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1 24 /S3 volume 24 suplemento 3 1º Semestre de 2014 issn X MM G RRevista Médica de Minas Gerais SUPLEMENTO DA SOCIEDADE DE ANESTESIOLOGIA DE MINAS GERAIS º Semestre

2 Expediente Uma publicação do INSTITUTO DE ENSINO E PESQUISA EM SAÚDE (IEPS) Conselho Curador (mandato 2012/2014): Lincoln Lopes Ferreira (AMMG) Presidente Helton Freitas (UNIMED BH) Vice-presidente Amélia Maria Fernandes Pessôa (Sinmed) Francisco José Penna (Faculdade de Medicina da UFMG) João Batista Gomes Soares (CRM-MG) Lucas Vianna Machado (FCMMG-Feluma) Marcelo Gouveia Teixeira (SMSa-PBH) Conselho Diretor (mandato 2010/2014): Lincoln Lopes Ferreira Diretor Presidente Amélia Maria Fernandes Pessôa Diretor Vice-presidente Helton Freitas Diretor Administrativo-Financeiro Conselho Fiscal (mandato 2010/2014): Ciro José Buldrini Filogonio Cristiano Gonzaga da Mata Machado Lucas Vianna Machado Mantenedoras/Apoio: Associação Médica de Minas Gerais AMMG Cooperativa Editora e de Cultura Médica Ltda COOPMED Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais CRM-MG Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais FCMMG Faculdade de Medicina da UFMG FM/UFMG Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais SES/MG Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte SMSa/BH Sindicato dos Médicos do Estado de Minas Gerais SINMED-MG Unimed-BH Cooperativa de Trabalho Médico Ltda UNIMED-BH Conselho Gestor da RMMG: Amélia Maria Fernandes Pessôa (Sinmed) Cláudio de Souza (CRM-MG) Francisco José Penna (FM-UFMG) Helton Freitas (Unimed) José Ricardo de Paula Xavier Vilela (Coopmed) Luciana Costa Silva (AMMG) Lucas Viana Machado (FCMMG) Marcelo Gouveia Teixeira (SMSa-BH) Editor Geral: Enio Roberto Pietra Pedroso Editor Administrativo: Maria Piedade Fernandes Ribeiro Leite Revisores: Magda Barbosa Roquete de Pinho Taranto (Português) Maria Piedade Fernandes Ribeiro Leite (Normalização) Maria Rita Dumond Viana (Inglês) Produção Editorial: Folium Tiragem: 1000 exemplares Indexada em: LILACS-Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde; PERIÓDICA-Índice de Revistas Latinoamericanas; LATINDEX Sistema Regional de Información em Línea para revistas Científicas da América latina, El Caribe y Portugal. ISSN: X e-issn: Disponível em: Faculdade de Medicina da UFMG: < Biblioteca Universitária da UFMG: < Portal de Periódicos CAPES: < Afiliada à Associação Brasileira de Editores Científicos (ABEC) Início da Publicação: v.1, n.1, jul./set Periodicidade: Trimestral Normas para publicação, instruções aos autores e submissão de manuscritos estão disponíveis em: < Correspondências e Artigos: Revista Médica de Minas Gerais Faculdade de Medicina da UFMG Av. Prof. Alfredo Balena, 190 Sala 12. CEP: Belo Horizonte, MG Brasil. Telefone: (artigos): editoria.rmmg@medicina.ufmg.br Submissão de artigos:

3 24 /S3 Editorial Mensagem dos Coordenadores Revista Mineira de Anestesiologia DOI: / S009 Nossa compreensão de coagulopatia no perioperatório, ferramentas de diagnóstico e abordagens terapêuticas tem evoluído nos últimos anos. São necessários esforços multidisciplinares para entender as combinações ideais, relação custo-eficácia e perfil de segurança de componentes alogênicos do complexo protrombínico 1 e antifibrinolíticos. A gestão da anticoagulação de qualquer doente crítico é problemática. Todos os agentes anticoagulantes podem causar sangramento e os pacientes são anticoagulados por um problema específico, que merece atenção especial. 2 Esta primeitra edição de 2014 da Revista Mineira de Anestesiologia dá ênfase especial ao manejo dos pacientes em uso de medicações antitrombóticas, quando e como utilizar o arsenal terapêutico disponível, além da avaliação laboratorial complementar ou à beira da mesa de cirurgia. O complexo protrombínico, assunto em todas as discussões sobre reversão da anticoagulação, é minuciosamente detalhado nesta edição, com as suas indicações precisas e as indicações por enquanto ainda offlabel. São apresentados, ainda, artigos que discutem o bloqueio do neuroeixo e suas complicações em pacientes em terapia antitrombótica. A fisiologia da hemostasia e os aspectos práticos dos testes de coagulação realizados no laboratório, testes de coagulação viscoelásticos e outros efetuados à beira do leito no diagnóstico de coagulopatia perioperatória são perfeitamente detalhados no artigo escrito por Walkíria Vilas Boas e Gustavo de Oliveira. Finalizando, no artigo sobre Reversão de Urgência da Anticoagulação, é apresentada bem detalhada uma tabela, seguindo as recomendações atuais, com as condutas a serem observadas ante um quadro ameaçador à integridade do paciente. Temas variados e muito frequentes em centros cirúrgicos são expostos com o objetivo de orientar a nossa conduta frente a situações que podem trazer dúvidas. Anestesia em usuários de crack e cocaína, assim como o ambiente látex free, é cada vez mais corriqueiro e muitas vezes não ganha a atenção merecida. Luciana de Souza Cota Carvalho Laurentys Marcel Andrade Souki Coordenadores Revista Mineira de Anestesiologia Referências 1. Tanaka KA, Bader SO, Görlinger K. Novel approaches in management of perioperative coagulopathy. Curr Opin Anaesthesiol. 2014; 27(1): Levy JH. Role of coagulation factor concentrates for reversing dabigatran-related anticoagulation. Anesthesiology. 2014; 120:

4 24 /S3 sumário Capa: Logomarca da Sociedade de Anestesiologia de Minas Gerais Editorial 1 Mensagem dos Coordenadores Revista Mineira de Anestesiologia Luciana Laurentys Marcel Andrade Souki Artigos de Revisão 4 Anestesia na gestante cardiopata Anesthesia on cardiac pregnant patients Eliane Cristina de Souza Soares Carlos Othon Bastos Maria Cecília Lessa Beloni 9 Anestesia na gestante portadora de estenose mitral Anesthesia in pregnant women with mitral stenosis Eliane Cristina de Souza Soares Carlos Othon Bastos Rachel de Andrade Ivo 14 Anestesia no paciente usuário de crack e cocaína Anesthesia in patients who are users of crack and cocaine Cláudio Henrique Corrêa Leonardo Saraiva Guimarães de Oliveira José Eduardo Alves de Assis Rafael Teixeira Corrêa de Barros 20 Monitorização da coagulação sanguínea perioperatória Perioperative blood coagulation monitoring Walkíria Wingester Vilas Boas Gustavo Henrique Silva de Oliveira 30 Anticoagulantes e bloqueios do neuroeixo Anticoagulants and neuraxial blockade Estefânia Furtado Rocha Gabriela Ferreira Duarte Marcela Morais Afonso Cruz Gisela Magnus 37 O Concentrado de Complexo Protrombínico e suas aplicações na sala de cirurgia Prothrombin Complex Concentrate and its applications in the operating room Erick Martins Faria de Abreu Leonardo Saraiva Guimarães de Oliveira Pablo Martins Biagioni de Menezes Jaci Custódio Jorge 49 Reversão de urgência da anticoagulação Urgent reversal of anticoagulation Igor Neves Afonso Castro Rafael Coelho Tibúrcio Marcel Andrade Souki Relato de Caso 60 Ambiente látex seguro: relato de dois casos Latex safe environment: report of two cases Renato Machado Coelho Filho Cláudia Helena Ribeiro Silva Wirleyde Mattos Leão Núbia Campos Faria Isoni Marcelle Mafra de Queiroz Magna Adaci de Quadros Coelho 2 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S1-S88

5 68 Analgesia para toracotomia com cateter multiperfurado e bomba elastomérica: relato de caso Analgesia for thoracotomy with multi-perforated catheters and elastomeric pump: case report Flávia Aparecida Resende Maria Beatriz Assumpção Mourão Bárbara Sanches Cardoso Allevato Bráulio Antônio Maciel de Faria Mota Oliveira Celso Homero Santos Oliveira Sérgio Ricardo Botrel e Silva 73 Choque neurogênico e posicionamento após trauma raquimedular Neurogenic shock and positioning after spinal cord injury Ana Paula Almada Michelle Nacur Lorentz Bruna Silviano Brandão Vianna 77 Manejo anestésico de paciente com trauma cranioencefálico em uso de clopidogrel: relato de caso e revisão de literatura Anesthetic management of a patient with traumatic brain injury in use of clopidogrel: case report and literature review Daniella Semino Tavares Patrícia Rodrigues da Silva Luciana de Souza Cota Carvalho Laurentys Literatura Sugerida 83 Management of bleeding and coagulopathy following major trauma: an updated European guidelin 83 Prophylactic phenylephrine for caesarean section under spinal anaesthesia: systematic review and meta-analysis 84 Anesthetic induction with etomidate, rather than propofol, is associated with increased 30-day mortality and cardiovascular morbidity after noncardiac surgery 84 Comparison of the effects of albumin 5%, hydroxyethyl starch 130/0.4 6%, and Ringer s lactate on blood loss and coagulation after cardiac surgery 85 Clinical review: What are the best hemodynamic targets for noncardiac surgical patients? corpo editorial do Suplemento SAMG COORDENADORES Dr. Marcel Andrade Souki Dr. Luciana de Souza Cota Carvalho Laurentys MEMBROS Dra. Bruna Silviana Brandão Vianna Dra. Roberta Ferreira Boechat Dr. Luciano Costa Ferreira Dr. Wellington de Souza Silva Dr. Gisela Magnus Dr. Thiago Gonçalves Wolf Dra. Raquel Rangel Costa Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S1-S88 3

6 ARTIGO DE REVISÃO Anestesia na gestante cardiopata Anesthesia on cardiac pregnant patients Eliane Cristina de Souza Soares 1, Carlos Othon Bastos 2, Maria Cecília Lessa Beloni 3 DOI: / S010 RESUMO 1 Médica. Anestesiologista do Hospital Mater Dei e Professora Assistente do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais UFMG. Belo Horizonte, MG Brasil. 2 Médico Anestesiologista. Título Superior em Anestesiologia TSA da Sociedade Brasileira de Anestesiologia SBA. Vice diretor científico Sociedade de Anestesiologia do Estado de São Paulo. Diretor científico Latin American Society of Regional Anesthesia Brasil. Responsável pela Residência Médica do Centro de Ensino e Treinamento Integrado de Campinas. Campinas, SP Brasil Responsável pela Residência Médica CET Integrado de Campinas. Vice-diretor científico SAESP. Diretor científico da LASRA Brasil. Campinas, SP Brasil. 3 Médica Residente do Serviço de Anestesiologia do Hospital das Clínicas da UFMG. Belo Horizonte, MG Brasil. As cardiopatias representam a primeira causa não obstétrica de morte materna no ciclo gravídico puerperal. Este artigo tem como objetivo apresentar os principais fatores envolvidos na predição do risco de morbimortalidade cardiovascular em gestantes cardiopatas. Os avanços obtidos ao longo dos anos no diagnóstico, tratamento e correção cirúrgica de cardiopatias permitiram significativo aumento no número de mulheres portadoras dessas doenças que alcançam a idade fértil e engravidam. Esse grupo de pacientes representa um grande desafio pelas complicações potenciais e pelo fato de que a otimização das condições maternas deve ser cuidadosamente pensada para assegurar a sobrevivência e bem-estar fetais. O cuidado dessas pacientes deve envolver uma equipe multidisciplinar com a participação do anestesiologista. E assim como ocorre em diversas outras situações em anestesia obstétrica, o trabalho em equipe e a comunicação precoce são elementos-chave para garantir a redução da morbimortalidade materna e fetal. Palavras-chave: Anestesia obstétrica; Preditores de risco; Morte materna. ABSTRACT Cardiopathies represent the first non-obstetric cause of maternal death during the pregnancypuerperal cycle. This article aims to present the main factors involved in the prediction of cardiovascular morbidity and mortality risks in pregnant women with heart disease. The progress achieved over the years in the diagnosis, treatment, and surgical correction of cardiopathies allowed for a significant increase in the number of these women who reach child-bearing age and become pregnant. This group of patients represents a major challenge because of potential complications and the optimization of maternal conditions that must be carefully designed to ensure fetal survival and well-being. The care of these patients should involve a multidisciplinary team with the participation of an anesthesiologist. Similarly to several other situations involving obstetric anesthesia, teamwork and early communication are key elements to ensure the reduction of maternal and fetal morbidity and mortality. Key words: Anesthesia, Obstetrical; Risk Factors; Maternal Mortality. INTRODUÇÃO Instituição: Hospital Mater Dei. Universidade Federal de Minas Gerais UFMG. Belo Horizonte, MG Brasil Autor correspondente: Eliane Cristina de Souza Soares elianecssoares@gmail.com As cardiopatias são a primeira causa não obstétrica de morte materna no ciclo gravídico puerperal e dados atuais mostram que 0,1 a 4% das gestações nos países ocidentais são complicadas por doenças cardiovasculares. 1-3 O espectro dessas doenças durante a gestação tem se modificado com o tempo e entre os países. A doença reumática é a principal causa de cardiopatias em gestantes nos países em desenvolvimento e entre imigrantes na população americana. Nos países desenvolvidos, 4 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S4-S8

7 Anestesia na gestante cardiopata mais da metade das gestantes cardiopatas apresenta doenças cardíacas congênitas. 1,2 Os avanços obtidos ao longo dos anos no diagnóstico, tratamento e correção cirúrgica das cardiopatias congênitas permitiram significativo aumento no número de mulheres portadoras dessas doenças que alcançam a idade fértil e engravidam. 4 As cardiomiopatias, apesar de raras, são causas importantes de complicações cardiovasculares em gestantes, sendo a cardiomiopatia periparto a causa mais comum de complicações graves. 2 As gestantes cardiopatas formam um grupo heterogêneo de pacientes, um vez que cada cardiopatia apresenta fisiopatologia e abordages terapêuticas e anestésicas específicas. 4 Esse grupo de pacientes representa grande desafio, pelas complicações potenciais e pelo fato de que a otimização das condições maternas deve ser cuidadosamente pensada para assegurar a sobrevivência e bem-estar fetais. 5 A literatura é, com apenas algumas exceções, escassa em estudos prospectivos ou randomizados referentes a este assunto, de modo que a maioria das recomendações a esse grupo de pacientes corresponde a evidências nível C (Tabela 1). Tabela 1 - Níveis de evidência Classificação Nível A Dados derivados de vários estudos clínicos randomizados ou metanálises Nível B Dados derivados de um único estudo clínico randomizado ou vários grandes estudos não randomizados Nível C Dados derivados de um único estudo clínico randomizado ou vários grandes estudos não randomizados No Brasil a incidência das afecções cardíacas no ciclo gravídico-puerperal varia de 1 a 1,5%, sendo as doenças do coração a quarta causa de óbito não obstétrico. 3 Em 55% dos casos a etiologia é reumática, com 70 a 80% dos casos representados pela estenose mitral. 3 A mortalidade materna varia entre 1 e 30% nas portadoras de cardiopatias favoráveis à gestação com classes funcionais I e II, chegando a 50% nas desfavoráveis e com classes funcionais III e IV. A mortalidade fetal varia entre 2 e 10% nas cardiopatias do grupo favorável ou até 30% no grupo desfavorável. 3 Na estimativa de risco, a avaliação pré-concepção é ideal por oferecer oportunidade de revisar cada caso de forma individualizada e, diante dos dados disponíveis, avaliar a decisão por uma gravidez que pode ser muito complicada e arriscada. 3,5 O risco gravídico compreende o risco obstétrico, o risco cardiológico e o risco de doenças associadas/preexistentes. 3 De forma geral, os guidelines publicados sobre este assunto mostram conclusões semelhantes: a avaliação, acompanhamento e aconselhamento de mulheres em idade fértil com suspeita de doença cardíaca deve começar no período pré gestacional; 3,5 o acompanhamento pré-natal deve ser realizado por equipe multidisciplinar incluindo obstetra, cardiologista e anestesiologista. 2,3 A prioridade no atendimento multiprofissional é prevenir o surgimento de complicações graves, como insuficiência cardíaca, endocardite infecciosa, edema agudo pulmonar, complicações tromboembólicas e arritmias; 3 pacientes de alto risco devem ser acompanhadas e tratadas em centros especializados; 2-4 procedimentos diagnósticos e terapêuticos devem ser realizados por profissionais com experiência na população de gestantes; 1,3,4 especialistas recomendam manejo anestésico individual de acordo com a condição cardiovascular da parturiente; 4 o parto não deve ser induzido por razões cardíacas, e sim por indicações obstétricas. 3 A avaliação inicial deve incluir dados objetivos para a estratificação, os quais são prontamente obtidos por meio de anamnese, exame físico, eletrocardiograma, ecocardiografia transtorácica e, em pacientes cianóticas, gasometria arterial. 1,3 A gestação impõe significativas mudanças hemodinâmicas e o reconhecimento precoce e seguimento das gestantes portadoras de cardiopatas melhoram a tolerância cardiovascular materna e proporcionam melhores condições ao desenvolvimento do concepto. 2,3 Há cinco principais mudanças fisiológicas durante a gestação que, em gestantes cardiopatas, podem não ser bem toleradas e resultar em complicações: 1. aumento de 50% no volume intravascular; 1,3,6 2. decréscimo progressivo da resistência vascular sistêmica, com manutenção dos níveis de pressão arterial em limites adequados a partir do aumento de 30-50% no débito cardíaco e de 15% na frequência cardíaca; 1,3,7,8 3. alterações crescentes do débito cardíaco durante o trabalho de parto e parto, associado a taquicardia e acréscimo de cerca de 500 ml de sangue à circulação materna durante as contrações uterinas e elevação abrupta do débito após clampagem do cordão umbilical e involução uterina; 1,3,7 4. redução da capacidade residual funcional, 1,3 pela redução do volume de reserva expiratório e do volume residual; Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S4-S8 5

8 Anestesia na gestante cardiopata 5. aumento da produção de vários fatores de coagulação, levando a estado de hipercogulabilidade. 1,3 De modo geral, as taxas de mortalidade materna e fetal dependem do tipo da cardiopatia, da reserva funcional de cada paciente e das medidas profiláticas e terapêuticas adotadas. 3 A definição do tipo e gravidade da lesão cardíaca ou da natureza da lesão residual ou sequela é fundamental, assim como o tipo de abordagens prévias realizadas e os medicamentos em uso atualmente. 3 A função ventricular, pressão arterial pulmonar e a hipoxemia também devem ser investigadas. Gestantes cardiopatas possuem mais chances de complicações se comparadas às gestantes hígidas, com elevado risco de deterioração da função cardíaca, arritmias e eventos isquêmicos secundários a eventos tromboembólicos. 1,3,4,8 A estimativa da capacidade funcional é valiosa e o padrão atual nessa investigação é a classificação estabelecida pela New York Heart Association (NYHA). 3,6,8,9 Tabela 2 - Classificação do Estado Funcional New York Heart Association (NYHA) 9 Classe I Assintomática Classe II Sintomática em atividades com mais esforço que o habitual Classe III Classe IV Sintomática em atividades cotidianas Sintomática em repouso Fonte: The Criteria Committee of the New York Heart Association. 9 Estudos baseados na predição de risco considerando lesões cardíacas específicas são raros, mas preditores de risco foram identificados em estudos com grandes grupos de gestantes portadoras de diferentes cardiopatias. O sistema mais conhecido e utilizado é denominado CARPREG e é baseado no estudo canadense publicado em Nesse trabalho, um sistema de pontuação foi desenvolvido e validado em um seguimento de 562 pacientes com doença cardíaca congênita ou adquirida, que receberam cuidados em centros terciários. Os resultados obtidos basearam-se na predição do risco de eventos maternos adversos, considerando edema pulmonar agudo, arritmia cardíaca sustentada, acidente vascular cerebral, parada cardíaca ou morte de origem cardiovascular. A Tabela 3 mostra os preditores de risco identificados. Cada preditor equivale a 1 ponto e a taxa de eventos adversos foi de 5% por zero ponto, 27% para um ponto e 75% para dois ou mais pontos. Tabela 3 - Preditores de risco para eventos cardiovasculares adversos estudo CARPREG 1. Cianose (SpO 2 < 90% em ar ambiente) 2. Classe Funcional NYHA III ou IV 3. Obstrução da via de saída do ventrícuo esquerdo 4. Gradiente ventrículo esquerdo/aórtico > 30 mmhg repouso 5. Área valvar mitral < 2 cm 2 6. Disfunção ventricular esquerda 7. Fração de ejeção < 40% 8. Área valvar aórtica < 1,5 cm 2 9. Evento cardiovascular prévio 10. Insuficiência cardíaca com edema pulmonar, arritmias, AVC ou AIT AVC = acidente vascular cerebral AIT = ataque isquêmico transitório, Fonte: Siu et al. 10 Embora estudos associando lesões específicas e morbimortalidade sejam normalmente pequenos e retrospectivos, com base nos dados existentes quase todas as pacientes podem ser estratificadas em grupos de risco baixo, moderado ou alto. 11,12 As Tabelas 4 e 5 mostram estratificações publicadas em 2006 e Tabela 4 - Risco de morbidade materna grave e morte associada a determinadas lesões cardíacas na gestação Baixo risco Mortalidade 0,1 a 1% Lesões cardíacas corrigidas Shunt esquerdo-direito não complicado Estenose pulmonar / Regurgitação pulmonar Regurgitação aórtica / Válvula aórtica bicúspide Regurgitação mitral / Prolapso da válvula mitral Risco Moderado Mortalidade 1 a 5% Alto Risco Mortalidade 5 a 30% Fonte: Dob, Yents. 11 Válvulas metálicas Ventrículo único Ventrículo direito sistêmico Cardiopatias cianóticas não corrigidas Estenose mitral Estenose aórtica leve a moderada Estenose pulmonar grave Classe funcional NYHA III ou IV Estenose aórtica grave História de cardiomiopatia periparto Hipertensão pulmonar (mortalidade de 30 a 50%) Síndrome de Marfan (lesão valvar ou dilatação aórtica) Disfunção ventricular esquerda grave 6 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S4-S8

9 Anestesia na gestante cardiopata Tabela 5 - Risco de mortalidade materna associada à cardiopatia na gestação Baixo Risco Mortalidade < 1% Defeito septal atrial não complicado Defeito septal ventricular não complicado Persistência do ducto arterial não Disfunção leve das válvulas tricúspide e pulmonar Tetralogia de Fallot corrigida Válvula biológica Lesões corrigidas sem disfunção cardíaca residual Prolapso de válvula mitral isolado sem regurgitação significativa Válvula aórtica bicúspide sem regurgitação significativa Regurgitação valvar com função sistólica normal Estenose mitral (Classe Funcional NYHA I e II) Risco Intermediário Mortalidade 5 a 15% Estenose mitral com fibrilação atrial Shunt esquerdo-direito intenso Válvula artificial mecânica Estenose mitral (Classe Funcional NYHA III ou IV) Estenose aórtica Estenose pulmonar grave Coarctação aórtica não corrigida Tetralogia de Fallot não corrigida Cardiopatia congênita cianótica não corrigida Infarto do miocárdio prévio Disfunção ventricular moderada a grave Síndrome de Marfan com aorta normal História de cardiomiopatia periparto sem disfunção residual Risco Alto Mortalidade 25 a 50% Hipertensão pulmonar grave Estenose aórtica grave História de cardiomiopatia periparto com disfunção residual Coarctação de aorta complicada Síndrome de Marfan com envolvimento aórtico ou valvar Fonte: Davis, Hebert. 12 Síndrome de Eisenmenger A Organização Mundial de Saúde (World Health Organization WHO) disponibiliza uma estratificação de risco modificada em 2006 que integra fatores de risco cardiovasculares considerando doenças cardíacas existentes e comorbidades associadas. 13 A novidade mostrada por essa classificação foi a inclusão de uma categoria (WHO IV) em que a gravidez é classificada como de alto risco para morbimortalidade e, portanto, contraindicada (sendo que, se já presente, autoriza discussão multidisciplinar sobre a sua interrupção). Tabela 6 - Condições classificadas como WHO Classe IV Hipertensão pulmonar grave primária ou secundária Disfunção ventricular esquerda grave (Fração de ejeção < 30% Classe Funcional NYHA III ou IV) História pregressa de cardiomiopatia periparto (com qualquer disfunção ventricular esquerda) Estenose mitral ou aórtica graves e sintomáticas Síndrome de Marfan com dilatação aórtica > 45 mm Dilatação aórtica > 50 mm em doença aórtica associada com válvula bicúspide Coarctação de aorta grave Fonte: Jastrow et al. 13. A gestante cardiopata, independentemente dos preditores de risco presentes, deve ser acompanhada pela equipe multidisciplinar a partir de uma rotina estabelecida para as situações de gravidez de alto risco. Nessa rotina, a avaliação pré-anestésica ambulatorial é altamente recomendável, permitindo precocemente a estratificação de risco, o preparo pré-operatório 1,3,5 e a discussão e conhecimento do caso pelo anestesiologista assistente. Assim como em diversas outras situações em anestesia obstétrica, isso é formalmente recomendado pelo último guideline publicado pela American Society of Anesthesiologists 14. O trabalho em equipe e a comunicação precoce são elementos-chave em gestantes cardiopatas para garantir redução de morbimortalidade materna e fetal. Gostaríamos de convidá-lo a testar os seus conhecimentos após a leitura deste artigo. Seguem abaixo cinco questões referentes ao tema abordado e o gabarito encontra-se ao final. 1. Incidência de cardiopatias no ciclo gravídico puerperal em países desenvolvidos: a. 0,04 a 1% b. 0,1 a 1% c. 0,01 a 4% d. 0,1 a 4% 2. A maior parte das recomendações relativas às pacientes portadoras de cardiopatias durante a gestação é baseada em nível de evidência: a. dados derivados de um único estudo clínico randomizado ou vários grandes estudos clínicos não randomizados b. dados derivados de vários estudos clínicos randomizados ou metanálises Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S4-S8 7

10 Anestesia na gestante cardiopata c. consenso na opinião de experts e/ou dados derivados de pequenos estudos, estudos retrospectivos ou séries /relatos de caso d. dados derivados de um único estudo clínico randomizado ou vários grandes estudos não randomizados 3. De acordo com o estudo CARPREG, são preditores de risco para eventos adversos, exceto: a. Classe funcional III ou IV b. Área valvar mitral < 2cm 2 c. História prévia de cardiomiopatia periparto com disfunção ventricular residual d. Fração de ejeção <40% 4. Lesões associadas a baixo risco de morbimortalidade cardiovascular, exceto: a. Válvula biológica b. Prolapso da válvula mitral sem regurgitação importante c. Tetralogia de Fallot corrigida d. Válvula mecânica 5. São condições consideradas WHO Classe IV, exceto: a. Fração de ejeção= 35% b. Hipertensão pulmonar grave secundária à regurgitação mitral c. Síndrome de Eisenmenger d. Estenose aórtica com estado funcional NYHA IV GABARITO 1) D 2) C 3) C 4) D 5) A REFERÊNCIAS 1. Maitra G, Sengupta S, Rudra A, Debnath S. Pregnancy and non- -valvular heart disease- Anesthetic considerations. Ann Card Anaesth. 2010; 13(2): Ayoub CM, Jalbout MI, Baraka AS. The pregnant cardiac woman. Curr Opin Anaesthesiol. 2002; 15: Moreira WR, Andrade LC. Anestesia para gestante cardiopata. Rev Med Minas Gerais. 2009;19(4 Supl1):S21-S Gomar C, Errando CL. Neuroaxial anaesthesia in obstetrical patients with cardiac disease. Curr Opin Anaesthesiol. 2005; 18: Thorne SA. Pregnancy in heart disease. Heart. 2004; 90: Klein LL, Galan HL. Cardiac disease in pregnancy. Obstet Gynecol Clin North Am. 2004; 31: Clark SL, Cotton DB, Lee W, Bishop C, Hill T, Southwick J, et al. Central hemodynamic assessment of normal term pregnancy. Am J Obstet Gynecol Dec;161(6 Pt 1): Am J Obstet Gynecol 1989; 161: Ray P, Murphy GJ, Shutt LE. Recognition and management of maternal cardiac disease in pregnancy. Br J Anaesth. 2004; 93(3): The Criteria Committee of the New York Heart Association. Nomenclature and criteria for diagnosis of diseases of the heart and blood vessels. Boston: Little Brown; Siu SC, Sermer M, Colman JM, Alvarez AN, Mercier LA, Morton BC, et al. Prospective multicenter study of pregnancy outcomes in women with heart disease. Circulation. 2001; 104: Dob DP, Yentis SM. Practical management of the parturient with congenital heart disease. Int J Obstet Anesth. 2006;15: Davies GAL, Herbert WNP. Heart disease in pregnancy Part II - Congenital heart disease in pregnancy. J Obstet Gynaecol Can. 2007;29: Jastrow N, Meyer P, Khairy P, Mercier LA, Dore A, Marcotte F, Leduc L. Prediction of complications in pregnant women with cardiac diseases referred to a tertiary center. Int J Cardiol Sep 1; 151(2): Practice guidelines for obstetric anestesia. Anesthesiology. 2007;106(4): Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S4-S8

11 ARTIGO DE REVISÃO Anestesia na gestante portadora de estenose mitral Anesthesia in pregnant women with mitral stenosis Eliane Cristina de Souza Soares 1, Carlos Othon Bastos 2, Rachel de Andrade Ivo 3 DOI: / S011 RESUMO A doença cardíaca é a principal causa não obstétrica de morte materna e sua incidência varia entre 0,1 e 4% das gestações. 1 No Brasil, 55% dos casos de cardiopatias em gestantes têm como etiologia a doença reumática, com 70 a 80% dos casos representados pela estenose mitral. A evolução da estenose mitral na gravidez envolve complicações tanto maternas quanto fetais, com incidência diretamente relacionada à gravidade da lesão. O objetivo deste artigo é revisar a fisiopatologia, quadro clínico e condução anestésica em gestantes portadoras de estenose mitral. Palavras-chave: Anestesia Obstétrica; Febre Reumática; Estenose da Valva Mitral. 1 Médica. Anestesiologista do Hospital Mater Dei e Professora Assistente do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais UFMG. Belo Horizonte, MG Brasil. 2 Título Superior em Anestesiologia TSA da Sociedade Brasileira de Anestesiologia SBA. Vice-diretor científico Sociedade de Anestesiologia do Estado de São Paulo. Diretor científico Latin American Society of Regional Anesthesia Brasil. Responsável pela Residência Médica do Centro de Ensino e Treinamento Integrado de Campinas. Campinas, SP Brasil. 3 Médica em Especialização do Serviço de Anestesiologia do CET/SBA/IPSEMG. Belo Horizonte, MG Brasil. ABSTRACT Heart disease is the leading non-obstetric cause of maternal death and its incidence varies between 0.1 and 4% of pregnancies. 1 In Brazil, the etiology for 55% of cardiopathy cases in pregnant women is rheumatic disease with 70 to 80% of cases represented by mitral stenosis. The evolution of mitral stenosis during pregnancy involves both maternal and fetal complications with incidences directly related to the severity of the injury. The purpose of this article is to review the pathophysiology, clinical presentation, and anesthetic approach in pregnant women with mitral stenosis. Key words: Anesthesia, Obstetrical; Rheumatic Fever; Mitral Valve Stenosis. INTRODUÇÃO No Brasil, a estenose mitral é a lesão valvular mais comum na gestação, sendo a doença cardíaca reumática a sua principal causa, seguida por doenças cardíacas congênitas, artrite reumatoide, lúpus e síndrome carcinoide. 1 Aproximadamente 90% de todas parturientes com doença cardíaca reumática têm estenose mitral como lesão predominante. 1 Embora a estenose mitral seja frequentemente acompanhada por algum grau de regurgitação, a morbimortalidade relacionada à gestação é usualmente ligada às consequências da estenose. 2 A área normal da válvula mitral varia entre 4 e 6 cm2 e a gravidade da estenose mitral é classificada de acordo com a área valvar (Tabela 1). 1-3 Pacientes usualmente desenvolvem sintomas quando o orifício valvar torna-se inferior a 2 cm2. 2 A gravidade da estenose mitral avaliada pela medida da área valvar pelo ecodoppler é um importante preditor de edema pulmonar. 1 Esta técnica, no entanto, tende a superestimar a área valvar e subestimar a gravidade da estenose. 1,2 Instituição: Hospital Mater Dei Belo Horizonte, MG Brasil. Autor correspondente: Eliane Cristina de Souza Soares. elianecssoares@gmail.com Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S9-S13 9

12 Anestesia na gestante portadora de estenose mitral Tabela 1 - Classificação da estenose mitral Leve Área valvar > 1,5 cm 2 Moderada Área valvar entre 1,1 e 1,5 cm 2 Grave Área valvar 1,0 cm 2 FISIOPATOLOGIA A estenose mitral pode produzir repercussões hemodinâmicas importantes, por dificultar o esvaziamento do átrio esquerdo e o enchimento do ventrículo esquerdo (Figura 1). 2 Como resultado da lesão, pode ocorrer elevação da pressão atrial esquerda, dilatação do átrio esquerdo e aumento da pressão arterial pulmonar com aumento reativo da resistência vascular pulmonar. 2 Tais alterações predispõem à formação de trombos murais intra-atriais, fibrilação atrial, dispneia, hemoptise, dor torácica e edema pulmonar. 2 A incidência de fibrilação atrial em gestantes portadoras de estenose mitral é de 30 a 70% e a minoria das pacientes com estenose moderada a grave que permanecem com ritmo sinusal possui um átrio pequeno, fibrótico e hipertensão pulmonar secundária. 1 A progressão da doença pode levar à hipertrofia ventricular direita, seguida de insuficiência tricúspide e falência do ventrículo direito. 2 O prejuízo ao enchimento ventricular esquerdo leva à redução do volume sistólico e do débito cardíaco. 2 Após um episódio agudo de febre reumática, a doença progride lentamente por 20 a 30 anos e a área valvar decresce aproximadamente 0,09 a 0,17 cm2/ano. 1,2 As alterações fisiológicas da gestação podem tornar manifesta uma estenose mitral até então assintomática e em aproximadamente 25% das mulheres com estenose mitral os sintomas iniciam durante a gravidez. 2 A história natural da estenose mitral na gravidez envolve significativa taxa de complicações, tanto maternas quanto fetais. A incidência de complicações está relacionada à gravidade da estenose, sendo 67% para os casos graves, 38% para lesão moderada e 26% para leve. 2,3 A maioria das pacientes com estenose moderada a grave mostra piora de uma ou duas classes funcionais durante a gestação. 1 Em pacientes com classes funcionais III e IV a mortalidade materna é estimada em quase 7%, sendo muito baixa (<1%) em pacientes assintomáticas. 1 Na classe funcional IV, a mortalidade fetal pode atingir até 30%. 1 Em relação ao feto, há aumento nas taxas de prematuridade, retardo de crescimento fetal e baixo peso ao nascimento. Aumento do volume plasmático e do volume sanguíneo Redução da pressão oncótica plasmática * Piora a congestão pulmonar Aumento da frequência cardíaca * Reduz o tempo de enchimento do VE * Dificulta o esvaziamento atrial * Aumenta a pressão atrial esquerda Figura 2 - Alterações fisiológicas da gestação vs. estenose mitral. Aumento da pressão atrial esquerda Dilatação do átrio esquerdo Aumento da pressão arterial pulmonar Figura 1 - Fisiopatologia da estenose mitral. Dificuldade no esvaziamento do átrio esquerdo Estenose Mitral Redução no enchimento do VE Redução do volume sistólico Redução do débito cardíaco 10 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S9-S13

13 Anestesia na gestante portadora de estenose mitral ABORDAGEM TERAPÊUTICA Na maioria dos casos de estenose mitral, o tratamento clínico é suficiente. 3 A abordagem é direcionada para a redução da frequência cardíaca e diminuição da pressão do átrio esquerdo a partir da restrição de atividade física, redução na ingesta de sal e uso de beta-bloqueadores e de diuréticos (estes últimos de forma criteriosa, para evitar hipovolemia e redução da perfusão uteroplacentária). 1 A fibrilação atrial está associada a alto risco de complicações maternas e requer tratamento agressivo. A perda da sístole atrial associada ao aumento da frequência ventricular resulta em piora do débito cardíaco e da congestão pulmonar. Nos casos agudos, caso não haja resposta ao tratamento farmacológico, a cardioversão está indicada. Cerca de 80% dos casos de embolização sistêmica ocorrem em pacientes com fibrilação atrial, indicando, portanto, o uso de anticoagulação na presença desta arritmia. 3,4 Alguns autores sugerem a anticoagulação profilática mesmo em pacientes com estenose grave e aumento do átrio esquerdo não associado à fibrilação. 2,4 Nos casos de estenose grave com classe funcional III ou IV, outras medidas podem ser necessárias, incluindo desde reparo valvular (cirúrgico ou percutâneo) até a troca valvar. 1 O índice da válvula mitral, obtido pela ecocardiografia, avalia a mobilidade, o espessamento, a calcificação do folheto e o espessamento subvalvular e pode ser usado para predizer quais pacientes se beneficiam de valvuloplastia percutânea com balão e quais requerem cirurgia para valvuloplastia ou troca mitral. 1 Intervenções cirúrgicas devem preferencialmente ser realizadas antes do planejamento da gravidez. 1-3 A valvuloplastia percutânea por balão tem se mostrado segura durante a gravidez, resultando em significativo aumento da área valvar, geralmente acima de 2.0 cm2, com os benefícios mantidos por vários anos. 1 A técnica é recomendada quando sintomas estão presentes e em pacientes assintomáticas nos casos de estenose moderada a grave, com pressões pulmonares elevadas no repouso ou início recente de fibrilação atrial. O ideal é que seja realizada entre a 13ª e a 28ª semanas de gravidez, para reduzir risco de abortamento e parto prematuro. 1,2 A anatomia desfavorável e a associação de regurgitação mitral importante ou trombo atrial contraindicam a técnica. 1 Essas situações impõem a cirurgia de troca valvar. 1 O reparo cirúrgico (comissurotomia) e a troca da valva mitral, quando indicados, devem ser idealmente realizados no período preconcepção. 1-3 Durante a gestação estão indicados apenas nos casos de estenose grave refratária aos medicamentos e naquelas situações em que o acompanhamento médico ideal estiver impossibilitado. 1 Quando a troca valvar é indicada, a seleção e o tipo de prótese devem ser baseados no seu perfil hemodinâmico, durabilidade e na necessidade de anticoagulação, sendo mais comum o uso de próteses biológicas. 1,2 VIA DE PARTO: ABORDAGEM ANESTÉSICA A via de parto é de indicação obstétrica, não havendo contraindicação ao parto vaginal. 1 A estenose mitral não afeta a abordagem ao primeiro estágio do trabalho de parto, sendo a analgesia, no entanto, essencial, por impedir o aumento da pressão arterial pulmonar secundário à dor. 1-3 Durante o segundo estágio, a manobra de Valsalva associada aos puxos maternos pode resultar em aumentos indesejáveis e agudos do retorno venoso, sendo, desta forma, importante o uso de fórceps de alívio. 1-3 Nas gestantes portadoras de estenose mitral usualmente está indicado o parto por via vaginal, sob analgesia neuroaxial e com a instrumentação da terceira fase, a fim de diminuir os esforços associados ao período expulsivo. A monitorização invasiva da pressão arterial deve ser empregada em todas as pacientes sintomáticas ou com área valvar < 1,5 cm2 e deve ser mantida por várias horas no pós-parto imediato. 1 Nas pacientes portadoras de estenose grave e hipertensão pulmonar grave deve ser considerada a monitorização invasiva da pressão arterial pulmonar. 5,6 A antibioticoprofilaxia contra endocardite bacteriana não é recomendada para o parto vaginal ou cesariana de acordo com as novas diretrizes, considerando lesão valvar não corrigida e ausência de história prévia de endocardite. 1,3,7 Tendo como base os aspectos discutidos anteriormente, a anestesia/analgesia em gestantes portadoras de estenose mitral deve observar as metas propostas na Tabela 2 e as técnicas anestésicas sugeridas estão listadas na Tabela 3. Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S9-S13 11

14 Anestesia na gestante portadora de estenose mitral Tabela 2 - Metas na abordagem anestésica de gestante portadora de estenose mitral Manter frequência cardíaca adequada Frequência cardíaca Evitar taquicardia A bradicardia também pode ser deletéria já que o volume sistólico é limitado pela presença de estenose Manter ritmo sinusial Ritmo Pré-carga Pós-carga Pressão pulmonar Tratar episódios agudos de fibrilação atrial (ß-bloqueadores / amiodarona / cardioversão elétrica) Atenção à presença de anticoagulação em pacientes portadoras de fribilação atrial crônica Manter retorno venoso adequado Minimizar a compressão aorto-cava Desvio lateral esquerdo do útero a 15º Evitar e tratar reduções na resistência vascular periférica Fenilefrina ou metaraminl são os vasopressores de escolha por produzirem redução reflexa da frequência cardíaca Evitar o uso de vasopressores com efeito cronotrópico direto com a efedrina e etilefrina (exceto se FC < 70) Evitar fatores que elevam a resistência vascular pulmonar Hipoxemia Considerar suplementação de oxigênio via cateter nasal ou máscara facial Hipercarbia Acidose Dor Tabela 3 - Anestesia / analgesia para gestantes portadoras de estenose mitral Parto vaginal Analgesia Controle precoce da dor Evitar puxos no segundo estágio indicada instrumentação do parto Técnicas Analgesia peridural (contínua/ intermitente / controlada pela paciente) Analgesia combinada (contínua/ intermitente / controlada pela paciente Considerar o uso de opioides isolados no primeiro estágio do TP Analgesia sistêmica Considerar o uso de técnica neuroaxial ou bloqueio locorregional no segundo estágio do TP Cesariana Anestesia neuroaxial Os bloqueios combinados ou peridural são formas mais adequadas por evitarem quedas rápidas e significativas na resistência vascular periférica A raquianestesia em dose única deve ser evitada em pacientes sintomáticas ou portadoras de lesões moderadas e graves Cesariana Anestesia geral Observar os cuidados gerais para uso desta técnica em gestantes Profilaxia para aspiração pulmonar Avaliação rigorosa da via aérea (uso do algoritmo em caso de VA difícil prevista) Pré-oxigenação Indução em sequência rápida com compressão cricoide Evitar agentes que causem taquicardia Cetamina / pancurônio / atropina Evitar taquicardia e aumento da pressão pulmonar associados ao estímulo álgico na intubação e extubação Utilizar dose adequada de opioides na indução Considerar remifentanil em bolus de 0,5 a 1 mcg/kg ou infusão contínua de 0,3 mcg/kg/min Utilizar beta-bloqueador de curta duração Considerar esmolol em infusão contínua Evitar modificações significativas da pós-carga na indução Considerar etomidato 0,2 a 0,3 mg/kg A profilaxia para atonia uterina com ocitocina, metilergonovina e prostaglandina F2α deve ser feita de forma cuidadosa já que estas drogas podem afetar a resistência vascular periférica e pulmonar. 2 O parto, clampagem do cordão umbilical e dequitação placentária causam elevação importante e aguda no retorno venoso e débito cardíaco (pela auto-hemotransfusão secundária à involução uterina, exclusão da circulação placentária e fim da compressão aorto-cava). Desse modo, o período pós-parto imediato acarreta risco importante de descompensação aguda com congestão pulmonar. 2 É fundamental manter vigilância e monitorização intensivas nas primeiras horas após o parto, sendo indicado CTI pós-operatório a todas as pacientes sintomáticas ou portadoras de estenose moderada ou grave. 2 Gostaríamos de convidá-lo a testar os seus conhecimentos após a leitura deste artigo. Seguem abaixo cinco questões referentes ao tema abordado e o gabarito encontra-se ao final. 1. A causa mais comum de estenose mitral em gestantes é: a) doença cardíaca reumática b) valvulopatia congênita c) lúpus eritematoso sistêmico d) artrite reumatoide 2. Sobre a área valvar mitral é correto afirmar que: a) é adequada quando entre 4 e 6 cm 2 b) caracteriza estenose moderada quando maior que 1,5 cm 2 c) geralmente está associada a sintomas quando menor que 4 cm 2 d) caracteriza estenose grave quando menor ou igual a 0,5 cm 2 12 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S9-S13

15 Anestesia na gestante portadora de estenose mitral 3. Sobre a estenose mitral em gestantes, é incorreto afirmar que: a) Em aproximadamente 25% das mulheres os sintomas iniciam durante a gravidez b) A incidência de complicações maternas está associada à gravidade da estenose, sendo em torno de 60-70% nas gestantes portadoras de lesões graves c) Em pacientes com classes funcionais III e IV a mortalidade materna é estimada em quase 7%, sendo <1% em pacientes com classe funcional I d) Em relação ao feto, há aumento nas taxas de prematuridade, retardo de crescimento fetal e baixo peso ao nascimento, sendo a mortalidade fetal, no entanto, baixa, atingindo 5% em pacientes com classe funcional IV. 4. Sobre a abordagem terapêutica nas gestantes portadoras de estenose mitral, é incorreto afirmar que: a) O tratamento clínico é suficiente na maioria dos casos e envolve restrição de atividade física, redução na ingesta de sal e uso de beta-bloqueadores e de diuréticos b) A fibrilação atrial pode ocorrer em virtude do aumento do átrio esquerdo e é, em geral, bem tolerada, sem necessidade de abordagem terapêutica pelos riscos fetais envolvidos no uso de medicamentos e cardioversão c) Intervenções cirúrgicas devem preferencialmente ser realizadas antes do planejamento da gravidez d) A valvuloplastia percutânea por balão tem se mostrado segura durante a gravidez, devendo ser realizada entre a 13ª e a 28ª semanas, para reduzir risco de abortamento e parto prematuros 5. Sobre a abordagem anestésica na gestante portadora de estenose mitral, é incorreto afirmar que: a) A monitorização invasiva da pressão arterial deve ser empregada em todas as pacientes sintomáticas ou com área valvar < 1,5 cm2 b) A efedrina é o vasopressor de escolha para o tratamento da hipotensão arterial resultante do bloqueio neuroaxial c) A raquianestesia em dose única para cesariana deve ser evitada nas pacientes sintomáticas ou portadoras de lesões moderadas e graves d) A profilaxia para atonia uterina com ocitocina, metilergonovina e prostaglandina F2α deve ser feita de forma cuidadosa, já que estas drogas podem afetar a resistência vascular periférica e pulmonar. GABARITO 1) A 2) A 3) D 4) B 5) B REFERÊNCIAS 1. Moreira WR, Andrade LC. Anestesia para gestante cardiopata. Rev Med Minas Gerais. 2009; 19(4 Supl 1):S21-S Harnett M, Tsen L C. Cardiovascular disease. In: Chestnut DH, Polley LS, Tsen LC, Wong CA. Obstetric Anesthesia: principles and practice. 4 th ed. New York: Mosby Elsevier, p Klein LL, Galan HL. Cardiac disease in pregnancy. Obstet Gynecol Clin North Am. 2004; 31: Carvalho B, Jackson E. Structural Heart Disease in Pregnant Women. In: Gambling DR, Douglas MJ, McKay RSF. Obstetric Anesthesia and Uncommon Disorders. 2. ed. Cambridge: Cambridge University Press; p Gomar C, Errando CL. Neuroaxial anaesthesia in obstetrical patients with cardiac disease. Curr Opin Anaesthesiol. 2005; 18: Ayoub CM, Jalbout MI, Baraka AS. The pregnant cardiac woman. Current Curr Opin Anaesthesiol. 2002; 15: European Society of Gynecology (ESG); Association for European Paediatric Cardiology (AEPC); German Society for Gender Medicine (DGesGM), Regitz-Zagrosek V, Blomstrom Lundqvist C, Borghi C, Cifkova R, Ferreira R, et al. ESC Committee for Practice Guidelines.ESC Guidelines on the management of cardiovascular diseases during pregnancy: the Task Force on the Management of Cardiovascular Diseases during Pregnancy of the European Society of Cardiology (ESC). Eur Heart J Dec; 32(24): Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S9-S13 13

16 ARTIGO DE REVISÃO Anestesia no paciente usuário de crack e cocaína Anesthesia in patients who are users of crack and cocaine Cláudio Henrique Corrêa 1, Leonardo Saraiva Guimarães de Oliveira 2, José Eduardo Alves de Assis 3, Rafael Teixeira Corrêa de Barros 4 DOI: / S012 RESUMO 1 Médico Anestesiologista. Hospital Municipal Odilon Behrens e Hospital Risoleta Tolentino Neves. Belo Horizonte, MG Brasil. 2 Médico Anestesiologista. Hospital Municipal Odilon Behrens, Hospital Risoleta Tolentino Neves e Hospital Vera Cruz. Preceptor da Residência Médica em Anestesiologia do Centro de Especialização e Treinamento CET do Instituto de Previdência dos Servidores de Minas Gerais IPSEMG. Belo Horizonte, MG Brasil. 3 Médico em Especialização-ME-2 de Anestesiologia do CET/IPSEMG. Belo Horizonte, MG Brasil. 4 ME-2 de Anestesiologia do CET/IPSEMG. Belo Horizonte, MG Brasil. A incidência de pacientes dependentes de drogas está aumentando. As substâncias ilícitas de consumo mais comuns são cocaína, maconha, álcool e heroína, embora o uso do crack tenha se tornado cada vez mais frequente, tornando-se um problema comum nos hospitais que atendem emergências. O efeito agudo e a longo prazo do abuso de drogas pode complicar o manejo anestésico. Muitas vezes esses pacientes não são identificados no pré-operatório, por tratar-se de cirurgia de emergência ou omissão de informação. Esses pacientes demandam vigilância contínua e perspicácia do anestesiologista para evitar sérias complicações perioperatórias. Neste artigo são apresentados os principais problemas relacionados ao uso da cocaína e do crack, bem como a melhor abordagem perioperatória. Durante o procedimento anestésico são utilizados vários medicamentos de ação central que interagem com outras substâncias como a cocaína, tornando predizer o tipo de resposta apresentado pelos pacientes que fazem uso desse tipo de droga. Isso torna a anestesia nesses pacientes um verdadeiro desafio para o anestesiologista que, portanto, deve conhecer as alterações fisiopatológicas para melhor abordar esses pacientes e diminuir a morbimortalidade. Palavras-chave: Anestesia; Cocaína; Cocaina Crack; Usuários de Drogas. ABSTRACT The incidence of drug dependent patients is increasing. The most common consumption among illicit substances includes cocaine, marijuana, alcohol, and heroin, however, the use of crack has become increasingly frequent and a common problem in hospitals that tend to emergencies. The acute and long-term effects of drug abuse can complicate the anesthetic management. These patients are often not identified preoperatively because they are in need of emergency surgery or due to information omission. These patients require continuous vigilance and insight from the anesthesiologist to avoid serious perioperative complications. This article presents the main problems related to the use of cocaine and crack, as well as the best perioperative approach. During the anesthetic procedure, several centrally acting medications that interact with other substances like cocaine is used making it difficult to predict the type of responses from the patients who make use of these drugs. Thus, anesthesia in these patients is a real challenge to the anesthesiologist who must therefore be aware of the pathophysiological alterations to best address these patients and decrease morbidity and mortality. Key words: Anestheia; Cocaine; Crack Cocaine; Drug Users. Instituição: Instituto de Previdência dos Servidores de Minas Gerais (IPSEMG) Belo Horizonte, MG Brasil Autor correspondente: José Eduardo Alves de Assis jalvesdeassis@yahoo.com.br INTRODUÇÃO A cocaína ressurgiu no Brasil nos últimos 20 anos. 1 Desde então, novos padrões de consumo foram introduzidos entre os usuários da droga 2, entre eles destaca-se 14 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S14-S19

17 Anestesia no paciente usuário de crack e cocaína o crescimento do crack, derivado não refinado da coca. Antes de 1989 não se revelava a presença dessa substância em levantamentos epidemiológicos nacionais. Em 1993, seu uso atingiu 36% e, em 1997, 46% entre os usuários de cocaína. 3 No Brasil, 0,2% dos estudantes já experimentou o crack em pelo menos uma ocasião. 4 Na região Sudeste, segundo levantamento realizado em 2005, seu uso em vida foi de 0,8% 5. O consumo do crack inicia-se em idades cada vez mais precoces e difunde-se por todas as classes sociais. 6-9 O usuário expõe-se a risco de dependência duas vezes mais alto que aqueles que utilizam a cocaína inalada 10 ; e risco ainda mais elevado quando há associação de cocaína, maconha e tabaco. 11 Os serviços especializados em tratamento de dependência química começaram a sentir o impacto do crescimento do crack a partir dos anos 90, quando seu consumo saltou de 17% (1990) para quase 64% (1994) entre pacientes internados nos centros de recuperação. 12 Diante disso, torna-se fundamental para o médico anestesiologista conhecer as alterações fisiopatológicas, bem como as interações farmacológicas do crack com os principais agentes anestésicos. Dessa forma, pode-se realizar adequado planejamento anestésico e antecipar as possíveis complicações perioperatórias esperadas para esse grupo de pacientes. HISTÓRICO Embora o termo crack venha sendo veiculado há pouco mais de 25 anos, o consumo de cocaína iniciou-se num período histórico muito mais precoce. Derivada das folhas do arbusto Erythoxylon coca, a substância já era utilizada por tribos indígenas na América do Sul dois mil anos antes do descobrimento do continente. A folha mascada libera baixas doses de cocaína, que promove todos os seus efeitos (Figura 1). 13 Seu uso possibilitava aos nativos da região dos Andes sobreviver em altitudes elevadas, onde a rarefação do ar e o frio tornavam extremas as condições de trabalho. A chegada dos espanhóis representou o primeiro contato do homem moderno com a droga. Suas propriedades estimulantes foram de fundamental importância na exploração da Terra do Ouro. No entanto, as tentativas de transporte da folha de coca para a Europa não foram bem-sucedidas, uma vez que a longa viagem causava deterioração do princípio ativo contido na folha. A cocaína ficou, então, esquecida por vários anos, até que em 1860 Albert Niemann obteve êxito na extração da substância pura na forma de pó. 14 Processo de refino da cocaína, indicando também seus subprodutos Folhas de coca Erythroxylon coca Maceração e tratamento químico com solventes pesados e ácidos. Pureza: 0,5% a 2% de cocaína nas folhas. Podem ser macaradas. Crack Subproduto da cocaína. Natureza básica. Pode ser fumado. Pasta de coca Tratada com solventes e ácido clorídrico. Pureza: 20% a 85% de sulfato de cocaína. Pode ser fumada (natureza alcalina). Cloridrato de cocaína Produto final do refino ( pó ). Pureza: 30% a 90% de cloridrato de cocaína. Pode ser cheirada ou injetada (dissolvida em água). Merla Subproduto da cocaína. Natureza básica. Pode ser fumada. Figura 1 - Processo de refino da cocaína, indicando também seus subprodutos. Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S14-S19 15

18 Anestesia no paciente usuário de crack e cocaína A droga começou a popularizar-se na Europa no final do século XIX. Sigmund Freud, um de seus usuários mais ilustres, publicou em 1884 o artigo de revisão Über Coca, no qual conta suas experiências com o consumo da droga. Nesse mesmo ano, Karl Köller, oftalmologista austríaco que trabalhava no mesmo hospital de Freud, publicou os primeiros relatos de suas propriedades anestésicas. 15 No início do século XX, o uso recreacional da cocaína difundiu-se e chegou até a América do Norte. Logo, seus efeitos colaterais devastadores começaram a ser notados. Em 1914, o uso da cocaína foi proibido na Europa e Estados Unidos. A proibição resultou em significativa redução de seu consumo até meados da década de 70, quando a droga reapareceu, dessa vez na ilegalidade. Na década de 80 a sociedade teve o contato inicial com o crack, utilizado por via inalatória. A potencialização do efeito da substância ativa, uma vez que esta atinge rapidamente a corrente sanguínea pela circulação pulmonar, associada ao seu baixo custo, fez com que o crack se difundisse rapidamente. Antes restrito aos usuários de baixa renda, hoje é utilizado por número cada vez mais alto de pessoas de todas as classes sociais. FARMACOCINÉTICA A cocaína é uma benzoilmetilecgonina, alcaloide extraído das folhas da coca (Erythroxylon coca). A maceração das folhas misturadas a determinados produtos químicos produz uma pasta de natureza alcalina, denominada pasta-base de cocaína. 16 O refino da pasta origina a cocaína em pó (cloridrato de cocaína), apresentação mais conhecida em nosso meio, que pode ser aspirada ou diluída em água para ser injetada. O crack é a cocaína em sua forma de base livre. 17 A cocaína possui vida-média plasmática entre 30 e 90 min. 18 Quando inalada, atinge a circulação encefálica entre seis e oito segundos e, por via venosa, entre 12 e 16 segundos. Seu uso através da via nasal causa intensa vasoconstrição, o que limita a absorção. Cerca de 80 a 90% da cocaína são metabolizados no plasma por hidrólise do radical éster, gerando o primeiro metabólito, ecgonina metil éster (meia-vida 3,5 a 6h), que sofre degradação para benzoilecgonina (meia-vida 5 a 8h), o principal metabólito urinário. Norcaide, outro metabólito, é produzido por desmetilação no fígado através do sistema citocromo P Embora a cocaína possa ser encontrada no sangue e urina por poucas horas, seus metabólitos podem ser detectados por 24 a 36 horas após uso. 18 A análise bioquímica do cabelo pode demonstrar uso prévio dessa substância por semanas a meses. FARMACODINÂMICA A cocaína, independentemente da via de administração, age bloqueando a recaptação de catecolaminas nos terminais pré-sinápticos de nervos simpáticos, aumentando, assim, a estimulação das células receptoras 17 e também a sensibilidade dos terminais nervosos adrenérgicos à noradrenalina. 19 Atua como antiarrítmico de classe I (anestésico local) bloqueando canais de sódio e potássio, o que impede o início e transmissão do sinal elétrico. 18 Apesar dessas duas ações opostas, a atividade simpática predomina em baixas doses. 19 O efeito psicoestimulante pode ser explicado por sua capacidade de aumentar os níveis de dopamina, norepinefrina e serotonina no encéfalo. Os efeitos sistêmicos ocorrem como resultado da capacidade de, simultaneamente, aumentar os níveis de catecolaminas, bem como bloquear a sua recaptação, o que leva a agonismo contínuo em ambos os receptores, alfa e beta 20. A cocaína estimula a liberação de endotelina-1, potente vasoconstritor das células endoteliais, e inibe a produção de óxido nítrico, potente vasodilatador destas, levando a vasoespasmo. Essa liberação geralmente ocorre 90 minutos após o uso inicial da droga. Promove trombose por ativação e agregação plaquetária e liberação de grânulos alfa, além de aumentar a atividade do fator inibidor de plasminogênio, níveis de fibrinogênio e fator de Von Willebrand. ALTERAÇÕES CARDIOVASCULARES Diversos mecanismos são implicados na gênese da isquemia miocárdica induzidas pelo uso agudo da cocaína. O estímulo simpático resulta em aumento da contração ventricular, pressão arterial, frequência cardíaca e demanda miocárdica de oxigênio. Simultaneamente diminui o suplemento de O 2 devido à vasoconstrição das artérias coronárias, principalmente nas esclerosadas de menor calibre. 21 O uso combinado com cigarro aumenta o efeito vasoconstritor. 22 O aumento da atividade plaquetária contribui para a formação de trombose coronariana Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S14-S19

19 Anestesia no paciente usuário de crack e cocaína As manifestações clínicas dessas alterações são vistas como dor torácica/angina. Ocorrem geralmente na primeira hora após o uso em pacientes do sexo masculino, jovens, tabagistas e sem outros fatores de riscos. 24 Dor de característica subesternal e em aperto, acompanhada de dispneia e diaforese. Apesar de a dor ser o sintoma presente mais comum, a incidência de alterações das enzimas e marcadores de isquemia miocárdica é de apenas 6%. 25 A etiologia da dor torácica permanece obscura na maioria dos pacientes. A cocaína causa deterioração da função ventricular esquerda (VE). Agudamente leva à diminuição da força de contração e fração de ejeção e aumento na pressão diastólica final de VE, predispondo a edema agudo de pulmão. 26 A médio e longo prazo está associada à hipertrofia do VE. Usuários tendem a desenvolver aterosclerose coronariana prematura, aumentando os riscos de isquemia miocárdica. As alterações que podem ser encontradas no eletrocardiograma são de difícil interpretação, pois possuem baixa sensibilidade, menos de 36%, para diagnóstico de isquemia miocárdica. Devido aos efeitos diretos do bloqueio dos canais de sódio, podem-se encontrar taquicardia sinusal, bradicardia sinusal, taquicardia supraventricular, ritmo idioventricular acelerado, aumento do intervalo QT, taquicardia ventricular, Torsades de Pointes, fibrilação ventricular e assistolia. O diagnóstico de dissecção aórtica deve ser sempre lembrado nos pacientes com dor torácica, devido aos altos índices de catecolaminas circulantes e hipertensão não tratada desses pacientes. Usuários de cocaína intravenosa estão mais predispostos a desenvolver endocardite, envolvendo as válvulas do lado esquerdo do coração, devido ao compartilhamento de seringas, baixas condições de higiene pessoal e efeito imunossupressor da droga. APARELHO RESPIRATÓRIO O uso regular de crack é responsável por alterações significativas na árvore traqueobrônquica e parênquima pulmonar. A agressão térmica, inalação dos resíduos da combustão e a intensa vasoconstrição, associadas ao efeito anestésico local, são os principais responsáveis pelos danos ao sistema respiratório. 27 O efeito irritativo direto causa lesões nas células do epitélio brônquico, o que resulta na exposição e estimulação dos receptores vagais. Como consequência, observam-se crises importantes de broncoespasmo e exacerbação da asma em indivíduos predispostos. Inalações sustentadas e prolongadas podem estar associadas à ocorrência de pneumotórax e pneumomediastino. 17 Alterações histológicas como hiperplasia de células basais, metaplasia escamosa e desorganização celular e nuclear foram encontradas da mucosa bronquial em usuários de crack, principalmente quando associado ao tabagismo. A avaliação de macrófagos alveolares evidenciou reduzida capacidade de destruição bacteriana e de células tumorais. 28 A forma inalada da cocaína induz, ainda, uma variedade de desordens pulmonares como hemorragia alveolar (presente na autópsia de 58% dos usuários de crack), edema agudo do pulmão e pneumonite intersticial. 29 Estudo prévio sugere que as hemorragias sucessivas associadas à permeabilidade capilar aumentada resultam numa elevação das concentrações pulmonares de ferro, o que seria responsável pelas lesões encontradas em nível celular, tanto em macrófagos quanto em células epiteliais. Por fim, o uso contínuo da substância pode ocasionar lesão pulmonar crônica, evidenciada por reduzida capacidade de difusão alveolar MANEJO ANESTÉSICO Não existe uma técnica ótima para anestesiar um paciente usuário de crack ou cocaína, havendo riscos importantes, independentemente da técnica empregada. A cocaína e seus alcaloides apresentam ação anticolinérgica importante e os usuários cursam com redução no esvaziamento gástrico, lentificação do trânsito intestinal e prolongamento do contato da mucosa gástrica com o conteúdo ácido contribuindo para doença cloridopéptica tão frequente nesses pacientes. 32 A indução em sequência rápida é recomendável mesmo com tempos de jejum adequados. É importante frisar que a cocaína compete com a succinilcolina na metabolização pela butirilcolinesterase, levando à diminuição do metabolismo de ambas. 33 A associação de dor torácica, hipertensão e taquicardia é muito frequente e é causada por grande aumento no débito cardíaco concomitante à vasoconstrição periférica e à estimulação simpática direta. 34 A utilização isolada de beta-bloqueadores não é encorajada, pelo risco de crise hipertensiva secundária ao agonismo alfa isolado. Deve-se preferir, nos casos de hipertensão, a utilização de vasodilatadores como a nitroglicerina, Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S14-S19 17

20 Anestesia no paciente usuário de crack e cocaína nitroprussiato de sódio, alfa-bloqueadores ou, ainda, o uso de beta-bloqueadores com atividade alfa-bloqueadora associada. A associação entre cocaína e crack e isquemia miocárdica é bem conhecida, embora seu diagnóstico seja muitas vezes desafiador. O eletrocardiograma é anormal mesmo em pacientes sem isquemia. Os níveis de creatinofosfoquinase estão elevados, secundários ao aumento da atividade muscular e rabdomiólise. A dosagem de troponinas é mais sensível e específica para o diagnóstico de infarto miocárdico. A isquemia relaciona-se ao aumento do consumo de oxigênio associado à vasoconstrição coronariana por ação alfa-adrenérgica. O tratamento de escolha na isquemia miocárdica inclui suplementação de oxigênio, aspirina, nitroglicerina e benzodiazepínicos. 35 A combinação frequente de álcool e alcaloides da cocaína leva à formação de um metabólito denominado cocaetileno, que reduz a recaptação de dopamina, potencializando a ação da cocaína. É frequente o surgimento de arritmias e distúrbios de condução cardíacos devido ao efeito simpaticomimético direto da cocaína, com aumento da irritabilidade ventricular e redução do limiar para fibrilação ventricular. 35 A anestesia regional também cursa com complicações frequentes. Os pacientes apresentam-se com hipovolemia relativa e não respondem adequadamente aos vasopressores de ação indireta. Também é descrita a trombocitopenia com uso de crack/cocaína. Especula-se que a trombocitopenia ocorra pela ativação plaquetária contínua, por ação alfa-adrenérgica, supressão medular e expressão de anticorpos antiplaquetários, entre outras causas. 36 A intoxicação aguda por crack pode cursar também com convulsões secundárias à hipertermia. Ocorre alteração do centro termorregulador hipotalâmico Existem também vários relatos de acidentes vasculares encefálicos, tanto isquêmicos quanto hemorrágicos. As convulsões muitas vezes não respondem à terapêutica tradicional com benzodiazepínicos, barbitúricos ou hidantoína, mas possuem boa resposta ao uso de agonistas alfa 2. A lesão do epitélio brônquico ocasionado tanto pela ação irritante direta da cocaína como pela fumaça inalada leva ao aumento da frequência de broncoespasmos importantes. Ocorre também redução da função de macrófagos alveolares e aumento do risco de infecções pulmonares. 28 A toxicidade endotelial pode levar a edema agudo, por aumento da permeabilidade capilar. 39 Anestesias regionais com elevadas doses de anestésicos locais podem levar a sérias complicações, como convulsões e parada cardíaca, uma vez que a cocaína apresenta efeito aditivo com esses anestésicos. CONCLUSÃO O anestesiologista deve conhecer as alterações fisiológicas causadas pela cocaína e crack, uma vez que é cada vez mais frequente a presença do paciente usuário dessas drogas no centro cirúrgico. A cocaína exerce efeitos em diversos locais e por diversos mecanismos, tornando muito difícil a previsão da interação com os diferentes medicamentos de ação centrais usados durante o procedimento anestésico. Qualquer tipo de procedimento anestésico traz elevados riscos e os anestesiologistas devem estar preparados para o correto manejo desses pacientes. REFERÊNCIAS 1. Carlini EA, Nappo AS, Galduróz JC. A cocaína no Brasil ao longo dos últimos anos. Rev ABP-APAL. 1993; 15: Dunn J, Laranjeira R. Cocaine-profiles, drug histories, and patterns of use of patients from Brazil. Subst Use Misuse. 1999; 34: Noto AR, Nappo SA, Galduróz JC, Mattei R, Carlini EA. IV Levantamento sobre uso de drogas entre crianças e adolescentes em situação de rua de seis capitais brasileiras. São Paulo: Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID); 1997; Universidade Federal de São Paulo; Galduróz JC, Noto AR, Carlini EA. IV Levantamento sobre o uso de drogas entre estudantes de 1º e 2º graus em 10 capitais brasileiras. São Paulo: Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID); 1997; Universidade Federal de São Paulo; Noto AR, Galduróz JC, Nappo SA, Fonseca AM, Carlini CM, Moura YG, et al. Levantamento nacional sobre uso de drogas entre crianças e adolescentes em situação de rua nas 27 capitais brasileiras São Paulo: SENAD/ CEBRID; Galduróz JC, Noto AR, Fonseca AM, Carlini EA. V levantamento nacional sobre o consumo de drogas psicotrópicas entre estudantes do ensino fundamental e médio da rede pública de ensino nas 27 capitais brasileiras (2004). São Paulo: SENAD/CE- BRID; [Citado em 2013 set. 20] Disponível em: cebrid.epm.br. 7. Duailibi LB, Ribeiro M, Laranjeira R. Profile of cocaine and crack users in Brazil. Cad Saúde Pública. 2008; 24: Guindalini C, Vallada H, Breen B, Laranjeira R. Concurrent crack and powder cocaine users from Sao Paulo: do they represent a different group? BMC Public Health. 2006; 6: Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S14-S19

21 Anestesia no paciente usuário de crack e cocaína 9. Oliveira LG, Nappo SA. Characterization of the crack cocaine culture in the city of the São Paulo: a controlled pattern of use. Rev Saude Publica. 2008; 42: Chen CY, Anthony JC. Epidemiological estimates of risk in the process of becoming dependent upon cocaine: cocaine hydrochloride powder versus crack cocaine. Psychopharmacology (Berl). 2004; 172: Wagner FA, Anthony JC. Male-female differences in the risk of progression from first use to dependence upon cannabis, cocaine, and alcohol. Drug Alcohol Depend. 2007; 86: Dunn J, Laranjeira R, Silveira DX, Formigoni MLOS, Ferri CP. Crack cocaine: an increase in use among patients attending clinics in São Paulo: Subst Use Misuse. 1996; 31: Romano M, Ribeiro M, Marques ACPR. Projeto Diretrizes: abuso e dependência de cocaína. Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina; [Citado em 2013 maio 14]. Disponível em: Araujo DR, Paula E, Fraceto LF. Anestésicos locais: interação com membranas biológicas e com o canal de sódio voltagem-dependente. Química Nova. 2008; 31(7): Reis Jr A. Sigmund Freud ( ) e Karl Koller ( ) e a descoberta da anestesia local. Rev Bras Anestesiol. 2009, 59(2): Romano M, Ribeiro M, Marques ACPR. Projeto Diretrizes: abuso e dependência de cocaína. Brasília: Associação Médica Brasileira; Luft A, Mendes FF. Anestesia no paciente usuário de cocaína. Rev Bras Anestesiol. 2007; 57(3): Afonso L, Mohammad T, Thatai D. Crack whips the heart: a review of the cardiovascular toxicity of cocaine. Am J Cardiol. 2007; 100: Schwartz BG, Rezkalla S, Kloner RA. Cardiovascular effects of cocaine. Circulation. 2010; 122: Steadman JL, Birnbach DJ. Patients on party drugs undergoing anesthesia. Curr Opin Anaesthesiol. 2003; 16: Lange RA, Cigarroa RG, Yancy Jr CW, Willard JE, Popma JJ, Sills MN, et al. Cocaine-induced coronary artery vasoconstriction N Engl J Med. 1989; 321: Moliterno DJ, Willard JE, Lange RA, Negus BH, Boehrer JD, Glamann DB, et al. Coronary-artery vasoconstriction induced by cocaine, cigarette smoking, or both. N Engl J Med. 1994; 330: Minor Jr RL, Scott BD, Brown DD, Winniford MD. Cocaine-induced myocardial infarction in patients with normal coronary arteries. Ann Intern Med. 1991; 115: Weber JE, Chudnofsky CR, Boczar M, Boyer EW, Wilkerson MD, Hollander JE. Cocaine-associated chest pain: how common is myocardial infarction? Acad Emerg Med. 2000; 7: Pitts WR, Vongpatanasin W, Cigarroa JE, Hillis LD, Lange RA. Effects of the intracoronary infusion of cocaine on left ventricular systolic and diastolic function in humans. Circulation. 1998; 97: Restrepo CS, Carrillo JA, Martınez S, Ojeda P, Rivera AL, Hatta A. Pulmonary complications from cocaine and cocainebased substances: Imaging manifestations. Radiographics. 2007; 27: Baldwin GC, Tashkin DP, Buckley DM, Park AN, Dubinett SM, Roth MD. Marijuana and cocaine impair alveolar macrophage function and cytokine production. Am J Respir Crit Care Med. 1997; 156: Bailey ME, Fraire AE, Greenberg SD, Barnard J, Cagle PT. Pulmonary histopathology in cocaine abursers. Hum Pathol Feb; 25(2): Weiss RD, Goldenheim PD, Mirin SM, Hales CA, Mendelson JH. Pulmonary dysfunction in cocaine smokers. Am J Psychiatry Aug;138(8): Tashkin DP, Khalsa ME, Gorelick D, Chang P, Simmons MS, Coulson AH, et al. Pulmonary status of habitual cocaine smokers. Am Rev Respir Dis. 1992; 145: Herrine SK, Park PK, Wechsler RJ. Acute mesenteric ischemia following intranasal cocaine use. Dig Dis Sci. 1998; 43: Fleming JA, Byck R, Barash PG. Pharmacology and therapeutic applications of cocaine. Anesthesiology. 1990; 73: Tuncel M, Wang Z, Arbique D, Fadel PJ, Victor RG, Vongpatanasin W. Mechanism of the blood pressure- raising effect of cocaine in humans. Circulation, 2002; 105: Vasica G, Tennant CC. Cocaine use and cardiovascular complications. MJA 2002; 177: Burday MJ, Martin SE. Cocaine-associated thrombocytopenia. Am J Med. 1991; 91: Fahim I, Ismail M, Osman OH. Hypothermic effect of cocaine in rats. West Afr J Pharmacol Drug Res. 1975; 2: Long SF, Davis WM, Waters IW. Additive hypothermic effects of cocaine and nicardipine in guinea-pigs. Gen Pharmacol, 1994; 25: Cruz R, Davis M, O Neil H, Tamarin F, Brandstetter RD, Karetzky M. Pulmonary manifestations of inhaled street drugs. Heart Lung. 1998; 27: Mittleman MA, Mintzer D, Maclure M, Tofler GH, Sherwood JB, Muller JE. Triggering of myocardial infarction by cocaine. Circulation. 1999;99: Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S14-S19 19

22 ARTIGO DE REVISÃO Monitorização da coagulação sanguínea perioperatória Perioperative blood coagulation monitoring Walkíria Wingester Vilas Boas 1, Gustavo Henrique Silva de Oliveira 2 DOI: / S013 RESUMO 1 Médica Anestesiologista. Doutora em Fisiologia. Coordenadora da Residência Médica em Anestesiologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais UFMG. Belo Horizonte, MG Brasil. 2 Médico-Residente de Anestesiologia do Hospital das Clínicas da UFMG. Belo Horizonte, MG Brasil. A monitorização perioperatória da coagulação sanguínea é crítica para entender melhor as causas de hemorragia, guiar terapias hemostáticas e prever o risco de sangramento durante procedimento cirúrgico. Nosso entendimento de coagulopatia perioperatória, ferramentas diagnósticas e abordagens terapêuticas têm evoluído nos últimos anos. O recentemente desenvolvido modelo celular da coagulação somado aos novos testes hemostáticos viscoelásticos (TEG e ROTEM) e testes de função plaquetária realizados à beira do leito facilita o entendimento e mede a formação e resolução do coágulo no sangue total, possibilitando rápido diagnóstico e tratamento da coagulopatia perioperatória. Palavras-chave: Coagulação Sanguínea; Monitoramento; Assistência Perioperatória, Substâncias Viscoelásticas; Tromboelastografia; Cirurgia Geral. ABSTRACT The perioperative blood coagulation monitoring is critical to better understand the causes of bleeding, guide hemostatic therapies, and predict the risk of bleeding during surgery. Our understandings of perioperative coagulopathy, diagnostic tools, and therapeutic approaches have evolved in recent years. The newly developed cell coagulation model combined with new hemostatic viscoelastic tests (TEG or ROTEM) and platelet function tests, carried out by the bedside, facilitates the understanding and measure of the formation and resolution of the clot in whole blood, enabling rapid diagnosis and treatment of perioperative coagulopathy. Key words: Blood Coagulation; Monitoring; Perioperative Care; Viscoelastic Substances; Thrombelastography; General Surgery. INTRODUÇÃO Instituição: Hospital das Clínicas da UFMG Belo Horizonte, MG Brasil. Autor correspondente: Walkíria Wingester Vilas Boas walkiria589@hotmail.com Nos últimos anos o interesse na hemostasia e seu manejo no período perioperatório tem se intensificado. A cascata da coagulação tem sido ampliada para uma representação da coagulação baseada também em células (plaquetas, subendotélio, endotélio) 1-3 e tem havido grande interesse em entender não apenas uma única parte, mas o quadro geral do sistema de coagulação no período perioperatório, com seus procoagulantes bem como anticoagulantes e os mecanismos de controle fibrinolítico. 4 No período perioperatório, o paciente morre não apenas por hemorragia, mas também por eventos trombótico-tromboembólicos. É absolutamente crucial entender que o sistema de coagulação representa um delicado equilíbrio entre fatores pro e anticoagulantes. 4 E não sendo esse equilíbrio firme ao longo de todo o período 20 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S20-S29

23 Monitorização da coagulação sanguínea perioperatória Hemostasia seria controle do sangramento sem a ocorrência de eventos trombóticos (quando o equilíbrio entre as atividades procoagulantes, anticoagulantes, fibrinolíticas e antifibrinolíticas é alcançado). Consiste de múltiplas fases, envolvendo elementos celulares e humorais da coagulação. Sua avaliação no período perioperatório, uma grande preocupação na prática clínica, tem múltiplos objetivos: pesquisa de desordens hemorrágicas constitucionais ou adquiridas no pré-operatório, reconhecimento de hemostasia comprometida no intra e pós-operatório e monitoramento do tratamento nessas circunstâncias. 18 Os diversos passos da cascata de coagulação citada nos livros textos descrevem a iniciação da coagulação como ela ocorre nos tubos de ensaio e são, assim, úteis para explicar como os testes de coagulação plasmática trabalham (Figura 1). Em contraste, o modelo celular da coagulação, recentemente desenvolvido, torna possível entender melhor o processo de coagulação como ele ocorre in vivo 4. A coagulação, de acordo com o modelo baseaperioperatório, ambos os lados, o pro e o anticoagulante, devem ser repetidamente avaliados durante grandes cirurgias ou trauma e podem requerer tratamento específico para cuidado ótimo, dependendo da condição do paciente. Tratamento de sangramento maciço no período perioperatório ainda permanece como um desafio para o anestesiologista. O sangramento perioperatório frequentemente é multifatorial. 5,6 Ao lado de distúrbios nas condições fisiológicas básicas para a hemostasia (ph, Ca, temperatura e hematócrito), podem ocorrer distúrbios na hemostasia primária (plaquetas), anormalidades do plasma sanguíneo (déficit isolada ou global de fatores de coagulação) e coagulopatias complexas (CID e hiperfibrinólise). 5 Coagulopatias perioperatórias podem necessitar de transfusão sanguínea, hoje considerada fator de risco independente para mortalidade perioperatória. 7 Apesar da relativa segurança dos hemoderivados em relação ao risco de transmissão viral nos últimos anos 8, minimizar a exposição é importante porque transfusão de hemácias, de plasma e seus produtos tem sido implicada em eventos adversos graves como infecções nosocomiais, lesão pulmonar aguda e disfunção orgânica. 4,8,9 O uso de protocolos de transfusão padronizados, para sangramento perioperatório, repetidamente 10,11 tem mostrado redução da necessidade de transfusão de hemoderivados. Entretanto, para construir um protocolo de intervenções hemostáticas clinicamente útil é necessária a disponibilidade de testes de coagulação em tempo real, particularmente em casos de sangramento grave. O tempo da coleta até a disponibilidade do resultado de testes feitos no laboratório é, em média, minutos, considerado muito longo para casos de sangramento grave. 6,8 Esse alargado tempo para o diagnóstico pode afetar não apenas o tempo da intervenção hemostática, mas a sua eficácia, já que a coagulação nesses casos é bastante dinâmica no tempo. Alternativamente, nessa situação de sangramento grave em andamento, a transfusão baseada em razão (1:1:1 razão de papa de hemácias, plasma fresco e plaquetas) tem sido usada em grandes centros de trauma. 12 Embora esse tipo de abordagem reduza a infusão maciça de cristaloide/coloide, evitando sobrecarga de volume e coagulopatia dilucional 13-16, falta um objetivo específico para a reposição, é ignorada a variabilidade individual nos níveis de fatores de coagulação e resposta vascular (endotelial) e provavelmente ele não minimiza riscos de ex- posição a hemoderivados. E, ainda, as evidências, até o momento, do uso da transfusão baseada na razão 1:1:1 não têm implicado melhoras consistentes no prognóstico dos pacientes com trauma. 16,17 Ao lado dos produtos sanguíneos conhecidos (plasma fresco congelado, crioprecipitado e plaquetas), novos produtos farmacêuticos pro e anticoagulantes, incluindo fibrinogênio, fator XIII, complexo protrombínico, fator VIIa recombinante, antifibrinolíticos e agentes para tratar hipercoagolubilidade têm sido introduzidos na prática clínica. Essas substâncias podem ajudar o médico a tratar especificamente uma desordem de coagulação no período perioperatório. A utilidade dessas substâncias, contudo, depende largamente de ferramentas de monitorização para caracterizar a desordem de coagulação subjacente, assim determinando indicações, momento e dose específicos de administração. Neste artigo, será revisada a fisiologia da hemostasia (base para a interpretação dos testes de coagulação) e discutidos aspectos práticos dos testes de coagulação realizados no laboratório, testes de coagulação viscoelásticos e outros realizados à beira do leito no diagnóstico de coagulopatia perioperatória. FISIOLOGIA DA HEMOSTASIA Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S20-S29 21

24 Monitorização da coagulação sanguínea perioperatória do em célula, é descrito nas fases de iniciação, amplificação e propagação 1-3, com a participação de todos os componentes plasmáticos circulantes e celulares. A geração de trombina é central para o desenvolvimento e força do coágulo. Ela ocorre na superfície de plaquetas ativadas e, portanto, plaquetas e geração de trombina estão intimamente relacionadas ao desenvolvimento de coagulopatias 19 (Figura 2). Figura 1 - Cascata da coagulação e sua correlação com testes de coagulação plasmáticos. PT = tempo de protrombina; aptt = tempo de tromboplastina parcial. Em algarismo romano os fatores de coagulação na forma não ativada e ativada(a). a. fase da iniciação 1-3 : classicamente referida como a via extrínseca da coagulação, inicia quando ocorre a lesão vascular e quando células subendoteliais, como as musculares lisas e fibrobrastos, se tornam expostos ao sangue. Essas células expõem o iniciador chave da cascata da coagulação, TF (fator tecidual), o qual se liga ao FVII (fator sete). Por agir como cofator para FVII, o TF promove a ativação para FVIIa. O complexo TF/FVIIa quebra FIX (fator nove) e FX (fator 10) para FIXa e FXa, respectivamente. Isso permite FXa associar-se ao cofator FVa (fator cinco ativado) para formar um complexo protrombinase nas células que expressam TF, o qual serve para converter protrombina (FII) em trombina (Figura 2). Com a exposição do colágeno subendotelial iniciam-se também a adesão, ativação e agregação inicial das plaquetas no local lesado. Esse passo é facilitado pela atividade de ponte do fator vwf, a ligação do fibrinogênio aos receptores de glicoproteína (GPIIb/IIIa) das plaquetas e a pequena quantidade de trombina gerada na fase de iniciação da coagulação 4. Ativação das plaquetas é causada pela ligação de agonistas (ex: trombina, tromboxane A2, ADP, colágeno, AC aracdônico) a receptores específicos delas. E uma vez ativadas, outras plaquetas chegam e aderem a estas já aderidas à parede lesada (agregação). Figura 2 - Modelo da coagulação baseado em células. Fonte: Versteeg et al Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S20-S29

25 Monitorização da coagulação sanguínea perioperatória b. fase da amplificação: a quantidade de trombina, lentamente acumulando, ativa as plaquetas que aderiram ao local de lesão (como descrito anteriormente). Paralelamente, trombina converte FV derivado das plaquetas em FVa, assim ampliando a atividade protrombinase, e convertem FVIII em FVIIIa, o qual age como cofator para FIXa na superfície das plaquetas ativadas para suportar a geração de FXa. Em adição, trombina converte FXI em FXIa. 2 (Figura 2). De acordo com esse modelo biológico celular da coagulação, a via intrínseca FXI-FXII apenas serve como uma amplificação da alça iniciada pela via extrínseca do FT. Entretanto, diversas evidências já revelam que, desta forma, o papel da via intrínseca está subestimado. 2 c. fase da propagação: ocorre nas superfícies contendo fosfolípides procoagulantes, tais como as plaquetas ativadas. FXI ativado converte FIX em FIXa, o qual se associa ao FVIIIa. O complexo tenase de FIXa/FVIIIa catalisa a conversão de FX em FXa, depois do que o complexo FXa/FVa produz suficientes quantidades de trombina para extensivamente formar fibras de fibrina. 2 Como passo final, a transglutaminase plasmática FXIIIa ativada pela trombina catalisa a formação de ligações covalentes entre cadeias de fibrina adjacentes para alcançar um coágulo de fibrina polimerizado elástico 2 (Figura 2). TESTES LABORATORIAIS CONVENCIONAIS DA COAGULAÇÃO Embora esses testes não tenham sido desenvolvidos para prever sangramento ou guiar a condução de distúrbios de coagulação de pacientes cirúrgicos, a maioria dos hospitais na prática clínica coleta sangue no perioperatório para os seguintes testes de coagulação convencionais 20 : tempo de protrombina (PT): é a medida da integridade das vias extrínseca e comum da cascata da coagulação. 21 Foi desenvolvido para monitorar e ajustar doses de cumarínicos. 20 É realizado por incubar o plasma do paciente com tromboplastina tecidual e cálcio a 37ºC em um ph padronizado. Representa o tempo, em segundos, até a formação da fibrina. 20 Em geral, o PT é mais sensível a deficiências do FVII na via extrínseca e menos sensível a deficiências dentro da via final comum (FV, FX, FII e fibrinogênio). 21 Os resultados de PT para amostras de paciente idêntico podem variar com o laboratório. Essa variabilidade dos resultados pode significar sensibilidades diferentes entre as tromboplastinas usadas. E para resolver essa variação entre os laboratórios, a razão internacional normalizada (RNI) foi introduzida. A RNI é uma conversão matemática de um PT do paciente, que leva em conta a sensibilidade da tromboplastina usada em um dado laboratório, pelo índice de sensibilidade internacional fornecido pelo fabricante. 21 tempo de tromboplastina parcial ativada (aptt): é a medida da integridade das vias intrínseca e final comum da cascata de coagulação. 21 Foi desenvolvido para monitorar a heparinização no tratamento de desordens tromboembólicas e pesquisa na hemofilia. 20 Representa o tempo, em segundos, para o plasma do paciente coagular após a adição de tromboplastinas parciais, cálcio e kaolin a 37ºC em um ph pardonizado. 20 O aptt é sensível aos fatores de coagulação VIII, IX, XI, XII, V, II e I; heparina; produtos de degradação do fibrinogênio; inibidores, hipotermia; e hipofibrinogenemia. 20 Certas variáveis pré-teste podem causar prolongamento do PT ou aptt (ou ambos), que seria artefato. Quando o hematócrito é alto, o volume de plasma coletado é proporcionalmete reduzido e o volume de anticoagulante aumentado (efeito diluição). Como resultado, a disponibilidade de cálcio adicionado ao ensaio está reduzida, resultando num prolongamento artificial do tempo de coagulação. Problemas semelhantes podem ocorrer quando o volume de sangue coletado é menor que o recomendado. 21 A maioria dos instrumentos do laboratório detecta a formação do coágulo com um sistema fotóptico de detecção que informa alterações na transmissão de luz. Portanto, plasmas mais turvos (ausência de jejum, amostras lipêmicas, amostras ictéricas ou hemolisadas) levam a resultados artificiais. 20 Em caso de um PT/aPTT prolongado, se o paciente não está recebendo anticoagulantes e não é portador de doença sistêmica (ex: doença hepática), um estudo de mistura do plasma do paciente com plasma normal (1:1) seguido da realização de novo PT e aptt pode ajudar a esclarecer os fatos. Este estudo diferencia entre deficiência de fatores da coagulação e presença Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S20-S29 23

26 Monitorização da coagulação sanguínea perioperatória de inibidores da coagulação. Se o PT/aPTT não corrige para faixa normal com a adição de plasma normal, implica a existência de inibidores da coagulação (medicações, inibidores contra fatores específicos e inibidores inespecíficos (ex: anticoagulantes do lúpus). 20 concentração de fibrinogênio: pode ser medida a partir de vários métodos, mas o mais comum é o de Clauss. 22 Nesse método, a trombina é adicionada ao plasma diluído do paciente e a concentração de fibrinogênio será inversamente proporcional ao tempo de coagulação medido. 20,22 Concentração de fibrinogênio pelo método de Clauss pode ser falsamente alto na presença de soluções coloides, especialmente o HES. 20 contagem de plaquetas: é rotineiramente realizada por máquinas automáticas. O número de plaquetas, contudo, não reflete a qualidade da função das plaquetas. 20 Limitações dos testes laboratoriais convencionais no perioperatório Esses testes são realizados no plasma isolado (PT, aptt e fibrinogênio) ou em sangue total anticoagulado (contagem de plaquetas). 23 Os testes realizados no plasma são feitos à temperatura padronizada de 37ºC (impede a detecção de coagulopatias induzidas pela hipotermia), sem adição de plaquetas ou outras células sanguíneas. Como a resposta hemostática à lesão ou cirurgia é uma complexa interação de proteínas plasmáticas, plaquetas e parede do vaso, de acordo com o atual e bem-aceito modelo de hemostasia baseado em células, ela não pode ser determinada pelos testes realizados no plasma. 20 Refletem apenas a formação inicial da trombina no plasma, com pouca ou nenhuma informação quantitativa da trombina 18 e não são afetados por qualquer elemento corpuscular no sangue. Não oferecem qualquer informação sobre a estabilidade do coágulo no tempo: nada dizem sobre fibrinólise ou deficiência de fator XIII. 5,17,19 O tempo entre a coleta da amostra e o resultado, em caso de sangramento perioperatório grave, é muito longo (30-90 min), dificultando um diagnóstico e terapia hemostática a tempo. 8 Também, o preparo de alguns hemoderivados tais como plasma e crioprecipitado requerem min além do tempo de espera pelo resultado do exame, antes de estarem prontos à beira do leito. 8 A contagem de plaquetas é puramente quantitativa e não pode detectar disfunção plaquetária preexistente, induzida por drogas ou adquirida perioperativamente. 5 Esses testes têm uso limitado para previsão, detecção e monitoramento de tratamento das coagulopatias perioperatórias 5. São pobres preditores de mortalidade e sangramento cirúrgicos, exceto quando muito alterados. 20 Permanecem ainda em uso, no sangramento e coagulopatia perioperatória, devido à tradição, mais que por evidência. 20 Algumas dessas limitações dos testes convencionais de coagulação podem ser resolvidas pelo uso de testes viscoelásticos da coagulação e teste de agregação plaquetária em sangue total. 5,23 TESTES VISCOELÁSTICOS Tromboelastografia (TEG), tromboelastometria (ROTEM) e analisador Sonoclot são os mais comuns mecanismos de teste viscoeláticos disponíveis atualmente. 24 A formação do coágulo é avaliada no sangue total, por medir o desenvolvimento da força viscoelástica entre o copo e o pino imerso no sangue total (Figura 3). 25 Figura 3 - Diferenças entre o os testes viscoelásticos TEG e ROTEM. A =TEG; B = ROTEM. Fonte: Bolliger et al. 25 A tecnologia dos testes viscoelásticos resulta em um perfil visual (traçado) e variáveis com valores de referências 19 (Figura 4, Tabelas 1 e 2). 24 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S20-S29

27 Monitorização da coagulação sanguínea perioperatória Figura 4 - Traçado dos testes viscoelásticos TEG e ROTEM. CT: tempo de coagulação; CFT: tempo de formação do coágulo; MCF: força máxima do coágulo; MA: amplitude máxima; LY: lise; CL: lise do coágulo. Fonte: Bolliger et al. 25 Tabela 1 - Termos (variáveis) usados para TEG e ROTEM TEG ROTEM Período para 2 mm de amplitude Tempo R CT Período de 2 até 20 mm de amplitude Ângulo α Tempo K A (Inclinação entre R e K) CFT A (ângulo na tangente de 2 mm de amplitude) Força máxima do coágulo MA MCF Amplitude (em determinado tempo, em min) A30, A60 A5, A10, A15, A20, A30 Lise máxima ML Lise do coágulo (CL) após 30 e 60 min CL30, CL60 LY30, LY60 CT: tempo de coagulação; CFT: tempo de formação do coágulo; MA: amplitude máxima; ML: lise máxima; CL: lise do coágulo. Fonte: Bolliger et al. 25 Medem e mostram graficamente, em tempo real, as mudanças na viscoelasticidade durante todos os estágios de desenvolvimento e resolução do coágulo 24. E com o uso de ativadores, promovem os primeiros resultados dentro de 5-10 minutos. 8 O sinal viscoelástico é altamente dependente da geração de trombina endógena, polimerização de fibrina e interação da fibrina com receptores GPIIb/IIIa das plaquetas ativadas. 8,23 Em caso de fibrinólise sistêmica, a degradação precoce do coágulo pela plasmina pode ser observada. 8,23 ROTEM e TEG oferecem tipos semelhantes de testes e incluem medidas de coagulação estreitamente relacionadas, mas esses dois sistemas não são intercambiáveis, por causa de diferentes tipos e concentrações de reagentes e amostras sanguíneas diferentes (sangue citratado recalcificado ROTEM e sangue total fresco TEG) 8,23 (Figura 4, Tabelas 1 e 2). Resumidamente, a amostra de sangue total coletada é colocada num copo especial. Dentro do copo é suspenso um pino conectado a um sistema detector. O copo e o pino oscilam um em relação ao outro. Assim que cadeias de fibrina se formam entre o copo e o pino, a ligação entre eles é transmitida e detectada e um traçado é gerado, como visto na Figura Existem algumas diferenças no princípio de trabalho do TEG e ROTEM. 24,25 No TEG, o copo com a amostra de sangue está em rotação, enquanto a alça de torção é fixa. No ROTEM, o copo é fixo, enquanto o pino está em rotação. Mudanças no torque são detectadas eletromecanicamente no TEG e opticamente no ROTEM. O sinal processado pelo computador é finalmente apresentado como um traçado 24,25 (Figura 3). Os valores normais das variáveis dos testes viscoeláticos podem variar com o tipo de população específica (ex: adultos ou crianças, etnia e tipos de doença). 23,25 Nos pacientes adultos há correlação positiva entre firmeza máxima do coágulo e aumento de idade, enquanto o tempo de formação do coágulo encurta em pacientes idosos. 25 Existem também diferenças entre os sexos, a firmeza máxima do coágulo é maior nas mulheres (provavelmente por causa do hematócrito mais baixo). 25 Anemia também aumenta a firmeza máxima do coágulo (atribuído a questões metodológicas mais que a um estado hipercoagulável). 25 Neonatos têm tempo de coagulação encurtado, apesar de PT prolongado (pode ser atribuído a baixos níveis de antitrombina). 25 Tabela 2 - Valores de Referência para os testes básicos do ROTEM e TEG Teste (ativador) CT-ROTEM R-TEG (s) CFT-ROTEM K-TEG (s) Ângulo α (º) MCF-ROTEM MA-TEG (mm) Lise % de MA-TEG % MCF-ROTEM ROTEM EXTEM(TF) <15 INTEM (ácido elágico) <15 FIBTEM (TF +citocalasina D) 9-25 NATEM <15 TEG RapidTEG (Kaolin+TF) <15 Fonte: Tanaka et al. 23 KaoTEG <15 Nativo (Kaolin) <15 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S20-S29 25

28 Monitorização da coagulação sanguínea perioperatória Os testes de coagulação-padrão, comercialmente disponíveis no TEG e ROTEM, são KaoTEG (usa kaolin como ativador), RapidTEG (usa Kaolin e fator tecidual como ativadores) no TEG; e EXTEM (usa fator tecidual como ativador) e INTEM (usa kaolin como ativador) no ROTEM. Diversos outros testes específicos são disponíveis em ambas as tecnologias. 19,24,25 HepTEG monitoriza coagolubilidade sanguínea na presença de heparina, TEG-PM (mapeamento plaquetário) avalia a extensão da inibição plaquetária pela aspirina e clopidogrel e fibrinogênio funcional avalia a contribuição do fibrinogênio para a força do coágulo no TEG. Já no ROTEM: FIBTEM, a partir da adição de um antiplaquetário no copo, avalia a contribuição do fibrinogênio para a força do coágulo; APTEM, pela adição de aprotinina no copo, avalia a via fibrinolítica; HEPTEM, por meio da adição de heparinase, avalia a existência de heparina. Os reagentes para EXTEM, FIBTEM e APTEM para o ROTEM contêm hexadimetrina, a qual neutraliza a heparina. 23 Os testes de coagulação sem ativação são Nativo e NATEM no TEG e ROTEM, respectivamente. 24 A correlação entre a formação do coágulo (modelo baseado em células) e sua resolução (fibrinólise) com o traçado e variáveis dos testes viscoelásticos pode ser vista na Figura 5. Os testes viscoelásticos fornecem informações amplas e rápidas sobre a coagulação sanguínea do paciente e também sobre a resolução do coágulo. O equilíbrio entre coagulação e anticoagulação e fibrinólise e antifibrinólise fica demonstrado nos testes viscoelásticos, facilitando as intervenções terapêuticas necessárias (Figura 6). Os testes convencionais baseados no plasma (PT, aptt, fibrinogênio) avaliam unicamente a ativação plasmática sem os componentes celulares do sangue total e não refletem a fisiologia da geração de trombina baseada em células. 19 Nos testes viscoelásticos, existe íntima associação entre geração de trombina e o perfil de amplificação e propagação, fornecendo evidência de que testes viscoelásticos são capazes de detectar coagulopatias secundárias à geração reduzida de trombina. 19 Testes viscoelásticos também podem diferenciar entre nível e função reduzidos do fibrinogênio e reduzida função plaquetária como causa de força reduzida do coágulo (ex: Figura 7). Podem ser realizados na temperatura do paciente, o que os torna mais sensíveis na detecção de coagulopatias devidas à hipotermia 17 e com volume de sangue menor (1-5 ml) que o gasto numa bateria de exames convencionais 5. E é o único teste hemostático clínico prontamente disponível que permite avaliação rápida de fibrinólise sistêmica 19,23, importante causa de sangramento perioperatório. A hiperfibrinólise é suspeitada quando a redução da amplitude em uma hora é superior a 15% da MA/MCF no TEG/ROTEM 23. Figura 5 - Correlação entre testes viscoelásticos e modelo celular de coagulação. 26 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S20-S29

29 Monitorização da coagulação sanguínea perioperatória Figura 7 - ROTEM de paciente submetido a bypass cardiopulmonar (sobreposição de EXTEM e FIBTEM). A - Traçado do Rotem de base; B - Após grave diluição durante bypass cardiopulmonar; C - Após administração de crioprecipitado; PLT = plaquetas; FIB = fibrinogênio; HCT = hematócrito. Fonte: Bolliger et al. 25 Figura 6 - Traçados de ROTEM. Fonte: Tanaka KA, et al. 23 A função plaquetária refletida no TEG e ROTEM é diferente da dos dispositivos específicos para avaliação da função plaquetária, porque a formação do coágulo, no teste viscoelástico, envolve a ativação plaquetária que é mediada pela trombina, a qual leva à expressão de GPIIb/IIIa 8. Ambas, contagem plaquetária e função GPIIb/IIIa, são refletidas no KaoTEG/RapidTEG e EXTEM/INTEM no ROTEM, mas adesão e agregação plaquetária iniciais não podem ser avaliadas nesses testes. 8 O ensaio específico MT (mapeamento plaquetário) disponível no TEG consegue monitorar as respostas terapêuticas da inibição de agregação plaquetária pela aspirina e clopidogrel. 8,25 O diagnóstico de doença de Von Willebrand e disfunção plaquetária relacionada à deficiência de receptor plaquetário GPIb não é possível no TEG e ROTEM atuais. 8,25 Além da argumentação fisiológica para o uso dos testes viscoelásticos na monitorização perioperatória da coagulação, em cirurgias de grande porte e trauma existem também evidências clínicas suportando esse uso. 19 Mais de 30 estudos clínicos, primariamente avaliando pacientes submetidos a cirurgias hepáticas e cardíacas de grande porte, trauma e outros tipos de pacientes com sangramento maciço, têm mostrado que a terapia de transfusão baseada nos testes viscoelásticos está associada à redução de sangramento e hemotranfusão 19,23,26 e possivelmente também com menos incidência de reoperação e mortalidade, comparada com pacientes tratados de acordo com exames de coagulação tradicionais baseados no plasma. 19 O uso sistemático de testes viscoelásticos para monitorar e guiar a terapia de transfusão tem sido adotado por diversas diretrizes recentes e livros textos. 19 O custo total do teste viscoelástico e teste funcional plaquetário (reagentes, tubos, soluções, manutenção e mecanismos) é em torno de 2,5-3,5 vezes uma bateria de testes convencionais (PT, aptt, fibrinogênio e plaquetas). 5 Esses custos aumentados, no entanto, podem ser compensados pelo mais baixo custo de um regime de transfusão mais racional e eficiente baseados em protocolos de transfusão que usam testes viscoelásticos e de função plaquetária à beira do leito. 5 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S20-S29 27

30 Monitorização da coagulação sanguínea perioperatória TESTES DE FUNÇÃO PLAQUETÁRIA A contagem plaquetária por si só não fornece informação sobre a função plaquetária. Os testes de função plaquetária tradicionalmente têm sido realizados por técnicos de laboratório especializados usando agregometria em plasma rico em plaquetas. Mais recentemente, no entanto, diversos mecanismos de monitoramento da função plaquetária têm se tornado disponíveis e fáceis de usar a beira do leito. 8 A forma como esses dispositivos de avaliação da função plaquetária trabalham é variável, assim como os defeitos ou inibições plaquetárias específicos que eles detectam. 8 A agregometria de sangue total que trabalha com mudanças de impedância, por exemplo, pode ser usada para monitorar os efeitos das drogas antiplaquetárias, bem como da desmopressina, ácido tranexâmico e transfusão de plaquetas, na função plaquetária. 9,20 Também é capaz de detectar a disfunção plaquetária devido ao bypass cardiopulmonar. 9,20 O tempo para leitura da amostra é inferior a seis minutos. 20 Portanto, agregometria por impedância de sangue total idealmente complementa a tromboelastometria na monitorização da coagulação sanguínea perioperatória, particularmente na cirurgia cardíaca. 9 MONITORIZAÇÃO DA HEPARINA INTRAOPERATÓRIA No período perioperatório, o tempo de coagulação ativado (ACT) é o teste à beira do leito preferido para detectar heparina no sangue total. 8 Contudo, as correlações entre valores de ACT e níveis de heparina são fracos. 8 Os valores de referências são pobremente padronizados e dependentes do ativador usado (kolin, celite). 20 ACT não é sensível o suficiente para monitorar baixas doses de heparina, usadas, por exemplo, para proteção de anastomoses vasculares difíceis. 20 Após cirurgia cardíaca, protamina é administrada para neutralizar heparina, mas a administração empírica de protamina usando o ACT frequentemente resulta em dose excessiva de protamina. 8 INTEM e HEPTEM, testes do ROTEM, também têm sido usados para detectar heparina residual no sangue total. Em estudo observacional 27 de 22 pacientes submetidos à revascularização do miocárdio, 16 (72,7%) receberam protamina adicional baseado no ACT ou impressão clínica. Medidas de INTEM/ HEPTEM indicaram que apenas um dos 16 pacientes tinha necessidade de protamina adicional. O uso excessivo de protamina pode, por exemplo, alterar a função plaquetária dos pacientes. Com o uso do IN- TEM/HEPTEM seria fácil confirmar a atividade de heparina residual à beira do leito e evitar administração excessiva de protamina. 8 CONCLUSÕES O sangramento perioperatório é uma causa de morte. A causa é frequentemente multifatorial e pede diagnóstico e intervenção rápidos. Nosso entendimento de hemostasia tem evoluído nos últimos anos e tem sido enfatizado que sua monitorização deve ser realizada de acordo com o modelo celular da coagulação. Os testes de coagulação tradicionais realizados no laboratório avaliam apenas a ativação plasmática, sem os componentes celulares do sangue total, e o tempo de espera para se obter o resultado é acima do ideal para uma intervenção terapêutica específica a tempo. Já os testes viscoelásticos, à beira do leito, como TEG e ROTEM, medem no sangue total a formação e quebra do coágulo, permitindo identificação e tratamento rápidos da coagulopatia. Testes de função plaquetária (agregômetros), também à beira do leito, complementam as informações dos testes viscoelásticos em relação à participação plaquetária na formação do coágulo. Apesar de certas limitações, que devem estar em mente, esses testes de coagulação à beira do leito têm significativo papel ao testar vários aspectos da hemostasia rapidamente e em detalhes. A implementação deles em algoritmos de tratamento hemostático reduz taxas de transfusão sanguínea e possivelmente melhora prognóstico. REFERÊNCIAS 1. Adams RL, Bird RJ. Coagulation cascade and therapeutics update: Relevance to nephrology. Part 1: Overview of coagulation, thrombophilias and history of anticoagulants. Nephrology (Carlton) Aug; 14(5): Versteeg HH, Heemskerk JW, Levi M, Reitsma PH. New fundamentals In hemostasis.physiol Rev Jan;93(1): Smith SA. The cell-based model of coagulation. J Vet Emerg Crit Care (San Antonio) Feb; 19(1): Innerhofer P, Kienast J. Principles of perioperative coagulopathy. Best Pract Res Clin Anaesthesiol Mar; 4(1): Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S20-S29

31 Monitorização da coagulação sanguínea perioperatória 5. Weber CF, Zacharowski K. Perioperative point of care coagulation Testing.DtschArztebl Int May;109(20): Tanaka KA, Esper S, Bolliger D. Perioperative factor concentrate therapy. Br J Anaesth Dec; 111(Suppl 1):i Watson GA, Sperry JL, Rosengart MR, Minei JP, Harbrecht BG, Moore EE, et al. Fresh frozen plasma is independently associated with a higher risk of multiple organ failure and acute respiratory distress syndrome. J Trauma Aug; 67(2):221-7; discussion Tanaka KA, Bader SO, Sturgil EL. Diagnosis of Perioperative Coagulopathy - Plasma versus Whole Blood Testing. J Cardiothorac Vasc Anesth Aug; 27(4 Suppl):S Görlinger K, Shore-Lesserson L, Dirkmann D, Hanke AA, Rahe- -Meyer N, Tanaka KA. Management of hemorrhage in cardiothoracic surgery. J Cardiothorac Vasc Anesth Aug; 27(4 Suppl):S Bolliger D, Tanaka KA. Roles of thrombelastography and thromboelastometry for patient blood management in cardiac surgery.transfus Med Rev Oct; 27(4): Vamvakas EC, Blajchman MA. Blood still kills: six strategies to further reduce allogeneic blood transfusion related mortality. Transfus Med Rev Apr; 24(2): Erratum in: Transfus Med Rev Jul; 24(3): Holcomb JB, Wade CE, Michalek JE, Chisholm GB, Zarzabal LA, Schreiber MA, et al. Increased plasma and platelet tored blood cell ratios improves outcome in 466 massively transfused civilian trauma patients. Ann Surg Sep; 248(3): Ho AM, Dion PW, Cheng CA, Karmakar MK, Cheng G, Peng Z, et al. A mathematical model for fresh frozen plasma transfusion strategies during major trauma resuscitation with ongoing hemorrhage.can J Surg Dec; 48(6): Chowdary P, Saayman AG, Paulus U, Findlay GP, Collins PW. Efficacy of standard dose and 30ml/kg fresh frozen plasma in correcting laboratory parameters of haemostasis in critically ill patients. Br J Haematol Apr; 125(1): Narick C, Triulzi DJ, Yazer MH. Transfusion associated circulatory overload after plasma transfusion.transfusion Jan; 52(1): Ho AM, Dion PW, Yeung JH, Holcomb JB, Critchley LA, Ng CS, et al. Prevalence of survivor bias in observational studies on fresh frozen plasma: Erythrocyte ratios in trauma requiring massive transfusion. Anesthesiology Mar; 116(3): Pham HP, Shaz BH. Update on massive transfusion. Br J Anaesth Dec; 111(Suppl 1):i Sié P, Steib A. Central laboratory and point of care assessment of perioperative hemostasis.can J Anaesth Jun; 53(6 Suppl):S Stensballe J, Ostrowski SR, Johansson PI. Viscoelastic guidance of resuscitation. Curr Opin Anaesthesiol Apr; 27(2): Kozek-Langenecker SA. Perioperative coagulation monitoring. Best Pract Res ClinAnaesthesiol Mar; 24(1): Kamal AH, Tefferi A, Pruthi RK. How to Interpret and Pursue an Abnormal Prothrombin Time, Activated Partial Thromboplastin Time, and Bleeding Time in Adults. Mayo Clin Proc Jul; 82(7): Rochon AG, Shore-Lesserson L. Coagulation Monitoring. Anesthesiol Clin Dec; 24(4): Tanaka KA, Bader SO, Görlinger K. Novel approaches in management of perioperative Coagulopathy. Curr Opin Anaesthesiol Feb; 27(1): Ganter MT, Hofer CK. Coagulation monitoring: current techniques and clinical use of viscoelastic point-of-care coagulation devices. Anesth Analg May; 106(5): Bolliger D, Seeberger MD, Tanaka KA. Principles and practice of thromboelastography in clinical coagulation management and transfusion practice. Transfus Med Rev Jan; 26(1): Afshari A, Wikkelsø A, Brok J, Møller AM, Wetterslev J. Thrombelastography (TEG) or thromboelastometry (ROTEM) to monitor haemotherapy versus usual care in patients with massive transfusion. Cochrane Database Syst Rev Mar 16; (3):CD Mittermayr M, Velik-Salchner C, Stalzer B, Margreiter J, Klingler A, StreifW, et al. Detection of protamine and heparin after termination of cardiopulmonary bypass by thrombelastometry (ROTEM):Results of a pilot study. Anesth Analg Mar; 108(3): Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S20-S29 29

32 ARTIGO DE REVISÃO Anticoagulantes e bloqueios do neuroeixo Anticoagulants and neuraxial blockade Estefânia Furtado Rocha 1, Gabriela Ferreira Duarte 1, Marcela Morais Afonso Cruz 1, Gisela Magnus 2 DOI: / S014 RESUMO 1 Médica especializanda em Anestesiologia do Hospital Luxemburgo. Belo Horizonte, MG Brasil. 2 Médica Anestesiologista. Título Superior em Anestesiologia pela Sociedade Brasileira de Anestesiologia. Instrutora da residência médica em Anestesiologia do Hospital Luxemburgo. Belo Horizonte, MG Brasil. O número de pacientes em uso de fármacos anticoagulantes ou que alteram a hemostasia tem aumentado em virtude da maior expectativa de vida da população, do advento de medicamentos mais seguros e do aumento na prevalência de doenças cardiovasculares. A anestesia por bloqueio do neuroeixo quando realizada nesses pacientes traz o risco de sangramento e hematoma espinhal. Apesar da incidência estimada de complicações hemorrágicas associadas a bloqueios neuroaxiais ser baixa, além de imprecisa, a gravidade de suas consequências torna imperativo o desenvolvimento de estratégias que aumentem a segurança no procedimento anestésico desses pacientes. Entretanto, as recomendações baseadas em evidências são fracas, pois se baseiam principalmente em relatos de casos, pequenos estudos e farmacocinética das drogas. Neste artigo, revisamos a literatura sobre técnicas neuroaxiais realizadas em pacientes em uso de drogas anticoagulantes e/ou que alteram a hemostasia, com o objetivo de auxiliar o anestesiologista no manejo mais seguro e de qualidade para os pacientes. Palavras-chave: Anestesia por Condução; Raqueanestesia; Anticoagulantes, Inibidores da Agregação de Plaquetas; Hematoma Epidural Espinal. ABSTRACT The number of patients using anticoagulants or drugs that alter hemostasis has increased because of increased life expectancy, advent of safer medicines, and increased prevalence of cardiovascular diseases. In these patients, anesthesia by neuraxial blockade brings the risk of bleeding and spinal hematoma. Despite the estimated incidence of hemorrhagic complications associated with neuraxial blockade being low and inaccurate, the gravity of its consequences makes the development of strategies that increase the safety in the anesthetic procedures in these patients imperative. However, evidence-based recommendations are weak because they are based primarily on case reports, small studies, and drugs pharmacokinetics. In this article, we reviewed the literature on neuraxial techniques performed in patients using anticoagulant drugs, and/or those that alter hemostasis, with the objective of assisting the anesthesiologist to improve the quality and safety in these patients management. Key words: Anesthesia, Conduction; Anesthesia, Spinal; Anesthesia, Epidural; Anticoagulants; Platelet Aggregation Inhibitors; Hematoma, Epidural, Spinal. INTRODUÇÃO Instituição: CET Hospital Luxemburgo Belo Horizonte, MG Brasil Autor correspondente: Gisela Magnus gisela_magnus@gmail.com O bloqueio neuroaxial é rotineiramente utilizado para anestesia cirúrgica e analgesia pós-operatória. Essa modalidade anestésica apresenta vantagens sobre outras técnicas, entre elas: analgesia eficaz; redução do sangramento perioperatório; redução da necessidade de transfusão sanguínea; e redução da incidência da oclusão de enxertos. 1 As complicações hemorrágicas após bloqueios neuroaxiais são pouco 30 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S30-S36

33 Anticoagulantes e bloqueios do neuroeixo frequentes, mas implicam consequências desastrosas. O hematoma espinhal (HEP), definido como sangramento no interior do neuroeixo, é um evento raro, porém catastrófico, que pode ocorrer como complicação hemorrágica mais grave associada à anestesia subaracnóidea ou peridural. 1 O sangramento dentro do canal medular pode resultar em dano neurológico irreversível com paraplegia. 2 A real incidência de disfunções neurológicas advindas de complicações hemorrágicas associadas a bloqueios do neuroeixo é desconhecida. 1,3 Em revisão da literatura, TRYBA 4 estimou a incidência 1: anestesias peridurais e 1: em anestesias subaracnóideas. 3,4 O sangramento no canal medular origina rapidamente uma mielopatia compressiva. O desenvolvimento de coágulo e a reação inflamatória comprometem o fluxo sanguíneo da medula e raízes nervosas espinhais, com consequente isquemia e lesão nervosa. O HEP manifesta-se inicialmente por regressão incompleta ou ausente do bloqueio motor ou sensitivo; retorno de déficit sensitivo ou motor após regressão completa; dor na região do dorso e retenção urinária. 2,5 O HEP é uma emergência neurocirúrgica que demanda intervenção imediata. A descompressão cirúrgica precoce (6-12 horas após o desenvolvimento dos primeiros sintomas) está diretamente relacionada ao prognóstico da lesão neurológica. 6-8 Dessa forma, frente à suspeita de HEP, o paciente deve ser submetido à ressonância nuclear magnética, considerada o exame padrão-ouro para diagnóstico e acompanhamento ou, na indisponibilidade desta, realizar tomografia computadorizada. 2 A causa mais comum de HEP é a espontânea, seguida de complicação hemorrágica de bloqueio neuroaxial e em terceiro lugar secundário às malformações vasculares. 2 Os fatores de risco associados ao HEP estão relacionados à idade do paciente (mais frequente em idosos); sexo feminino; coagulopatias; trombocitopenias; alterações da anatomia espinhal; múltiplas tentativas de punção neuroaxial; sangue no cateter epidural durante sua inserção ou remoção; uso de drogas anticoagulantes, antiplaquetárias ou fibrinolíticas; e uso de terapia anticoagulante/antiplaquetária dupla. 1-3,6,9-14 Em relação ao HEP associado a bloqueios neuroaxiais, a inserção de cateter peridural está em primeiro lugar, seguida da punção peridural simples e, por último, a punção subaracnóidea. 2 Em decorrência do reduzido número de casos relatados referentes a hematoma espinhal após blo- queios neuroaxiais, as recomendações não se baseiam em estudos prospectivos randomizados, mas em opiniões de especialistas e relatos de casos. 15 A recomendação adotada pela maioria das sociedades tem sido estabelecer um intervalo de tempo, entre a interrupção da medicação e o bloqueio do neuroeixo, de duas vezes a meia-vida de eliminação do fármaco. 16 HEPARINA NÃO FRACIONADA Usada para tratamento de trombose venosa profunda (TVP), para profilaxia antitrombótica, em circulação extracorpórea para cirurgia cardíaca e em cirurgia vascular. 2 Em dose terapêutica, a anticoagulação é monitorada com tempo de tromboplastina parcial ativado (TTPa). Sua anticoagulação pode ser revertida com protamina; 1 mg de heparina (protamina) neutraliza 100 UI de heparina. Doses para profilaxia de TVP geralmente não alteram o TTPA. 4 O uso de doses profiláticas (duas doses diárias de UI) não contraindica a realização de bloqueio do neuroeixo. 1,2 Em decorrência do risco de trombocitopenia induzida pela heparina em pacientes que usam HNF por mais de quatro dias, a contagem de plaquetas deve ser realizada nesses pacientes antes do bloqueio de neuroeixo e da remoção do cateter. 1,15 O intervalo entre a administração de HNF e o bloqueio de neuroeixo ou remoção de cateter peridural deve ser de 4-6 horas. 15 A próxima dose de HNF profilática deve ser realizada no mínimo uma hora após a anestesia ou a remoção do cateter. 2 A heparinização intraoperatória não representa necessariamente uma contraindicação para bloqueio do neuroeixo 15. No entanto, algumas recomendações são sugeridas. Deve-se aguardar intervalo de no mínimo uma hora entre a punção/colocação de cateter e a heparinização. O bloqueio não deve ser realizado se o paciente estiver em uso de anticoagulantes ou apresentar coagulopatias. É necessário aguardar intervalo de quatro horas entre a dose de heparina e a retirada do cateter. Após a remoção do cateter, aguardar uma hora para nova dose de HNF. 1,15 Pacientes em uso de doses terapêuticas devem apresentar valores normais de TTPa ou TCP (tempo de coagulação ativado) antes da punção ou remoção do cateter. Esses pacientes devem ter a droga suspensa por no mínimo quatro horas antes do bloqueio neuroaxial ou remoção do cateter. 2 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S30-S36 31

34 Anticoagulantes e bloqueios do neuroeixo HEPARINA DE BAIXO PESO MOLECULAR Heparina de baixo peso molecular (HBPM) é usada para profilaxia e tratamento de trombose venosa profunda (TVP), bem como na terapêutica de substituição nos doentes cronicamente medicados com varfarina, tais como grávidas, doentes com próteses valvares ou com história de fibrilação atrial 17. Sua vantagem em relação à heparina não fracionada é a maior biodisponibilidade após administração subcutânea, o que resulta em efeito anticoagulante superior, sem aumentar a tendência ao sangramento e sua longa meia-vida de 4-7 horas, que permite a administração da droga apenas uma vez ao dia. Seu efeito resulta da ativação da antitrombina III com efeito inibitório marcado do fator Xa em relação à trombina. O tempo de coagulação ativado e o tempo de tromboplastina parcial ativado podem permanecer inalterados com o uso da HBPM e sua ação anticoagulante é monitorada pela dosagem plasmática da atividade do fator Xa. Ao contrário da heparina não fracionada, sua atividade não pode ser revertida pela protamina. A HBPM é excretada pela via renal e, por isso, é contraindicada em pacientes com clearance de creatinina <30 ml/min. 18 Após administração subcutânea, seu pico de ação ocorre em aproximadamente 3-4 horas e a meia-vida de eliminação nos pacientes com função renal normal é de 4-6 horas. Naqueles com insuficiência renal grave a meia-vida de eliminação pode ser superior a 16 horas. 4 Na Europa, a dose profilática de HBPM administrada é de 40 mg uma vez ao dia, sendo a primeira dose administrada 12 horas antes da cirurgia; e nos EUA a administração é feita duas vezes ao dia na dose de 30 mg. As diversas sociedades de anestesiologia são coerentes em relação ao intervalo de segurança recomendado entre a última dose de HBPM dose profilática de uma vez ao dia e o bloqueio do neuroeixo/remoção do cateter, com intervalos superiores a 10 a 12 horas. 17 Em pacientes com esquema profilático de 12/12 horas, dever-se-á omitir uma dose, para possibilitar intervalo de 24 horas antes do BNE ou retirada do cateter. Naqueles com doses terapêuticas de HBPM, como enoxaparina 1 mg/ kg a cada 12 horas ou 1,5 mg/kg/dia, é recomendado intervalo de pelo menos 24 horas entre a última dose e o bloqueio neuroaxial 2. Para uso pós-operatório, a primeira dose deve ser administrada seis a oito horas após a cirurgia e a segunda não deve ser administrada antes de 24 horas da primeira. A retirada do cateter peridural deve ser feita somente após 10 a 12 horas da última dose; e a dose subsequente de HBPM, após a retirada do cateter, deve ser feita depois de duas horas. ANTAGONISTAS DA VITAMINA K (ACENOCOUMAROL, FLUINDIONA, FENPROCOUMON, VARFARINA) Anticoagulação terapêutica com cumarínicos representa contraindicação absoluta para bloqueio neuroaxial. 15 O uso concomitante de medicamentos que afetam outros mecanismos de coagulação, como AINES, ticlopina e clopidogrel, aumenta o risco de complicações hemorrágicas nos pacientes em uso de anticoagulantes orais. 1,2 Antes do bloqueio, a terapia anticoagulante deve ser interrompida por 4-5 dias e o retorno da coagulação normal deve ser verificado usando-se o índice normalizado internacional (RNI). 1,2,15 RNI de 1,5 está relacionado à atividade do fator VII de 40%. Dessa forma, para pacientes que estão recebendo analgesia peridural e que foi iniciada a terapia profilática com varfarina no pós-operatório, é recomendado pela ASRA que a remoção do cateter seja feita apenas após valores inferiores a 1,5 de RNI. 1,2 Esses pacientes devem ser avaliados por testes neurológicos de função sensorial e motora rotineiramente durante a analgesia peridural. 1 AGENTES ANTIPLAQUETÁRIOS Pertencem a esse grupo: AINEs, tienopiridínico (ticlopidina e clopidogrel) e inibidores de GP IIb/ IIIa (abciximab, eptifibatide, tirofibano). Tais drogas exercem diversos efeitos sobre a função plaquetária e apresentam diferenças farmacológicas, tornando impossíveis recomendações únicas em relação às técnicas anestésicas e ao uso dos fármacos. Não há qualquer exame, incluindo o tempo de sangramento, que oriente a terapia antiplaquetária. Dessa forma, deve ser realizada avaliação pré-operatória para identificar fatores de risco que contribuem para alterações hemorrágicas. Entre os fatores, são citados: história de fácil sangramento excessivo, sexo feminino e idade avançada. 1 AAS e AINEs Não representam risco adicional para o desenvolvimento de hematoma espinhal em pacientes submetidos a bloqueio de neuroeixo. 1,2,19,20 Não existem preocupações em relação ao tempo entre a administração da droga e o bloqueio de neuroeixo ou remoção do cateter. 1,2 32 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S30-S36

35 Anticoagulantes e bloqueios do neuroeixo Não é necessário aguardar intervalo entre o bloqueio ou remoção do cateter e a dose pós-operatória do fármaco. 2 Ticlopidina O efeito máximo de inibição da agregação é alcançado após 8-11 dias, durante uso de 500 mg por dia. A meia-vida de eliminação é de horas e aumenta para mais de 90 horas com a administração a longo prazo. A disfunção plaquetária permanece por 10 a 14 dias após suspensão do fármaco. O intervalo entre a última dose da droga e o bloqueio neuroaxial ou a retirada do cateter deve ser de 10 a 14 dias. 1,2,15 Clopidogrel O efeito máximo de inibição plaquetária após uso oral de 75 mg é observado depois de 3-7 dias ou depois de aproximadamente horas após a administração de bolus inicial de mg. A recuperação da função plaquetária ocorre apenas 6-7 dias após o fim da administração de clopidogrel. 2,15,21,22 Dessa maneira, o bloqueio do neuroeixo e a remoção do cateter devem ser feitos após sete dias da última dose. 1,2,15 Prasugrel Seu início de ação é rápido, de 30 a 60 min. Após interrupção do fármaco, a função plaquetária é restaurada em 10 dias. A anestesia neuroaxial é fortemente desencorajada durante o tratamento com prasugrel. Deve ser aguardado intervalo de tempo de 7-10 dias entre a última dose do fármaco e o bloqueio ou remoção do cateter. 1,2 Inibidores de glicoproteína IIb/IIIa (abciximab, eptifibatibe e tirofiban) São as drogas mais efetivas para a inibição plaquetária. Os efeitos antiplaquetários são reversíveis e desaparecem em oito horas (para o eptifibatibe e o tirofiban) e horas (para o abciximab), após descontinuação do uso. São fármacos comumente usados em síndromes coronarianas agudas, em com- binação com anticoagulantes e aspirina. Nos procedimentos emergenciais realizados nesses pacientes, o bloqueio do neuroeixo está contraindicado. 2,15 A remoção de cateter ou bloqueio de neuroeixo deve ser feita após interrupção de 8-10 horas para o tirofiban/epifibatibe e 48 horas para o abciximab. A contagem plaquetária também deve ser realizada anteriormente para excluir trombocitopenia. 2,15,22 Ticagrelor Rápido início de ação e curta duração (48-72 horas). É utilizado em duas doses orais diárias. Os efeitos na agregação plaquetária ocorrem cerca de 30 minutos após a dose de ataque. Cessando o tratamento, a função plaquetária normal é recuperada em 4,5 dias. 2,15 Admite-se que o curto e reversível efeito antiplaquetário facilita o manejo perioperatório. No entanto, o intervalo entre a última dose da droga e a anestesia do neuroeixo deve ser de pelo menos cinco dias, visto que não existem dados conclusivos sobre o uso perioperatório da droga. 2 Cilostazol É utilizado por via oral na dose de 100 mg duas vezes ao dia. Após a ingestão oral, os níveis plasmáticos máximos são atingidos após 2,7-3,6 horas. A meia- -vida de eliminação da droga e de seus metabólitos ativos é em torno de 21 horas. 2,15 As técnicas de neuroeixo durante o uso do fármaco são desencorajadas. O bloqueio neuroaxial e a remoção do cateter só devem ser realizados após, no mínimo, 42 horas de interrupção do fármaco, o que corresponde a duas meias-vidas de eliminação da droga. O intervalo recomendado pelo fabricante, no entanto, é de pelo menos cinco dias. A dose subsequente à retirada do cateter peridural deve ser administrada após cinco horas. 2,15 INIBIDORES DO FATOR XA Fondaparinux O risco real de hematoma espinhal com fondaparinux é desconhecido. Consensos são baseados no Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S30-S36 33

36 Anticoagulantes e bloqueios do neuroeixo efeito antitrombótico sustentado e irreversível e relatos de casos clínicos são publicados 15. Possui meia- -vida plasmática de 21 horas. 1 É administrado seis a 12 horas após a cirurgia. 2,15,23 Quando utilizado em dose profilática (2,5 mg uma vez por dia) no pós-operatório, a anestesia do neuroeixo atraumática pode ser realizada. O intervalo entre a retirada do cateter peridural e a última dose do fármaco deve ser de 36 horas. A nova dose do fondaparinux após remoção do cateter deve respeitar o intervalo de 12 horas. 2,15 Rivaroxaban Utilizado para profilaxia de TVP após cirurgias ortopédicas (artroplastia total de joelho e coxofemoral). A primeira dose, que corresponde a 10 mg de rivaroxaban, é administrada 6 8 h após o procedimento cirúrgico. A meia-vida plasmática é de 5-9 horas e prolongada, de acordo com o fabricante, para 11 a 13 horas em idosos. O intervalo entre a última dose e o bloqueio neuroaxial ou a retirada de cateter deve ser de 22 a 26 horas. Após a retirada do cateter e a dose subsequente de rivaroxaban, deve-se aguardar quatro a seis horas. 2,15 Apixaban Utilizado em duas doses diárias e não requer monitorização da anticoagulação. Níveis plasmáticos máximos são obtidos com três horas e a meia-vida é de 10 a 15 horas. O intervalo entre a última dose e o bloqueio neuroaxial ou retirada de cateter deve ser de 20 a 30 horas. Após a retirada de cateter, aguardar quatro a seis horas para nova dose de apixaban. 2,15 INIBIDORES DE TROMBINA Dabigatran Utilizado como profilaxia contra trombose venosa periférica profunda (TVP) em pacientes que realizam cirurgias ortopédicas (artroplastia total de joelho e coxofemoral) 2. É iniciado quatro horas após a cirurgia. A meia-vida é de 12 a 17 horas e os níveis plasmáticos máximos são obtidos em duas a quatro horas após sua administração. 2,16 O intervalo entre a última dose da droga e o bloqueio neuroaxial deve ser de sete dias. O cateter não deve ser retirado antes de 36 horas (mínimo de duas meias-vidas) após a última dose do fármaco. A próxima dose do dabigatran deve ser 12 horas após a retirada do cateter. 16 Argatroban É administrado por via intravenosa na dose de 0,5-2,0 µg/kg/min e a dose é ajustada para manter o TTPA entre 1,5 e três vezes o normal. A meia-vida é curta, de 35 a 45 minutos. A normalização do TTPa ocorre após duas a quatro horas da interrupção da infusão. 2,15 O intervalo mínimo de quatro horas deve ser respeitado entre a interrupção da droga e o bloqueio neuroaxial ou a inserção do cateter peridural. 2 Após o bloqueio neuroaxial ou retirada do cateter, a nova dose da droga deve ser administrada no mínimo duas horas depois e após confirmação da inexistência de efeito anticoagulante residual por meio da dosagem do TTPa ou TCA. 2 MANEJO ANESTÉSICO DO PACIENTE RECEBENDO TERAPIA FITOTERÁPICA É descrito aumento do número de pacientes cirúrgicos que utilizam medicamentos fitoterápicos e muitas vezes a utilização de desses fármacos não é relatada. Ainda não existe algum exame laboratorial para avaliar hemostasia adequada nos pacientes que utilizam tais medicações. A morbimortalidade associada ao uso de ervas medicinais no perioperatório está mais associada à polifarmácia. O uso concomitante de ervas medicinais e fármacos como anticoagulantes orais ou heparina deve ser investigado, pois nesses casos há aumento do risco de complicações hemorrágicas. Em resumo, tais medicamentos isoladamente não estão relacionados ao aumento no risco de desenvolvimento de hematoma espinhal secundário à anestesia espinhal ou peridural. A interrupção de sua utilização ou o cancelamento de cirurgias em função de uso de ervas medicinais não são mandatórios. Não existe consenso quanto à necessidade de aguardar intervalo de tempo entre a última dose do fármaco e a realização de bloqueio neuroaxial, remoção de cateter ou monitorização neurológica pós-operatória. 1,2 34 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S30-S36

37 Anticoagulantes e bloqueios do neuroeixo Alho É uma das plantas medicinais mais pesquisadas. Modifica o risco potencial de desenvolvimento de aterosclerose a partir da redução dos valores de pressão arterial, da formação de trombos e da redução nos níveis séricos de lípides e colesterol. Causa inibição plaquetária dose-dependente. A dose usualmente recomendada é de 4 gramas por dia do bulbo fresco (aproximadamente dois dentes) ou o equivalente em extrato. Tem o potencial de aumentar o sangramento peroperatório, principalmente quando utilizado com outras medicações que inibem a agregação plaquetária. O tempo para retorno da hemostasia normal após interrupção do seu uso é de sete dias. É relatado na literatura um caso de hematoma peridural espontâneo atribuído ao uso exagerado de alho. 1 Ginko É utilizado para tratamento de desordens cognitivas, doença vascular periférica, degeneração macular relacionada à idade, disfunção erétil, vertigem e zumbido. A dose utilizada usualmente é de mg do extrato por dia divididos em duas ou três doses. É responsável pela inibição do fator ativador plaquetário. São descritos quatro casos de sangramento espontâneo intracraniano que foram atribuídos ao uso de ginko. O tempo para retorno da hemostasia normal após interrupção de seu uso é de 36 horas. 1 Ginseng A dose rotineiramente utilizada é de 200 mg do extrato por dia. Causa inibição da agregação plaquetária in vitro e prolonga tanto o tempo de trombina quanto o tempo de tromboplastina parcial ativada em ratos. O tempo necessário para retorno da hemostasia normal após descontinuação de seu uso é de 24 horas. 1 REFERÊNCIAS 1. Horlocker TT, Wendel DJ, Benzon H, Brown DL, Enneking FK, Heit JA, et al. Regional anesthesia in the anticoagulated patient: Defining the risks (the second ASRA Consensus Conference on Neuraxial Anesthesia and Anticoagulation). Reg Anesthes and Pain Medic. 2003; 28: Fonseca MF, Pontes JPJ, Alves RR. Recomendações da SBA para segurança na anestesia regional em uso de anticoagulantes. Rev Bras Anestesiol. 2014; 64(1): Green L, Machin SJ. Managing anticoagulated patients during neuraxial anaesthesia. Br J Haematol. 2010; 149: Tryba, M. European practice guidelines: thromboembolism prophylaxis and regional anesthesia. Reg Anesthes and Pain Medic. 1998; 23: Vandermeulen E. Regional anaesthesia and anticoagulation. Best Pract Res Clin Anaesthesiol. 2010; 24: Vandermeulen E, Singelyn F, Vercauteren M, Brichant JF, Ickx BE, Gautier P. Belgian guidelines concerning central neural blockade in patients with drug-induced alteration of coagulation: an update. Acta Anaesthes Belgica. 2005; 56: Cheney FW, Domino KB, Caplan RA, Posner KL. Nerve injury associated with anesthesia: a closed claims analysis. Anesthesiology. 1999; 90: Meikle J, Bird S, Nightingale JJ, White N. Detection and management of epidural haematomas related to anaesthesia in the UK: a national survey of current practice. Br J Anaesthes. 2008; 101: Brem SS, Hafler DA, Van Uitert RL, Ruff RL, Reichert WH. Spinal subarachnoid hematoma: a hazard of lumbar puncture resulting in reversible paraplegia. N Eng J Med. 1981; 304: Ruff RL, Dougherty Jr JH. Complications of lumbar puncture followed by anticoagulation. Stroke. 1981; 12: Owens EL, Kasten GW, Hessel EA. Spinal subarachnoid hematoma after lumbar puncture and heparinization: a case report, review of the literature, and discussion of anesthetic implications. Anesth Analg. 1986; 65: Vandermeulen EP, Van AH, Vermylen J. Anticoagulants and spinal-epidural anesthesia. Anesth Analg. 1994; 79: Wulf H Epidural anaesthesia and spinal haematoma. Can J Anaesth. 1996; 43: Horlocker TT, Wedel DJ. Neuraxial block and low-molecular- weight heparin: balancing perioperative analgesia and thromboprophylaxis. Reg Anesth Pain Med. 1998; 23: Gogarten W, Vandermeulen E, Van Aken H, Kozek S, Liau JV, Samama CM. Regional anaesthesia and antithrombotic agents: recommendations of the European Society of Anaesthesiology. Eur J Anaesthesiol. 2010; 27: Rosencher N, Bonnet MP, Sessler DI. Selected new antithrombotic agents and neuraxial anaesthesia for major orthopaedic surgery: management strategies. Anaesthes. 2007; 62: Correia C, Fonseca C, Lages N. Guia prático de doentes medicados com fármacos que interferem na hemostase propostos para anestesia do neuroeixo ou de plexo/nervos periféricos. Rev SPA jun; 16: Green L, Machin SJ. Managing anticoagulated patients during neuraxial anaesthesia. Br J Haematol. 2010; 149: Maclean, A. Antiplatelet therapy, regional anesthesia, and spinal hematomas. Anesthes Analges. 1995; 81: Urmey WF, Rowlingson J. Do antiplatelet agents contribute to the development of perioperative spinal hematoma? Reg Anesthes and Pain Medic. 1998; 23: Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S30-S36 35

38 Anticoagulantes e bloqueios do neuroeixo 21. Denninger MH, Necciari J, Serre-Lacroix E, Sissmann J. Clopi- dogrel antiplatelet activity is independent of age and presence of atherosclerosis. Semin Thromb Hemost. 1999; 25(S2): Patrono C, Coller B, FitzGerald GA, Hirsh J, Roth G. Platelet-active drugs: the relationships among dose, effectiveness, and side effects: the Seventh ACCP Conference on Antithrombotic and Thrombolytic Therapy. Chest. 2004; 126:234S 64S. 23. Turpie AG, Eriksson BI, Bauer KA, Lassen MR. New pentasaccharides for the prophylaxis of venous thromboembolism: clinical studies. Chest. 2003; 124:371S 8S. 24. Gogarten W, Van Aken H, Buttner J, Riess H, Wulf H, Buerkle H. Neuraxial blockade and thromboembolism prophylaxis/antithrombotic therapy: revised recommendations of the German Society of Anaesthesiology and Intensive Care Anasthesiol Intensivmed Notfallmed Schmerzther. 2003; 44: Cook TM, Counsell D, Wildsmith JA. Major complications of central neuraxial block: report on the Third National Audit Project of the Royal College of Anaesthetists. Br J Anaesthes. 2009; 102: Afzal A, Hawkins F, Rosenquist RW. Epidural hematoma in a patient receiving epidural analgesia and LMWH after total-knee arthroplasty. Reg Anesth Pain Med. 2006; 31: Tam NL, Pac-Soo C, Pretorius PM. Epidural haematoma after a combined spinal-epidural anaesthetic in a patient treated with clopidogrel and dalteparin. Br J Anaesthes. 2006; 96: Xu R, Bydon M, Gokaslan ZL, Wolinsky JP, Witham TF, Bydon A. Epidural steroid injection resulting in epidural hematoma in a patient despite strict adherence to anticoagulation guidelines. J Neurosur. 2009; 11: Ain RJ, Vance MB. Epidural hematoma after epidural steroid injection in a patient withholding enoxaparin per guidelines. Anesthesiology. 2005; 102: Ansell J, Hirsh J, Hylek E, Jacobson A, Crowther M, Palareti G. Pharmacology and management of the vitamin K antagonists: American College of Chest Physicians Evidence-Based Clinical Practice Guidelines (8th Edition). Chest. 2008; 133: 160S-98S. 32. Baglin T, Barrowcliffe TW, Cohen A, Greaves M. Guidelines on the use and monitoring of heparin. Br J Haematol. 2006; 133: Davignon KR, Maslow A, Chaudrey A, Ng T, Shore-Lesserson L, Rosenblatt MA. CASE : Epidural Hematoma: when is it safe to heparinize after the removal of an epidural cath- eter? J Cardioth Vasc Anesthes. 2008; 22: Kozek-Langenecker SA, Fries D, Gutl M, Hofmann N, Innerhofer P, Kneifl W, et al. Locoregional anesthesia and coagulation inhibitors. Recommendations of the Task Force on Perioperative Coagulation of the Austrian Society for Anesthesiology and Intensive Care Medicine. Der Anaesthes. 2005; 4: Lassen MR, Davidson BL, Gallus A, Pineo G, Ansell J, Deitchman D. The efficacy and safety of apixaban, an oral, direct factor Xa inhibitor, as thromboprophylaxis in patients following total knee replacement. J Thromb and Haemostas. 2007; 5: Llau JV, Ferrandis R. New anticoagulants and regionalanesthesia. Curr Opin Anaesthesiol. 2009; 22: Llau PJV, De Andres IJ, Gomar SC, Gomez LA, Hidalgo MF, Torres MLM. Guidelines of hemostasis inhibiting drugs and neuraxial anaesthesia. Rev Espan de Anestes y Reanimac. 2009; 52: Parvizi J, Viscusi ER, Frank HG, Sharkey PF, Hozack WJ, Rothman RR. Can epidural anesthesia and warfarin be coadministered? Clin orthopaed and relat researc. 2007; 456: Hirsh J, Bauer KA, Donati MB, Gould M, Samama MM, Weitz JI. Parenteral anticoagulants: American College of Chest Physicians Evidence-Based Clinical Practice Guidelines. Chest. 2008;133:141S-59S. 30. Cameron CM, Scott DA, McDonald WM, Davies M.J. A review of neuraxial epidural morbidity: experience of more than 8,000cases at a single teaching hospital. Anesthesiology. 2007; 106: Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S30-S36

39 ARTIGO DE REVISÃO O Concentrado de Complexo Protrombínico e suas aplicações na sala de cirurgia Prothrombin Complex Concentrate and its applications in the operating room Erick Martins Faria de Abreu 1, Leonardo Saraiva Guimarães de Oliveira 2, Pablo Martins Biagioni de Menezes 3, Jaci Custódio Jorge 4 DOI: / S015 RESUMO Os concentrados de complexo protrombínico (CCPs) contêm fatores de coagulação dependentes da vitamina K em uma concentração 25 vezes maior que a do plasma e são classificados em compostos de três ou quatro fatores, de acordo com a presença do fator VII (FVII). Quando comparados ao plasma fresco congelado (PFC), são mais eficazes, podendo ser administrados rapidamente e com baixa dose para atingir o efeito desejado. O perfil de segurança dos CCPs ainda é incerto, já que eventos adversos, principalmente tromboembólicos, foram relatados com o seu uso. Os CCPs foram desenvolvidos, inicialmente, para o tratamento da hemofilia B. Hoje, sua indicação principal é a reversão emergencial da anticoagulação induzida por antagonistas da vitamina K. Após a criação dos concentrados de fatores específicos, os CCPs têm sido utilizados em hemofílicos, na sua forma ativada, para profilaxia de sangramento no peroperatório de pacientes portadores de anticorpos inibidores. Diversos trabalhos demonstram bons resultados com o uso de CCPs na coagulopatia dilucional induzida pelo trauma e cirurgia cardíaca. Redução do sangramento e diminuição da necessidade de hemotransfusão foram verificadas quando administrados em associação ao concentrado de fibrinogênio, porém estudos de maior impacto ainda são necessários para comprovar tais benefícios. Novos anticoagulantes orais (NACs) foram introduzidos como substitutos de cumarínicos. Mesmo com mais previsibilidade, estes não possuem antídotos conhecidos. Os CCPs ainda não são indicados de rotina no peroperatório de usuários de NACs, exceto em casos de sangramento importante ou em órgãos críticos. Em hepatopatas, CCPs são promissores, porém poucos trabalhos avaliam sua segurança e eficácia nesse perfil de paciente. Palavras-chave: Protrombina; Cuidados Intraoperatórios; Anticoagulantes. 1 Médico especializando ME3 do Centro de Treinamento CET da Sociedade Brasileira de Anestesiologia-SBA do Hospital do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais IPSEMG. Belo Horizonte, MG Brasil. 2 Médico Anestesiologista. Hospital Vera Cruz, Hospital Municipal Odilon Behrens, Hospital do IPSEMG. Belo Horizonte, MG Brasil. 3 Médico Anestesiologista. Hospital Municipal Odilon Behrens, Hospital do IPSEMG. Belo Horizonte, MG Brasil. 4 Médico Anestesiologista. Título Superior em Anestesiologia TSA/SBA. Responsável pelo CET/SBA do Hospital do IPSEMG. Coordenador do Serviço de Anestesiologia do Hospital Vera Cruz. Belo Horizonte, MG Brasil. ABSTRACT Prothrombin Complex Concentrates (PCCs) contain clotting factors that are vitamin K-dependent at a concentration 25 times greater than the plasma and are classified into compounds of three or four factors according to the presence of factor VII (FVII). When compared to frozen fresh plasma (FFPs), those are more effective, and can be administered quickly and at low doses to achieve the desired effect. The safety profile of PCCs is still uncertain because its adverse events, especially thromboembolic ones, have been reported with its use. PCCs were developed initially for the treatment of hemophilia B. Today, its main indication is the emergency reversal of anticoagulation induced by vitamin K antagonists. After the creation of specific concentrate factors, PCCs have been used in hemophiliacs, in its activated form, for the prophylaxis of bleeding in the peri-operative period of patients who are carriers of antibody inhibitors. Several studies demonstrate good results with the use of PCCs in dilutional coagulopathy induced by trauma and cardiac surgery. Reduced bleeding and decreased need for blood transfusions were observed when administered in association with fibrinogen concentrate; however, high-impact studies are still needed to prove Instituição: Hospital do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais IPSEMG Belo Horizonte, MG Brasil Autor correspondente: Erick Martins Faria de Abreu erickabreu13@yahoo.com.br Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S37-S48 37

40 O Concentrado de Complexo Protrombínico e suas aplicações na sala de cirurgia such benefits. New oral anticoagulants (NACs) were introduced as coumarin replacements, which even with more predictability there are no known antidotes. The PCCs are still not routinely indicated in the per-operative period for NACs users, except in cases of major bleeding or in critical organs. PCCs are promising options for patients with liver disease; however, few studies assess its safety and efficacy in these patients. Key words: Prothrombin; Intraoperative Care; Anticoagulants. INTRODUÇÃO Os concentrados de complexo protrombínico (CCPs) são compostos altamente purificados, produzidos por cromatografia de troca iônica do sobrenadante crioprecipitado do plasma humano, após remoção do fator XI (FXI) e da antitrombina III. Eles contêm os fatores de coagulação dependentes da vitamina K (II, IX e X e quantidades variáveis de FVII). 1 Inicialmente, os CCPs eram utilizados para a profilaxia e tratamento de sangramentos em pacientes com deficiências congênitas de fatores de coagulação. 2 Hoje, a reversão emergencial dos antagonistas da vitamina K (AVKs) tornou-se a principal indicação dos CCPs. Apesar de ainda não padronizado, o uso em outras situações de anticoagulação adquirida, como coagulopatia dilucional, sangramentos cirúrgicos maciços, reversão de novos anticoagulantes e hepatopatias, também vem sendo especulado. A única contraindicação absoluta para o uso de CCPs são os pacientes com coagulação intravascular disseminada (CIVD). Os CCPs também não são recomendados em pacientes com história de trombocitopenia induzida pela heparina, naqueles com alto risco de trombose, relato de reação alérgica ao composto, gravidez e puerpério. 3 Esta revisão objetiva expor as evidências disponíveis até o momento sobre a eficácia dos CCPs na abordagem da anticoagulação adquirida e congênita no período peroperatório, bem como a sua dosagem e eventos adversos associados. Para este trabalho foi realizada pesquisa na base de dados PUBMED de publicações com a palavra-chave prothrombin complex e termos adicionais como perioperative e bleeding management. Incluiu-se também a exploração de referências bibliográficas dos artigos encontrados, que não foram contempladas na busca inicial. Foram selecionados estudos em língua inglesa e portuguesa, do período de 1968 a CONCENTRADOS DE COMPLEXO PROTROM- BÍNICO COM TRÊS OU QUATRO FATORES Existe ampla variedade de CCPs no mercado. São compostos de fatores de coagulação dependentes da vitamina K em uma concentração 25 vezes maior que a do plasma. Os produtos são categorizados em CCPs com três fatores (CCPs-3F), que não contêm FVII ou apenas quantidades mínimas, ou quatro fatores (CCPs-4F), que contêm FVII. 2 A efetividade dos CCPs-3F tem sido questionada devido a essa pequena quantidade ou ausência do FVII. Isso poderia afetar a sua capacidade de corrigir o RNI em usuários de varfarina, uma vez que existe relação inversa entre RNI e FVII. 4 Muitos estudos demonstraram a capacidade dos CCPs em reverter a anticoagulação dos AVKs e na maioria deles utilizaram- -se produtos com quatro fatores. 5,6 No entanto, estes não estão disponíveis em muitos países devido a um risco teórico mais alto de trombose. 7 No Brasil, estão registrados na ANVISA apenas os CCPs-4F, cuja composição varia de acordo com o fabricante (Tabela 1). Tabela 1 - Composição dos concentrados de complexo protrombínico de quatro fatores disponíveis no Brasil em UI/mL *valores médios 2,8,9 Fabricante Baxter CSL Behring LFB Octapharma Nome do produto Prothromplex T Beriplex P/N Kaskadil Octaplex Fator II Fator VII Fator IX Fator X Proteína S* 4,3 17,9 11,8 12 Proteína C* 8,5 27, Proteína Z* 14,1 51,3 27,5 16,1 Antitrombina* 0,5 0,6 Traços 0,1 Heparina* <0,2 0, Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S37-S48

41 O Concentrado de Complexo Protrombínico e suas aplicações na sala de cirurgia Numa revisão sistemática foi demonstrado que os CCPs-4F são mais efetivos que os CCPs-3F na diminuição do RNI para <1,5 dentro de 1 hora após administração. 10 Isso pode ser significativo no prognóstico de pacientes com sangramentos importantes como os intracranianos. 11 O FVII necessita de apenas 10-15% de sua concentração normal para gerar uma adequada hemostasia. 12 Com resultados de RNI > 4, a concentração provavelmente está abaixo de 5-10%. Nesses casos, os CCPs-3F seriam insuficientes para reversão e os CCPs-4F seriam necessários para a adequada reversão da anticoagulação. Com RNI < 4, os pacientes teriam uma concentração suficiente de FVII para permitir o uso dos CCPs-3F com sucesso. 13 Imberti et al. 14 corroboram esses dados ao evidenciarem a correção do RNI com CCPs-3F, principalmente, em pacientes com RNIs iniciais entre dois e 3,9. Com resultados de RNI mais elevados não houve boa resposta. Não há estudos comparando diretamente os CCPs-3F com os CCPs-4F. Diferenças nas características dos pacientes, nas concentrações dos fatores nas preparações de CCPs, nas doses utilizadas e no RNI basal são situações que causam dificuldade na avaliação dos dados. Além disso, em muitos estudos a comparação é baseada na capacidade de reversão do RNI. Não é claro se a correção do RNI é necessariamente associada à parada do sangramento e melhora dos resultados clínicos. 10 Mesmo com a ausência de pesquisas comparativas, vários especialistas recomendam os CCPs-4F para sangramentos importantes relacionados aos AVKs. 5 Quando utilizados os CCPs-3F, caso ocorra resposta inadequada, indica-se a complementação de FVII (com fator VII recombinante ativado rfviia ou PFC). Se a falha ocorrer com os CCPs-4F, orienta-se o repique da dose. 4 HEMOFILIAS E OS CCPS Os CCPs foram desenvolvidos, originalmente, para o tratamento da hemofilia B. 15 Hemofilia é um termo utilizado para referir-se a doenças recessivas ligadas ao X, caracterizadas por deficiências de fatores de coagulação. Hemofilia A define-se por deficiência do FVIII e a hemofilia B, do FIX. 2 Podem ser classificadas, quanto ao nível de fatores, em leve (5-40% do normal), moderada (1-5%) e grave (< 1%). 16 Os episódios hemorrágicos ocorrem de acordo com a gravidade da doença, sendo que nos quadros moderados e graves são descritos sangramentos espontâneos e após pe- quenos traumas. Entre eles, o sangramento musculoesquelético é o mais frequente e debilitante. 17 Tratamento e prevenção de episódios de sangramento são a base da terapia de hemofílicos e consistem na reposição do fator deficiente. 18 Antes da introdução de concentrados purificados de FVIII e FIX, hemofílicos eram tratados com CCPs. Desde a década de 60, diversas complicações trombóticas foram relatadas com o uso destes, incluindo episódios de IAM em pacientes jovens. 3 Os hemofílicos são deficientes apenas em fatores específicos e a administração de CCPs elevaria a níveis suprafisiológicos os outros fatores, o que aumentaria o risco de trombose, quando em doses repetidas. 19 Hoje, os concentrados purificados específicos são a base do tratamento dos hemofílicos, com bons resultados terapêuticos. 16 Apesar disso, uma das complicações do uso desses compostos é o desenvolvimento de inibidores, anticorpos IgG, que neutralizam os fatores de coagulação. 17 Aproximadamente 30% dos pacientes com deficiência grave do FVIII e até 5% daqueles com deficiência grave de FIX irão desenvolver inibidores, o que torna o tratamento convencional com reposição de fatores pouco eficaz. Esses inibidores se desenvolvem em pessoas geneticamente propensas e após frequentes exposições ao fator substituto. 20 Os CCPs, nas orientações atuais, principalmente na sua forma ativada (CCPa), são utilizados em hemofílicos com altos títulos de inibidores (>5 unidades Bethesda) para profilaxia, manejo do sangramento grave e preparo pré-operatório. 17, Esse CCPa, por conter formas ativadas do FVII, IX e X, facilitaria as vias intrínseca, extrínseca e comum da cascata de coagulação, realizando um bypass dos fatores deficientes. O FVIIa e o FXa aumentariam a atividade da via extrínseca, e a protrombina junto ao FIXa estimularia o FXI e o resto da cascata. 22 Na década de 50, a mortalidade peroperatória nos hemofílicos era de 66%. Atualmente, essa taxa foi reduzida para 4,5% após adoção de protocolos de manejo que orientam o uso de concentrados de FVIII, FIX e concentrados ativados (CCPa e rfviia). 23 É preconizado o aumento profilático pré-operatório dos níveis de fatores deficientes em 50-80%, quando cirurgias de pequeno porte, e em %, quando de grande porte. Também são administradas doses de manutenção 17, 20 variáveis até por volta de 14 dias no pós-operatório. A realização de cirurgias é viável, com baixo risco de complicações hemorrágicas graves em hemofílicos com inibidores, ao serem utilizados concentrados Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S37-S48 39

42 O Concentrado de Complexo Protrombínico e suas aplicações na sala de cirurgia ativados. O CCPa e o rfviia apresentaram sucesso no tratamento de hemorragias nesses pacientes, porém não foram tão eficazes quanto os fatores específicos nos doentes sem inibidores. 16,24-26 As doses recomendadas para o uso do CCPa disponível no mercado, FEIBA (Tabela 2) variam de U/kg, podendo ser administradas a cada 12h na vigência de hemorragias graves. 22 De acordo com Tjønnfjord et al. 27, bons resultados foram conseguidos após a administração de 100 U/kg pré-operatório, seguida de 200 U/ kg/dia (dividida em três doses) por três dias, com manutenção de U/kg/dia nos dias seguintes. Este estudo foi consonante com as orientações do fabricante, que limitam as doses diárias em até 200 U/kg e as doses únicas em até 100 U/kg. 22 Em crianças, não há pesquisas de impacto sobre o tema, porém dose pré-operatória de 100 U/kg seguido de 50 U/kg a cada seis horas, com manutenção de 50 U/kg cada 12 horas, mostrou-se eficaz. 28 Em nenhuma faixa etária se indica o uso de antifibrinolítico sistêmico concomitante com o CCPa. 22 Entretanto, pacientes com inibidores podem desenvolver episódios de sangramento refratários à monoterapia com CCPa. Em estudo retrospectivo, Schneiderman et al. 29 demonstraram eficácia e segurança de terapia sequencial utilizando CCPa e rfviia em caso de refratariedade, com administração de dose média de 154 mcg/kg de rfviia associada a 50 U/kg de CCPa. O estudo concluiu que ensaios randomizados e prospectivos são necessários para comparar a eficácia dessa abordagem com a monoterapia. Tabela 2 - Composição do FEIBA em UI de fatores por unidade de concentrado 22 Fabricante Baxter Fator II 1,3±0,3 Fator VII 0,9±0,1 Fator IX 1,4±0,1 Fator X 1,1±0,2 Proteína C 1,1±0,2 Trombina 0,01±0,004 FVIIa 1,5±0,2 FIXa 0,0006 FXa 0,06±0,002 REVERSÃO DE ANTAGONISTAS DE VITAMINA K Os AVKs agem a partir da inibição da enzima epóxido-redutase. Esta regenera a vitamina K após a gamacarboxilação dos resíduos de ácido glutâmico dos FII, FVII, FIX e FX e das proteínas C, S e Z. 1,30 Esse evento, que ocorre no fígado, é necessário para que os fatores se tornem funcionais. Aproximadamente 1-1,5% da população ocidental utiliza AVKs para prevenção de embolismo sistêmico relacionado a valvopatias, próteses valvares, fibrilação/ flutter atrial e trombose venosa profunda. 31,32 A incidência anual de sangramentos graves relacionados ao uso de varfarina é de 0,9-1,4%, 6 sendo o trato gastrintestinal envolvido em 30-60% dos eventos e o sistema nervoso central (SNC) em 17-30%. 1 De todas as hemorragias intracranianas, 15% se relacionam ao uso de AVKs, sendo que o paciente em uso está sob o risco estimado de 0,25-1,1% ao ano, o qual pode aumentar para 2% se RNI >4. 30,33 O prognóstico de sangramentos no SNC é ruim e associa-se à mortalidade de até 50% em 1 mês. 34 O tamanho do hematoma é o maior preditor de mortalidade e a reversão da anticoagulação deve ocorrer, precocemente, para evitar a expansão deste. 33 Desde 1976, quando Taberner et al. 35 descreveram, em um ensaio clínico randomizado, sucesso com o uso de CCPs para correção da deficiência de fatores de coagulação em pacientes tratados com AVKs, diversos estudos comprovaram sua eficácia. 7,36 Quando comparado com o PFC, que demora horas para reversão da anticoagulação, os CCPs são mais rápidos e atingem bons resultados em alguns minutos. 2 São necessários volumes 15 a 30 vezes maiores de PFC para efeito equivalente. Sendo assim, o uso de CCPs minimiza o risco de sobrecarga volêmica, principalmente em cardiopatas, nefropatas e hepatopatas, além de diminuir o tempo necessário para infusão. Ao se comparar o modo de preparo, os CCPs não precisam ser descongelados e podem ser armazenados em temperatura ambiente. O tempo necessário para a preparação e administração de plasma é, usualmente, de uma a duas horas, enquanto os CCPs podem ser infundidos de imediato (sem prova cruzada ou tipagem) e com taxa de infusão rápida. 37 Os CCPs tem perfil de segurança melhor do que o PFC, porque eles passam por etapas de inativação viral, minimizando o risco de transmissão de uma variedade de agentes infecciosos. 1 O uso do plasma está associado a maior risco de anafilaxia e TRALI que os CCPs. 38,39 Deste modo, diversos guidelines os colocam como primeira escolha para correção emergencial da anticoagulação induzida por AVK sem caso de sangramento importante ou necessidade de cirurgia de urgência. 5,40,41 A dose adequada para administração de CCPs ainda não está clara. 2,3,30 Estudos demonstram que 40 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S37-S48

43 O Concentrado de Complexo Protrombínico e suas aplicações na sala de cirurgia são necessários níveis plasmáticos médios de 30-40% do normal de cada fator para que a hemostasia ocorra de forma correta. Esses níveis equivalem a um RNI <1,5. 3,13,42 Por ter sido padronizado, inicialmente, para pacientes com hemofilia B, o cálculo da dosagem de CCPs continua sendo baseado na concentração de FIX. 15 A média de recuperação in vivo do FIX, em U/kg administrada, é de aproximadamente 1-1,5% e dos outros fatores de 1-2%. Dessa maneira, a dose de U/kg seria adequada para reposição dos fatores deficientes. 2,32 Entretanto, essa dose parece ser excessiva para reversão emergencial em usuários AVKs, uma vez que estes não estão completamente depletados de fatores de coagulação. 15,30 Assim, apesar do RNI ser corrigido prontamente, esses pacientes estariam expostos a elevado risco de trombose. 43 Pesquisas tentam esclarecer qual regime seria ideal. Yasaka et al. 44 compararam doses fixas crescentes de CCPs-4F administrados para pacientes com RNI alterado que necessitavam de reversão por sangramento ou que iriam ser submetidos a procedimentos invasivos. Concluíram que doses de 500 UI (aproximadamente 8,8 U/kg) foram suficientes em pacientes com RNI <5. 44 Van Aart et al. 15, em estudo prospectivo randomizado, utilizaram a dose fixa de 500 UI de CCP-4F e compararam com doses individualizadas ajustadas por peso entre 15 e 35 U/ kg. Verificaram que 89% dos pacientes do regime individualizado alcançaram o RNI-alvo contra apenas 43% dos pacientes que receberam dose fixa, principalmente nos casos cujo RNI de base era >4,5. Khorsand et al. 45,46, em duas coortes observacionais e prospectivas, salientaram que a dose fixa de UI seria suficiente para garantir reversão adequada em pacientes com RNI <7,5, com melhor custo-benefício e desfechos clínicos positivos, mesmo sem atingir o RNI-alvo proposto. Kerebel et al. 32 conduziram estudo multicêntrico e randomizado em pacientes com hemorragia intracraniana, comparando a eficácia e segurança da administração de 25 e 40 U/kg de Octaplex. Seus resultados demonstraram que, apesar do desfecho clínico não ter apresentado diferença estatística, a dose de 40 U/kg foi mais eficaz em normalizar o RNI (alvo <1,2) sem, no entanto, promover aumento na incidência de eventos adversos. O órgão canadense National Advisory Comitee on Blood and Blood Products (NAC) associado ao Canadian Blood Services (CBS) padronizou a administração do CCP disponível naquele país com dose fixa de UI, todavia, com ressalva de que doses mais altas ou complementares deveriam ser consideradas em extremos de pesos ou de RNI. O consenso australiano mais atual, bem como as recomendações do British Committee for Standards in Haematology (BCSH), orienta a utilizar dose de U/kg para reversão dos AVKs. 40,41 Já o American College of Chest Physicians (ACCP), apesar de, em 2012, ter atualizado suas diretrizes de manejo de terapia anticoagulante, não recomenda qualquer dose para uso. 5 No Brasil, há publicação do Ministério da Saúde que cita o complexo protrombínico como preferível em relação ao PFC para reversão dos AVKs, porém não sugere dosagem. A orientação mais direta sobre o tema está presente nas Diretrizes Brasileiras de Antiagregantes Plaquetários e Anticoagulantes em Cardiologia de 2013, afirmando que, apesar de não existir ainda qualquer padronização da dose de CCPs, estes devem ser administrados de acordo com o valor do RNI inicial (Tabela 3). 47 Atualmente, aguarda-se a publicação do estudo multicêntrico, randomizado e fase III, denominado Prophylaxis of Thromboembolism in Critical Care (PROTECT), que pode direcionar a redução das doses recomendadas de CCPs. Os consensos atuais divergem quanto à dose a ser administrada, porém concordam que é imprescindível a administração concomitante de 5-10 mg de vitamina K intravenosa (diluída em um mínimo de 50 ml e administrado no mínimo em 30 minutos), uma vez que a meia-vida do FVII é de cerca de 6h. 48 Desta forma, garante-se a manutenção dos níveis plasmáticos dos fatores de coagulação e evita-se aumento rebote do RNI 12-24h após a administração do CCPs. 5,40,41,48 Vários estudos foram conduzidos para avaliar a taxa de infusão ideal dos CCPs. A maioria dos fabricantes orienta taxa de infusão máxima de 2-4 ml/min. Apesar disso, estudo prospectivo conduzido por Pabinger et al. 49 demonstrou que ao infundir Beriplex P/N em taxas de 2-40 ml/min (mediana de 7,5 ml/min), não houve aumento de marcadores de trombogenicidade e eventos adversos. Este estudo é a primeira evidência prospectiva de que CCPs podem ser infundidos rapidamente, sem ter eficácia e segurança comprometidos. O uso de CCPa para reversão de AVKs tem sido avaliado. A maior preocupação do uso desses concentrados ativados seria a alta incidência de eventos trombóticos. Apesar de plausível teoricamente, não há qualquer evidência clara de que o uso de CCPa confere mais risco de eventos adversos que os CCPs com uso de AVKs. 50,51 Pesquisa conduzida por Aledort et al. 52 demonstrou menos incidência de eventos trombóticos Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S37-S48 41

44 O Concentrado de Complexo Protrombínico e suas aplicações na sala de cirurgia quando comparado com rfviia. Dois trabalhos, conduzidos com o uso de dose baixa fixa (500 U para RNI <5 e U para RNI>5), evidenciaram boa eficácia da abordagem, com frequência de eventos adversos próxima das descritas com o uso de CCPs. 50,51 Tabela 3 - Dose de CCP ajustada por RNI 3,47 RNI Dose de CCP (UI de fator IX) 2,0-3,9 25 U/kg 4,0-5,9 35 U/kg 6 50 U/kg MONITORIZAÇÃO DA REVERSÃO DOS AVKS Estudos de pouco impacto enfatizaram correlação razoável entre a queda do RNI e resposta hemostática, quando se avaliou a reversão dos AVKs com CCPs. 44,53,54 No entanto, existem investigações em que se observaram pacientes com boa resposta hemostática, apesar de não atingirem o RNI-alvo. 55,56 Também há pesquisas em que se notaram pacientes que atingiram seu RNI- -alvo, mas continuaram a sangrar. 15 Os AVKs interferem na via extrínseca da coagulação, sendo então rotineiramente monitorizados a partir do TP e RNI. 57 Contudo, o TP foi introduzido há mais de 50 anos, quando ainda se pensava que o processo de hemostasia ocorria apenas no plasma. 58 Com o estabelecimento do modelo celular da coagulação, tornou-se evidente que a avaliação tradicional reflete apenas a fase de iniciação. Especula-se se as complicações hemorrágicas em usuários de AVKs têm relação com o fato desses testes tradicionais refletirem apenas esses passos iniciais do processo hemostático. 59 A tromboelastografia (TEG) e a tromboelastometria rotacional (ROTEM) avaliam a formação do coágulo e a habilidade da geração da trombina, estudando então o processo inteiro da coagulação. 60 Esses exames são melhores preditores de transfusão de hemoderivados que o TP e RNI para pacientes com sangramento maciço. 61 A necessidade de transfusão e, inclusive, de reoperação diminuiu em vítimas de trauma, nos quais a coagulação foi estudada com TEG/ROTEM. O motivo dessa diferença é que o TEG/ROTEM inclui as plaquetas na avaliação da hemostasia, permitindo a análise das três fases da coagulação (iniciação, amplificação e propagação) e das características físicas do coágulo. 62 No entanto, não há estudos duplo-cegos, randomizados, comparando o valor da TEG/ROTEM com o RNI em prever sangramentos em pacientes usuários de AVKs. Também não existem estudos relevantes que comprovem a capacidade do RNI ou TEG/ROTEM em guiar com acurácia a reversão da anticoagulação dos AVKs pelo CCPs. CIRURGIA CARDÍACA, TRAUMA E CCPS O sangramento crítico que ocorre no trauma e cirurgia cardíaca correlaciona-se com hemodiluição, consumo de fatores de coagulação, danos microvasculares e fibrinólise. 63 Durante a última década, poucos estudos de impacto e diversos outros com baixo nível de evidência indicam o uso de CCPs nessas situações. 64 Em alguns países, eles são utilizados em substituição ao PFC ou como seu complemento. 65 Entretanto, no cenário do trauma e cirurgias cardíacas, os CCPs ainda não são recomendados por diretrizes ou algoritmos. 65,66 A circulação extracorpórea (CEC) é importante contribuidora da inflamação, disfunção plaquetária, déficit da coagulação e hiperfibrinólise relacionadas à cirurgia cardíaca. Esses prejuízos, associados à hemodiluição que acarreta a diminuição dos fatores II, VII, IX e X, geram aumento do sangramento pós- -operatório. 67 Kaspereit et al. 64, em modelo animal de CEC, concluíram que o CCP corrigiu a coagulopatia dilucional e reduziu o sangramento difuso. Lin et al. 63, em revisão sistemática de sangramento em cirurgias cardíacas, indicaram a possibilidade de pacientes que usaram CCPs e concentrado de fibrinogênio (fator I-FI) para coagulopatia necessitarem de menos hemotransfusão e apresentarem menor volume de drenagem torácica do que aqueles que receberam PFC. Görlinger et al. 68 realçaram, em estudo retrospectivo, que a administração de concentrado de fibrinogênio e CCPs em cirurgia cardíaca foi associada à diminuição da incidência de transfusão maciça e reoperação, sem aumento de trombose. Arnékian et al. 69, em análise retrospectiva, mostraram redução significativa do sangramento após cirurgia cardíaca com CEC usando baixas doses de CCPs. A dose média encontrada na literatura foi de U/kg. 55 Embora os CCPs tenham demonstrado eficácia em análises retrospectivas e em modelos animais, estudos prospectivos e randomizados em humanos submetidos a cirurgias cardíacas ainda são necessários. 70 Os CCPs contêm doses concentradas de todos os fatores da via extrínseca. Esta é a principal via da coagulação implicada no trauma, cenário no qual há dano endotelial e exposição do fator tecidual. Portanto, é justificável que os CCPs possam ser úteis no 42 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S37-S48

45 O Concentrado de Complexo Protrombínico e suas aplicações na sala de cirurgia Os AVKs são as opções tradicionais para a anticoagulação oral. Entretanto, possuem várias interações medicamentosas, necessidade de monitorização e prolongado início de ação. 82 No intuito de melhorar o perfil de segurança, foram desenvolvidos os novos anticoagulantes (NACs), com baixo potencial de interação, rápido início de ação e meias-vidas mais curtas, possibilitando então a não monitorização laboratorial de rotina. 83 Diferentemente dos cumarínitratamento da coagulopatia dilucional do trauma. 71 Em um modelo suíno de hemorragia, foi apurada a eficácia dos CCPs,em relação ao PFC, na correção da coagulopatia dilucional. Ao contrário do PFC, o CCP corrigiu o tempo de protrombina e o pico de geração da trombina. Além de reduzir o tempo para a hemostasia em relação ao PFC, o CCP diminuiu o volume de sangue perdido. 72 A dose média utilizada nos estudos de trauma foi de U/kg. 72,73 Entretanto, provavelmente é necessária a adição de concentrado de fibrinogênio aos CCPs, em decorrência da ausência de FI nestes e da hipofibrinogenemia ocorrida no trauma. 74 Em análise retrospectiva, Schochl et al. avaliaram pacientes com sangramento maciço secundário ao trauma e que receberam CCPs em conjunto com fibrinogênio ou PFC. Obtiveram menos necessidade de transfusão sanguínea, transfusão de plaquetas e internação mais curta naqueles que receberam CCPs e fibrinogênio, com significância estatística. 30 Há referências na literatura de que o uso de CCPs reverte melhor a coagulopatia dilucional que o rfviia. Apesar do FVII ser o fator-chave na hemostasia do trauma, os outros fatores também têm sua importância na cascata, o que corrobora a ideia de que os CCPs são mais efetivos. 71 Eventos trombóticos são mais comuns com rfviia (10% a 20%), em comparação aos CCPs (1% a 4%). 75 Quanto à duração de ação, na ausência de hemorragia persistente, CCPs corrigem a hemostasia por seis a oito horas, enquanto rfviia, por ter meia-vida curta (1h), torna necessária administração de nova dose ou reposição de outros fatores. 76 Há indícios de que o uso de CCPs seja benéfico para a coagulopatia do trauma e cirurgia cardíaca, porém estudos de maior impacto são necessários. USO DE CONCENTRADO DE COMPLEXO PROTROMBÍNICO EM PACIENTES COM DOENÇA HEPÁTICA O fígado é o local onde ocorre a síntese de grande parte das proteínas envolvidas na hemostasia. O cirrótico está sujeito a alterações importantes da coagulação, que levam à redução do nível plasmático de fatores procoagulantes e anticoagulantes, gerando um novo estado de balanço hemostático. 77 Dessa forma, o hepatopata é sujeito a eventos tanto trombóticos quanto hemorrágicos, uma vez que esse novo balanço é mais precário e suscetível à descompensação após situações de estresse orgânico. 78 A redução dos fatores dependentes da vitamina K correlaciona-se com a gravidade da doença. Todavia, o hepatopata avançado possui potencial de coagulação normal ou até mesmo aumentado, associado ao estado de hiperfibrinólise. 78,79 Quando esses pacientes são submetidos a procedimentos abdominais, estão sujeitos a aumentado risco de sangramento devido à hipertensão portal, que mantém alta a pressão venosa nos vasos esplâncnicos. Verifica-se que a sobrecarga volêmica é prejudicial, por aumentar o risco hemorrágico. Baseado nisso, orienta-se à restrição de fluidos, inclusive de hemoderivados no peroperatório. 80 Pacientes hepatopatas que experimentam sangramento ou precisam de intervenção cirúrgica urgente necessitam de rápida correção da hemostasia. Para isso, é proposta a administração de CCPs, no lugar de PFC. Até o momento, há poucos estudos para avaliação da eficácia e segurança do uso destes com esse objetivo. Lorenz et al. 81 avaliaram a eficácia e o perfil de eventos adversos com o uso de CCPs em pacientes hepatopatas graves com sangramento importante ou que necessitavam de cirurgia de urgência. No seu estudo com dose mediana de UI de CCP, verificou-se resposta clínica e laboratorial satisfatória, sem eventos tromboembólicos associados. Está em curso um ensaio duplo-cego, multicêntrico, controlado e randomizado denominado PRO- TON, cujo objetivo primário é avaliar a redução do sangramento intraoperatório, após a administração de CCP em pacientes com insuficiência hepática submetidos à transplante hepático ortotópico. Este estudo tem como objetivo secundário analisar a frequência de eventos adversos relacionados ao uso de CCPs em hepatopatas. 77 Após este ensaio, novas recomendações poderão ser feitas a respeito do risco e de como utilizar CCPs nessa situação. REVERSÃO DOS NOVOS ANTICOAGULANTES Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S37-S48 43

46 O Concentrado de Complexo Protrombínico e suas aplicações na sala de cirurgia cos, que inibem fatores dependentes da vitamina K, os NACs são inibidores diretos de um único fator da cascata de coagulação. Dabigatrana é inibidor direto da trombina (FIIa); rivaroxabana, apixabana e edoxabana são inibidores diretos do fator Xa. 84, 85 Apesar da acentuada previsibilidade desses agentes, o sangramento permanece como importante complicação. 86 Como não possuem antídotos conhecidos, estratégias são necessárias em situações de sangramentos vultosos e cirurgias de emergência. 87 Existem dados na literatura que suportam a possibilidade dos CCPs reverterem os NACs. 76, 88 Porém, os estudos são em animais, in vitro e ex vivo, e com resultados não muito consistentes. A ideia seria que a elevação dos fatores dependentes da vitamina K implementaria a geração de trombina e, assim, suplantaria os efeitos dos inibidores do FIIa e FXa. Em vez de simplesmente repor fatores deficientes como na reversão dos AVKs, a intenção é transpor os efeitos do inibidor a partir da elevação dos fatores a níveis supranormais. 89 Sendo assim, o PFC provavelmente não é útil nessa situação, uma vez que possui baixa concentração de fatores. O rfviia também não é considerado primeira linha de tratamento, porque não reverte a maioria dos testes, especialmente os parâmetros de geração da trombina. 87, 90 Embora estudos pré-clínicos tenham demonstrado resultados satisfatórios, foram utilizadas, para reversão dos NACs, em média, doses mais altas que as usadas para AVKs. Pesquisas que utilizaram doses mais baixas falharam na correção laboratorial e melhora do sangramento. 12 A frequência de trombose, com as doses de CCPs utilizadas para AVKs, é baixa, mas com doses mais altas há mais probabilidade de complicações trombóticas. 7,91 Utilizando um modelo celular de coagulação, testaram-se os efeitos de um CCP-4F nos parâmetros de geração da trombina. Notou-se, por meio de trombinografia, que o aumento da concentração de dabigatrana diminuiu a velocidade e o nível do pico da geração de trombina e aumentou o tempo de latência para o início da geração. O CCP foi capaz de normalizar a maioria desses parâmetros (velocidade, pico), mas não diminuiu a latência para o início. É sabido que os exames mais comuns (TP, TTPa) medem primariamente o tempo de latência para o início da formação do coágulo. Então, a falha na correção desse parâmetro explica a não normalização dos exames de coagulação tradicionais, mesmo que a geração de trombina tenha sido aumentada. Essa me- lhora na cinética da trombina pode refletir o aperfeiçoamento da hemostasia gerado pelos CCPs, mesmo com os exames comuns alterados. Talvez a reversão da anticoagulação não tenha que normalizar todos os parâmetros da geração da trombina para garantir significante efeito hemostático. 92 Os testes de coagulação convencionais são pouco sensíveis aos efeitos dos NACs, havendo ampla variabilidade nos valores quando há altas concentrações plasmáticas das drogas. Todavia, quando o TP e o TTPa estão normais, há grande probabilidade de a droga estar presente em concentração muito baixa (alto valor preditivo negativo), o que permitiria que uma cirurgia fosse realizada com segurança. 93 O TP é pouco sensível à dabigatrana e sensível aos efeitos da rivaroxabana. Então, para dabigatrana, o TP não deve ser usado isoladamente, mas em associação com o TTPa. A medida da atividade antixa é muito sensível para rivaroxabana. 94 A ausência de evidência científica consistente na reversão dos NACs faz com que o manejo dessas drogas seja baseado no julgamento clínico, na extrapolação de dados de pesquisas pré-clínicas e na opinião de experts. Propõe-se um tratamento de suporte, incluindo ressuscitação volêmica, hemotransfusão, manutenção da função renal e controle cirúrgico do sangramento. Indica-se também a descontinuação das drogas, dada a curta meia-vida delas (7-17h). Caso a ingestão tenha ocorrido há no máximo 2h, orienta-se o uso de carvão ativado. 95 Em situações de sangramentos ameaçadores à vida causados por dabigatrana, a hemodiálise é uma alternativa, devido à sua baixa ligação proteica (35%). Rivaroxabana e apixabana não são dialisáveis, devido à alta ligação proteica. 87 Mesmo quando a cirurgia é inadiável e os exames estão alterados, é proposto operar sem a administração profilática de CCPs ou CCPa e apenas utilizá-los (doses de e U/kg, respectivamente) em caso de sangramentos vultosos ou em órgãos críticos como cérebro e olhos. Existe uma tendência que considera o CCPa mais efetivo que os outros CCPs, mas com maior risco possível de trombose. 76,96 Embora evidências pré-clínicas promissoras demonstrem a reversão de alguns parâmetros laboratoriais, a correlação com a interrupção do sangramento não está bem clara. Estudos de melhor qualidade, em humanos com sangramento ativo, precisam ser realizados. 93 Agentes seletivos de reversão estão em desenvolvimento Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S37-S48

47 O Concentrado de Complexo Protrombínico e suas aplicações na sala de cirurgia EVENTOS ADVERSOS O perfil de segurança dos CCPs é ainda incerto. Eventos adversos potenciais associados ao seu uso incluem, principalmente, complicações trombóticas venosas (TVP, CIVD) e arteriais (AVE, IAM, TEP); e de forma menos frequente, reações alérgicas e infecção viral. 1 Estudos na década de 90 atribuíram aos CCPs risco potencial de eventos tromboembólicos. 2 Metanálise conduzida por Dentali et al. 7, que revisou estudos com usuários de AVKs de , verificou incidência de 1,4% de eventos tromboembólicos relacionados à administração de CCPs. Quando analisado apenas eventos associados ao uso de CCP-4F, a incidência foi um pouco aumentada (1,8%). Em sua revisão, Sørensen et al. 19 concluíram ser improvável que a administração de CCPs fosse a causa única dos eventos trombóticos, visto que os pacientes envolvidos apresentavam alto risco de trombose, devido à história prévia ou à doença atual. O risco de complicações trombóticas associado à reversão de anticoagulação é quantificável e, desse modo, não há como descartar a correlação dos CCPs com tais eventos. Nenhum estudo randomizado e controlado sobre a segurança de sua administração teve resultados publicados até o momento. 3 Além disso, Sadeghi et al. 97 ressaltam, em sua análise da composição dos atuais CCPs, que, apesar da padronização desses agentes, a grande variação de seus constituintes determina perfis individuais de hemostasia, o que pode conferir eficácia e segurança distintas. Entretanto, até o momento não há qualquer evidência que mostre superioridade entre os CCPs com o mesmo número de fatores disponíveis no mercado. 3 O mecanismo trombogênico proposto é a sobrecarga de FII, que leva a uma geração excessiva de trombina. O FII, por ter meia-vida de 60h, está mais sujeito ao acúmulo após doses repetidas. 19 Por outro lado, diferenças na composição dos concentrados também estão implicadas na formação de trombos. Os produtos atuais, diferentemente dos produzidos na década de 70 e 80, possuem inibidores de coagulação, como heparina, antitrombina III, proteína C, S e Z, o que os tornariam mais seguros por haver um balanço dos efeitos procoagulantes e anticoagulantes. 19,98 Todavia, a presença dessas substâncias estão implicadas em um risco teórico de trombocitopenia induzida pela heparina. 2 Reações alérgicas são eventos raros. 2 Entretanto, relato de caso em 2010 correlaciona o uso de Octaplex em paciente com deficiência de IgA, com reação anafilática grau III. Na ocasião, foi realizada detecção por método imunoturbidimétrico de IgA e outras imunoglobulinas em amostras de Octaplex, Beriplex e FEIBA, levando à conclusão de que deve haver cuidado na administração de CCPs a pacientes que possuem anticorpos anti-iga. 99 Durante a preparação dos CCPs, todos eles são submetidos a pelo menos um passo de inativação viral, sendo mais frequentes os métodos do solvente- -detergente e o tratamento por calor (pasteurização, calor úmido e seco). Esses métodos são eficazes para remoção ou inativação de vírus envelopados, como HIV, HBV e HCV, mas menos eficazes para remoção de vírus não envelopados, como o vírus da hepatite A (HAV) e parvovírus B19, por serem estes menores que 25 nm e resistentes ao calor. Assim, em alguns processos de preparação utiliza-se o método de nanofiltração que, ao remover esses agentes, reduz ainda mais o risco de transmissão viral. 100 Revisão recente estima o risco geral de infecção viral após o uso de CCPs em 1,9%, baseado em quatro episódios de soropositividade para parvovírus B19, após o uso de Octaplex. 7 Atualmente, aguarda-se a conclusão do estudo INCH, ensaio multicêntrico, controlado e randomizado, que compara a segurança/eficácia do CCPs em relação ao PFC. Seus resultados poderão elucidar os reais riscos do uso de CCPs. 101 REFERÊNCIAS 1. Franchini M, Lippi G. Prothrombin complex concentrates: an update. Blood Transfus. 2010; 8(3): Samama CM. Prothrombin complex concentrates: a brief review. Eur J Anaesthesiol. 2008; 25(10): Colomina MJ, Diez Lobo A, Garutti I, Gomez-Luque A, Llau JV, Pita E. Perioperative use of prothrombin complex concentrates. Minerva Anestesiol. 2012; 78(3): Makris M, Van Veen JJ. 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50 O Concentrado de Complexo Protrombínico e suas aplicações na sala de cirurgia 72. Dickneite G, Pragst I. Prothrombin complex concentrate vs fresh frozen plasma for reversal of dilutional coagulopathy in a porcine trauma model. Br J Anaesth. 2009; 102(3): Dickneite G. Prothrombin complex concentrate versus recombinant factor VIIa for reversal of coumarin anticoagulation. Thromb Res. 2007; 119(5): Porta CR, Nelson D, McVay D, Salgar S, Eckert M, Izenberg S, et al. The effects of tranexamic acid and prothrombin complex concentrate on the coagulopathy of trauma: an in vitro analysis of the impact of severe acidosis. J Trauma Acute Care Surg. 2013; 75(6): Frumkin K. Rapid reversal of warfarin-associated hemorrhage in the emergency department by prothrombin complex concentrates. Ann Emerg Med. 2013; 62(6): e Tanaka KA, Szlam F, Dickneite G, Levy JH. Effects of prothrombin complex concentrate and recombinant activated factor VII on vitamin K antagonist induced anticoagulation. 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51 ARTIGO DE REVISÃO Reversão de urgência da anticoagulação Urgent reversal of anticoagulation Igor Neves Afonso Castro 1, Rafael Coelho Tibúrcio 2, Marcel Andrade Souki 3 DOI: / S016 RESUMO Com o envelhecimento da população e as consequentes comorbidades associadas, o uso de anticoagulantes tem se tornado cada vez mais prevalente. Os anestesiologistas devem estar preparados para o manejo do sangramento e dos riscos associados a esses medicamentos. Esta revisão tem o intuito de nortear a reversão de urgência da anticoagulação e estabelecer as opções disponíveis para este fim. Palavras-chave: Anticoagulantes; Antifibrinolíticos; Anestesiologia; Emergências. 1 Médico Anestesiologista. Título Superior em Anestesiologia TSA pela Sociedade Brasileira de Anestesiologia SBA, corresponsável do Centro de Ensino e Treinamento CET da Santa Casa de Belo Horizonte. Belo Horizonte, MG Brasil. 2 Médico Especializando do 3 ano do CET da Santa Casa de Belo Horizonte. Belo Horizonte, MG Brasil. 3 Anestesiologista do CET da Santa Casa de Belo Horizonte. Belo Horizonte, MG Brasil. ABSTRACT The use of anticoagulants has become increasingly prevalent with the aging of the populations and the consequent comorbidities associated with it. Anesthesiologists should be prepared for the management of bleeding and the risks associated with these medications. This review is intended to guide the urgent reversion of anticoagulation and establish options available for this purpose. Key words: Anticoagulants; Antifibrinolytic Agents; Anesthesiology; Emergencies. INTRODUÇÃO É prática atual para muitos médicos interromper a terapia antitrombótica antes da cirurgia para reduzir o sangramento. No entanto, a interrupção de tratamento antitrombótico nesses pacientes pode levar a eventos tromboembólicos com consequências graves. 1 A reversão da anticoagulação em urgência é uma situação incomum, porém desafiadora. Os pacientes que se apresentam para a cirurgia de urgência anticoagulados são normalmente aqueles que têm altos riscos de eventos adversos no período perioperatório, não apenas pela cirurgia emergencial, mas também pela doença motivadora da anticoagulação. A reversão da anticoagulação representa um delicado equilíbrio entre o aumento do risco da formação de coágulos e a diminuição do risco de perda sanguínea perioperatória. 2 A identificação, quando possível, da medicação anticoagulante é muito importante para orientar o tratamento eficaz e seguro. A decisão de submeter ou não o paciente aos riscos da reversão da anticoagulação deve ser conjunta com a equipe cirúrgica e informada ao paciente ou ao responsável. A literatura publicada sobre este tema mostra que a suspensão do antiagregante plaquetário ou tratamento anticoagulante conduz a substancial aumento do risco de eventos tromboembólicos venosos ou arteriais e complicações relacionadas (especialmente em pacientes com fibrilação atrial, próteses valvulares cardíacas ou Instituição: Centro de Ensino e Treinamento da Santa Casa de Belo Horizonte Belo Horizonte, MG Brasil Autor correspondente: Marcel Andrade Souki mandradesouki@yahoo.com Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S49-S59 49

52 Reversão de urgência da anticoagulação Anticoagulação, em longo prazo, se justifica em três grandes situações clínicas: fibrilação atrial, doença cardíaca valvular e profilaxia do tromboembolismo venoso. Os agentes anticoagulantes também são indicados para um período mais curto para tratar oclusão arterial aguda ou eventos tromboembólicos venosos. A interrupção da terapia antitrombótica expõe os pacientes a aumentado risco de eventos tromboembólicos, que pode ter consequências catastróficas (acidente vascular cerebral, trombose da válvula cardíaca, embolia pulmonar e morte, por exemplo). Eventos tromboembólicos venosos recentes e pacientes com trombofilia grave correm alto risco de complicações tromboembólicas perioperatórias. Em relação à fibrilação atrial, o escore CHADS2 (insuficiência cardíaca congestiva, hipertensão, idade 75 anos, diabetes e acidente vascular cerebral ou ataque isquêmico transitório) ajuda a quantificar o risco de acidente vascular cerebral e na escolha da terapia mais adequada antitrombótica. 6 O risco absoluto de acidente vascular cerebral isquêmico é de cerca de 4,5% ao ano em doentes sem tratamento antagonista de vitamina K e diminui para 1,4% ao ano em pacientes em tratamento com antagonista da vitamina K. As recomendações recentes para o período perioperatório são: continuar anticoagulantes orais para pequenos procedimentos e suspender o uso de anticoagulantes orais para outros procedimentos invasivos. 7 A escolha de substituir a terapia de anticoagulação ou a interrupção de anticoagulação oral tem de levar em conta o risco trombótico com base em fatores relacionados ao paciente e relacionados à cirurgia. No entanto, deve-se ter em mente que a terapia de ponte não impede totalmente complicações trombóticas. 8 Em pacientes com alto risco de tromboimplante de stent coronariano recente). Esse risco parece ser nitidamente mais alto do que o risco de hemorragia significativa. 1 Portanto, sempre que possível deve-se manter o paciente anticoagulado. Os princípios gerais de manejo dos pacientes apresentando sangramento, em uso de anticoagulantes, são: suspender nova dose de anticoagulante, considerar antídotos, implementar medidas de suporte (reposição volêmica e inotrópicos, se necessário), medidas hemostáticas cirúrgicas ou sistêmicas (ácido aminocaproico, ácido tranexâmico e complexo protrombínico), transfusões, se necessário, e investigação de sítios de sangramento. 3 AVALIAÇÃO PRÉ-ANESTÉSICA Durante a avaliação pré-anestésica, devem ser identificadas as medicações anticoagulantes e antiagregantes plaquetários em uso, data e hora da última dose administrada. A indicação de uma cirurgia em caráter de urgência ou emergência fica a cargo da equipe cirúrgica. Os riscos e benefícios devem ser avaliados, discutidos e expostos ao paciente ou acompanhante responsável. História de sangramento espontâneo, hematomas, sangramento gengival à escovação, equimoses, sangramento de difícil controle, com ou sem o uso de medicações anticoagulantes e antiagregantes plaquetários também devem ser interrogados. Além, obviamente, do motivo do uso dessas medicações. A INTERRUPÇÃO DA TERAPIA ANTIPLAQUETÁRIA E RISCO TROMBÓTICO Medicamentos antiagregantes plaquetários são a pedra angular da terapia para pacientes com doença vascular aterosclerótica, incluindo doença arterial coronariana, doença cerebrovascular e doença arterial periférica. A duração da terapia antiplaquetária dupla é geralmente de 30 dias após o implante de stents metálicos em angina estável e 12 meses após o stent farmacológico. 4 Alguns pacientes com alto risco de eventos tromboembólicos podem ter benefício da terapia antiplaquetária dupla prolongada para além de um ano. Interrupção da terapêutica antiplaquetária pode levar a grandes eventos cardiovasculares, incluindo trombose do stent, infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral não fatal e morte. 1 Por essas razões, as diretrizes americanas e europeias recomendam a continuação da aspirina no perioperatório, salvo risco de sangramento claramente superior ao risco de eventos cardiovasculares. 5 Quando necessário, é suficiente suspender a aspirina três dias antes do procedimento invasivo. Para outras terapias antiagregantes plaquetárias, clopidogrel e ticagrelor devem ser interrompidos por cinco dias e prasugrel durante sete dias. A INTERRUPÇÃO DA TERAPIA ANTICOAGULANTE E RISCO TROMBÓTICO 50 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S49-S59

53 Reversão de urgência da anticoagulação embolismo, a terapia ponte, mesmo com uma dose terapêutica com heparina de baixo peso molecular apresenta incidência de eventos arteriais tromboembólicos de cerca de 1 a 2%. E quando heparina não fracionada é usada, a incidência de eventos tromboembólicos varia entre 0 e 5%. Eventos tromboembólicos ocorrem mais frequentemente após a alta e durante o período de retorno ao tratamento oral. 9 PROPOSTAS PARA A GESTÃO DA TERAPIA ANTITROMBÓTICA EM PACIENTES SUBMETIDOS À CIRURGIA Ácido acetilsalicílico (AAS), clopidogrel, prasugrel e ticagrelor Baixas doses de aspirina (150 mg/dia) têm meia- -vida de ação do medicamento de cerca de 2,0-4,5 horas, overdose (mais de mg) prolongam a meia-vida até horas. Clopidogrel, prasugrel e ticagrelor têm meia-vida de 7-10 horas. Ressalta-se que apenas o ticagrelor é um inibidor reversível da agregação plaquetária, todos os demais antiagregantes plaquetários inibem as plaquetas até que novas plaquetas sejam sintetizadas (7-10 dias). 3 Esses medicamentos, quando em circulação na corrente sanguínea e sendo realizada transfusão plaquetária, têm a capacidade de inibir a atividade das plaquetas transfundidas. Dessa forma, a reversão de urgência desses medicamentos está diretamente associada ao tempo desde a última dose e quantidade de medicamento ingerida. Mesmo assim, havendo sangramento significativo, faz-se necessária a transfusão de plaquetas. Heparina não fracionada A heparina não fracionada (HNF) é uma mistura heterogênea de glicosaminoglicanos de diversos tamanhos e pesos moleculares. Seu peso molecular médio é de daltons, podendo variar de daltons. Uma sequência pentassacarídea específica que se liga à antitrombina III (ATIII) está presente em aproximadamente 30% das moléculas de heparina. 10 Essa ligação potencializa a ação da ATIII em cerca de vezes, permitindo à heparina inibir, fortemente, a trombina e o fator Xa e também os fatores IXa, XIa e XIIa. Assim, inibe as vias comum e intrínseca da coagulação, alargando especialmente o tempo de protrombina parcial ativada (PTTa). Para que haja inibição da trombina, a molécula de heparina precisa envolver todo o complexo antitrombina III trombina, sendo necessário, portanto, um tamanho acima de Da. Por outro lado, para inativar o fator Xa, basta que a heparina se ligue à ATIII, sem a necessidade de envolver todo o complexo. 11 A heparina de baixo peso molecular (HBPM) tem peso médio de Da. Por isso, essa forma de heparina inibe fortemente o fator Xa e fracamente a trombina. Pela fraca inibição antitrombina, a HBPM frequentemente não alarga o PTTa. A HNF apresenta meia-vida de cerca de minutos quando administrada por via venosa. No caso de administração subcutânea, o aparecimento da anticoagulação é retardada por cerca de uma hora e as concentrações plasmáticas máximas são atingidas em três horas. 10 É eliminada pelos rins ou pelo sistema reticuloendotelial. Reversão rápida e eficaz da HNF pode ser alcançada a partir da protamina endovenosa (1 mg de protamina neutraliza 100 unidades de HNF). 12 No entanto, a dose da protamina varia de acordo com o tempo desde a última dose da HNF. Para uma dose de HNF realizada há 30 minutos, recomenda-se a reversão de 1 mg de protamina para 100 U de HNF. Uma dose de HNF realizada há 30 minutos-duas horas, a dose de protramina seria de 0,5 mg para 100 U de HNF. E para doses de HNF realizadas há mais de duas horas a dose seria de 0,25 mg de protamina para cada 100 U de HNF. 13 Na infusão contínua de HNF a dose de protamina recomendada deve ser calculada baseada na dose anterior de HNF realizada há 2-3 horas. Nos casos de sangramento grave associado à HNF administrada por via subcutânea e insensível à dose de 1 mg de protramina para 100 U de HNF, recomenda-se a infusão contínua de protamina, sendo a dose orientada pelo PTTa. Heparinas de baixo peso molecular (HBPM) As HBPM apresentam peso molecular menor em relação às HNF, de aproximadamente Da. Exercem seu efeito a partir da ligação com a ATIII, potencializando seu efeito. No entanto, como sua cadeia é mais curta, a maioria das HBPMs é insuficiente para envolver todo o complexo antitrombina III trombina inibindo fortemente o fator Xa e fracamente a trombina. 14 HBPM inclui dalteparina, enoxaparina, nadroparina, bemiparin, certoparin, reviparina e tinzaparina. Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S49-S59 51

54 Reversão de urgência da anticoagulação Esses produtos diferem no peso molecular, farmacocinética, atividade antif-iia/antif-xa e indicações clínicas, mas as recomendações de reversão de anticoagulação se aplicam igualmente entre eles. 15 A meia-vida das HBPMs variam de duas a cinco horas, dependendo da HBPM usada. A biodisponibilidade após administração subcutânea de injeção é de aproximadamente 90% e tem seu pico de concentrações atingido em uma a cinco horas. 16 A monitorização da anticoagulação é frequentemente desnecessária, mas pode ser avaliada a partir da atividade antifxa (em casos especiais como obesidade, gravidez e insuficiência renal). 17 A reversão do efeito das HBPMs pode ser feita pela protamina, sendo que todo o efeito anti-iia (antitrombina) é neutralizado, mas apenas 60% do efeito antixa. Isso se deve à cadeia mais curta da HBPM. A dose de protamina depende do tempo decorrido da última aplicação da HBPM, assim como seu subtipo. 14 No caso da enoxaparina (Clexane ), se o tempo da última aplicação for < 8 horas, recomenda-se usar 1 mg de protamina para cada 1 mg de enoxaparina. Se o tempo de aplicação for de 8-12 horas, a dose de protamina seria de 0,5 mg para cada 1 mg de enoxaparina. E se > 12 horas de aplicação da enoxaparina, o uso de protamina não seria benéfico. 13 Fondaparinux Diferentemente da HNF e das HBPMs, que são produtos biológicos derivados de tecidos animais, o fondaparinux é um pentassacarídeo sintético, com peso molecular de Da, que se liga à antitrombina para inibir seletivamente o Fator Xa, mas sem afetar a atividade da trombina. 18 Apresenta meia-vida de cerca de 18 horas, sendo administrado por via subcutânea geralmente em dose única. Mesmo em doses terapêuticas, não altera o PTTa e o tempo de protrombina (TP). Desse modo, monitorização de rotina não é indicada, sendo reservada a dosagem de fator antixa para ocasiões especiais, como no caso de insuficiência renal. 19 As moléculas muito pequenas de fondaparinux não se ligam à protamina, sendo esta contraindicada para reversão da anticoagulação. 20 Atualmente, não há antídoto eficaz para o fondaparinux e, apesar de ter sido proposto o uso de fator VIIa (90 mcg/kg) para controle de hemorragias graves, não há evidências que suportem seu uso. 21 Antagonistas da vitamina K O varfarin (Marevan ) constitui o principal anticoagulante oral utilizado em nosso meio. Trata-se de uma opção prática e barata, capaz de garantir um anticoagulação plena a longo prazo. 22 Age a partir da inibição da síntese hepática dos fatores II, VII, IX e X (dependentes da vitamina K). Sua monitorização se faz por meio do RNI, sendo mantido entre 2,0 e 3,0 para a maioria das sua indicações. Hemorragia é a complicação mais comum do varfarin. 23 Os pacientes idosos (> 65 anos) são geralmente mais sensíveis à medicação, sendo necessária uma dose diária menor. O sangramento tende a ocorrer com mais frequência nos primeiros três meses de terapia. Drogas que alteram o metabolismo do varfarin incluem antibióticos, amiodarona, estatinas, anticonvulsivantes e até mesmo algumas plantas, como a erva de São João. O consumo de álcool em pequena a media quantidade parece não afetar seu metabolismo. No entanto, o cosumo excessivo de álcool e seus fatores relacionados, como aumento do risco de queda, alimentação inadequada e uso inadequado da medicação, favorecem o aumento do risco de sangramento. Comorbidades associadas, como hipertensão, doenças hepáticas, insuficiência renal, AVC, história ou predisposição a sangramento e RNI lábil, ajudam a identificar os pacientes que estão mais propensos a sangramento e, com isso, otimizar sua terapêutica. 24,25 O grau de anticoagulação prévia do paciente, os níveis de vitamina K existentes no organismo e a capacidade hepática de síntese dos fatores de coagulação irão determinar a facilidade da reversão da anticoagulação. Para pacientes com quadro de sangramento, independentemente do RNI, em que o objetivo é normalizar o RNI, vitamina K 1 é o tratamento de escolha. Nesse caso, doses de 3 mg são ineficazes, sendo indicado o uso de 5-10 mg O uso de plasma fresco congelado (PFC) também pode ser usado na dose de ml/kg. No entanto, atualmente recomenda-se a reversão a partir do complexo protrombínico (CPP). Estudos clínicos comparando CPP e o PFC demonstram a correção do RNI mais rapidamente pelo CPP (média de 30 min para o CPP; e o PFC, em média, 2 horas, pela necessidade de ser aquecido, tipado e transportado do banco de sangue, além da quantidade de volume aumentada). 29 A dose pode ser guiada de acordo com RNI. RNI: 1,5-3,9: 25 UI/kg; RNI: 4,0-6,0: 35 UI/kg; RNI > 6,0: 50 UI/kg. Em pacientes com RNI aumentado e que não apresentam sangramentos devemos orientar nossa condu- 52 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S49-S59

55 Reversão de urgência da anticoagulação Seus principais representantes são: rivaroxaban e apixaban. rivaroxaban: é um inibidor oral direto do fator Xa que apresenta boa biodisponibilidade (80%) e pouca interação medicamentosa. Sua meia-vida plasmática é de 5-9 horas, podendo ser de horas no idoso. Não há, até o momento, antídoto específico. 33 Em casos de qualquer sangramento significativo, deve-se avaliar reposição volêmica adequada, assim como hemotransfusão, e identificar o local do sangramento e sua hemostasia. 34 Parece aceitável, se possível, aguardar duas meias-vidas (14-26h) para que se alcance um nível plasmático adequado para realização do procedimento. Em casos de suspeita de intoxicação pela droga, o uso de carvão ativado até 1-2 horas após a ingestão da mesma pode ser útil. Por apresentar alta ligação proteica, rivaroxaban não pode ser removido de modo efetivo por meio de hemodiálise. 35 O uso de PFC, frequentemente utilizado para reversão inicial dos pacientes anticoagulados, ainda não foi estudado para reversão dos novos anticoagulantes em humanos, não sendo recomendado para essa finalidade. 36 Fator VIIa recombinado vem sendo cada vez mais utilizado de forma off-label como um hemostático universal. No entanto, também não foi estudado em humanos para reversão dos NACOs. A relação risco-benefício deve ser cuidadosamente avaliata baseado no valor do RNI. Para um RNI abaixo de 4,5, deve-se diminuir a próxima dose da medicação ou omiti-la. RNI de 4,5-10,0 devemos parar com a medicação e tentar encontrar motivos que levaram ao seu aumento. O uso de vitamina K 1 1,0-2,0 mg por via oral ou 5-10 mg por via endovenosa deve ser considerada. Para os paciente com RNI > 10,0, que não apresentam sangramentos nem fatores de risco, a utilização de vitamina K 1 não diminuiu o risco de sangramento em relação ao placebo. No entanto, se o paciente exibe fatores de risco como sangramento nas últimas quatro semanas, cirurgia nas últimas duas semanas, plaquetas < 50 x 10 9 /L, doença hepática ou terapia antiplaquetária associada, deve-se usar vitamina K na dose de 2,5 mg VO ou 1-2 mg EV. O uso de CPP deve ser considerado. 30 Ao deparar com um paciente em uso de varfarin que necessita de procedimento cirúrgico, é necessário avaliar se o risco de trombose é mais alto que o sangramento peroperatório. Nesse caso, a estratificação do paciente em relação ao risco de desenvolver trombose, assim como o tipo de cirurgia a ser realizada, torna- -se de grande importância. Um RNI < 1,5 é considerado seguro para realização da cirurgia. O risco de sangramento é alto em cirurgias cardíacas, neurocirurgia, procedimentos ortopédico e urológicos, cirurgia em pacientes oncológicos e polipectomias. Consideram- -se pacientes de alto risco aqueles com CHADS 2 5-6, AVC ou AIT recente (<3 meses ), doença valvar reumática, TVP recente (<3 meses) e qualquer válvula mecânica cardíaca. Nesse casos, a terapia de ponte com substituição para heparina deve ser avaliada. 31 Pacientes com baixo risco (CHADS 2 <2 e pacientes tratados por mais de três meses sem episódios recorrentes de TVP ), mas que necessitam de RNI <1,5, a terapia de ponte não é indicada, sendo suficiente apenas a suspensão da medicação. A avaliação do RNI deve ser feita próximo do dia da cirurgia e se esse for >1,5, administrar 5 mg de vitamina K 1 por via oral. 32 Para procedimentos com baixo risco de sangramento, como procedimentos dermatológicos, odontológicos, outros procedimentos orais e endoscopia (mesmo que haja biópsia, mas não polipectomia), o uso de varfarin deve ser continuado. 30 Novos anticoagulantes orais Os novos anticoagulantes orais (NACOs) incluem os inibidores diretos do fator Xa (rivaroxaban e apixaban) e os inibidores diretos da trombina (dabiga- tran). Apresentam algumas vantagens como início de ação relativamente rápido e ação anticoagulante mais previsível, não sendo necessária a monitorização de rotina do seu efeito anticoagulante. Estão sendo cada vez mais utilizados em substituição aos antagonistas da vitamina K. Assim, o anestesiologista está cada vez mais suscetível a se defrontar com pacientes que fazem uso desses novos anticoagulantes e que serão expostos a diferentes situações clínicas que requerem intervenção (sangramento espontâneo ou pós-operatório, overdose, trauma e procedimentos cirúrgicos eletivos ou de urgência). A maioria das questões pertinentes ao manejo desses anticoagulantes nessas situações ainda não apresenta respostas claras e estudos estão sendo realizados para tentar elucidar essas questões e orientar nossas condutas. Inibidores diretos do fator Xa Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S49-S59 53

56 Reversão de urgência da anticoagulação da, uma vez que seu uso está relacionado a alto risco de trombose arterial em idosos ao contrário dos outros agentes procoagulantes, o complexo protrombínico total (fatores II, VII, IX e X) tem sido considerado potencial agente de reversão em humanos. Pequeno estudo duplo-cego, randomizado, controlado por placebo, com 12 homens saudáveis demonstrou que o CPP reverteria tanto o prolongamento do tempo de protrombina quanto a inibição trombina endógena. 40 Apesar de promissor, mais estudos são necessários para avaliar a eficácia do CPP. A Washinton Univeristy sugere, para reversão de urgência do rivaroxaban, o CPP na dose de 50 U/kg (dose máxima de U). 13 Alguns autores recomendam, em caso de sangramento muito importante, avaliar o uso de fator VIIa recombinante 90 mcg/kg. 41 A monitorização da atividade anticoagulante pode ser feita com base na dosagem da atividade antifator Xa. Importante lembrar que o CPP, apesar de corrigir parcialmente o PTTa e o TP, não afeta o fator antixa, assim como a depuração da droga. E a correlação entre diminuição do TP e PTTa e diminuição do sangramento ainda não foi estabelecida. 13 apixaban: é um inibidor direto do fator Xa que também apresenta boa biodisponibilidade (51-85%), meia-vida de 10-15h, com concentração plasmática máxima atingida após sua ingestão em 1-3h. Sua eliminação é tanto hepática/biliar (75%), quanto renal (25%). Também não necessita de monitorização; e em condições que são necessárias pode-se usar a dosagem dos níveis antifator Xa. 42 Em relação à reversão de urgência do apixaban, devem-se seguir os mesmos conceitos citados para o rivaroxaban, exceto por sua meia-vida mais longa, aguardando-se duas meias-vidas (20-30h), se possível, para atingir níveis plasmáticos aceitáveis para a realização do procedimento. 17 Inibidores direto da trombina A trombina exerce papel central na homeostase, tornando-se um atraente alvo para drogas anticoagulantes. Quando a trombina é ativada a partir da protrombina, ela converte o fibrinogênio solúvel em fibrina insolúvel; ativa os fatores de coagulação V, VIII, XI (que geram mais trombina) e ativa as plaquetas. O dabigratan é um inibidor direto reversível da trombina, que inibe a trombina livre e a ligada à fibrina, sem a necessidade da antitrombina. O pico de concentração plasmática é alcançado 1,25-3,0 horas após sua administração e tem meia-vida de horas em indivíduos saudáveis. Cerca de 80% do fármaco são eliminados por via renal. Seu efeito anticoagulante acumula-se no quadro de insuficiência renal e tal bioacumulação correlaciona-se bem com o grau de disfunção renal. Ao contrário dos NACOs, que possuem alta ligação proteica, o dabigratan tem baixa ligação, permitindo sua eliminação através de hemodiálise. 42,43 Embora não seja necessária monitorização laboratorial de rotina nos casos em que há hemorragia aguda, suspeita de overdose ou cirurgia de emergência, essa monitorização torna-se interessante. 44 O dabigratan prolonga o PTTa de forma curvilínea em relação à sua concentração, que resulta em diminuição na sua precisão. No entanto, o PTTa parece ser uma alternativa razoável se outros testes não estão disponíveis. O PTTa normal provavelmente irá indicar ausência de efeito anticoagulante clinicamente importante. 45 Outro modo de monitorização seria por meio do Hemoclot (teste que avalia a inibição da trombina), que provavelmente é hoje o método mais 46, 47 confiável para avaliar sua atividade. A reversão de urgência segue os mesmos conceitos dos outros NACOs. No entanto, o dabigrantan possibilita a hemodiálise para sua eliminação. 42 Em estudo, seis voluntários com doença renal em estágio terminal receberam 50 mg de dabigatran antes da hemodiálise. Média de 62% do dabigratan foi removida depois de duas horas e 68% após quatro horas. 48 Infelizmente, a hemodiálise em paciente com distúrbio de coagulação e sangramento ativo pode não ser possível. Como citado anteriormente, o PFC para reversão dos NACOs ainda não é recomendado. Em pesquisa com camundongos foi administrado dabigatran (4,5 mg/kg ou 9,0 mg/kg) antes da indução da hemorragia intracraniana. A administração de PFC conseguiu limitar a expansão do hematoma no grupo de baixa dose, mas não teve algum efeito no grupo de altas doses e não diminuiu significativamente a mortalidade. 36,49 Em vários modelos animais, o fator VIIa reverte o sangramento prolongado associado ao dabigatran, mas não corrige a coagulopatia subjacente, tal como sugerido por outros marcadores laboratoriais. 49 Apesar de ser uma conduta off-label, alguns autores recomendam o uso de fator VIIa na dose de mcg/kg EV. 41 O CPP vem sendo estudado em humanos para reversão dos NACOs e segue o mesmo princípio para os outros NACOs (CPP 50 U/kg ) Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S49-S59

57 Reversão de urgência da anticoagulação Van Ryn et al. avaliaram a neutralização do dabigatran a partir de um anticorpo seletivo, sendo aguardados os dados clínicos. 52 É aconselhável, se possível, aguardar duas meiasvidas (34h) para que a concentração de dabigratan se torne aceitável e o procedimento proposto seja realizado. 17 Inibidores direto da trombina parenteral Os inibidores diretos da trombina parenterais (IDTP) ligam-se de forma bivalente à trombina (centro ativo e exossítio), diferentemente dos NACOs, que se ligam de forma univalente à trombina somente em seu sítio ativo. Os representantes desse grupo são: argotraban, bivalirudina, lepirudina e desirudina. Eles não apresentam antídotos específicos. Na ocorrência de sangramentos, é necessário interromper a infusão do anticoagulante. A monitorização da anticoagulação é feita por meio do PTTa, mas pode alargar também o RNI. 53 Argotraban apresenta meia-vida de eliminação de minutos e pode ser monitorizado por meio do PTTa. 54,55 A bivalirudina tem meia-vida muito curta, de 25 minutos, sendo metabolizada predominantemente por proteólise. No entanto, 20% dela são excretados pelos rins, o que requer ajuste de dose na insuficiência renal. 56 A meia-vida da lepirudina é de cerca de 80 minutos, tem eliminação renal e recomenda-se o mo- nitoramento do PTTa A desirudina possui meia- -vida de cerca de 120 minutos, tem eliminação renal e a monitorização pelo PTTa é indicada nos casos de seu uso na insuficiência renal Apesar de não haver antídotos específicos, o uso do DDAVP em modelos animais reduziu o efeito anticoagulante da lepirudina. O DDAVP pode ser usado na dose de 3 mcg/kg, podendo-se repetir após 8-12h. Não é indicado mais de duas doses Ácido tranexâmico e ácido aminocaproico também podem ser considerados em casos de sangramentos pelos IDTPs (ácido tranexâmico na dose de 10 mg/kg IV de 6-8h e ácido aminocaproico na dose de 0,1-0,15 g/kg IV durante 30 minutos seguido de infusão contínua de 0,5-1 g/kg/h). 65 RESUMO Os princípios da reversão da anticoagulação são: suspender doses subsequentes do anticoagulante; considerar o antídoto apropriado; tratamento de suporte: reposição volêmica, inotrópicos, conforme necessário; medidas locais ou cirúrgicas de hemostasia: agentes tópicos (ácido tranexâmico e ácido aminocaproico); transfusão (concentrado de hemácias, plaquetas, plasma fresco congelado, fator VIIa, CPP, como indicado); identificar a fonte do sangramento. Tabela 1 - Sumário dos agentes reversores Agente Dose Comentários Vitamina K Sulfato de protamina Plaquetas Plasma fresco congelado Concentrado de complexo protrombínico Fator recombinante VIIa (rfviia) 1-10 mg IV/VO Não administrar SC/IM 12,5-50 mg IV 1 unidade de aferese 5-8 unidades plaquetárias ml/kg (1 unidade = 250 ml) Unidades/kg Unidades/kg reações à infusão são raras: administrar em min 6 (IV) a 24 (VO) horas para reversão do varfarin doses excessivas podem causar resistência ao reiniciar a medicação reversão total da heparina não fracionada 60-80%de reversão da heparina de baixo peso molecular não reverte fondaparinux aumenta a contagem de plaquetas em aproximadamente /mm 3 goal: x 103/mm 3 substitui todos os fatores da coagulação, mas não corrige totalmente pode ser necessário repetir a dose após seis horas volume alto, horas para descongelar e infundir correção rápida do RNI em pacientes em uso de varfarin volume reduzido de infusão em curto espaço de tempo (10-30 min) risco de trombose = 1,4% contraindicado quando há história de plaquetopenia induzida por heparina pode ser necessário repetir a dose após seis horas infusão rápida e volume pequeno correção rápida do RNI em pacientes em uso de varfarin pode não corrigir o sangramento porque contém apenas rfviia contraindicado quando há história de plaquetopenia induzida por heparina risco de trombose 5-10% pode ser necessário repetir a dose após duas horas Fonte: 2011 Clinical Practice Guide on Anticoagulant Dosing and Management of Anticoagulant-Associated Bleeding Complications in Adults. Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S49-S59 55

58 Reversão de urgência da anticoagulação Tabela 2 - Sumário dos anticoagulantes Agente Apixaban (eliquis) Meia-vida de eliminação 12 horas (aumentada se houver alteração da função renal) Eliminação por diálise Não Argatroban minutos 20% Bivalirudin (angiomax) Dabigatran (pradaxa) Enoxaparina (clexane) Fondaparinux (arixtra) Heparina Rivaroxaban (xarelto) Varfarin (marevan) 25 minutos (até 1 hora se houver alteração da função renal) 14 horas (até 34 horas se houver alteração da função renal) 3-5 horas (aumentada se houver alteração da função renal) horas (muito aumentada se houver alteração da função renal) minutos Dose-dependente 5-9 horas Idosos: horas (aumentada se houver alteração da função renal) 25% 62-68% 20% Não Parcial Não Sumário da reverção emergencial do sangramento potencialmente fatal se administrado há menos de duas horas: carvão ativado 1 g/kg máximo 50 g administrar concentrado de complexo protrombínico 50 UI/kg em 10 minutos considerar fator VIIa mcg/kg monitorizar RNI e fator Xa para confirmar a reversão Suspender a infusão considerar DDAVP: 3 mcg/kg Se necessário, repetir após 8-12h considerar ácido tranexâmico 10 mg/kg EV de 6-8h ou ácido aminocaproico 0,1-0,15 g//kg EV em 30 minutos seguido de infusão contínua 0,5-1 g/kg/h Considerar crioprecipitado monitorizar PTTa para confirmar o clearance suspender a infusão considerar DDAVP: 3 mcg/kg. Se necessário, repetir após 8-12h. considerar ácido tranexâmico 10 mg/kg EV de 6-8h ou ácido aminocaproico 0,1-0,15 g//kg EV em 30 minutos seguido de infusão contínua 0,5-1 g/kg/h. considerar crioprecipitado monitorizar PTTa para confirmar o clearance se administrado há menos de duas horas: carvão ativado 1 g/kg máximo 50 g administrar concentrado de complexo protrombínico 50 UI/kg em 10 minutos considerar fator VIIa mcg/kg TTPa pode ser usado para monitorizar a reversão protamina reverte parcialmente o efeito (aproximadamente 60%) administrar protamina: (taxa 5 mg/min, máximo 50 mg) se a última dose < 8 horas: para cada 1 mg de enoxaparina, administrar 1 mg de protamina se última dose 8-12 horas: para cada 1 mg de enoxaparina, administrar 0,5 mg de protamina se última dose >12 horas: não há benefício com a protamina se sangramento refratário ou potencialmente fatal: administrar duas unidades de plasma fresco congelado; concentrado de complexo protrombínico 50 UI/kg em 10 minutos; monitorar antifator Xa para confirmar a reversão não há antídodo eficaz considerar fator VIIa 90 mcg/kg monitorização por meio da atividade fator antixa protamina neutraliza a heparina tempo última dose heparina: - imediato: 1 mg de protamina para 100 UI - 30 min-2h: 0,5 mg para 100 UI de heparina - > 2h: 0,25 mg para 100 UI de heparina não exceder a taxa de 5 mg/minuto e dose máxima de 50 mg se administrado há menos de duas horas: carvão ativado 1 g/kg máximo 50g administrar concentrado de complexo protrombínico 50 UI/kg em 10 minutos considerar fator VIIa mcg/kg Monitorizar RNIe fator Xa para confirmar a reversão RNI Cenário Opções Terapêuticas <4.5 sem sangramento suspender administração até RNI em níveis terapêuticos reversão rápida necessária suspender varfarin Vitamina K 2,5 mg VO sem sangramento suspender administração até RNI em níveis terapêuticos considerar vitamina K 1,0 2,0 mg VO ou 5-10 mg EV. reversão rápida necessária suspender varfarin vitamina K 2,5-5 mg VO. >10 sem sangramento suspender administração até RNI em níveis terapêuticos avaliar fatores de risco: vitamina K 2,5 mg VO. reversão rápida necessária suspender varfarin vitamina K 2 mg IV considerar o uso de CCP. qualquer RNI sangramento potencialmente fatal suspender varfarin vitamina K 10 mg IV em 30 minutos concentrado de complexo protrombínico: -RNI 1,5-3,9: 25 UI/kg -RNI 4,0-6,0: 35 UI/kg -RNI > 6,0: 50 UI/kg avaliar plasma fresco congelado ml/kg Fonte: 2011 Clinical Practice Guide on Anticoagulant Dosing and Management of Anticoagulant-Associated Bleeding Complications in Adults. 56 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S49-S59

59 Reversão de urgência da anticoagulação REFERÊNCIAS 1. Bonhomme F, Hafezi F, Boehlen F, Habre W. Management of antithrombotic therapies in patients scheduled for eye surgery of Anticoagulant-Associated Bleeding Complications in Adults. Eur J Anaesthesiol. 2013; 30: Koutrouvelis A, Abouleish A, Indrikovs A, Alperin J. Case Scenario: emergency reversal of oral anticoagulation. Anesthesiology. 2010; 113: Cushman M, Lim W. Clinical practice guide on anticoagulant dosing and management of anticoagulant-associated bleeding complications in adults. Washington-DC: American Society of Hematology; Task Force on Myocardial Revascularization of the European Society of Cardiology (ESC) and the European Association for Cardio-Thoracic Surgery (EACTS)1; European Association for Percutaneous Cardiovascular Interventions (EAPCI), Wijns W, Kolh P, Danchin N, et al. Guidelines on myocardial revascularization. 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60 Reversão de urgência da anticoagulação ClinicalPractice Guidelines (8th Edition). Chest. 2008; 133 (6 Suppl):160S-98S. 29. Pabinger I, Tiede A, Kalina U, Knaub S, Germann R, Ostermann H, et al. Anticoagulation Reversal StudyGroup: Impact of infusion speed on the safety and effectiveness of prothrombin complex concentrate: A prospective clinical trial of emergency anticoagulation reversal. Ann Hematol. 2010; 89: Tran HA, Chunilal SD, Harper PL, Tran H, Wood EM, Gallus AS. An update of consensus guidelines for warfarin reversal. Med J Aust Feb 3;200(2): Douketis JD. Perioperative management of patients who are receiving warfarin therapy: an evidence-based and practical approach. Blood. 2011; 117: Douketis J, Berger P, Dunn A, Spyropoulos A, Becker R, Ansell J, et al. The perioperative management of antithrombotic therapy: American College of Chest Physicians Evidence-Based Clinical Practice Guidelines (8th Edition). Chest. 2008; 133(6 Suppl):299S-339S. 33. Levy JH, Key NS, Azran MS. 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61 Reversão de urgência da anticoagulação 62. Nafziger AN, Bertino JS Jr. Desirudin dosing and monitoring in moderate renal impairment. J Clin Pharmacol. 2010; 50: Ibbotson SH, Grant PJ, Kerry R, Findlay V. The influence of infusions of 1-desamino-8-D-arginine vasopressin (DDAVP) in vivo on the anticoagulant effect of recombinant hirudin (CGP39393) in vitro. Thromb Haemost. 1991; 65: Bove CM, Casey B, Marder VJ. DDAVP reduces bleeding during continued hirudin administration in the rabbit. Thromb Haemost.1996; 75: Amin DM, Mant TG, Walker SM. Effect of a 15-minute infusion of DDAVP on the pharmacodynamics of REVASC during a four- -hour intravenous infusion in healthy male volunteers. Thromb Haemost. 1997; 77: Crowther M, Warkentin T. Bleeding risk and the management of bleeding complications in patients undergoing anticoagulant therapy: focus on new anticoagulant agents. Blood. 2008; 111: Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S49-S59 59

62 RELATO DE CASO Ambiente látex seguro: relato de dois casos Latex safe environment: report of two cases Renato Machado Coelho Filho 1, Cláudia Helena Ribeiro Silva 2, Wirleyde Mattos Leão 2, Núbia Campos Faria Isoni 2, Marcelle Mafra de Queiroz 3, Magna Adaci de Quadros Coelho 4 DOI: / S017 RESUMO 1 Residente em Anestesiologia. Centro de Ensino e Treinamento CET da Santa Casa de Belo Horizonte. Belo Horizonte, MG Brasil. 2 Médico Anestesiologista. Título Superior em Anestesiologia TSA pela Sociedade Brasileira de Anestesiologia SBA e corresponsável pelo CET da Santa Casa de Belo Horizonte. Belo Horizonte, MG Brasil. 3 Acadêmica do curso de Medicina das Faculdades Integradas Pitágoras de Montes Claros. Montes Claros, MG Brasil. 4 Médica Alergista. Professora Titular da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de Montes Claros Unimontes. Montes Claros, MG Brasil. Introdução: a anafilaxia é a forma mais grave de manifestação alérgica e constitui verdadeira emergência médica. A alergia ao látex aumentou muito nos últimos 30 anos, paralelamente ao emprego de produtos derivados no ambiente da saúde, com especial destaque para as luvas. Simultaneamente, medidas preventivas e terapêuticas surgiram no âmbito da Anestesiologia para o adequado manejo de pacientes suscetíveis à alergia ao látex, desde a avaliação pré-anestésica, até a alta hospitalar. A magnitude das reações ao látex varia desde inofensivas placas cutâneas, até o dramático colapso cardiovascular. 1 Objetivo: descrever a abordagem pré-operatória de dois pacientes alérgicos ao látex, com ênfase no preparo da sala de cirurgia látex seguro ( latex free ) na Santa Casa de Belo Horizonte e fazer breve revisão bibliográfica sobre a alergia ao látex e suas implicações para o anestesiologista. Métodos: foram selecionados dois casos recentes, abordados em março e abril de 2012, e solicitada autorização por escrito dos pacientes. Para a revisão bibliográfica, foram procuradas publicações indexadas nacionais e estrangeiras sobre o tema. Conclusão: a alergia ao látex representa um problema real, de incidência de 0,2% na população geral, sem considerar os indivíduos com fatores de risco. Assim, medidas preventivas e terapêuticas devem ser do conhecimento do anestesiologista, para o adequado manejo de pacientes susceptíveis. Nesse contexto, merece especial destaque o ambiente látex seguro como principal alternativa preventiva. Palavras-chave: Anafilaxia; Hipersensibilidade ao Látex; Hipersensibilidade ao Látex; Complicações Intraoperatórias; Anestesiologia. ABSTRACT Instituição: Santa Casa de Misericórdia Belo Horizonte, MG Brasil. Autor correspondente: Renato Machado Coelho Filho renato @hotmail.com Introduction: Anaphylaxis is the most severe form of allergic manifestation and constitutes a true medical emergency. Allergy to latex has increased a lot in the last 30 years parallel to the use of derivative products in healthcare environments with particular emphasis on gloves. At the same time, preventive measures and therapies have emerged within the Anesthesiology field for the appropriate management of patients with allergy to latex, from the pre-anesthetic assessment to hospital discharge. The magnitude of the reactions to latex range from harmless skin plates to dramatic cardiovascular collapse. 1 Objective: to describe the preoperative approach in two patients allergic to latex, with emphasis on the preparation of an operating room as latex safe ( latex free ) at the Santa Casa de Belo Horizonte and to present a brief bibliographical review about latex allergy and its implications for the anesthesiologist. Methods: we selected two recent cases, in March and April of 2012, and requested written consent from these patients. The literature review included a search of indexed domestic and foreign publications on the topic. Conclusion: latex allergy represents a real problem with 0.2% incidence in the general population, without considering individuals with risk factors. Thus, preventive and therapeutic measures should be known to the anesthesiologist for the appropriate management of susceptible patients. Therefore, latex safe environments deserve special mention as the main preventive alternative. 60 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S60-S67

63 Ambiente látex seguro: relato de dois casos Key words: Anaphylaxis; Latex Hypersensitivity; Intraoperative Complications; Anesthesiology. INTRODUÇÃO Com a descoberta de doenças infectocontagiosas, medidas de biossegurança foram cada vez mais adotadas nos últimos 30 anos, sobretudo com a dispersão de entidades clínicas como a síndrome da imunodeficiência adquirida e hepatites. 1 Nesse contexto, o emprego de luvas de látex e preservativos foi amplamente incentivado, o que representou um estímulo à sensibilização de pacientes e de profissionais da área da saúde com o aparecimento de um problema clínico a alergia ao látex. Também colaboraram para essas manifestações as alterações no processamento e fabricação da borracha que provocou alterações qualitativas com aumento do conteúdo proteico alergênico do látex. 2,3 Após discussões científicas e reconhecimento desse problema de saúde emergente, diversos países programaram medidas preventivas e educativas para evitar o risco nos grupos expostos 1. Embora a associação do látex em luvas descartáveis seja a mais recorrente, esse constituinte pode também compor dispositivos de via aéreas, cateteres venosos, seringas, estetoscópios, roupas e curativos sintéticos, além de outros produtos de uso médico ou não, passíveis de sensibilizar diretamente por via mucosa, cutânea ou percutânea. 1 O látex é uma substância produzida por células lactíferas de árvores, com destaque especial para a seringueira ou Hevea braziliensis, 99% das espécies utilizadas. 1 É composto de lipídios, fosfolipídios e proteínas. As últimas perfazem 1 a 2% e cerca de 240 polipeptídeos diferentes já foram identificados. Destes, 25% têm propriedades alergênicas e são responsáveis pela estimulação imunológica e produção do anticorpos IgE. 3 Durante a vulcanização, à parte natural são adicionados antioxidantes e aditivos químicos aceleradores para comporem o látex, que é matéria-prima para a síntese dos mais diversos produtos médico- -hospitalares. 1 Esses outros aditivos também exibem potencial irritativo, no entanto, não desempenham papel alergênico significativo, como as proteínas. 1 As manifestações clínicas das reações relacionadas ao látex variam de não imunológica dermatite de contato irritativa (DCI) a imunológica (hipersensibilidade tipo IV e I) dermatite alérgica de contato, urticária e angioedema. 2,4 A reação alérgica tipo I pode também se apresentar como asma, rinite, conjuntivite até a forma clássica de anafilaxia. 3 A anafilaxia provocada pelo látex é citada em determinados estudos como segundo agente entre eventos alérgicos perioperatórios entre adultos, depois dos relaxantes neuromusculares e seguidos pelos antibióticos β-lactâmicos em geral 4,5 ; e como primeiro, para pacientes pediátricos. Pode acontecer no intraoperatório ou horas após e, conforme a magnitude, ser fatal. 4 As reações cutâneas como a DCI, provocadas pelos outros componentes associados ao látex, podem ser fator de risco para a sensibilização alérgica, deflagrando reação tardia ou imediata potencialmente fatal, como o choque anafilático. 1,2 No entanto, um indivíduo pode vir a experimentar franca anafilaxia, sem nunca ter tido alguma manifestação cutânea prévia, pois a sensibilização também ocorre através partículas inaladas. 2,3 O evento anafilático relacionado ao látex é, como qualquer outro, uma emergência médica. Requer medidas imediatas pelo anestesiologista. Mediado pelo anticorpo IgE, surge como reação multissistêmica, com manifestações cutâneas (angioedema, eritema, exantema, urticária); respiratórias (dispneia, sibilos, roncos); cardiovasculares (hipotensão, taquicardia, arritmias) e neurológicas (confusão mental). 1,2,6 No entanto, no intraoperatório, é uma causa difícil de determinar, sem contar com a história prévia do paciente e principalmente quando se considera o número de substâncias potencialmente alergênicas empregadas pelo anestesiologista (bloqueadores neuromusculares, antibióticos, coloides, hemoderivados, anti-inflamatórios, analgésicos, soluções antissépticas). O fato de o paciente ficar encoberto por campos cirúrgicos e sedado dificulta a percepção de manifestações cutâneas pela inspeção e pela queixa do prurido, respectivamente. Portanto, o sinal mais sensível de anafilaxia percebido pelo anestesiologista é a taquicardia. 7,8 Os pacientes com mais risco de desenvolverem alergia ao látex incluem crianças com história de múltiplas cirurgias prévias, como portadores de malformação urinária, mielomeningocele e espinha bífida, e profissionais da área de saúde. Merecem destaque especial pacientes que já demonstram sinais de hipersensibilidade ao látex ou mesmo quando possuem exames laboratoriais e testes cutâneos positivos. 3 Em estudo, estimou-se a prevalência de sensibilização ao látex, entre anestesiologistas, de 12,5%. 4 Quando há Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S60-S67 61

64 Ambiente látex seguro: relato de dois casos dados que sugerem sensibilização associada a atopias, as chances de alergia ao látex aumentam, além da última ser uma condição de pior prognóstico para eventos anafiláticos no geral. A coexistência de alergia a alimentos como abacate, kiwi, banana e castanhas e sensibilidade cruzada com o látex é bem estabelecida e denominada síndrome látex-fruta. 2,5 No grupo de risco dos profissionais de saúde com alergia ao látex e entre aqueles que exibiram anafilaxia ao látex, essa síndrome é elevada, o que difere das crianças com espinha bífida cuja prevalência de síndrome látex-fruta é menor. 8 É importante avaliar pacientes que já relataram evento anafilático prévio em cirurgias sem identificar o alérgeno ou que o identificaram como látex, pois esses eventos podem ser fatores de risco para novas reações. 6,9 Também devem ser analisados com mais critério os relatos de angioedema labial ou sintomas relacionados à alergia após tratamento odontológico. 6 Vale ressaltar que há duas situações para o paciente: ser sensível ou ter alergia ao látex. A sensibilidade pode ser determinada por testes diagnósticos in vivo (testes cutâneos ou provas de provocação) e/ou laboratoriais com dosagem do IgE específico para as proteínas do látex. O diagnóstico da alergia ao látex é fundamentado na história clínica e confirmado pelos testes em indivíduos hipersensíveis. 2 As características da reação e a forma de exposição ao látex são necessárias para o entendimento do quadro apresentado, pois não é necessário contato direto com as substâncias, embora seja essa a maior forma de estímulo. 1 Dos vários peptídeos isolados, 14 têm o poder de dispersão no ar. 1 Assim, tais partículas podem estimular o paciente, seja por via aérea ou mesmo ao precipitarem aerossóis em área cruenta na incisão operatória. A simples presença do látex na sala de cirurgia constitui um risco aos indivíduos suscetíveis, ainda que não esteja em contato direto. Dessa forma, surge a necessidade de um ambiente livre de látex O conceito de ambiente livre de látex vai além da sala de cirurgia. Não pode conter algum material de látex, incluindo aparelho de anestesia e de monitorização, mesa cirúrgica, móveis, luvas, drenos, sondas, cateteres, instrumental, seringas, torniquetes, entre outros. Esses itens devem ser substituídos por similares feitos com vinil e outros derivados do petróleo, metal ou vidro. O item cuja constituição não seja de conhecimento da equipe deve ser removido e, quando inevitável e desconhecido, como a superfície na qual o paciente estará deitado, deve ser devidamente forrada com lençóis de algodão. Deve-se optar por equipos de PVC sem injeto- res laterais ou, se houver, não utilizá-los; dar preferência às ampolas de vidro, sem perfurar a borracha isolante de frascos convencionais. Na sua existência, utilizar um porta-agulhas para romper o lacre metálico, expondo o conteúdo sem perfurar a borracha isolante. 1,11,12 A sala de cirurgia livre de látex deve ser preparada idealmente na noite anterior e serem colocados no seu interior o máximo dos itens previstos para seu emprego, para se evitar a abertura de sua porta, a qual deve ser fechada ao ser montada, com o ar-condicionado cuja tubulação não seja comunicante com as demais salas de cirurgia. Tanto a equipe médica, anestesiologistas e cirurgiões como a enfermagem devem ter esse paciente como o primeiro da manhã. Não devem ter tido contato com látex nesse dia, para se evitar a impregnação de partículas antigênicas na roupa. 1,11,13 A atenção ao contato desse paciente com o látex deve ser estendida para além do bloco cirúrgico. Considerar que a maca de transporte deve ser higienizada previamente, forrada com tecido de algodão e que o funcionário responsável pela movimentação não utilize luva de látex, bem como o indivíduo encarregado da higienização do ambiente na noite anterior. Um ambiente totalmente livre de látex é difícil de ser atingido em sua forma plena, pois demanda conscientização e esclarecimento de toda a equipe com médicos, enfermeiros, técnicos, farmacêuticos, equipe de limpeza, nutricionistas e pessoal encarregado pelo preparo e condicionamento de alimentos, os quais normalmente usam luvas e manipulam outros alimentos potencialmente relacionados à síndrome látex fruta. 1,5 O ambiente livre de látex é uma importante medida preventiva e está indicado a todos os indivíduos documentados como sensibilizados ou alérgicos e àqueles considerados como grupo de risco que apresentarem história sugestiva de anafilaxia durante procedimentos cirúrgicos e/ou odontológicos. Para os pacientes com indicação de cirurgias eletivas, a consulta pré-anestésica é um momento crucial para se extraírem dados relacionados à alergia e aos alimentos passíveis de reação cruzada com látex ou eventos clínicos de anafilaxia em procedimentos anteriores. Em caso de suspeita de alergia, o anestesiologista deve encaminhar o paciente ao serviço de imunologia clínica, para tentar, a partir de métodos específicos, definir o grau de sensibilidade e orientações adequadas. Em cirurgias de emergência, para pacientes que apresentam o relato de alergia a látex ou história de anafilaxia em cirurgias anteriores, cujo agente é desconhecido, recomenda-se realizar o ato em sala latex free Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S60-S67

65 Ambiente látex seguro: relato de dois casos Para os pacientes que apresentaram anafilaxia ou choque anafilático durante o ato anestésico-cirúrgico, deverá ser oferecida uma cópia do boletim de anestesia, contendo o nome químico e comercial, dosagem e horário da infusão de todas as substâncias utilizadas no perioperatório para auxiliar o alergista que realizará a investigação no mínimo 30 dias após evento. 4,9 O tratamento da anafilaxia deflagrada pelo látex é idêntico àquele destinado a qualquer agente e deve obedecer ao estádio clínico: grau I: apenas manifestações cutâneas, pode-se proceder à observação ou empregar glicocorticoide para reduzir angioedema e prurido. 13 grau II: manifestações cutâneas e/ou respiratórias e/ou cardiovasculares sem choque (pressão arterial sistólica acima de 90, abordagem idêntica ao grau I; se tendência à hipotensão, pode-se empregar adrenalina, mas não é mandatória. Além disso, recomenda-se ofertar oxigênio a 100% suplementar, hidratação e posição de Trendeleburg. 13 grau III: pode apresentar manifestações contidas em I e II, com hipotensão, pressão arterial sistólica inferior a 90, associada à taquicardia. O uso de adrenalina está formalmente indicado, associado às medidas anteriores. 13 grau IV: quando recrudesce com parada cardiovascular. Uso de adrenalina é mandatório O uso da adrenalina diante de choque anafilático é mandatório. É a droga de escolha, uma vez que representa o antagonista fisiológico da histamina, principal mediador da anafilaxia. Por sua estimulação beta, consegue ativar a adenilciclase, aumenta o AMp cíclico intracelular e, assim, evita a degranulação de mastócitos e basófilos. 13 Dessa forma, a adrenalina é capaz de reduzir as manifestações da anafilaxia e evita o aumento de sua intensidade, já que inibe a liberação de mediadores de anafilaxia Para pacientes que utilizam beta-bloqueadores, a resposta à adrenalina pode ser ineficaz ou ausente, quando o emprego do glucagom está indicado, já que este estimula a adenilciclase, sem a participação do receptor beta. Quando o choque se mostra refratário, usar adrenalina contínua ou noradrenalia ou metaraminol. 13,15,16 Os glicocorticoides compõem o arsenal terapêutico, mas não têm posição imperativa no choque anafilático, já que seu mecanismo de ação é por transrepressão nuclear e lento. A hidrocortisona tem pico de ação em quatro horas, a metilprednisona em 30 minutos. 13 Os anti-histamínicos podem ser utilizados em graus leves de anafilaxia. Não há grau de evidência que recomende o seu emprego em choque anafilático. 17 A pré-medicação com glicocorticoide e anti-histamínico defendida por algumas fontes não tem evidencia que corrobore seu emprego. Inclusive, pode mascarar as manifestações de anafilaxia no peroperatório Além das medidas citadas, a observação pós- -evento é fundamental para garantir a segurança do paciente. Existe a forma bifásica da anafilaxia, a qual pode se mostrar com intensidade igual, inferior ou superior à manifestação inicial. Há autores que recomendam tempo mínimo de oito horas de observação, embora já tenham sido citados casos fatais da forma bifásica com até 24 horas do evento-índice. 13 Há autores que defendem a coleta de sangue da veia femoral para dosagem de histamina e/ou triptase sérica para aqueles pacientes que vieram a óbito e há suspeita de anafilaxia. Essas evidências laboratoriais têm alto valor preditivo positivo para confirmar o diagnóstico. Essas amostras seriam então congeladas para posterior análise clínica, se o serviço não dispuser de kits laboratoriais específicos. 4,17 O anestesiologista é o médico que potencialmente apresenta mais chance de presenciar uma anafilaxia. Nesse contexto, fazem parte de suas funções estar atento e reverter o quadro, como também dar seguimento ao paciente acometido no peroperatório, ao encaminhá-lo para ambulatórios de imunologia clínica para investigação das causas de anafilaxia. 4,17,18 RELATO DE CASO Caso I Paciente feminino, 69 anos, PII, candidata a histerectomia, ooforectomia, linfadenectomia paraórtica e omentectomia, por conta de neoplasia de corpo uterino em março de Portadora de asma persistente moderada, hipertensão arterial controlada e diabetes mellitus. Há o relato de reação anafilática grave, com choque durante colecistectomia via laparotômica há 14 anos, fato que foi investigado pelo alergista, em que houve sugestão de hipersensibilidade ao látex por teste cutâneo. Houve, pois, um relatório do alergista sugerindo alergia ao látex. Para corroborar a evidência clínica, a mesma paciente já exibira angioedema de lábios durante tratamento Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S60-S67 63

66 Ambiente látex seguro: relato de dois casos odontológico. Não havia história de alergias alimentares, nem de exposição ocupacional concisa. A cirurgia atual já havia sido cancelada por duas vezes nas últimas semanas em outro serviço. Optamos pela raquianestesia, com 20 mg de bupivacaína pesada, 30 mcg de clonidina, 100 mcg de morfina. Sedada com midazolan e fentanil. A antibioticoprofilaxia foi feita com 2 gramas de cefazolina, com a paciente acordada e antes do bloqueio do neuroeixo e da sedação. Sondada com cateter vesical de demora, feito de silicone, bem como todo o material utilizado era destituído de látex. Para melhor acompanhamento pós-operatório, foi solicitada vaga no Centro de Terapia Intensiva (CTI) pós-operatório da Santa Casa de Belo Horizonte e antes havia sido informado à equipe do CTI para a preparação do leito, isolado, sem itens de látex, o que foi devidamente atendido. No CTI foram transfundidos 300 ml de concentrado de hemácias, em virtude de queda da hematimetria pós-cirurgia, em que a hemoglobina inicial foi de 12 g/dl e final 6,8. A despeito disso, durante o ato manteve-se predominantemente estável. Realizou-se apenas bolus de efedrina totalizando 75 mg. A hidratação foi feita com solução fisiológica a 0,9% aquecida. A paciente recebeu alta do CTI no segundo dia pós-operatório e do hospital com quatro dias de internação para seguimento com oncologista. É importante ressaltar que essa paciente iria ao Centro de Especialidades Médicas (CEM) para a retirada dos pontos. Antevendo isso, nosso serviço sugeriu o uso de luvas de procedimento de silicone pela equipe cirúrgica. Não houve sinais de hipersensibilidade durante sua estada na Santa Casa BH. Caso II Paciente feminino, 36 anos, PI, candidata à mamoplastia bilateral sob anestesia geral. Profissional da área de saúde, sem história prévia de eventos anafiláticos, apresentou dosagem IgE específico para o látex fortemente reator. Embora essa paciente nunca tenha experimentado qualquer manifestação de hipersensibilidade, esse exame havia sido solicitado pela equipe de cirurgia plástica, em virtude de uma experiência grave com alergia ao látex vivenciada pela equipe no passado. Tornou-se, portanto, para essa equipe, rotina solicitar dosagem de IgE para o látex indiscriminadamente. Optamos pela anestesia geral balanceada, com sevoflurane, protóxido, remifentanil, propofol e cisatracúrio. Para analgesia pós-operatória: cetoprofeno, dipirona e morfina. Sondada com cateter vesical de demora de silicone. Hidratada com solução salina a 0,9%. Todo o material utilizado era destituído de látex e a sala foi preparada na noite anterior, enfatizando- -se que todo o circuito do aparelho de anestesia foi trocado, inclusive o reservatório de cal sodada. Ato transcorrido em oito horas e sem intercorrências. Encaminhada diretamente da sala de cirurgia (onde foi extubada e observada por 30 minutos) para o leito, preparado previamente sem látex. O tempo de permanência foi de dois dias no hospital, com alta, sem manifestações alérgicas. DISCUSSÃO A incidência de sensibilidade ou alergia ao látex é variável conforme a população estudada, bem como ocupação, mas há estudos que reportam até 6,4% de pessoas sensíveis ao látex. 10 Em um intervalo de menos de um mês tivemos dois pacientes. O ambiente livre de látex está indicado a todos com história documentada de alergia ao látex ou que apresentem sinais clínicos ou laboratoriais de sensibilização. 13,15 Alguns estudos sugerem a abordagem preventiva precoce àqueles fortemente sujeitos à sensibilização futura, como crianças com malformação em vias urinárias, sondados por muito tempo, bem como os portadores de mielomeningocele e espinha bífida. 15 Assim, desde a primeira abordagem, empregar-se ambiente livre de látex. A paciente I apresentou-se com quadro prévio de anafilaxia grave sugerida ao látex por testes cutâneos, enquanto a paciente do caso II somente apresentou um resultado de IgE fortemente reator. Como se tratava de história clínica compatível e investigada em I e de um exame válido em II, optamos por preparar uma sala livre de látex para ambos, na noite anterior, com cerca de 12 horas de antecedência. Embora em I tenha-se apresentado parecer do alergista sugerindo alergia ao látex, adotamos também mais precaução nessa paciente. Assim, evitamos o emprego de bloqueador neuromuscular (principal causa de anafilaxia no peroperatório), administramos o antibiótico com a paciente acordada e antes de prosseguir ao bloqueio do neuroeixo. Não utilizamos coloides para a hidratação. 8,13 Não existe 64 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S60-S67

67 Ambiente látex seguro: relato de dois casos recomendação para evitar bloqueador neuromuscular em pacientes alérgicos a látex, mas optamos por evitá-lo dada a gravidade da anafilaxia anterior e pelo fato de não ter sido realizado teste alérgico com esses medicamentos documentados no relatório fornecido pelo alergista (Figuras 1 e 2). Figura 1 - Prick test: Teste em que é colocado em contato com a derme o antígeno pesquisado. No âmbito das possibilidades de fármacos e substâncias do ambiente anestésico cirúrgico, seriam testados todas, inclusive o látex e a induração cutânea comparada com os grupos controle, em que são inoculados separadamente água e Histamina. Assim, conforme tamanho da induração cutânea, recai-se a suspeita alergênica. O ideal é que seja pesquisado, pelo menos 30 dias após o evento alérgico suspeito. 15 Fluxograma para abordagem anestésica do paciente com história previa de anafilaxia grave durante peroperatório Agente alergênico conhecido Agente alergênico desconhecido Relatório do anestesiologista / alergista discriminando o agente/ boletim anestésico anterior Emergência Eletivo Não Sim Proceder ao ato normalmente, evitar o agente alergênico especificado *Bloqueadores neuromusculares 1) proceder ao ato em ambiente látex free 2) evitar BNM* 3) quando indicado fazer antibiótico-profilaxia com paciente acordado; 4) dar preferência para técnicas regionais de anestesia; 5) observação criteriosa na sala de recuperação sem contato com látex; 6) em caso de anafilaxia tratar conforme gravidade. Encaminhar ao alergista para investigação e postergar abordagem Figura 2 - Fluxograma sobre abordagem de pacientes com história prévia de anafilaxia em ato anestésicocirúrgico anterior. Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S60-S67 65

68 Ambiente látex seguro: relato de dois casos O preparo do ambiente livre de látex é muito difícil, ainda mais ao se considerarem os antígenos que se dispersam no ar. Para os dois casos, foram preparadas as salas na noite anterior e deixamos as salas cirúrgicas com porta fechada, orientando os cirurgiões e técnicos de que deveria ser o primeiro paciente do dia e quanto à proibição de contato com látex na manhã. 18 Na sala de cirurgia, todo o material de anestesia, cirurgia e de monitorização deve ser destituído de látex. 1,13 A mesa de cirurgia foi devidamente forrada com lençóis de algodão, como também o foi toda a superfície em que pairava a dúvida sobre a possibilidade da presença de látex na constituição da superfície, como cadeiras e mesas. 18 Os antígenos do látex são também dispersáveis. Não é preciso o contato direto com o corpo do paciente para se deflagrar a anafilaxia. 1,6,9 Assim, toda a equipe foi devidamente orientada e os itens removidos da sala na noite anterior. A punção venosa dos pacientes foi feita na sala de cirurgia, sem o auxílio de garrotes. A conscientização do ambiente livre de látex para o paciente deve abranger equipe multidisciplinar. Em nosso serviço, a enfermagem do bloco de cirurgia e dos leitos foram devidamente informados para que houvesse o preparo de ambientes o mais próximo do livre de látex para as pacientes relatadas. 15,18 Posteriormente, foram ministradas aulas para médicos anestesiologistas, enfermeiros, farmacêuticos, técnicos de limpeza sobre a importância da abordagem correta do paciente suscetível à alergia ao látex. Houve, assim, a listagem de alguns itens para compor quites para esse tipo de paciente, os quais já deveriam ser montados caso houvesse a necessidade de novos ambientes livres de látex futuros. Instituímos um check-list específico (Tabela 1). CONCLUSÃO A alergia ao látex, como qualquer outra, é uma entidade potencialmente grave que deve ser sempre atentada pelo anestesiologista. 4,16 Cabe a esse profissional instituir medidas de prevenção e tratamento dessa entidade clínica. Nesse contexto, ações como programar um ambiente latex free, identificar fatores de risco e estabelecer programas de orientação de toda a equipe do serviço são de suma importância. Tabela 1 - Check List Cirurgia Látex Free Santa Casa de Belo Horizonte Data: / / sala: Item Sim Não É a primeira cirurgia do dia? Foi realizada limpeza terminal da sala? A sala foi montada no dia anterior? Após a limpeza terminal e montagem da sala, a porta permaneceu fechada durante todo o plantão noturno? A mesa cirúrgica e as cadeiras foram totalmente cobertas com lençóis? Realizada a troca da caixa de pérfuro cortante? Providenciada a pinça para retirar as tampas dos medicamentos vedados com material de borracha? Kit de anestesia de material de silicone dentro da sala? Providenciado manguito de pa em material látex free? Protegidas com algodão as partes em borracha dos materiais e/ou equipamentos que são necessários para o procedimento e que são insubstituíveis? Porta da sala de cirurgia devidamente identificada com os dizeres: cirurgia látex free-favor não entrar? Trocada a cal sodada? O kit da farmácia e o kit de anestesia para a cirurgia látex free foram solicitados e estão na sala desde a noite anterior? A recuperação pós anestésica do paciente será feita na sala de cirurgia? O acesso venoso foi puncionado sem o uso de garrote? O CTI ou unidade de internação para onde o paciente será encaminhado foi comunicado sobre a necessidade de preparar o leito com as especificações de látex free? A equipe médica está toda ciente do que representa um ambiente latex free? Assinatura e carimbo do anestesiologista responsável Assinatura e carimbo do enfermeiro responsável 66 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S60-S67

69 Ambiente látex seguro: relato de dois casos Deve-se reforçar o conceito de que os antígenos do látex são vários e potencialmente dispersíveis e que não precisa necessariamente um contato direto do material de látex com o paciente para deflagrar a estimulação. 1,4,9 Por fim, na história prévia de alergia durante ato anestésico cirúrgico e desconhecido o agente específico, o ambiente latex free também está indicado para abordagens emergenciais. 4,17 REFERÊNCIAS 1. Abrams EM, Becker AB, Gerstner TV. Anaphylaxis related to avocado ingestion: a case and review. Allergy Asthma Clin Immunol. 2011; 7(1): Accetta PDJ, Klancnik M, Elms N, Wang ML, Hoffmann RG, Kurup VP,et al. Analysis of available diagnostic tests for latex sensitization in an at-risk population. Ann Allergy Asthma Immunol Feb; 108(2): Filon FL, Radman G. Latex allergy: a follow up study of 1040 healthcare workers. Occup Environ Med Feb; 63(2): Brown RH, Schauble JF, Hamilton RG. Prevalence of latex allergy among anesthesiologists: identification of sensitized but asymptomatic individuals. Anesthesiology Aug; 89(2): Cabañes N, Igea JM, de la Hoz B, Agustín P, Blanco C, Domínguez J, et al. Latex Allergy: Position Paper. J Investig Allergol Clin Immunol. 2012; 22(5): Machado JA, Cunha RC, Oliveira BH, Silva J. Reação anafilática induzida por látex em paciente submetido à apendicectomia aberta: relato de caso. Rev Bras Anestesiol June; 61(3): Allarcon JB, Malito M, Linde H, Brito MEM. Alergia ao látex. Rev Bras Anestesiol. 2003; 53(1): Kroigaard M, Garvey LH, Gillberg L, Johansson SG, Mosbech H, Florvaag E, et al. Scandinavian Clinical Practice Guidelines on the diagnosis, management and follow-up of anaphylaxis during anaesthesia. Acta Anaesthesiol Scand Jul; 51(6): Gawchik SM. Latex allergy. Mt Sinai J Med Sep-Oct; 78(5): Gaspar A, Faria E. Alergia ao látex. Rev Port Imunoalergologia Jul; 20(3): Kemp SF, Lockey RF, Simons FE; World Allergy Organization ad hoc Committee on Epinephrine in Anaphylaxis. Epinephrine: the drug of choice for anaphylaxis. A statement of the World Allergy Organization. Allergy Aug; 63(8): Mcentee J. Dental local anaesthetics and latex: advice for the dental practitioner. Dent Update Sep; 39(7): Quadros-Coelho MA, Coelho RMF, Coelho MA, Alencar GG, Marques PQ, Solé D. Reações anafiláticas em serviço de urgência: tratamento farmacológico em 61 pacientes. Rev Bras Alerg Imunopatol. 2010; 33(5): Mertes PM, Lambert M, Guéant-Rodriguez RM, Aimone-Gastin I, Mouton-Faivre C, Moneret-Vautrin DA, et al. Perioperative anaphylaxis. Immunol Allergy Clin North Am Aug; 29(3): Moneret-Vautrin DA, Mertes PM. Anaphylaxis to general anesthetics. Chem Immunol Allergy. 2010; 95: Soar J, Deakin CD, Nolan JP, Abbas G, Alfonzo A, Handley AJ, et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2005 Section 7. Cardiac arrest in special circumstances. Resuscitation Dec; 67 (Suppl 1):S Sussman G, Gold M. Guidelines for the Management of Latex Allergies and Safe Latex Use in Health Care Facilities. Arlington Heights, IL: American College of Allergy, Asthma & Immunology; p. [Cited 2013 Sept 15]. Available from: allergies/types/latex-allergy/pages/latex-allergies-safe-use.aspx 18. Hospital Albert Einstein. Protocolo ambiente látex free Hospital Albert Einstein, diretrizes assistenciais. [Citado em 2013 Set 15] Disponível em: Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S60-S67 67

70 RELATO DE CASO Analgesia para toracotomia com cateter multiperfurado e bomba elastomérica: relato de caso Analgesia for thoracotomy with multi-perforated catheters and elastomeric pump: case report Flávia Aparecida Resende 1, Maria Beatriz Assumpção Mourão 1, Bárbara Sanches Cardoso Allevato 1, Bráulio Antônio Maciel de Faria Mota Oliveira 2, Celso Homero Santos Oliveira 3, Sérgio Ricardo Botrel e Silva 4 DOI: / S018 RESUMO 1 Médico em Especialização- 3º ano. Centro de Ensino e Treinamento-CET, Sociedade Brasileira de Anestesiologia -SBA. Hospital Felício Rocho. Belo Horizonte, MG Brasil. 2 Médico Anestesiologista. Título Superior em Anestesiologia TSA pela Sociedade Brasileira de Anestesiologia SBA. Hospital Felício Rocho. Belo Horizonte, MG Brasil. 3 Médico Anestesiologista. Hospital Felício Rocho. Belo Horizonte, MG Brasil. 4 Médico Anestesiologista. Responsável pelo CET/SBA. Hospital Felício Rocho. Belo Horizonte, MG Brasil. A toracotomia é um procedimento que provoca intensa dor no pós-operatório. Para amenizá-la, várias técnicas de analgesia são descritas, sem, contudo, mostrar superioridade comprovada uma sobre as outras. Apresenta-se um caso de analgesia para toracotomia com cateteres multiperfurados e bomba elastomérica. Relato do caso: paciente com proposta de toracotomia exploradora devido à fratura brônquica por trauma torácico compressivo. Planejada a realização de anestesia geral e peridural torácica para analgesia, porém o paciente apresentava múltiplas lesões dermatológicas difusas pelo dorso. Realizadas então anestesia geral e analgesia com implantação de cateteres multiperfurados e infusão contínua de anestésico local por bomba elastomérica. Concluiu-se que as opções para realização de uma boa analgesia pós-operatória para toracotomia são muitas e novas técnicas vêm surgindo e ganhando espaço. A utilização de cateteres multiperfurados pode ser considerada uma opção para pacientes que tenham contraindicação à peridural torácica. Palavras-chave: Anestesia por Condução; Toracotomia; Traumatismos Torácicos/terapia; Cateteres. ABSTRACT Thoracotomy is a procedure that causes intense pain in the postoperative period. Several analgesia techniques are described to ease this pain, however, without showing a proven superiority of one over the other. A case of analgesia for thoracotomy with multi-perforated catheters and elastomeric pump is presented. Case report: a patient with proposed exploratory thoracotomy due to bronchial fracture by compressive chest trauma. The general anesthesia and thoracic epidural for analgesia were planned, however, the patient presented multiple diffuse dorsal skin lesions. General anesthesia and analgesia were then performed with the implantation of multi-perforated catheters and continuous infusion of local anesthetic through an elastomeric pump. It was concluded that the options for performing a good postoperative analgesia for thoracotomy are many and that new techniques are emerging and gaining space. The use of multi-perforated catheters can be considered an option for patients who have a contraindication to thoracic epidural. Key words: Anesthesia, Conduction; Thoracotomy; Thoracic Injuries/therapy; Catheters. Instituição: Centro de Ensino e Treinamento da Sociedade Brasileira de Anestesiologia CET/ SBA do Serviço de Anestesiologia do Hospital Felício Rocho HFR Belo Horizonte, MG Brasil Autor correspondente: Dr a. Flávia Aparecida Resende flavinha_0611@yahoo.com.br INTRODUÇÃO A dor causada por toracotomia é considerada uma das mais intensas e de maior duração entre os diversos procedimentos cirúrgicos, podendo ocorrer por trauma te- 68 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S68-S72

71 Analgesia para toracotomia com cateter multiperfurado e bomba elastomérica: relato de caso Após o bloqueio de plexo braquial via interescalênica com ropivacaína a 0,5%, a ortopedia realizou a osteossíntese de úmero direito. As cirurgias ocorreram sem intercorrências, apesar do longo período pecidual extenso, fratura de costelas, neurite intercostal aguda, lesão do ligamento costovertebral posterior, luxação costocondral, ressecção ou compressão do parênquima pulmonar e colocação de drenos pleurais. A lesão tecidual resulta em resposta inflamatória que afeta a sensação dolorosa. A própria estimulação nociceptiva resulta em resposta inflamatória neurogênica, provocando vasodilatação, extravasamento de proteínas plasmáticas e ação sobre as células inflamatórias com liberação de mediadores químicos. 1 Um dos princípios do tratamento da dor aguda é o evitar o estabelecimento dessa resposta inflamatória, com o emprego de fármacos potentes puros ou associados, pela via mais apropriada, em doses adequadas e a intervalos regulares de acordo com sua meia- -vida ou, mais modernamente, por infusão contínua. 2 ção da analgesia com o sistema de cateteres multiperfurados (Figuras 1 e 2), em que um cateter foi implantado na ferida operatória (Figura 3) e o outro dentro da cavidade torácica pelo cirurgião (Figura 4). Uma bomba elastomérica, responsável pela infusão contínua de anestésico local, foi preenchida com ropivacaína 0,2%. RELATO DE CASO CRO, 26 anos, sexo masculino, sem comorbidades, com história de trauma torácico. Evoluiu com dispneia, sendo submetido à tomografia computadorizada (TC) de tórax, que mostrou fraturas de arcos costais, pneumotórax e hemotórax à direita, além de fratura brônquica. A radiografia de membros superiores mostrou fratura de úmero direito. Realizada drenagem torácica em selo d água pela cirurgia torácica, mas nova TC mostrou pneumotórax residual e colabamento total do pulmão direito. Exames laboratoriais normais, exceto queda progressiva da hemoglobina. Optou-se por toracotomia exploradora e osteossíntese de úmero, após reserva de CTI e hemoderivados. O paciente foi admitido no bloco cirúrgico estável hemodinamicamente, mantendo saturação de oxigênio de 100% com oxigênio a 10 litros por minuto através de máscara facial. Realizadas venóclise com jelco de grosso calibre, monitorização com eletrocardiograma, oximetria de pulso, pressão arterial invasiva em artéria radial e pressão venosa central através de cateterização de veia subclávia. A intubação orotraqueal foi realizada após indução em sequência rápida com fentanil, propofol e rocurônio. Foram utilizadas cânula endotraqueal de Carlens número 37 e ventilação monopulmonar, mantendo frequência respiratória de 14 irpm, PEEP de 9 e volume corrente de 6 ml/kg. A equipe da cirurgia torácica realizou reconstrução do brônquio intermediário e reimplante do lobo superior direito. Drenos torácicos foram colocados e fixados entre a sexta e a sétima costelas. Optou-se por realiza- Figura 1 - Bomba elastomérica e seus componentes. Fil port: local para injetar a medicação; tubing: tubulação; clamp; filter: filtro; flow restrictor: restritor de fluxo; catheter: cateter. Figura 2 - Detalhe do cateter mostrando múltiplas perfurações. Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S68-S72 69

72 Analgesia para toracotomia com cateter multiperfurado e bomba elastomérica: relato de caso rioperatório. O paciente foi extubado e encaminhado ao CTI com infusão contínua de ropivacaína a 0,2%, 4 ml/h, pelo sistema de bomba elastomérica (Figura 5). Houve necessidade de resgate da dor com 4 mg de morfina endovenosa apenas uma vez, durante todo o pós-operatório, na chegada do paciente ao CTI. A analgesia foi mantida apenas com dipirona e AINE, após a retirada do cateter (48h após o procedimento). Figura 5 - Posicionamento da bomba elastomérica e dos cateteres após a cirurgia. A alta do CTI ocorreu após 36h e a alta hospitalar foi dada no nono dia de pós-operatório. DISCUSSÃO Figura 3 - Seta mostrando o cateter na ferida operatória. Figura 4 - Seta mostrando o cateter colocado entre parede torácica e pleura parietal A dor é um importante fator de aumento na morbimortalidade pós-operatória. Ela provoca respiração superficial devido à imobilidade da parede torácica e, consequentemente, perda da efetividade da tosse, o principal mecanismo de eliminação de secreções das vias aéreas, provocando atelectasia, inadequado gradiente ventilação-perfusão e hipoxemia. 3 A toracotomia é um procedimento extremamente doloroso, sendo importante o planejamento da analgesia pós-operatória pelo anestesiologista. O objetivo da terapêutica analgésica pós-operatória deve ser propiciar aos pacientes um regime analgésico balanceado, baseado na identificação de múltiplos mecanismos envolvidos na gênese da dor. 4 Várias são as vantagens de uma adequada analgesia pós-operatória, entre elas mais conforto ao paciente, melhor expansão pulmonar e da caixa torácica, melhor mobilização das secreções, redução na incidência de atelectasias e broncopneumonia, redução do trabalho cardíaco e consumo de oxigênio pelo miocárdio e alta precoce da unidade de terapia intensiva e hospitalar. 5 A analgesia sistêmica é mais comumente realizada com não opioides (anti-inflamatórios não hormonais, dipirona e agonistas a -adrenérgicos) 6 e opioides, mas esses fármacos apresentam efeitos adversos 2 como sedação e depressão respiratória, aumentando 70 Rev Med Minas Gerais 2014; 24 (Supl 3): S68-S72

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