PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ACÓRDÃO

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de Santos, em que é apelante RONDNEY NOGUEIRA PRATES PEREIRA, é apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. ACORDAM, em 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores GUILHERME DE SOUZA NUCCI (Presidente), LEME GARCIA E BORGES PEREIRA. São Paulo, 11 de agosto de Guilherme de Souza Nucci RELATOR Assinatura Eletrônica

2 Apelação nº Comarca: Santos Apelante: RONDNEY NOGUEIRA PRATES PEREIRA Advogado: Tânia Cristina Oliveira dos Santos VOTO Nº Apelação. Lesão Corporal, dano, resistência e posse de droga para uso próprio. Alegada fragilidade probatória. Não ocorrência. Réu silente em solo policial e revel em juízo. Três milicianos a corroborar integralmente a versão acusatória. Condenação mantida. Alegada descriminalização do art. 28 da Lei de Drogas. Não ocorrência. Simples desencarceirização que não afasta a tipicidade penal. Lesão corporal grave. Desclassificação para leve. Impossibilidade. Perda de um dente. Debilidade da função mastigatória. Necessidade de implante dentário. Penas postas no mínimo legal e assim tornadas definitivas. Fixado o regime aberto e suspensa a execução nos termos do art. 78, 1º, do CP. Apelo improvido. Pela sentença de fls. 132/134v, proferida em 16/10/2013 pelo MM. Juiz de Direito, Dr. Walter Luiz Esteves de Azevedo, da 5ª Vara Criminal da Comarca de Santos, RONDNEY NOGUEIRA PRATES PEREIRA foi condenado à pena de 1 ano de reclusão, como incurso no art. 129, 1º, inciso III, do Código Penal; à pena de 6 meses de detenção, e pagamento de 10 dias-multa, como incurso no art. 163, parágrafo único, III, do Código Penal; à pena de 2 meses de detenção, por Apelação nº

3 infração ao art. 329, 2º, também do Código Penal; e à pena de advertência sobre os efeitos nocivos da droga, em razão da infração ao art. 28 da Lei /06. Foi fixado o regime inicial aberto para desconta da pena privativa de liberdade. A execução da reprimenda foi suspensa mediante o cumprimento das condições previstas no art. 78, 1º, do Diploma Penal. Irresignada, a defensoria do réu maneja recurso de apelação, alegando haver a Lei /06 descriminalizado o porte de droga para uso próprio. Quanto aos demais crimes, sustenta fragilidade probatória. Subsidiariamente, em relação à lesão corporal, requer a desclassificação para lesão leve (fls. 144/155). O Ministério Público se bateu pelo acerto do decisum (fls. 165/171) e a Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo improvimento do recurso (fls. 202/205). É o relatório. Segundo consta, em 05/03/2013, policiais militares realizavam patrulhamento de rotina, ocasião na qual observaram o apelante em atitude suspeita. Ao se aproximarem, o acusado empreendeu fuga, tendo os milicianos partido em seu encalço. Ato contínuo, o réu muniu-se com um pedaço de madeira e resistiu à abordagem. Foi solicitado auxílio de outra viatura, tendo o acusado arremessado o pedaço de madeira contra a mesma, danificando-a ao lado do passageiro. Uma terceira viatura seguiu em seu encalço, ocasião na qual o acusado, munido com dois pedaços Apelação nº

4 de vidro, arremessou-os contra os milicianos, novamente danificando o automóvel. Quando finalmente abordado, o apelante resistiu à prisão, quebrando um dente do policial militar Levy, sendo necessário uso moderado de força para contê-lo. Em busca pessoal, foi encontrado no bolso de sua bermuda um pequeno tablete prensado de maconha. Interrogado em solo policial, o acusado valeu-se de seu direito constitucional ao silêncio. Em juízo, embora devidamente intimado, deixou de comparecer a seu interrogatório. Os milicianos Levy e Marcos narraram os fatos exatamente como constam da denúncia. Narraram estar em patrulhamento em local conhecido como ponto de venda de drogas, quando visualizaram o réu, o qual empreendeu fuga ao perceber a presença policial. Ao se aproximarem do acusado, o mesmo apoderou-se de um pedaço de madeira a fim de evitar a abordagem. Os policiais pediram reforços e quando segunda viatura se aproximou pelo lado oposto da rua, o apelante arremessou o pedaço de madeira em direção a esta, danificando-a. Em seguida, atirou pedaços de vidro contra outra viatura. O réu novamente empreendeu fuga, sendo abordado nas proximidades de um bar. Nesse instante, o Apelação nº

5 acusado desferiu um soco em direção ao rosto do policial Levy, quebrando um de seus dentes dianteiros. Sobre este ponto, Levy relatou ter sido necessária a realização de uma cirurgia para o implante de pinos e prótese. Por fim, narraram que o acusado estava portando pouca quantidade de maconha, provavelmente para uso próprio. A testemunha Fábio, por sua vez, disse estar em patrulhamento quando foi acionado por colegas de fardas que solicitaram apoio. Chegando ao local indicado, foi surpreendido por um indivíduo que arremessou uma pedaço de madeira em direção à sua viatura. O acusado, então, empreendeu fuga, sendo necessário que o automóvel efetuasse um retorno. Após efetuar a manobra o acusado já estava sendo imobilizado e o policial Levy já havia sido atingido no rosto pelo apelante. Desta feita, note-se inexistir nos autos qualquer elemento de prova a contrariar a versão acusatória. Ao contrário, a mesma é corroborada pelo prontuário médico (fl. 17), laudo de exame de corpo de delito (fl. 51), laudos periciais (fls. 54/66) e exame químico toxicológico (fl. 85). Assim, não se há falar em fragilidade probatória. Também não prevalece a alegação de não constituir o art. 28 da Lei de Drogas infração penal. Em verdade, a Lei /06 optou, Apelação nº

6 apenas, por afastar a possibilidade de aplicação de pena privativa de liberdade aos usuários de droga. Tal opção legislativa possui nítida natureza de política criminal do Estado, o qual entende pela desnecessidade de aplicação de severa reprimenda à pessoa que não trafica do entorpecente. Entendeu o legislador não ser a pena privativa de liberdade adequada para prevenir o uso de drogas, merecendo o usuário tratamento diverso, tratamento este destinado, no mais das vezes, a impedir a reincidência através de medidas educativas. Tal abordagem diferenciada para o usuário, entretanto, não se mostra como mero projeto social, mas sim como efetiva sanção penal, de aplicação e cumprimento obrigatórios. Desta feita, o art. 28 não perdeu sua natureza de crime. Quanto à lesão corporal, não se há falar em desclassificação para lesão de natureza leve. Conforme se verifica dos exames acostados aos autos, o policial Levy perdeu um de seus dentes dianteiros, sendo necessária a colocação de pinos e prótese. Os dentes integram o sistema mastigatório, o qual, por sua vez, faz parte do sistema digestivo. A necessidade de implante dentário evidencia a debilidade permanente da função mastigatória, sendo de rigor a manutenção da condenação pela lesão de natureza grave. As penas também não comportam Apelação nº

7 reparos. Favoráveis as circunstâncias judicias, as básicas foram postas no patamar mínimo para todos os crimes. Inexistem circunstâncias agravantes e atenuantes ou causas de aumento ou diminuição, motivo pelo qual as reprimendas tornam-se definitivas em 1 ano de reclusão para o delito de lesões corporais; 6 meses de detenção e pagamento de 10 dias-multa pelo delito de dano ao patrimônio público; 2 meses de detenção pelo crime de resistência; e advertência para a infração de posse de drogas para uso próprio. A somatória das pena privativas de liberdade perfazem 1 ano e 8 meses, motivo pelo qual foi corretamente fixado o regime inicial aberto. Por fim, a execução da pena privativa foi suspensa mediante o cumprimento das condições previstas no art. 78, 1º, do Diploma Penal, tudo a desmerecer reparos. Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao apelo defensivo, mantendo-se, na íntegra, a r. sentença atacada. GUILHERME DE SOUZA NUCCI Relator Apelação nº