Lucianna Cristina Teixeira Soares 1
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- Manoela Caldas Furtado
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1 A TERCEIRIZAÇÃO SOB A FLEXIBILIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: bases históricas e expressões no corredor de exportação minero-siderúrgico de Carajás/Ponta da Madeira Lucianna Cristina Teixeira Soares 1 Resumo: Esta comunicação trata do processo de terceirização ou de subcontratação como prática para redução de custos da produção e de precarização do trabalho e do emprego, e considera expressões no corredor de exportações minero-siderúrgico de Carajás/PA- Porto da Madeira/MA. Este processo é entendido como parte do novo paradigma de organização da produção industrial sob a flexibilização das relações de trabalho. Palavras-chave: Reestruturação produtiva, flexibilização das relações de trabalho, terceirização, Abstract: This communication deals with the process of outsourcing and subcontracting as a practice to reduce costs of production and precariousness of work and employment, and finds expression in the corridor of exports of mineral and steel Carajás/PA- Porto Madeira / MA. This process is understood as part of the new paradigm of industrial organization of production under the easing of relations. Key words: Productive restructuring, relaxation of labor relations, outsourcing. 1 Estudante. Universidade Federal do Maranhão. luciannacristinna@yahoo.com.br
2 1 INTRODUÇÃO O processo de reestruturação produtiva na perspectiva do enfrentamento da crise do capital da década de 1970 acarretou transformações nas políticas de gestão e organização do trabalho no espaço fabril. Para assegurar a reprodução das condições de lucratividade e competitividade, o empresariado industrial implementa novas práticas de gestão e organização da produção e do trabalho, que intensificam a exploração e alteram a base material da resistência operária e sindical. Nesta perspectiva os programas de qualidade total e a terceirização são as práticas de gestão inspiradas no modelo japonês que mais se difundem na atualidade, no país. Tais processos fundamentam-se na necessidade do capital de garantir as taxas médias de lucro e de se desonerar dos custos com a reprodução da força de trabalho. A terceirização envolve um conjunto de protocolos que impulsiona uma nova subsunção do trabalho ao capital. De acordo com Druck (1999:11), esse processo tem levado a uma quádrupla precarização: do trabalho, da saúde dos trabalhadores, do emprego e das ações coletivas. O Maranhão se insere na divisão internacional do trabalho a partir da década de 1950, desempenhando a função de fornecedor de produtos agrícolas para suprir as necessidades de dinamizar o processo de acumulação do capital urbano-industrial que ocorreu no sudeste (Silva, 2001:106). Mesmo com os discursos de modernização dos sucessivos governadores maranhenses, o estado se manteve como fornecedor de produtos agrícolas para os outros estados da federação e como corredor de exportação para o mercado internacional (idem). No final da década de 1970, o complexo mínero-siderúrgico é desenvolvido no âmbito do Programa Grande Carajás/PGC. O PGC é viabilizado pelo governo federal e pelos governos locais do Pará e do Maranhão, com vistas à expansão e desenvolvimento do capital em uma região periférica, na periferia do sistema mundializado da acumulação capitalista, apresentando-se como uma estratégia de desenvolvimento para a Amazônia Oriental. A Estrada de Ferro Carajás (EFC), inaugurada em 1985 com 892 km de extensão, ligando uma das mais importantes províncias mineral do mundo em Carajás (PA) ao porto (São Luis/MA), é parte do Projeto Ferro Carajás (PFC) da Vale (antiga CVRD), projeto que originou o Programa Grande Carajás (PGC), extinto em O PFC, que objetivava uma
3 integração mina-ferrovia-porto, transformou irreversivelmente a história a geografia da região sul-sudeste do Pará e sudoeste do Maranhão. O desenvolvimento industrial baseado no setor mínero-siderúrgico e a expansão do agronegócio, enquanto atividades articuladas desestruturam as bases tradicionais da economia maranhense e a inserem na rota da mundialização da acumulação do capital em crise, desde o final dos anos A terceirização é reafirmada no bojo desse processo como uma importante estratégia de exploração do trabalho, a qual se apresenta como uma das principais modalidades da inserção do trabalhador na produção industrial nesse contexto. 2 INDICAÇÕES HISTÓRICO-TEÓRICAS DA QUESTÃO A reestruturação produtiva, uma das respostas do sistema capitalista à sua crise dos anos 1970, provocou profundas transformações no mundo do trabalho. Além de desencadear um crescente processo de modernização tecnológica baseada na automação e na microeletrônica, também acompanha a introdução e a consolidação do novo paradigma de gestão da produção e da força-de-trabalho, que redefine os locais de trabalho e distingue os trabalhadores qualificados (aqueles que são valorizados pelo seu saber técnico- individual) dos trabalhadores sem qualificação (os subcontratados com baixos níveis salariais). O processo de reestruturação produtiva e difundido no país a partir dos anos 1990 com base na experiência do toyotismo tem sua centralidade na adoção crescente de duas práticas de gestão: os programas de qualidade total e a terceirização dos serviços. Como resultado das práticas de organização flexível do trabalho oriundas da reestruturação produtiva, tem-se a redução crescente do emprego industrial e a expansão significativa do setor de serviços, características que trazem conseqüências extremamente desastrosas para os trabalhadores e para o sindicalismo, na medida em que contribuem para uma dispersão cada vez maior dos trabalhadores e para o enfraquecimento sindical, reduzem drasticamente os coletivos de trabalhadores e reestruturam as antigas ou criam novas práticas sindicais e de ação coletiva (Druck, 1999). De acordo com Druck (1999:98-99): A intensificação e a generalização dessas práticas de gestão do trabalho desencadearam um rápido processo de terceirização, levando a uma proliferação acentuada de micros e pequenas empresas que mantêm, na sua maioria, contratos precários de
4 trabalho, contribuindo para reforçar o chamado mercado informal de trabalho. Para Druck (1999), a terceirização é entendida como uma rede de subcontratação que está intimamente ligada ao modelo japonês de organização do trabalho e da produção. O sistema toyotista impõe novas relações entre as empresas através das redes de fornecedores e de subcontratação, criando a partir dessas relações uma gestão mais horizontal e integralizada com as pequenas e médias empresas que produzem para as grandes corporações (Druck, 1999). Nesse caso, redes de subcontratação ou as empresas terceirizadas compõem atualmente a estrutura das relações entre as empresas, visto que, já faz parte da estrutura produtiva da economia capitalista contemporânea uma relação de complementaridade entre as grandes empresas e as micro, pequenas e médias empresas (Druck, 1999:123). Estas várias empresas fornecem os mais variados tipos de insumos, intermediários, produtos, embalagens e até mão-de-obra temporária. No caso das empreiteiras de mão-de-obra temporária, estabelece-se uma relação de fidelidade e subordinação hierárquica às grandes empresas. Já no caso de fornecedoras de componentes, eventualmente ocorrem programas de cooperação tecnológica promovidos pela empresa-cliente. Ainda no caso das subcontratadas, estas são de menor porte e de menos recursos, além de apresentarem um padrão de salários e de benefícios inferiores ao da empresa-mãe (Druck, 1999: ). Aspecto que é muito importante salientar e que é comum no entendimento de diversos autores, é que a terceirização associada à introdução e ao desenvolvimento tecnológico, tem levado a uma diminuição significativa do núcleo estável da mão-de-obra (Druck, 1999:125). Essa situação cria uma relação de discriminação muito grande entre os próprios trabalhadores. Nesse sentido, os trabalhadores que se identificam com a empresa, da qual são empregados efetivos, se distanciam e são distanciados, se diferenciam e são diferenciados dos trabalhadores subcontratados. Essa divisão fragmenta os trabalhadores e impossibilita a convivência social e a identidade de classe entre os operários desestruturando os coletivos de trabalho e excluindo da maioria deles, dos privilégios que o emprego estável oferece (Druck, 1999:126). A subcontratação aparece não só no plano econômico como forma de redução de custos, mas também como estratégia política, à medida que institui um amplo segmento de trabalhadores de segunda categoria, que se distanciam dos de primeira categoria. Desta forma, contribui, decisivamente, para dissolver qualquer identidade de classe (...) (Druck, 1999:97).
5 Nas empresas subcontratadas, verifica-se ainda o aumento significativo de trabalhadoras no mercado de trabalho, já que a contratação feminina é uma das formas de sustentação e parte integrante e indispensável da estrutura do modele toyotista. Outra característica inerente ao processo de subcontratação é a alta rotatividade no emprego: como são trabalhadores temporários ou por tempo parcial, se movimentam muito de uma empresa para outra, motivados por melhores níveis salariais. No modelo toyotista de regulação do trabalho, também é evidente a relação de subordinação hierárquica das terceiras em ralação à empresa contratante. Essa relação de dominação enfraquece a capacidade de reação dos trabalhadores assalariados das terceiras (Druck, 1999:125). Além disso, devem se adequar e atender a flexibilidade de pedidos das grandes empresas e a exigência de prazos muito curtos de entrega (Druck, 1999:124). Para isso, recorrem a horas extras de trabalho, realizam trabalhos nos fins de semana e também são obrigados a reduzir os custos. Todas essas exigências implicam a intensificação do trabalho, a redução do salário e o decréscimo na qualidade dos produtos. Faz-se necessário explicar que a reestruturação produtiva trouxe consigo a estratégia da terceirização dos serviços considerados atividades-meio da produção industrial. Assim, algumas atividades deixam de ser compreendidas como integradas ao sistema produtivo, ou seja, como parte da atividade total da empresa, e passam a compor as chamadas atividades-meio, acessórias; ainda que sejam importantes, não figuram como atividades-fim, e por isso não ocupam o mesmo patamar das atividades desenvolvidas dentro da planta da empresa, com prejuízos para os trabalhadores contratados para essas atividades. Nesse sentido, a externalização dos chamados serviços de apoio ou periféricos é oriunda também da intensificação da divisão social do trabalho e da especialização, na medida em que as empresas do setor industrial justificam a subcontratação pelo discurso de que devem centralizar seus esforços na geração de seu produto principal, isto é, nas atividades-fim, transferindo todas as outras atividades-meio para terceiros. A focalização na atividade-fim busca a redução dos custos de qualquer forma, a transferência dos gastos com salários e encargos trabalhistas, o deslocamento das responsabilidades com a gestão e a redução dos coletivos de trabalho para diluir a capacidade de ação dos trabalhadores e de seus sindicatos (Druck, 1999). 3 EXPRESSÕES DO TRABALHO TERCEIRIZADO NO CORREDOR DE EXPORTAÇÕES CARAJÁS (PA) PORTO PONTA DA MADEIRA (MA)
6 O Governo Federal, no início da década de 1970, propôs transformar uma área enorme que abrigava florestas tropicais e sem tradição industrial, no gigantesco complexo minero-siderúrgico, a Estrada de Ferro Carajás (EFC), que seria o elemento central na estratégia de desenvolvimento industrial para a Amazônia Oriental brasileira. O documento que fundamentou a criação do Programa Grande Carajás (PGC), isto é, o Plano Diretor da Estrada de Ferro Carajás, datado de 1989, indicava que a industrialização na região estava vinculada à implantação de um parque industrial progressivamente diversificado e integrado, principalmente em termos regionais, mas também, em termos nacionais, o que seria propiciado a partir de uma alavancagem inicial propiciada pela base de exportação (BRASIL, 1989). A integração industrial referida no documento seria possível por meio da implementação de três grandes complexos industriais motrizes: o complexo mínerometalúrgico, o complexo florestal e o complexo da construção civil. Contudo, a base desse complexo industrial seriam as atividades siderúrgicas e, nesse sentido, o Plano Diretor da EFC ressalta que a industrialização no corredor seria marcada por três ciclos: o primeiro seria caracterizado pela implantação de indústrias produtoras de insumos básicos, como o aço, e o segundo e o terceiro, respectivamente, pela verticalização e pela integração dos parques industriais (BRASIL, 1989). É notável pela percepção na atualidade que o PGC provou ser um completo fracasso em sua proposta de desenvolvimento sustentável ma região amazônica, reduzindo-se à exploração mineral (também in natura) para a exportação. Assim, todas as expectativas relacionadas ao sucesso do PGC foram frustradas, na medida em que a atual realidade no corredor da estrada não reflete as previsões iniciais esboçadas pelo programa, visto que o perfil de distribuição de renda e de propriedade na região não foi alterado, e sendo que em contrapartida a degradação ambiental, as pressões sobre a floresta e as tensões sociais aumentaram. No âmbito das relações de trabalho, o que seria apenas uma fase de transição, na qual a mão-de-obra contratada pelas empreiteiras seria maior que a mão-de-obra efetiva e regular, passou a ser regra geral: a opção pela terceirização como forma de diminuir os encargos trabalhistas foi uma decisão que traz sérios reflexos para a classe trabalhadora e para a sociedade, num contexto onde parte do processo de flexibilização e reestruturação produtiva significa recorrer à terceirização de atividades que até então eram desenvolvidas no interior da planta da empresa, aumentando, dessa forma, a rede de empresas
7 subcontratadas, especializadas na fabricação de alguns componentes e na prestação de determinados serviços. No lócus empírico dessa pesquisa, foram constatadas 125 empresas contratadas diretamente pela Vale, com 7012 funcionários. Essas empresas prestam serviços, dentre tantos outros, de informática, programação de computadores, serviços de caldeiraria e usinagem, consultoria, dedetização, climatização, limpeza industrial, vigilância e segurança armada, acompanhamento técnico de obras na ampliação da capacidade operacional dos pátios da EFC, montagem eletromecânica, obras civis de pequeno e médio porte, transporte de cargas e de empregados efetivos e contratados, manutenção da infra-estrutura, da mecânica, dos vagões e dos veículos industriais etc. Foram identificadas também 38 empresas contratantes (contratadas pela Vale) e 127 subcontratadas, com mais de 2335 funcionários. Dentre os serviços prestados, destacamse: fornecimento de transportes e alimentação, portaria, recepção, mecânica, lanchonete, serviço de engenharia nas áreas administrativas, elétrica e mecânica, telefonia, botânica e meio ambiente, serviços de desenvolvimentos de projetos executivos, manutenção de vagões e de oficinas, fornecimento de sistemas de carregamento de navios, terraplenagem, a desmontagem, modificação, adaptação e montagem de equipamentos etc 2. 4 CONCLUSÕES A terceirização como prática no contexto da especialização flexível está relacionada com as mudanças nas plantas industriais e com a maneira de produzir bens e serviços, mediante a descentralização da produção em pequenas e médias empresas, (também chamadas de terceiras) no processo de produção associadas a novos padrões na gestão empresarial, os quais têm assegurado o crescimento da produtividade e da lucratividade por meio da mudança na estrutura dos postos de trabalho e da transferência para terceiros de atividades antes desenvolvidas pelas empresas. No corredor de exportações Carajás - Porto Ponta da Madeira, os dados sobre a terceirização apontam a criação de novos empregos, mas, reafirmam esta prática como uma importante estratégia de exploração do trabalho, a qual se apresenta como uma das principais modalidades da inserção do trabalhador na produção industrial nesse contexto. As 2 Dados de 2008 fornecidos pelo Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias dos Estados do Maranhão, Pará e Tocantins.
8 conseqüências da terceirização manifestam-se principalmente, mediante: a drástica redução da contratação direta da força de trabalho, a desregulamentação das relações trabalhistas, a alta rotatividade no emprego, o rebaixamento dos salários, o prolongamento da jornada de trabalho, uma maior extração de mais-valia do trabalho vivo. REFERÊNCIAS CASTRO, Edna Maria Ramos de. Flexibilização e gestão do trabalho em indústrias de alumínio na Amazônia. In: COELHO, Maria Célia Nunes; COTA, Raymundo Garcia (orgs.). Dez Anos da Estrada de Ferro Carajás. Belém/PA: UFPA/NAEA. Editora Gráfica Supercores, COELHO, Maria Célia Nunes. A CVRD e o processo de (re)estruturação e mudança na área de Carajás (Pará). In: COELHO, Maria Célia Nunes; COTA, Raymundo Garcia (orgs.). Dez Anos da Estrada de Ferro Carajás. Belém/PA: UFPA/NAEA. Editora Gráfica Supercores, COTA, Raymundo Garcia. O setor madeireiro na região de Carajás. In: COELHO, Maria Célia Nunes; COTA, Raymundo Garcia (orgs.). Dez Anos da Estrada de Ferro Carajás. Belém/PA: UFPA/NAEA. Editora Gráfica Supercores, DRUCK, Maria da Graça. Terceirização: (des)fordizando a fábrica. Um estudo do complexo petroquímico. Salvador/BA: Editora da Universidade Federal da Bahia (EDUFBA) / Boitempo Editorial MARCELINO, Paula Regina Pereira. Honda: terceirização e precarização a outra face do toyotismo. In: ANTUNES, Ricardo (org). Riqueza e miséria do trabalho no Brasil. São Paulo: Boitempo, p MONTEIRO, Maurílio de Abreu. A siderurgia e a produção de carvão vegetal no corredor da Estrada de Ferro Carajás. In: COELHO, Maria Célia Nunes; COTA, Raymundo Garcia (orgs.). Dez Anos da Estrada de Ferro Carajás. Belém/PA: UFPA/NAEA. Editora Gráfica Supercores, SILVA, Ilse Gomes. Participação popular e reforma do Estado brasileiro nos anos 1990: contradições e impasses. Tese de Doutorado. São Paulo: PUC-SP, 2001.
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