A balança comercial do agronegócio brasileiro



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Transcrição:

A balança comercial do agronegócio brasileiro Antonio Carlos Lima Nogueira 1 Qual é a contribuição atual dos produtos do agronegócio para o comércio exterior, tendo em vista o processo atual de deterioração das contas externas do Brasil? Uma fonte recente sobre o tema é o relatório Balança Comercial Brasileira do Agronegócio, da Federação das Indústrias de São Paulo (FIESP), com dados de março de 2014. O objetivo deste artigo é apresentar uma análise dos resultados que se destacam na balança comercial do agronegócio e as perspectivas de evolução para os principais produtos. O resultado do comércio exterior brasileiro apresentou uma deterioração expressiva nos últimos 12 meses, visto que o saldo comercial diminuiu de US$ 162 milhões em 2013 para US$ 112 milhões, o que indica uma queda de 30% com dados de março de 2014. Neste período, observamos uma recuperação lenta da economia dos países desenvolvidos, alguma fragilidade nos países emergentes e forte oscilação do dólar em relação ao real. O aspecto cambial revelou-se especialmente turbulento no último ano, visto que em 2013, o Dólar estava no valor mínimo de R$ 1,94 em março, atingiu o pico de R$ 2,45 em agosto e caiu a R$ 2,16 em outubro. Em 2014, a moeda americana retornou ao patamar de R$ 2,43 em fevereiro e fechou o mês de março em R$ 2,27. Este comportamento da taxa de câmbio pode ter contribuído para a retração dos negócios internacionais nos diversos setores, por reduzir a previsibilidade dos preços e margens para os produtores e dificultar a negociação dos contratos de fornecimento com os potenciais compradores. Para o agronegócio a complexidade para a avaliação da competitividade dos produtos torna-se ainda maior em vista dos impactos nos preços dos insumos importados, que apresentam alta participação nos processos produtivos agrícolas. A balança comercial brasileira do agronegócio atingiu durante o mês de março de 2014 um superávit de US$ 6,5 bilhões, valor superior aos US$ 6,2 bilhões 1 Pesquisador no Centro de Conhecimento em Agronegócios (PENSA) da USP e professor na FATEC São Paulo. (E-mail: aclimano@gmail.com). 1

registrados no mesmo período de 2013. As exportações do setor totalizaram US$ 7,9 bilhões, variação de 3,7% em relação a março de 2013, e as importações apresentaram queda de 7%, fechando o mês em US$ 1,4 bilhão. A comparação com os demais setores econômicos realça a relevância desse resultado. Para essa parcela da economia, em março de 2014 foi obtido um déficit de US$ 6,4 bilhões, que é 18% superior ao obtido no mesmo período do ano passado, de US$ 5,16 bilhões. Assim, o resultado positivo do agronegócio conseguiu compensar as perdas dos demais setores e produzir o pequeno superávit citado no início do texto. Para a obtenção desse resultado referente ao mês de março de 2014, o agronegócio aumentou sua participação nas receitas totais das exportações, passando de 39,8% (US$ 7,68 bilhões em março de 2013) para 45,2% (US$ 7,97 bilhões em março de 2014), enquanto a participação nas importações oscilou de 8,0% para 8,1%. Esses dados revelam um aumento na competitividade dos produtos do agronegócio brasileiro, visto que o total das exportações brasileiras recuou 8,8% e os demais setores apresentaram queda de 17,7%. Nessa análise da participação do agronegócio no comércio exterior é interessante observar o comportamento das importações. Nesse caso temos maior uniformidade na comparação entre os setores. Enquanto o resultado agregado revela uma queda de 8,6% nas importações, com redução de US$ 19,2 bilhões para US$ 17,5 bilhões entre março de 2013 e 2014, os demais setores apresentaram queda de 8,7% e o agronegócio reduziu as importações em 7,0%. Observa-se uma redução geral na demanda de produtos importados, como resultado da elevação cambial e manutenção de um crescimento moderado da economia brasileira. Conforme apresentado, apesar do avanço inegável do agronegócio, a melhora na participação percentual no resultado agregado reflete uma deterioração muito acentuada nas exportações dos demais setores da economia brasileira. Aparentemente, a oscilação cambial apresentou um efeito líquido positivo para o agronegócio que não se observou nos demais setores nos últimos 12 meses. Possivelmente, os produtores do agronegócio conseguiram se apropriar dos ganhos 2

gerados nos períodos de alta do dólar em relação ao real, por meio da redução nos preços dos produtos brasileiros para os diversos mercados compradores. Para se avaliar as tendências mais recentes é interessante considerar o acumulado do primeiro trimestre de 2014. Neste período, o agronegócio registrou um saldo positivo de US$ 16,0 bilhões, valor inferior ao resultado de idêntico período do ano anterior, quando registrou um superávit de US$ 16,3 bilhões. Observa-se a estabilidade da participação do agronegócio nas exportações totais, oscilando entre 40,5% (US$ 20,5 bilhões no primeiro trimestre de 2013) e 40,8% (US$ 20,2 bilhões no primeiro trimestre de 2014). Da mesma forma, a participação nas importações ficou no patamar de 7,6% (US$ 4,27 bilhões no primeiro trimestre de 2013 e US$ 4,26 bilhões em 2014). Os dados revelam que o agronegócio está mantendo sua participação na economia e no comércio exterior nesse início de 2014 em relação ao ano passado. O primeiro trimestre é particularmente relevante para a balança do agronegócio por concentrar a colheita da safra de verão de grãos e o maior volume de embarques de produtos exportados, em vista das deficiências históricas em infraestrutura de armazenagem. Nas condições atuais, a parcela exportada da safra de grãos colhida fica armazenada nos caminhões e trens nos trajetos até os portos e precisa ser embarcada nos navios com rapidez, para não provocar um colapso nos armazéns públicos e privados. Essa situação reduz a margem de manobra aos produtores para a escolha do melhor momento do mercado para efetuar as vendas internacionais. O produto de maior destaque na balança do agronegócio continua sendo a soja em grão, cuja exportação encerrou o mês de março de 2014 em US$ 3,15 bilhões, com um aumento de 64,8% em relação ao desempenho observado no mesmo mês de 2013. O volume comercializado cresceu 76,2% e passou de 3,536 milhões de ton. para 6,229 milhões de ton. O preço médio obtido nas transações foi de US$ 540,0/ton., com uma redução de 6,4% em relação ao ano anterior. Conforme o relatório da FIESP, este ano os embarques da oleaginosa estão adiantados, especialmente em razão da colheita antecipada, do clima seco nos terminais e do menor embarque de milho, o que diminuiu a competição por espaço nos portos. 3

A elevada participação da soja em grão na receita de exportação do agronegócio já se tornou tradicional nas últimas décadas e pode ser objeto de diversas análises. Uma avaliação dos aspectos positivos do percentual de 39,5% no total das exportações do agronegócio para a soja em grão indica uma elevada competência produtiva nas diversas etapas do processo, incluindo genética, insumos, manejo e colheita. A partir da excelente produtividade obtida pelos agricultores, esse produto passa por um sistema de armazenagem, transporte terrestre e portos que apresenta enormes deficiências. Assim, grande parte do valor gerado na etapa da produção agrícola é perdida na infraestrutura logística. O desempenho global obtido revela que a demanda internacional continua robusta, mesmo com a redução nos preços pagos. O principal aspecto negativo da dependência da balança do agronegócio com a soja é o nível de risco que o setor está sujeito. A concentração de recursos utilizada para essa cultura revela uma situação vulnerável do agronegócio brasileiro em relação às oscilações de mercado, tendo como exemplo o comportamento do câmbio nos últimos 12 meses. Os riscos de mercado decorrentes da concentração da balança na exportação de soja têm sido minimizados pelas operações de contratos de venda futura entre produtores e traders, associados a operações de hedge cambial. Com relação aos recursos para custeio, seguros e comercialização da safra, observamos o desenvolvimento de sistema robusto formado por recursos com juros subsidiados e recursos livres privados, captados por meios de diversos títulos, como a Nota de Produto Rural e Letra de Crédito do Agronegócio (LCA). Esses títulos são utilizados em transações casadas para compra de insumos e captação de recursos na forma de investimento de pessoas físicas e jurídicas nos bancos. Ainda que o sistema tenha forte regulação pública e privada, não está descartada a ocorrência de oscilações significativas nos valores desses títulos em eventuais mudanças drásticas na demanda do produto pelos importadores tradicionais. 4

Assim, uma política de diversificação da balança comercial do agronegócio seria extremamente bem-vinda. Um produto que poderia colaborar no curto prazo com esse processo é o milho, que obteve uma receita de R$ 123 milhões em março de 2014, com uma queda de 74,1% em relação ao mesmo período de 2013. A quantidade exportada foi de 578 mil toneladas, com uma queda de 64,1%. O preço pago apresentou queda de 28% em relação ao ano anterior, atingindo US$ 212,0/ton. Apesar dos fatores conjunturais que podem ter afetado esse resultado, a cadeia do milho apresenta enorme complementaridade com a soja, por utilizar as mesmas áreas em esquemas de rodízio. Assim, existe enorme potencial não explorado de produção. A articulação de estratégias privadas de penetração nos mercados, apoiadas por políticas públicas consistentes para a exportação podem favorecer a expansão das exportações de milho e assim reduzir a dependência da balança do agronegócio em relação à soja em grão. As competências produtivas nas diversas etapas da cadeia do milho também estão presentes, talvez esperando somente uma diretriz clara dos agentes públicos e privados no sentido da exportação. 5