Resumo. Palavras-chave: Educação Física. Dependência química. Multidisciplinaridade. Anais do Encontro Nacional de Recreação e Lazer
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- Juan Mendonça Pinto
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1 * Graduando em Educação Física pelo Instituto Mairiporã de Ensino Superior (Imensu). ** Doutorando em Lazer pela Escola de Fisioterapia, Educação Física e Terapia Ocupacional da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Docente do Instituto Mairiporã de Ensino Superior (Imensu) A inserção do profissional de Educação Física na visão de profissionais atuantes em centros clínicos de recuperação de dependentes químicos: um estudo de caso no município de Mairiporã (SP) Nelson Mendes de Souza Neto,* Denis Terezani** Resumo O obetivo central do presente trabalho consiste em fundamentar e discutir os resultados da inserção do profissional de Educação Física em equipes intermultidisciplinares durante o tratamento de dependentes químicos, na visão dos profissionais que já integram estas equipes. O estudo é fruto da combinação de pesquisa bibliográfica e de campo, de caráter qualitativo, e se constitui como um estudo de caso, valendo-se pelo critério de acessibilidade e representatividade, realizado em cinco clínicas do município de Mairiporã, região metropolitana de São Paulo. Para tanto, foram entrevistados 20 profissionais, sendo cinco proprietários responsáveis pelas clínicas, cinco psicólogos, cinco enfermeiros e cinco conselheiros monitores, totalizando 16 homens e quatro mulheres. Ressaltamos que dentre as cinco clínicas visitadas, apenas duas apresentavam profissionais de Educação Física no seu quadro profissional. Os entrevistados alegaram ser extremamente positiva a atuação do profissional de Educação Física no quadro multi-interdisciplinar, nessa mesma perspectiva, destacaram principalmente que as atividades físico esportivas otimizam o quadro comportamental do dependente, contribuindo diretamente para a reestruturação dos aspectos fisiológicos, psicológicos, sociais e terapêuticos. Palavras-chave: Educação Física. Dependência química. Multidisciplinaridade.
2 Introdução A aventura pode ser louca, mas o aventureiro para levá-la a cabo, há de ser equilibrado (Charles Chaplin). Ao longo das últimas décadas o uso e abuso do consumo de drogas demonstramse cada vez mais evidentes tornando-se difícil imaginar a erradicação de tal fato, dentro de um curto espaço de tempo, principalmente se não atrelados aos mais distintos segmentos da nossa sociedade. Diante das circunstâncias, acrescidas pelas inúmeras questões que circundam o universo do consumo de drogas, nossos olhares voltam-se especificamente para a inserção do profissional de Educação Física, como uma das vertentes na contribuição do árduo processo de recuperação pelo qual passa o dependente, entendendo-a enquanto uma área a ser integrada a um amplo leque de profissões que agem em prol do ser humano, que procura se abster do consumo compulsivo e descontrolado de entorpecentes. Portanto, as justificativas para o presente estudo se delineiam após constatarmos, durante a realização do levantamento bibliográfico, que na maioria dos casos as atividades de caráter físico esportivas não são orientadas por Educadores Físicos, mas por voluntários ou enfermeiros, provocando uma imensa lacuna profissional a ser suprida. Este fato comprovou-se com a pesquisa de campo, pois, dentre as cinco clínicas visitadas, apenas duas apresentavam profissionais de Educação Física no seu quadro profissional. Em contrapartida, se almejamos a inserção da Educação Física em ações multidisciplinares, com perspectivas interdisciplinares, torna-se relevante nos debruçarmos sobre esta questão, valorizando as mais distintas competências profissionais, que de forma integrada atuem em prol da recuperação do dependente. Objetivos O objetivo do estudo consiste em fundamentar e discutir os resultados da inserção do profissional de Educação Física em equipes inter-multidisciplinares durante o tratamento de dependentes químicos. Metodologia O estudo é fruto da combinação de pesquisa bibliográfica (SEVERINO, 2000) e de campo (RUDIO, 2003), de caráter qualitativo, se constitui como um estudo de caso (BRUYNE; HERMAN; SCHOUTHEETE, 1991), valendo-se pelo critério de acessibilidade e representatividade, dessa forma, cinco clínicas do município de Mairiporã (SP) delimitaram o universo da pesquisa. Por meio de questionário constituído por uma pergunta aberta, repassamos a quatro profissionais, vinculados a cinco clínicas de recuperação. Os profissionais escolhidos foram: proprietários responsáveis pelas clínicas, psicólogos, enfermeiros e monitores conselheiros. Estivemos pessoalmente nas cinco clínicas no período de 8 a 19 de julho de 2013, efetuando a seguinte pergunta: Qual a relevância da inserção do Educador Físico em uma equipe inter-multidisciplinar durante o tratamento do dependente químico? As respostas foram coletas e posteriormente analisadas, evidenciando categorias fundamentadas com base na revisão bibliográfica. Salientamos que artigos disponíveis na rede mundial de computadores complementaram a revisão, contudo, foram selecionadas as publicações dos últimos dez anos, de acordo com as palavras-chave da língua portuguesa: exercício físico, atividade física, dependência química, compulsão, autoestima. Durante o levantamento, nos servimos também da língua inglesa, pelas seguintes palavras: exercise, drug dependence e physical activity. Ainda para maiores aprofundamentos, optamos pela composição exercício físico e dependência química. O estudo caracteriza-se como de caso, com base no modo de investigação proposto por Bruyne, Herman e Schoutheete (1991), que o define como: [...] um caráter particularizante e seu poder de generalização é limitado na medida em que a validade de suas conclusões permanece contingente. Essas conclusões não se revelam necessariamente corretas em outros casos, mesmo semelhantes, e fontes de diferenças distintas das contidas no caso escapam inteiramente à análise (BRUYNE; HERMAN; SCHOUTHEETE, 1991, p. 227). Nossas ações são impulsionadas pela grande lacuna existente no processo de tratamento de dependentes químicos, pelo fato de o profissional de Educação Física pouco se fazer presente em clínicas especializadas de tratamento, apesar de afirmarem, e consequentemente necessitarem de profissionais que atuem com ações integradas valorizando a multi-interdisciplinaridade.
3 Fundamentação teórica Classificada pela medicina como doença biopsicossocial, a substância química promove agressão ao corpo do dependente, mas manifesta-se de diferente formas, devido à individualidade biológica do usuário, propriedade tóxica da substância, quantidade consumida e o histórico de utilização. Portanto, cada usuário em recuperação deve ser entendido de forma singular ao receber indicação para realizar a prática de atividade física (tipo de exercício, duração e intensidade), respeitando suas capacidades biológicas, e também suprindo as necessidades do respectivo dependente. A Organização Mundial da Saúde (OMS) possui um Código Internacional de Doenças com a finalidade de classificá-las facilitando sua posterior identificação. Assim, o código CID-10 (F10-F19) refere-se à dependência química como uma enfermidade incurável e progressiva, apesar de poder ser estagnada pela abstinência. Portanto, o relatório da OMS (2011) a define como: Conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos que se desenvolvem após repetido consumo de uma substância psicoativa, tipicamente associado ao desejo poderoso de tomar a droga, à dificuldade de controlar o consumo, à utilização persistente apesar das suas conseqüências nefastas, a uma maior prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras atividades e obrigações, a um aumento da tolerância pela droga e por vezes, a um estado de abstinência física. A síndrome de dependência pode dizer respeito a uma substância psicoativa específica (por exemplo, o fumo, o álcool ou o diazepam), a uma categoria de substâncias psicoativas (por exemplo, substâncias opiáceas) ou a um conjunto mais vasto de substâncias farmacológicas. No entanto, equivocam-se aqueles que imaginam que a recuperação do dependente químico representa apenas o período de internação em clínicas ou comunidades terapêuticas. A internação é um tipo de tratamento indicado quando o adicto necessita de um ambiente mais estruturado e seguro, quando sua agressividade implica riscos a sua integridade física e para os outros, necessidade de interromper uma situação extrema que reforça o uso da droga, ausência de apoio psicossocial que possa facilitar o início da abstinência, complicações orgânicas devido ao uso de drogas ou até mesmo sua supressão. O tipo de tratamento escolhido deve variar de acordo com a gravidade do uso e dos recursos disponíveis para o encaminhamento. Os modelos de tratamentos cientificamente recomendados são desintoxicação, grupo de autoajuda, comunidades terapêuticas, tratamentos farmacológicos, tratamentos psicossociais, entrevista motivacional, aconselhamento, intervenção breve, terapia cognitiva comportamental (TCC) e prevenção à recaída, terapia de grupo, terapia de família e redução de danos. Portanto, entendemos que estudar esta questão representa um avanço para as questões pertinentes a inserção do profissional de Educação Física, entendendo-a enquanto componente de um quadro multi-interdisciplinar no tratamento da dependência química. Resultados e discussões Após a coleta e análise do questionário, evidenciamos as seguintes categorias: Aspectos Fisiológicos-Psicológicos, Sociais e Terapêuticos. Para os aspectos fisiológicos os profissionais entrevistados atestaram que a inserção de atividades físico esportivas, mediadas por Educadores Físicos, contribuiriam para acelerar a desintoxicação, recuperar a motricidade dos reflexos, como auxiliar no controle do peso corporal, consequentemente, oportunizariam melhoras no quadro físico e mental dos dependentes. Sobre o controle do peso corporal, esta questão destacou-se unânime entre os entrevistados, pois, durante o processo de recuperação da degradação física causada pelo uso e abuso de entorpecentes, o ganho de peso torna-se evidente, na maioria das vezes rápido e excessivo. Considerando em um primeiro momento as individualidades antropométricas e fisiológicas do dependente, em boa parte dos casos é notável o sobrepeso, e em alguns internos, o índice de massa corporal chega a caracterizar-se como obesidade. Com o passar do tempo esta situação pode agravar o aspecto psicológico, prejudicando a autoestima, devido à mudança repentina dos padrões estético corporais, como bem mencionou um conselheiro monitor: [...] com a abstinência das drogas há uma migração da sua compulsão para a sua alimentação, com o passar de 15 dias o paciente atinge o seu peso ideal, há casos de rápida obesidade. Em alguns casos, o paciente nota seu ganho de peso e por várias vezes opta por realizar atividade física.
4 Outro sintoma muito frequente no grupo de adictos em recuperação é a insuficiência cardíaca, segundo Rondon et al. (2000) a atividade física mais indicada é a prescrição de exercícios aeróbios cíclicos que envolvam grandes grupos musculares. Para contribuir na recuperação deste quadro a atividade física deve ser conduzida de forma sistemática, planejada e progressiva, sendo possível constatar em poucas semanas resultados expressivos. A prática regular de atividades físicas deve se constituir em hábito diário, procurando substituir o sedentarismo presente em boa parte dos dependentes. Dando prosseguimento, para as questões psicológicas os entrevistados apontaram o resgate da autoestima, autoimagem e a retomada de valores sociais, o controle da ansiedade e depressão mostrou-se bastante presente, como também a sensação de utilidade. Ainda com base nos aspectos psicológicos, detectamos nas respostas a necessidade da orientação profissional para o controle da compulsão, ou seja, durante o período de internação, e durante o tratamento que se estenderá por toda a vida, é comum existir a transferência da compulsão da droga por outra atividade (seja ela de qualquer natureza), não sendo diferente com a prática de atividade física, ou como afirmou um dos psicólogos [...] é bom para manter a disciplina, lidar com paciência, frustração e imediatismo dos resultados. Preocupação com a substituição do vício (de entorpecentes) pelo vicio da atividade física e aumento do narcisismo. As contribuições sociais apresentadas pelos profissionais foram: ajuda no trabalho em grupo, criação de hábitos positivos e a reinserção à sociedade, em suma, a resposta de um monitor conselheiro evidenciou a preocupação com o quadro comportamental in loco do dependente: [...] as atividades físicas esportivas são ótimas para avaliação do quadro comportamental, ficam evidentes características como manipulação, egocentrismo, liderança, aceitação de limites, entre outras. Este comportamento é aproveitado na análise terapêutica junto aos demais profissionais. Já para as questões terapêuticas, constamos que se implantadas, as atividades físico-esportivas se apresentarão como práticas prazerosas, na maioria dos casos, sendo entendidas pelos dependentes como práticas associadas ao lazer, otimizando a avaliação do quadro comportamental. Por certo, os resultados podem ser analisados por toda equipe multidisciplinar, ou como bem salientou um dos proprietários, ao afirmar que será [...] grande a contribuição na integração do dependente com o grupo, o isolamento é característico da doença. Considerações finais O presente ensaio constatou que a totalidade dos profissionais acredita ser positiva a contribuição do Educador Físico para o processo de recuperação de dependentes químicos. Nas respostas são identificadas contribuições de ordem fisiológica, psicológica, social e terapêutica. O convívio social do dependente químico é composto por pessoas que compartilham dos mesmos interesses. Quando é feita a opção pela abstinência, o dependente deve evitar lugares e pessoas que representem riscos e possibilidades de recaída. Neste momento, se faz necessária a criação de uma nova rede social que o acompanhe nesta nova fase de sua vida. Nessa trajetória, a resposta de um dos enfermeiros se mostrou pertinente ao objetivo do nosso estudo: [...] O paciente precisa de algo que lhe traga prazer e aumente a sua autoestima, sendo assim o esporte (atividade físico-esportiva) é essencial, fazendo com que o paciente saia deste quadro depressivo que na maioria dos casos acontece. Por fim, consideramos que um trabalho inter-multidisciplinar envolvendo a área da Educação Física oferecerá grandes contribuições durante toda a recuperação do dependente químico, valendo-se num primeiro momento da oferta da prática de atividades físico esportivas, e consequentemente, por entender que a internação será o início de um processo que se estenderá ao longo de toda vida do dependente, no qual o mesmo deverá autogerir seu tempo de lazer propiciando desenvolvimento social e pessoal, descanso e diversão.
5 Referências BRUYNE, P.; HERMAN, J.; SCHOUTHEETE, M. Dinâmica da pesquisa em ciências sociais. 5. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Relatório anual de saúde. Genebra, Disponível em: < Acesso em: 12 nov RONDON, M. U. P. B. et al. Exercício físico e insuficiência cardíaca. Revista Sociologia e Cardiologia Estado de São Paulo, São Paulo, v. 10, n. 1, jan./fev RUDIO, F. Introdução ao projeto de pesquisa científica. 31. ed. São Paulo: Vozes, SEVERINO, Antônio J. Metodologia do trabalho científico: aspectos técnicos da redação. 21. ed. São Paulo: Cortez, 2000.
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