Referência dinâmica. Luiz Arthur Pagani (UFPR)

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Vimos que a todo o argumento corresponde uma estrutura. Por exemplo ao argumento. Se a Lua é cúbica, então os humanos voam.

Transcrição:

Referência dinâmica Luiz Arthur Pagani (UFPR) 1

1 Introdução Motivo: sendo I uma função, ela não pode atribuir à mesma constante dois ou mais indivíduos [5, p. 160; grifo no original]. Com nome, argumento válido incondicionalmente: Todo homem é mortal. Sócrates é homem. Sócrates é mortal. Com pronome, argumento válido só se co-referencial: Todo homem é mortal. Ele i é homem. Ele i/ j é mortal. Luiz Arthur Pagani 2 arthur@ufpr.br

2 Semântica formal tradicional 2.1 Estrutura Universo de discurso [5, p. 157]:,,,,,,,,, Luiz Arthur Pagani 3 arthur@ufpr.br

Luiz Arthur Pagani 4 arthur@ufpr.br

Interpretação das expressões básicas [5, p.158]: [Sócrates] G,g = [foi um lósofo grego ] G,g = {,, } [foi um jog. de fut. br. ] G,g = {,, } Luiz Arthur Pagani 5 arthur@ufpr.br

[Sócrates] B,g = [foi um lósofo grego ] B,g = {,, } [foi um jog. de fut. br. ] B,g = {,, } Luiz Arthur Pagani 6 arthur@ufpr.br

2.2 Regras de interpretação se α é um nome próprio, [α] X,g = indivíduo referido por α na estrutura X se α é um predicado, [α] X,g = conjunto de indivíduos referido por α na estrutura X se α β é uma sentença, onde α é um nome próprio e β é um predicado, [α β ] X,g = V sse [α] X,g [β ] X,g se α e β são são sentenças, [α e β ] X,g = [α] X,g [β ] X,g Luiz Arthur Pagani 7 arthur@ufpr.br

2.3 Avaliação tradicional [Sócrates foi um lósofo grego ] G,g = [Sócrates] G,g [foi um lósofo grego ] G,g = V [Sócrates foi um jogador de futebol brasileiro ] G,g = [Sócrates] G,g [foi um jogogador de futebol br. ] G,g = F [S. foi um l. gr. e S. foi um jog. de fut. br. ] G,g = [S. foi um l. gr. ] G,g [S. foi um jog. de fut. br. ] G,g = F Luiz Arthur Pagani 8 arthur@ufpr.br

[Sócrates foi um lósofo grego ] B,g = [Sócrates] B,g [foi um lósofo grego ] B,g = F [Sócrates foi um jogador de futebol brasileiro ] B,g = [Sócrates] B,g [foi um jogogador de futebol br. ] B,g = V [S. foi um l. gr. e S. foi um jog. de fut. br. ] B,g = [S. foi um l. gr. ] B,g [S. foi um jog. de fut. br. ] B,g = F Luiz Arthur Pagani 9 arthur@ufpr.br

3 Problema para línguas naturais Sócrates foi um lósofo grego e Sócrates foi um jogador de futebol brasileiro Esta sentença não seria verdadeira, já que o lósofo grego nunca deve ter jogado futebol e o jogador de futebol brasileiro não pode ser considerado propriamente um lósofo; mas Sócrates só poderia ser interpretado como um ou como outro. (Algum corintiano mais exaltado poderia defender que o jogador era, sim, o maior lósofo do futebol brasileiro; de qualquer maneira, aqui basta reconhecer que ele não tem qualquer artigo em publicação avaliada no Qualis da Filosoa). No entanto, ela parece ser verdadeira. Luiz Arthur Pagani 10 arthur@ufpr.br

4 Solução trivial A sentença seria verdadeira se as ocorrências de Sócrates fossem nomes diferentes: o primeiro se referindo ao professor de Alexandre que morreu bebendo sicuta, e o segundo ao ex-jogador corintiano que morreu por complicações causada por uma cirrose (ambos tiveram os seus problemas com bebida): Sócrates 1 foi um lósofo grego e Sócrates 2 foi um jogador de futebol brasileiro Contudo, esta alternativa é apenas uma postulação e não tem nenhuma força explicativa: não parece haver qualquer motivação linguística que justique a existência de dois nomes próprios Sócrates diferentes. (A que testes empíricos poderíamos recorrer para justicar esta postulação?) Luiz Arthur Pagani 11 arthur@ufpr.br

5 Solução formal Outra solução pode ser buscada na semântica dinâmica [2, 1]. 5.1 Novas regras para interpretação conjunção: [α e β ] X,Y,g = [α] X,Z,g [β ] Z,Y,g sentença: [α β ] X,Y,g = [α] X,Y,g [β ] Y,Y,g ([α] X,Y,g [β ] Y,Z,g?) predicado: [α] X,X,g = conjunto de indivíduos referido pelo predicado α na estrutura X nome próprio: [α] Y,X,g = indivíduo referido pelo nome próprio α na estrutura X Luiz Arthur Pagani 12 arthur@ufpr.br

5.2 Avaliação dinâmica [Sócrates foi um l. gr. e Sócrates foi um jog. de fut. br. ] X,Y,g = [Sócrates foi um l. gr. ] X,Z,g [Sócrates foi um jog. de fut. br. ] Z,Y,g [Sócrates foi um l. gr. ] X,Z,g = [Sócrates ] X,Z,g [foi um l. gr. ] Z,Z,g = V, sse Z = G [Sócrates foi um jog. de fut. br. ] Z,Y,g = [Sócrates foi um jog. de fut. br. ] G,Y,g = [Sócrates ] G,Y,g [foi um jog. de fut. br. ] Y,Y,g = V, sse Y = B Luiz Arthur Pagani 13 arthur@ufpr.br

Portanto, a sentença complexa Sócrates foi um lósofo grego e Sócrates foi um jogador de futebol brasileiro é verdadeira quando: sua primeira subsentença for avaliada na estrutura G o que é determinado pela referência de Sócrates, junto com a de foi um lósofo grego (este predicado aplicado à interpretação de Sócrates em B é falso) e a segunda subsentença for avaliada na estrutura B novamente pela referência de Sócrates, agora junto com a de foi um jogador de futebol brasileiro (este predicado aplicado à interpretação de Sócrates em G é falso) A estrutura com que se inicia a avaliação acaba não afetando em nada a interpretação, que é determinada apenas pela identicação do `Sócrates' adequado para as respectivas predicações (uma coisa que só depende da relevância de cada uma das sentenças) Luiz Arthur Pagani 14 arthur@ufpr.br

6 Conclusões [foi um lósofo grego ] B,g? [foi um jog. de fut. br. ] G,g? Questão da determinação das estruturas (como sabemos o que faz e o que não faz parte de uma estrutura). Todo homem é mortal. Sócrates i é homem. Sócrates i/ j é mortal. Designação rígida [4]: inicialmente me pareceu exemplo contrário, mas não é; cada nome sempre denota um mesmo indivíduo em cada estrutura. Proposta nova (não estava em [2, 1], nem tãopouco em [3]). Ainda em fase inicial (interesse e auxílio são bem vindos). Luiz Arthur Pagani 15 arthur@ufpr.br

Referências [1] Paul J. E. Dekker. Dynamic Semantics. Springer, Dordrecht, 2012. [2] Jeroen Groenendijk and Martin Stokhof. Dynamic predicate logic. Linguistics and Philosophy, 14(1):39100, 1991. [3] Hans Kamp and Uwe Reyle. From Discourse to Logic Introduction to Modeltheoretic Semantics of Natural Language, Formal Logic and Discourse Representation Theory. Kluwer, Dordrecht, 1993. [4] David Kaplan. Demonstratives. In Joseph Almog, John Perry, and Howard Wettstein, editors, Themes from Kaplan, pages 481563. Oxford University Press, Oxford, 1989. [5] Cezar A. Mortari. Introdução à Lógica. Editora UNESP & Imprensa Ocial do Estado, São Paulo, 2001. Luiz Arthur Pagani 16 arthur@ufpr.br