IDENTIFICAÇÃO, RASTREAMENTO E PREVISÃO DE TEMPESTADES SEVERAS PARTE II: EVENTO DE VENTOS INTENSOS. Ana Maria Gomes 1* e Gerhard Held 1
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- Estela Barros Malheiro
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1 IDENTIFICAÇÃO, RASTREAMENTO E PREVISÃO DE TEMPESTADES SEVERAS PARTE II: EVENTO DE VENTOS INTENSOS Ana Maria Gomes 1* e Gerhard Held 1 RESUMO: Esse estudo utiliza-se do software TITAN como ferramenta operacional para a identificação, rastreamento e previsão do deslocamento das tempestades ocorrendo no raio de alcance de 240 km de cada um dos radares do IPMet. A implementação e o uso do TITAN será determinante para o monitoramento e alerta de tempestades potencialmente severas uma vez que até então só estavam disponíveis em ambos os radares de Bauru e Presidente Prudente, tarefas de alerta combinando informações de Topo dos Ecos e VIL (conteúdo de água líquida na vertical). Para o presente estudo foi selecionado um evento que recentemente produziu severos danos em superfície, em razão do intenso vendaval observado. As primeiras análises mostraram resultados encorajadores e que certamente trarão melhoria significativa nas emissões de alerta realizadas pelo Setor Operacional do IPMet. ABSTRACT: This study examines the application of TITAN software as the operational tool to identify, track and nowcast the severity of storms in the central area of the State of São Paulo. The implementation and use of TITAN will improve the current warning task implemented at IPMet, which only makes use of the automatically calculated VIL and Echo Tops, derived for storms within the 240 km range of Bauru and Presidente Prudente radars. For this study, a day was selected when severe wind damage at the surface was confirmed. The capability of TITAN to identify and track such an event has been demonstrated. These first results are very encouraging and will certainly lead to an improvement in the warnings to be issued by the Operational Sector of IPMet. Palavras-Chave: Nowcasting, Tempestades Severas, TITAN INTRODUÇÃO Um dos objetivos que tem motivado parte das pesquisas realizadas até o presente no IPMet é o de se melhorar os alertas a tempestades, severas ou não-severas, minimizando os riscos potenciais à vida e à propriedade, através do uso de produtos gerados pelos radares Doppler. As condições existentes para a realização do nowcasting eram bastante limitadas até recentemente, pois não existia nenhum procedimento objetivo e automático para a detecção de tempestades severas e sua conseqüente evolução e deslocamento. Através de uma cooperação com o National Center for Atmospheric Research (NCAR), foi disponibilizado um sistema especialmente desenvolvido para o tratamento e as aplicações das informações de radares meteorológicos, denominado TITAN (Thunderstorm Identification, Tracking, Analysis and Nowcasting; Dixon and Wiener, 1993). A implementação deste software foi realizada com a assistência do NCAR na adequação das várias rotinas computacionais necessárias para o acesso ao formato dos dados gerados pelos radares Doppler (Kokitsu, 2005), sob a responsabilidade do IPMet. No presente estudo o sistema TITAN é utilizado para a identificação, rastreamento e previsão do evento severo ocorrido em 29 de março de O potencial das novas ferramentas disponíveis com o TITAN é apresentado bem como sua aplicação direta para o ambiente operacional demonstrado. 1 Instituto de Pesquisas Meteorológicas, Caixa Postal 281, Bauru São Paulo * ana@ipmet.unesp.br / gerhard@ipmet.unesp.br
2 METODOLOGIA E DADOS Os dados utilizados para a análise foram informações de refletividades geradas pelo radar Doppler localizado em Bauru (Lat: S, Lon: W, 624 m amsl), cujas características principais são detalhadas em Gomes e Held (2006). O sistema TITAN, em sua versão ARCHIVE, foi utilizado para obtenção das propriedades características das células de precipitação e formam a base para o presente estudo. A célula de precipitação do TITAN foi definida pelo limiar de 35 dbz para a refletividade e de 50 km 3 para o volume, observados em pelo menos duas varreduras (15 minutos). Para todas as tempestades que excederam ao critério adotado, foram determinados parâmetros tais como a altura dos ecos, volume, área, intensidade máxima e média, VIL (conteúdo de água líquida integrada na vertical), velocidade e direção de deslocamento bem como a previsão desse deslocamento para tempos de 15 a 60 minutos. Para a caracterização do potencial de severidade deste evento foram analisados os índices SSS (Storm-Structure-Severity) proposto por Visser (2001). O modelo meso-eta, versão nãohidrostática com resolução em grade de 10x10 km, centrado em Bauru, com previsões a cada 3 horas foi utilizado para uma análise enfocando os índices de instabilidade termodinâmica (Held et al., 2006b). DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Evento de Vendaval: 29 de março de 2006 A instabilidade presente que causou as fortes chuvas acompanhadas por ventos intensos foi provocada pelo deslocamento de um sistema frontal sobre a região sudeste atingindo o Estado de São Paulo nas primeiras horas do dia 29 de março de O parâmetro CAPE (convective available potential energy), extraído da análise do modelo para as 9:00 HL (12UT) para Campinas (Figura 1), mostra um valor de 2138 J.kg -1, já evidenciando a grande instabilidade convectiva presente e necessária ao desenvolvimento de convecção profunda, que pode resultar em tempo severo. Esta linha de precipitação associada à frente deslocou com velocidade em torno de 50 km.hr -1, que é um valor próximo ao dobro do valor para a velocidade média observada para o deslocamento de linhas de precipitação associadas à passagem de sistemas frontais pelo Estado de São Paulo. Células convectivas embutidas no centro da extensa área estratiforme, conforme visto na Figura 1, às 09:14 HL, se deslocaram com velocidade média em torno de 70 km.h -1, velocidade típica observada em tempestades severas no Estado de São Paulo (Held et al., 2006a). Uma análise das imagens de radar para as próximas duas horas mostra, que o sistema passou a ter um deslocamento mais lento das áreas de chuva pela região central do Estado. No entanto a partir das 11:14 HL (Figura 2), se observa uma intensificação no ramo sul da região dos máximos de refletividade, e a formação de um vórtice de mesoescala bem definido na região estratiforme da linha de precipitação, identificado pela curvatura observada no campo de refletividade na região à esquerda destes máximos de refletividade. De acordo com Klimowski et al. (2003), a identificação das máximas refletividades organizadas em arco (bow echo) pode ser um indicador de ventos severos (mas não um previsor!), portanto é importante documentar tais assinaturas em seu estágio inicial de evolução para que se observe e identifique sinais que possam levar à produção de eventos
3 Figura 1: Refletividade composta do radar de Bauru, raio de alcance de 240 km, para o evento 29/03/2006, às 09:14 HL e radiossondagem obtida com a análise do modelo meso-eta, para as 09:00 HL. Os símbolos + e estrelas se referem às localidades de: PPR= Presidente Prudente, BRU= Bauru, O= Ourinhos, M= Marília, B= Botucatu, P= Piracicaba, SB= Santa Bárbara d Oeste e C= Campinas. de ventos destrutivos. Ainda na Figura 2, é mostrado no perfil vertical para Campinas, dado pelo modelo com previsão para as 12:00 HL, onde os valores de CAPE são previstos em torno de 3874 J.kg -1, um indicativo do potencial para ocorrência de tempo severo na região. Análise idêntica foi realizada para os perfis verticais de Piracicaba e Santa Bárbara d Oeste, cujos valores previstos foram de 3500 e 3740 J.kg -1, respectivamente, indicando o alto potencial de energia disponível para a ocorrência de tempestades severas na área. Estas áreas de precipitação intensa, associadas aos fortes ventos continuaram se deslocando para leste através da área central do Estado, e atingiram as regiões de Piracicaba e Santa Bárbara d Oeste, onde foi registrado extensos danos em superfície, causados pelo vendaval, entre 11:30 e 12:00 HL. A evolução temporal, média de 15 minutos, da velocidade e direção do vento, na estação meteorológica da ESALQ em Piracicaba (Figura 3), mostrou através da distribuição média a ocorrência de um pico na velocidade de 10.2 m.s -1, registrado entre 11:45-12:00 HL. No entanto, o máximo absoluto registrado para este dia, às 11:35 HL, para a velocidade do vento foi de 30.2 m.s -1, próximo ao horário em que o vendaval produzido pela intensa linha de precipitação atingiu as regiões de Piracicaba e Santa Bárbara d Oeste. Associado com os ventos intensos observa-se uma queda significativa na temperatura, de 25.2 ο C às 10:45 HL para 18.5 ο C às 12:00 HL. Analisando uma seqüência temporal das imagens do radar de Bauru tem-se que a passagem da linha de instabilidade pelas regiões de Piracicaba e Santa Bárbara d Oeste coincide com o período em que o sistema precipitante atingiu sua máxima intensificação, com refletividades máximas entre 48.8 e 56.2 dbz, no período de 11:30 a 11:53 HL, e topos dos ecos (10 dbz) excedendo a 16 km acima do n.m.m. (nível médio do mar), corroborando as observações de ventos máximos registrados na estação da ESALQ.
4 Figura 2: Esquerda: Rastreio das áreas de refletividades excedendo a 35 dbz para o evento de 29/03/2006, às 11:14 HL (elipse azul), e previsão deslocamento da tempestade (elipse vermelho). Os símbolos indicam as cidades conforme definidas na Figura 1. Direita: Sondagem do modelo Meso-Eta previsto para 12:00 HL em Campinas. Figura 3: Variação temporal do vento médio (15 minutos) velocidade (m.s -1 ) e direção (graus), na estação meteorológica da ESALQ, em Piracicaba (Fonte: Assinaturas de Tempestade Severa: Índice SSS Dentre os vários parâmetros disponíveis para identificação do potencial de severidade presente em tempestades observadas com o radar adotou-se o índice SSS (Storm-Structure- Severity), desenvolvido por Visser (2001) para tempestades na África do Sul e implementado no TITAN. Considerando que o ciclo de vida das células convectivas vai desde o estágio de desenvolvimento, passando pela maturidade e por fim pelo estágio de dissipação, num curto período, o método para obtenção de SSS identifica estes estágios de desenvolvimento das células numa dada tempestade. Como a intensidade das correntes ascendentes (updrafts) em células
5 convectivas pode determinar a distribuição vertical de refletividade observada pelo radar, isto é aplicado à distribuição vertical do conteúdo de água líquida, que forma a base da hipótese do método SSS. Portanto, no método SSS a máxima refletividade dentro de uma coluna vertical define a classificação de severidade para uma célula convectiva. De acordo com Visser (2001), são utilizados três índices para definir a severidade de uma tempestade, em termos de refletividade observada: Fraco (30-44 dbz), Moderado (45-50 dbz) e Severo (>55 dbz), sendo estes valores em relação às estruturas de Base, Volume e Topo, produzindo 9 categorias de classificação. Portanto, a classificação 1 (Base Fraca) de uma célula convectiva indica uma coluna vertical com refletividades máximas do radar entre 30 e 44 dbz e uma distribuição do conteúdo de água líquida concentrada abaixo de 6.5 km n.m.m. De modo análogo, uma classificação 8 (Volume Severo) indica uma coluna vertical com uma refletividade máxima de 55 dbz ou mais, com o conteúdo de água líquida igualmente distribuído através da coluna e regiões onde as células possuem uma estrutura de Base são regiões onde predominam intensos downdrafts. (a) Figura 4: Distribuição espacial do índice SSS para o dia 29 de março de 2006, às 11:37 HL (Piracicaba) e 11:59 HL (Santa Bárbara d Oeste). Os símbolos indicam as cidades conforme definidas na Figura 1. (b) Os campos de SSS para os horários das 11:37 e 11:59 HL são mostrados nas Figuras 4a e 4b. A Figura 4a representa o campo de SSS próximo ao horário do máximo da velocidade do vento registrado na estação da ESALQ, em Piracicaba e a Figura 4b, o campo de SSS no horário em que o vendaval atingiu Santa Bárbara d Oeste. Pelas figuras observa-se que a região das refletividades excedendo 35 dbz é a região onde se concentram as células convectivas com classificação de Base e Volume Moderados, onde os valores do índice SSS estão entre 4 e 5, representando células convectivas com o conteúdo de água líquida concentrado abaixo de 6.5 km ao n.m.m. e igualmente distribuído pela coluna vertical, e máximas refletividades entre 45 e 54 dbz, onde predominam intensos downdrafts.
6 CONCLUSÕES Índices que resumem as características que possam ser usadas como indicadores de severidade numa tempestade foram analisados e os resultados mostraram a potencialidade para o seu uso num ambiente operacional. Os critérios para definir a classificação estrutural de SSS foram aplicados para tempestades que ocorrem no Plateau Sul-africano, e portanto é importante a continuidade do trabalho de verificação para as tempestades observadas nas áreas de alcance dos radares do IPMet, incorporando outros eventos severos e não-severos à base de dados e a definição de limiares adequados para os padrões a serem adotados para o monitoramento e alerta de eventos severos na área central do Estado de São Paulo. O modelo meso-eta mostrou um bom desempenho na previsão dos índices de instabilidade termodinâmica, em particular o índice CAPE, e sua incorporação às práticas operacionais é importante uma vez que o mesmo irá adicionar benefícios às capacidades já existentes complementando o monitoramento com a previsão de eventos severos com uma antecedência de até 48 horas. AGRADECIMENTOS H.A.G França pela assistência na recuperação dos dados e J. M. Kokitsu pela implementação das rotinas do TITAN para análise. Aos Drs J. Wilson e M. Dixon, do NCAR, por abrir caminhos para que o TITAN se tornasse realidade nos computadores do IPMet/UNESP. À FAPESP pelo suporte financeiro no Projeto 05/ e Projeto SIHESP 01/ REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DIXON, M. and WIENER, G., 1993: TITAN: Thunderstorm Identification, Tracking, Analysis and Nowcasting - A radar-based methodology. J. Atmos. Ocean. Technol., 10, GOMES, A.M. e HELD, G., 2006: Identificação, rastreamento e previsão de tempestades severas. Parte I: Evento de granizo. Anais do XVI Congresso Brasileiro de Meteorologia, SBMET, Florianópolis, SC. HELD, G., GOMES, A.M., NACCARATO, K.P., PINTO Jr., O., NASCIMENTO, E., 2006a: The Structure of Three Tornado-Generating Storms Based on Doppler Radar and Lightning Observations in the State of São Paulo, Brazil. Proceedings, 8 th International Conference on Southern Hemisphere Meteorology and Oceanography, Foz do Iguaçu, April 2006, HELD, G., GOMES, J.L. and NASCIMENTO, E., 2006b: Forecasting a Severe Weather Occurrence in the State of São Paulo, Brazil, on 24 May 2005: The Indaiatuba Tornado. Proceedings, 8 th International Conference on Southern Hemisphere Meteorology and Oceanography, Foz do Iguaçu, April 2006, KOKITSU, J.M., 2005: Transferência de Tecnologias para Aplicação direta ao Monitoramento e Nowcasting Usando os Radares Meteorológicos Doppler do IPMet-UNESP. Relatório Técnico (Bolsa de Participação em Curso ou Estagio Técnico no Exterior, Período: 01/09/2005 a 01/10/2005), FAPESP Processo No. 05/ , 55pp. KLIMOWSKI, B.A., BUNKERS, M.J., HJELMFELT, M.R. e COVERT, J.N., 2003: Severe convective windstorms over the Northern High Plains of the United States. Weather and Forecasting, 18, VISSER, P.J.M., 2001: The Storm-Structure-Severity method for the identification of convective storm characteristics with conventional weather radar. Meteorological Applications, 8, 1-10.
ABSTRACT: The implementation of the TITAN system in December 2005, has provided
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