os legados, ocasionando ineficiência por retrabalho e existência de vários bancos de dados. Por outro lado, a área comercial colocou a automação da força de venda como prioridade. Nesse caso, automatizar os processos com o parceiro logístico e a concentração das informações no mesmo banco de dados também foram percebidas como necessidades vitais. Diante desse ambiente de reestruturação organizacional, a implantação do sistema integrado, a necessidade imediata das primeiras ferramentas de CRM (Automação da força) e a exigência de inserir o parceiro logístico nessa integração reforçam o papel do CRM na gestão da cadeia de suprimentos, visto que integrar e distribuir informações do cliente em todos os pontos da cadeia faz parte da concepção do CRM. 3. Conclusão ENEGEP 2005 ABEPRO 3720

O ambiente competitivo atual faz com que práticas de gestão sejam pensadas no âmbito de toda a cadeia de suprimentos. Formas de coordenação de atividades entre vários agentes, assim como a busca pela customização e por uma relação duradoura com clientes e consumidores finais, tornam-se fundamentais diante do atual contexto. De fato, percebeu-se nos resultados de dois estudos de casos realizados em duas unidades da indústria agro-alimentar, que tanto a gestão da cadeia de suprimentos como a administração do relacionamento com cliente são considerados relevantes e disseminados nessas organizações. A Empresa A possui a concepção do CRM, na medida em que se preocupa com negociação e busca de várias formas dados relevantes sobre os clientes. Ela possui também ferramentas como, por exemplo, um call center para contato com consumidores finais. Na Empresa B, percebeu-se que a comercialização do açúcar orgânico no mercado de varejo culminou na necessidade de se ter ferramentas do CRM, como a automação da força de vendas e a gerência do relacionamento de parcerias (PRM), para a inclusão de parceiros logísticos no sistema integrado. Dessa forma, acredita-se que o CRM, na medida em que possui o foco no cliente e apóia a customização, possui grande importância na gestão da cadeia de suprimentos. 6. Referências bibliográficas BRETZKE, M. (2000). Marketing de relacionamento e competição em tempo real com CRM (Customer Relationship Management). São Paulo: Atlas. CHOPRA, S.; MEINDL, P.(2003) Gerenciamento da cadeia de suprimentos. São Paulo: Prentice Hall. COX, A.; SANDERSON, J.; WATSON, G. (2001). Supply chains and power regimes: toward an analytical framework for managing extended networks of buyer and supplier relationships. The Journal of Supply Chain Management, v.37, n.2, p. 28-35. FLEURY A.; FLEURY M. T. (2000) Estratégias empresariais e formação de competências: um quebra-cabeça caleidoscópico da indústria brasileira. São Paulo: Atlas. GARVIN, D.A. (1988). Managing Quality. Ed. Freepress. GREENBERG, P. (2001). CRM Na Velocidade da Luz. Rio de Janeiro: Campus. HUTT, M. D.; SPEH, T. W. (2001) Business marketing management: a strategic view of industrial and organizational markets. USA: Hardcourt College Publishers. JURAN, J. (1980). Quality Planning And Analysis. New York: Ed. McGraw-Hill. KOTLER, P. (1999).Marketing para o século XXI. São Paulo: Futura. MARTINELLI, D. P. ; ALMEIDA, A.P. (1997). Negociação: como transformar confronto em cooperação. São Paulo: Atlas. PEPPARD, J. (2000). Customer relationship management (CRM) in financial services. European Management Journal. 2000, v.18, n.3, p. 312-327. PEPPERS, D.; ROGERS, M. (2000). Um guia executivo para entender e implantar estratégias de customer relationship management. São Paulo: Peppers & Rogers Group do Brasil. (CRM Series Marketing 1To1). PIRES, S. R. I. (2001). Gestão da cadeia de suprimentos e suas implicações no planejamento e controle da produção. In: AMATO NETO, J. (Org.) Manufatura classe mundial: conceitos, estratégias e aplicaçãoes. São Paulo: Atlas, Cap. 9, p.207-230. PIRES, S. R. I. (2004). Gestão da cadeia de suprimentos: conceitos, estratégias, práticas e casos. São Paulo: Atlas. PORTER, M. E. (1985). Competitive advantage. New York: McMillan. TAN, K. C. (2001). A framework of supply chain management literature. European Journal of Purchasing and Supply Management, n.7, p. 39-48. Disponível em: <http://www.elsevier.com/locate/ejpursupmgt> Acesso em 23 ago. 2003. THOMPSON, T. (2002). Collaboration: the cure for what ails CRM. http://www.crmguru.com (03/2003). ENEGEP 2005 ABEPRO 3721