0000099-94.2014.5.04.0663 RO Fl. 1 DESEMBARGADOR GEORGE ACHUTTI Órgão Julgador: 4ª Turma Recorrente: Recorrida: Origem: Prolatora da Sentença: LUIZ ANTONIO DA SILVA SANTOS - Adv. Pericles Belo Sarturi SEIFFERT SERVIÇOS AUTOMOTIVOS LTDA. - Adv. Cleo Mario Picon 3ª Vara do Trabalho de Passo Fundo JUÍZA PATRÍCIA BLEY HEIM E M E N T A DOENÇA OCUPACIONAL. INDENIZAÇÕES POR DANOS MATERIAL E MORAL. REINTEGRAÇÃO. A caracterização do nexo causal, entre as atividades exercidas pelo trabalhador - ou entre o acidente de trabalho - e a doença a que está acometido, deve ser cabalmente provada para que se possa imputar ao empregador a obrigação de reintegrar o empregado, bem como indenizá-lo por danos morais e materiais sofridos. A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos. ACORDAM os Magistrados integrantes da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE para acrescer à condenação o pagamento de honorários assistenciais, na base de 15% sobre o seu valor bruto, apuráveis a final. Valor da condenação inalterado
0000099-94.2014.5.04.0663 RO Fl. 2 aos efeitos de direito. Intime-se. Porto Alegre, 28 de outubro de 2015 (quarta-feira). R E L A T Ó R I O O reclamante interpõe recurso ordinário, conforme as razões das fls. 231-233, pretendendo a reforma da sentença no que pertine ao reconhecimento da dispensa discriminatória, acidente de trabalho típico e honorários de assistência judiciária gratuita. São apresentadas contrarrazões pela reclamada (fls. 239-243). Sobem os autos ao Tribunal para julgamento do apelo. É o relatório. V O T O DESEMBARGADOR GEORGE ACHUTTI (RELATOR): 1. DESPEDIDA DISCRIMINATÓRIA. INDENIZAÇÕES. O Juízo a quo indeferiu os pedidos das alíneas e e f, declarando que não se configurou a dispensa discriminatória. Salientou que não há prova de que o reclamante estivesse doente e com limitações funcionais no ato de sua despedida. Adotou a conclusão da perícia técnica, em que o expert concluiu que o reclamante está apto para o trabalho. Afirma o reclamante que foi despedido, de forma sumária, após a apresentação de atestado médico, e com estado de saúde debilitado,
0000099-94.2014.5.04.0663 RO Fl. 3 evidenciando que o ato demissional restou eivado de flagrante discriminação. Invoca o entendimento da Súmula nº 443 do TST. Pretende seja declarado o caráter discriminatório da extinção contatual, nos termos do art. 4º, inc. II, da Lei nº 9.029/95, com pagamento em dobro da remuneração do período de afastamento, compreendido entre a data da dispensa e a publicação do acórdão, com as repercussões legais. Sustenta que a conduta da reclamada extrapolou os limites legais de seu poder diretivo, gerando, assim, o direito à indenização por danos morais, que pretende seja arbitrada pelo Juízo de origem, no valor de R$ 50.000,00. Examino. O autor pleiteia o direito, fundamentando-o conforme o art. 4º, inc, II, da Lei nº 9.029/1995, in verbis: "Art. 4o O rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório, nos moldes desta Lei, além do direito à reparação pelo dano moral, faculta ao empregado optar entre: (...) II - a percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais." À fl. 34, à carmim, consta atestado médico prescrevendo ao autor dois dias de repouso, a partir de 09.12.2013, por apresentar urticária alérgica. Tal patologia não guarda relação com a moléstia geradora da fruição do auxílio-doença, espécie nº 31, no período de 06.5.2013 a 30.11.2013 (fls. 27-29, versos) - recuperação de cirurgia para retirada de tela de marlex (hérnia inguinal), fls. 26-27, à carmim -, tampouco configura inaptidão para o
0000099-94.2014.5.04.0663 RO Fl. 4 trabalho posterior aos dias de repouso. Em consequência, considerando-se que o órgão previdenciário rejeitou o pedido de prorrogação do benefício previdenciário findo em novembro/2013, por ausência de incapacidade laboral (fl. 27, verso), e que o atestado de saúde ocupacional emitido em 11.12.2013 (fl. 121) aponta a aptidão do autor, não se evidencia o alegado "estado de saúde debilitado" por ocasião da despedida. Sendo ônus do autor a prova da alegada conduta discriminatória da empregadora por ocasião da despedida, bem como do fato que a teria gerado (doença), e dele não se desincumbindo, não há falar em pagamento em dobro das remunerações e em indenização por dano moral. Tendo atuado a empregadora dentro dos limites de seu poder potestativo, não há falar em responsabilidade de indenizar. Nego provimento ao recurso. 2. ACIDENTE DE TRABALHO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. O Juízo de origem indeferiu o pedido de reintegração em razão da ocorrência de acidente de trabalho, bem como as indenizações por danos morais. Rejeitou, ainda, os pedidos das alíneas a, b, c, d, t e u. Adotou as conclusões periciais como fundamentos de decidir, considerando que o perito técnico negou qualquer relação entre a hérnia inguinal e o suposto acidente ocorrido na empresa. Considerou, ainda, que o autor recebeu auxílio-doença, espécie nº 31, não tendo o órgão previdenciário reconhecido o nexo causal. Em consequência, declarou ausente o nexo causal entre o trabalho e a patologia desenvolvida pelo reclamante. Assevera o autor que, há, aproximadamente, sete anos, realizou cirurgia de
0000099-94.2014.5.04.0663 RO Fl. 5 hérnia inguinal, em decorrência de acidente de trabalho típico. Afirma que, estando no estacionamento da empresa, um portão em péssimas condições caiu sobre si, ocasionando o atingimento da tela de marlex e causando infecção. Sustenta que se encontrava em tratamento e com cirurgia agendada, sem condições de exercer atividade laborativa, como comprovam os documentos das fls. 31-34 e 164-165. Alega que, na audiência de instrução, o representante da reclamada reconheceu a ocorrência do sinistro. Refere que não há dúvidas de que o portão caiu sobre si, causando infecção no local em que ele havia realizado cirurgia de hérnia inguinal. Afirma que não recebeu auxílio-doença por acidente de trabalho, porque a reclamada sonegou a informação perante o ente previdenciário. Pretende seja paga indenização por danos materiais e indenização por danos morais, no valor de R$ 50.000,00, bem como a indenização pertinente ao período estabilitário decorrente do acidente de trabalho, com repercussões. Analiso. Nos termos do art. 20, da Lei nº 8.213/91, são consideradas acidente do trabalho a doença profissional e a doença do trabalho, assim entendidas, respectivamente, a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar à determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social, e a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e que com ele se relacione diretamente, constante da relação antes mencionada. O subsequente art. 21 lista, ainda, outras hipóteses de infortúnio que são equiparadas ao acidente do trabalho. Em todos os casos, para que seja equiparada ao acidente de trabalho, a doença deve ter relação com a atividade laboral desenvolvida. No caso, o
0000099-94.2014.5.04.0663 RO Fl. 6 reclamante fundamenta o pedido na ocorrência de acidente de trabalho típico, do qual teriam decorrido complicações em cirurgia da hérnia inguinal. O recorrente foi admitido pela reclamada em 03.9.2012, para exercer a função de manobrista, laborando até 11.12.2013, quando foi despedido sem justa causa. Na petição inicial (fl. 02, à carmim), o reclamante alegou que, entre final de dezembro/2012 e início de janeiro/2013, sofreu acidente de trabalho típico ao fechar portão do estacionamento da reclamada, que estava em péssimas condições, vindo a cair sobre si. Informou que não foi emitida comunicação de acidente de trabalho - CAT, em flagrante fraude à legislação trabalhista e previdenciária. Referiu que, antes do acidente, havia realizado cirurgia de hérnia inguinal, há aproximadamente sete anos, tendo sido colocada uma "tela de marlex". Sustentou que, por ocasião do sinistro, o portão atingiu a área afetada, causando inflamação na tela de marlex, o que o obrigou a se afastar das atividades laborais em fruição de auxíliodoença. Conquanto a reclamada negue a ocorrência do acidente de trabalho, nas razões da defesa (fls. 72-73), o preposto da empresa, ao prestar depoimento pessoal (fl. 192), afirmou que: "... em razão de um vento muito forte um portão que não é muito usado caiu sobre o reclamante; (...) que o reclamante foi afastado pelo INSS porque fez uma cirurgia; que o portão caiu no começo de novembro de 2012; que o portão que caiu era um portãozinho de madeira com mais ou menos 1,50m; que não sabe informar se era uma madeira leve ou pesada;... ".
0000099-94.2014.5.04.0663 RO Fl. 7 A manifestação posterior à audiência (fls. 195-196), em que a reclamada afirma a ocorrência de erro material na ata que a registrou (fl. 192, anverso e verso), não afasta a confissão real emanada das declarações do preposto (sócio da reclamada). Constato que os depoimentos e seus registros foram firmados pelo preposto e pelo procurador da empresa reclamada, não tendo eles, na oportunidade, oposto qualquer impugnação aos termos do registro. Verificando-se a confissão real da ré no que pertine à ocorrência do sinistro, o ônus probatório do reclamante restringe-se às sequelas decorrentes do acidente, estas relativas à infecção surgida na área em que realizada cirurgia da hérnia inguinal, portanto, devendo demonstrar o nexo causal entre lesão e acidente. No laudo médico (fls. 151-154, complementado à fl. 184, anverso e verso, perito José Antonio de Barros Piantá, médico do trabalho), foram apresentadas as seguintes conclusões: "- O RECLAMANTE FOI PORTADOR E HÉRNIA INGUINAL PRÉVIA AOS TRABALHOS NA DEMANDADA, COM POSTERIOR RECIDIVA, ADEQUADAMENTE CORRIGIDA POR HERNIORRAFIA. - NÃO HÁ RELAÇÃO CAUSAL ENTRE AS ATIVIDADES DO RECLAMANTE E A PATOLOGIA, NÃO RESTANDO ESTABELECIDO O NEXO TÉCNICO. - O RECLAMANTE NÃO É PORTADOR DE DOENÇA OCUPACIONAL, OU SEQUELA ACIDENTÁRIA. - O EXAME FÍSICO PERICIAL MORFO-FUNCIONAL
0000099-94.2014.5.04.0663 RO Fl. 8 OBJETIVO DO RECLAMANTE FOI NORMAL, COM A PRESENÇA DE PEQUENA FÍSTULA EM PONTO DA CIRURGIA. - PELA MANUTENÇÃO DA ANATOMIA E DA FUNCIONALIDADE NÃO HÁ ENQUADRAMENTO NA TABELA REFERENCIAL DA SUSEP/DPVAT. - QUANTO AOS ASPECTOS ANALISADOS O RECLAMANTE É APTO PARA O TRABALHO." O perito médico informou (fls. 152, verso-153), ainda, que: " O Reclamante foi portador de Hérnia Inguinal prévia aos trabalhos na Demandada, há cerca de 6 anos. Foi submetido à respectiva correção cirúrgica - Herniorrafia. Posteriormente apresentou recidiva do quadro herniário, entre dezembro de 2012 e janeiro de 2013, tendo sido já então em maio de 2013 submetido a um novo procedimento cirúrgico - Herniorrafia. Quanto às causas do quadro, as Hérnias são a protusão de um órgão ou tecido através de uma abertura anormal no corpo humano, no caso apresentada antes das atividades na Demanada e também, por recidiva, no decurso do pacto laboral. (...) Desta forma podemos afirmar que o quadro apresentado pelo Reclamante não guarda relação com suas atividades laborais
0000099-94.2014.5.04.0663 RO Fl. 9 na Demandada, tendo havido inclusive quadro herniário prévio, não sendo incomuns os quadros de recidiva." (destaques no original) A partir do laudo transcrito, é possível concluir que o perito médico afasta qualquer nexo entre a hérnia inguinal e as atividades laborais, ou a ocorrência do acidente. Tendo sido admitido pela reclamada em 03.9.2012, o autor havia apresentado diagnóstico de hérnia inguinal seis anos antes, tratando-se de recidiva as complicações verificadas a partir de dezembro/2012, durante a execução do contrato de trabalho. O atestado médico juntado à fl. 26, à carmim, relata o histórico das afecções apresentadas pelo autor, tendo constado que: "Atesto para os devidos fins que o paciente acima, sofria de moléstia sob o CID-10: K40.9. Realizou cirurgia curativa com tela há 7 anos. Evolui com Granuloma local crônico. Realiza novo procedimento cirúrgico para retirada de tela de marlex em abril de 2013. Evolui com Granuloma de ferida operatória pela linha de sutura, CID-10:A58. Está com procedimento agendado para exérese de pequeno Granuloma a nível ambulatorial. Passo Fundo, 13 de novembro de 2013." O atestado médico da fl. 27, à carmim, relata a realização de procedimento cirúrgico, necessitando o paciente de 90 dias de afastamento para recuperação, em 20.4.2013. Tal evento ocasionou a fruição do auxíliodoença previdenciário, de 06.5.2013 a 30.11.2013, conforme os documentos juntados às fls. 27, verso-30, à carmim. A prorrogação do período inicial de afastamento decorreu de complicações pós-cirúrgicas
0000099-94.2014.5.04.0663 RO Fl. 10 (atestados médicos, fls. 31-32, à carmim). Em consequência, também a prova documental não indica o nexo causal entre a lesão apresentada pelo reclamante, a partir do final de 2012, e o acidente de trabalho sofrido. Ressalto que o atestado médico datado de novembro/2013 refere-se a granuloma local crônico. Tal lesão, mais conhecida popularmente como carne esponjosa, costuma ocorrer em razão da presença de corpo estranho no organismo, no caso, encontrando-se relacionada à tela de marlex. Portanto, tanto a recidiva da hérnia inguinal, quanto a necessidade de cirurgia para retirada do artefato, não se encontram relacionados ao sinistro. Não tendo o reclamante se desincumbido de ônus probatório que era seu, portanto, restando ausente prova de nexo causal entre o acidente e a lesão, não há falar em responsabilidade da empregadora quanto ao pagamento de indenização. Nego provimento ao recurso. 3. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. HONORÁRIOS. O Juízo de origem indeferiu o pedido de honorários advocatícios, ao fundamento de que o procurador do reclamante não se encontra credenciado pelo sindicato de sua categoria profissional, ausente, em consequência, requisito para sua concessão, na esteira das Súmulas nº 219, inc. I, e 329, ambas do TST. Refere o recorrente que é suficiente à concessão da assistência judiciária gratuita a declaração de hipossuficiência, nos termos do art. 790, 3º, da CLT, combinado ao art. 11 da Lei nº 1.060/50. Sustenta que não é admissível o monopólio sindical para a representação judicial do
0000099-94.2014.5.04.0663 RO Fl. 11 trabalhador, competindo ao cidadão escolher livremente o profissional de sua confiança para lhe representar em Juízo. Decido. Os honorários advocatícios, nesta Justiça especializada, decorrem do atendimento dos preceitos da Lei nº 5.584/70, na esteira das Súmulas nºs 219 e 329 do TST. Não se trata da hipótese de assistência sindical quando vem aos autos a declaração de miserabilidade jurídica da parte autora (fl. 11, verso), desacompanhada da credencial do ente sindical representativo de sua categoria profissional. Seriam indevidos os honorários assistenciais. Nada obstante estes fundamentos, aplico, todavia, por razões de política judiciária, ressalvando meu entendimento, a recente Súmula nº 61 deste TRT4, in verbis: HONORÁRIOS ASSISTENCIAIS. Atendidos os requisitos da Lei 1.060/50, são devidos os honorários de assistência judiciária gratuita, ainda que o advogado da parte não esteja credenciado pelo sindicato representante da categoria profissional." Dou provimento ao apelo para acrescer à condenação o pagamento de honorários assistenciais, na base de 15% sobre o seu valor bruto (Súmula nº 37 deste TRT4), apuráveis a final. PARTICIPARAM DO JULGAMENTO: DESEMBARGADOR GEORGE ACHUTTI (RELATOR)
0000099-94.2014.5.04.0663 RO Fl. 12 DESEMBARGADOR ANDRÉ REVERBEL FERNANDES DESEMBARGADOR JOÃO PEDRO SILVESTRIN