Superior Tribunal de Justiça

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1 RECURSO ESPECIAL Nº SP (2004/ ) RELATORA : MINISTRA DENISE ARRUDA RECORRENTE : PLAYSERVICE PARTICIPAÇÕES E EMPREENDIMENTOS LTDA ADVOGADO : ILIDIO BENITES DE OLIVEIRA ALVES E OUTRO(S) RECORRIDO : FAZENDA NACIONAL PROCURADOR : HUMBERTO GOUVEIA E OUTRO(S) EMENTA PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. IPI INCIDENTE SOBRE PRODUTO IMPORTADO. LEGITIMIDADE. 1. Cumpre esclarecer que eventual discussão acerca da incompatibilidade entre a legislação infraconstitucional reguladora do IPI (Lei 4.502/64, CTN e Regulamento do IPI) e a Constituição Federal não pode ser dirimida em sede de recurso especial, porquanto requer a apreciação acerca da existência ou não de contrariedade a dispositivo constitucional, o que constitui matéria afeta à competência do Supremo Tribunal Federal. 2. Por outro lado, nos termos do art. 46, I, do CTN, "o imposto, de competência da União, sobre produtos industrializados tem como fato gerador o seu desembaraço aduaneiro, quando de procedência estrangeira." Conforme a clássica lição de Aliomar Baleeiro, o IPI "recai sobre o produto, sem atenção de seu destino provável ou ao processo econômico do qual proveio a mercadoria", sendo que o "CTN escolheu, para fato gerador, três hipóteses diversas, ou momentos característicos da entrada da coisa no circuito econômico de sua utilização" ("Direito Tributário Brasileiro", 9ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1977, pág. 184). 3. Ressalte-se que, não obstante a doutrina admita que na hipótese ocorra o bis in idem (que não se confunde com a bitributação em sentido estrito), a incidência tanto do imposto de importação quando do IPI, nas hipóteses de produtos importados, não viola a "discriminação constitucional de competências tributárias, pois tanto um como o outro imposto pertencem à competência de uma só pessoa política" (MACHADO, Hugo de Brito. "Comentários ao Código Tributário Nacional", Volume I, São Paulo: Atlas, 2003, pág. 475). 4. Precedentes citados: REsp /RS, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ de ; AgRg no REsp /SP, 2ª Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de ; REsp /RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJ de Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça: A Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente do recurso especial e, nessa parte, negou-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros José Delgado, Luiz Fux e Teori Albino Zavascki votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão. Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 02/08/2007 Página 1 de 8

2 Brasília (DF), 26 de junho de 2007(Data do Julgamento). MINISTRA DENISE ARRUDA Relatora Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 02/08/2007 Página 2 de 8

3 RECURSO ESPECIAL Nº SP (2004/ ) RELATORA : MINISTRA DENISE ARRUDA RECORRENTE : PLAYSERVICE PARTICIPAÇÕES E EMPREENDIMENTOS LTDA ADVOGADO : ILIDIO BENITES DE OLIVEIRA ALVES E OUTRO(S) RECORRIDO : FAZENDA NACIONAL PROCURADOR : HUMBERTO GOUVEIA E OUTRO(S) RELATÓRIO A EXMA. SRA. MINISTRA DENISE ARRUDA (Relatora): Trata-se de recurso especial interposto em face de acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região cuja ementa é a seguinte: "CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. IPI INCIDENTE SOBRE PRODUTO IMPORTADO. POSSIBILIDADE. ART. 153, INCISO 1 E IV, DA CONSTITUIÇÃO. AUSÊNCIA DE SINALIZAÇÃO DE ELEMENTOS A SEREM SEGUIDOS PELO LEGISLADOR INFRACONSTITUCIONAL. LEIS 4.502/64 E 5.172/66 EM CONSONÂNCIA COM A CARTA MAIOR. INOCORRÊNCIA DE NEGATIVA DE VIGÊNCIA DOS ARTS. 108, 1, 110, 113, 1 E 114 DO CTN. 1. A Constituição Federal quando outorgou competência à União para instituir imposto sobre a importação e produtos industrializados não teceu, nem perfunctoriamente, alguma minúcia em particular que devesse ser observada pelo legislador infraconstitucional. II. As Leis n s 4.502/64 e 5.172/66 estão em consonância com a Carta Maior. III. O fato gerador do IPI na importação é o desembaraço aduaneiro do produto industrializado de origem estrangeira, a teor do que reza o Art. 46 do Código Tributário Nacional. IV. Inocorrência de negativa de vigência aos Arts. 108, 110, 113, IV e 114, todos do CTN. V. A aplicação do Art. 108, 1 e do Art. 110, ambos do CTN só seria justificável na falta de norma expressa, pelo que não há que se falar na falta de descrição do fato gerador, estabelecido no Art. 114, do CTN ou dificuldade de detectar sua ocorrência, Art. 113, 1 do mesmo Diploma Legal." (fl. 109) No recurso especial, interposto com base na alínea a do permissivo constitucional, a recorrente aponta ofensa aos arts. 4º, 46, 108, 110 e 114 do CTN, bem como à Lei 4.502/64, alegando, em síntese, que: "O v. acórdão recorrido entendeu que o núcleo da permissão constitucional, autorizativa da instituição e cobrança do IPI, é o simples fato da mercadoria ser industrializada e ter sido posta no circuito econômico. Entretanto, a legislação aplicável ao IPI não confirma aquela interpretação, porque, em primeiro lugar, a Constituição Federal autoriza a incidência do IPI sobre produtos industrializados em território nacional, uma vez que não pode disciplinar essa matéria em relação aos produtos confeccionados no exterior. Em segundo lugar, porque a Lei Federal nº Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 02/08/2007 Página 3 de 8

4 4.502/64 e o artigo 46 do Código Tributário Nacional não estabeleceram qualquer equiparação entre produto industrializado e produto importado, tampouco fixaram que a importação de mercadorias está analogicamente igualizada à operação de industrialização, decorrendo disso que não existe norma válida que justifique plenamente a incidência do IPI sobre mera operação de importação." (fl. 134) Argumenta, ainda, que os arts. 2º e 3º do Regulamento do IPI (Decreto /82) estabelecem a aplicação do "conceito de produto industrializado como parâmetro de identificação da legitimidade de sua incidência", não havendo menção, entre as "hipóteses que caracterizam o produto industrializado", do desembaraço aduaneiro ou da operação de importação de mercadorias, "como seu elemento identificador, desautorizando a incidência tributária combatida" (fls. 134/135). Em suas contra-razões, a Fazenda Nacional sustenta, em suma, que os preceitos legais supostamente violados não foram apreciados pela Corte de origem. Inadmitido o recurso, subiu por força de agravo de instrumento. É o relatório. Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 02/08/2007 Página 4 de 8

5 RECURSO ESPECIAL Nº SP (2004/ ) VOTO A EXMA. SRA. MINISTRA DENISE ARRUDA (Relatora): A pretensão recursal não merece amparo. De início, cumpre esclarecer que eventual discussão acerca da incompatibilidade entre a legislação infraconstitucional reguladora do IPI (Lei 4.502/64, CTN e Regulamento do IPI) e a Constituição Federal não pode ser dirimida em sede de recurso especial, porquanto requer a apreciação acerca da existência ou não de contrariedade a dispositivo constitucional, o que constitui matéria afeta à competência do Supremo Tribunal Federal. Por outro lado, nos termos do art. 46, I, do CTN, "o imposto, de competência da União, sobre produtos industrializados tem como fato gerador o seu desembaraço aduaneiro, quando de procedência estrangeira". Como bem leciona Hugo de Brito Machado: "Se em face da Lei nº 4.502/64 o tributo incidia sobre o consumo de produto industrializado, e a industrialização podia ocorrer tanto no país como no estrangeiro, o fato de o imposto ter passado a incidir sobre o próprio produto industrializado não tem a força de tornar necessária a ocorrência da industrialização no território nacional. O âmbito constitucional do imposto em tela é o produto industrializado. Basta a existência deste. Não importa onde tenha ocorrido a industrialização. Assim, o Código Tributário Nacional podia validamente delimitar, como o delimitou em seu art. 46, esse âmbito constitucional." (Comentários ao Código Tributário Nacional, Volume I, São Paulo: Atlas, 2003, pág. 475) Ele admite que na hipótese ocorre uma "bitributação". No entanto, esclarece que "bitributação", em sentido estrito (fazendo referência ao entendimento de Eduardo Marcial Ferreira Jardim), "caracteriza-se pela tributação de um mesmo fato jurídico tributário por duas pessoas constitucionais", o que, no direito brasileiro, "é tributação inconstitucional" (ob. cit., pág. 475). E prossegue o doutrinador referido, assinalando que a bitributação: "Não se confunde com a dupla ou múltipla tributação de um mesmo fato pela mesma pessoa jurídica de Direito Público, que tem sido designada pela expressão bis in idem. (...) O bis in idem é lícito, salvo, é claro, quando seja ultrapassada alguma limitação constitucional. Já a bitributação é sempre inconstitucional, porque viola a partilha constitucional das competências tributárias, além de poder eventualmente violar também outras limitações constitucionais." (ob. cit., pág. 475) Aliomar Baleeiro, tratando do fato gerador do IPI, ensina: "Como o imposto recai sobre o produto, sem atenção de seu destino provável ou ao processo econômico do qual proveio a mercadoria, o CTN escolheu, para Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 02/08/2007 Página 5 de 8

6 fato gerador, três hipóteses diversas, ou momentos característicos da entrada da coisa no circuito econômico de sua utilização. Esta, entretanto, é indiferente do ponto de vista fiscal, muito embora na quase totalidade dos casos a mercadoria se destine a comércio." (Direito Tributário Brasileiro, 9ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1977, pág. 184) Em relação às mercadorias importadas, destaca o saudoso doutrinador: "O fato gerador é o desembaraço aduaneiro destas, nos portos ou lugares alfandegados. (...) O imposto pode ser pago concomitantemente com os direitos alfandegários ou mesmo depois, mas antes de a mercadoria sair das docas ou da estação aduaneira. (...) O CTN serviu-se então do fato econômico da introdução da mercadoria estrangeira no circuito nacional e escolheu o momento cômodo de sua tributação alfandegária, simultaneamente com o pagamento desta, ou logo depois, desde que antes da liberação do volume nas portas de armazéns das docas ou estação alfandegada." (ob. cit., pág. 185) O Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o RE /SP (2ª Turma, Rel. Min. Cordeiro Guerra, DJ de ), ainda na vigência da Constituição anterior, apreciando a legitimidade de incidência do IPI no caso de produto importado à alíquota zero, entendeu que: "Inexistindo imposto a pagar, nem por isso deixa de ocorrer o desembaraço aduaneiro, e o IPI é exigível com base no preço normal do produto - art. 20, I, do CTN." Esse entendimento foi baseado na Súmula 576/STF, que tem a seguinte redação: "É lícita a cobrança do imposto de circulação de mercadorias sobre produtos importados sob o regime da alíquota 'zero'." Conclui-se, portanto, que até nas hipóteses de produtos sujeitos à alíquota zero na importação (que não é a hipótese dos autos, ressalte-se), é devida a incidência do IPI, porquanto seu fato gerador, no caso de mercadorias importadas, é o desembaraço aduaneiro (art. 46, I, do CTN). Corroborando esse entendimento, destacam-se: "TRIBUTÁRIO. IPI. FATO GERADOR. 1. O IPI incide sobre produtos industrializados. Estes, pela lei, são os que sejam submetidos a qualquer tipo de operação que lhes modifique a natureza ou a finalidade, aperfeiçoando-os para o consumo. 2. O equipamento usado que passa por recondicionamento deve ser considerado, para fins de tributação do IPI, como melhorado para fins de consumo, quando originário do estrangeiro. 3. O desembaraço aduaneiro de mercadoria importada é fato gerador de IPI, quando for o produto industrializado de procedência estrangeira. 4. Recurso improvido." (REsp /RS, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ de ) "AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL - TRIBUTÁRIO - IPI - MERCADORIA DE PROCEDÊNCIA ESTRANGEIRA - FATO GERADOR - DESEMBARAÇO ADUANEIRO. É firme a orientação desta Corte no sentido de que o fato gerador do Imposto sobre Produtos Industrializados incidente sobre mercadorias importadas é o desembaraço aduaneiro do bem. Dessa forma, não comporta solução diversa a pretensão recursal, na linha dos precedentes invocados na decisão agravada (REsp /RS, DJ , Rel. Min. José Delgado e REsp /SP, DJ , Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 02/08/2007 Página 6 de 8

7 Rel. Min. Francisco Peçanha Martins) e de diversos outros julgados do Superior Tribunal de Justiça. Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no REsp /SP, 2ª Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de ) "TRIBUTÁRIO CONSTITUCIONAL IPI DESEMBARAÇO ADUANEIRO INCIDÊNCIA POSSIBILIDADE SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO EFETIVAÇÃO DO LANÇAMENTO POSSIBILIDADE. 1. O principal argumento do acórdão recorrido, para afastar a incidência do IPI nas importações realizadas pela recorrida, por ocasião do desembaraço aduaneiro, reside na equivocada percepção de bitributação que ocorreria na incidência concomitante do IPI com o Imposto de Importação. Ora, a questão em foco foi objeto das lentes de Hugo de Brito Machado, que diagnosticou que não se cuida de bitributação, mas, na verdade, de bis in idem, o que não configura inconstitucionalidade alguma, pois as exações, leiam-se IPI e imposto de importação, pertencem à competência tributária da mesma pessoa política, a União. 2. No tocante ao segundo alicerce do recurso fazendário, vale dizer, a possibilidade de o Fisco efetuar o lançamento na pendência de decisão judicial que determinou a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, urge ventilar que a jurisprudência deste Tribunal ruma no sentido perlustrado pela FAZENDA NACIONAL. Precedentes: AgRg no REsp /AL, Rel. Min. DENISE ARRUDA e REsp /DF, Rel. Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS. Recurso especial provido." (REsp /RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJ de ) Diante do exposto, deve ser parcialmente conhecido o recurso especial e, nessa parte, desprovido. É o voto. Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 02/08/2007 Página 7 de 8

8 CERTIDÃO DE JULGAMENTO PRIMEIRA TURMA Número Registro: 2004/ REsp / SP Números Origem: PAUTA: 26/06/2007 JULGADO: 26/06/2007 Relatora Exma. Sra. Ministra DENISE ARRUDA Presidente da Sessão Exmo. Sr. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI Subprocurador-Geral da República Exmo. Sr. Dr. JOÃO FRANCISCO SOBRINHO Secretária Bela. MARIA DO SOCORRO MELO AUTUAÇÃO RECORRENTE : PLAYSERVICE PARTICIPAÇÕES E EMPREENDIMENTOS LTDA ADVOGADO : ILIDIO BENITES DE OLIVEIRA ALVES E OUTRO(S) RECORRIDO : FAZENDA NACIONAL PROCURADOR : HUMBERTO GOUVEIA E OUTRO(S) ASSUNTO: Tributário - IPI - Imposto Sobre Produtos Industrializados - Isenção CERTIDÃO Certifico que a egrégia PRIMEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente do recurso especial e, nessa parte, negou-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros José Delgado, Luiz Fux e Teori Albino Zavascki votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão. Brasília, 26 de junho de 2007 MARIA DO SOCORRO MELO Secretária Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 02/08/2007 Página 8 de 8