APELAÇÃO CÍVEL COM REVISÃO n /9-00, da Comarca de. SÃO PAULO-FAZ PUBLICA, em que é apelante ACAFRESP ASSOCIAÇÃO

Transcrição

1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO '"TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SAO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA ACÓRDÃO REGISTRADO(A) SOB N- * * Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL COM REVISÃO n /9-00, da Comarca de SÃO PAULO-FAZ PUBLICA, em que é apelante ACAFRESP ASSOCIAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS NO CONCURSO DE AGENTES FISCAIS DE RENDAS DO ESTADO DE SÃO PAULO sendo apelado SECRETÁRIO DE ESTADO DOS NEGÓCIOS DA FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO: ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferir a seguinte dec isão: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores GAMA PELLEGRINI (Presidente), MARREY UINT. São Paulo, 18 de dezembro de ANTÔNIO C. MALHEIROS Relator

2 Apelação Cível - Mandado de Segurança - Ilegitimidade passiva do Impetrado - Inocorrência - Secretário de Estado dos Negócios da Fazenda, que é legitimado para responder a Mandado de Segurança, em casos como o presente - Recurso provido. Apelação Cível - Mandado de segurança - Reserva de vagas, em concurso público, para candidatos aprovados em concurso anterior - Lei que não viola nenhum princípio constitucional - ADIN, voltada contra a Lei, não conhecida pelo Supremo Tribunal Federal - decurso provido. Voto Apelação CíveL n /9 Apte(s): ACAFRESP - ASSOCIAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS NO CONCURSO DE AGENTES FISCAIS DE RENDAS DO ESTADO DE SÃO PAULO Apdo(s): SECRETÁRIO DE ESTADO DOS NEGÓCIOS DA FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO

3 2 Trata-se de apelação (fls. 246/297), em face de sentença, cujo relatório se adota, proferida em mandado de segurança (fls. 241/244), que julgou extinto o feito, sem análise do mérito, reconhecendo a ilegitimidade passiva do impetrado. A ação mandamental visa nomeação, posse e, consequentemente, imediato exercício de candidatos aprovados em concurso na função de agente fiscal de Rendas do Estado, que foram preteridos por outros, participantes de concursos posteriores. 0 recurso foi recebido somente no efeito devolutivo. Foi, também, respondido (fls. 308/312). É o relatório. Em 2 6 de outubro de 1985, foi publicado edital, regulamentando o Concurso Público n 1/85, para ingresso na carreira de agente fiscal de rendas do Estado de São Paulo. As inscrições foram reabertas em 4 de janeiro de O edital previu prazo de dois anos de validade do concurso, a contar de sua homologação. Este foi homologado em 16 de agosto de e foi prorrogado em duas oportunidades, uma em 2 3 de julho de e outra em 16 de agosto de 1989, ambas pelo periodo de um ano, Apelação Civel n /9 - SÃO PAULO - v

4 completando-se o prazo máximo, de validade para concurso público (art. 37, II, da CF) em agosto de Apesar de já estar ultrapassado o limite máximo de validade do certame, sob a justificativa de que centenas de técnicos administrativos tributários da Secretaria da Fazenda haviam sido transformados, por sentenças judiciais, em agentes fiscais de renda, ocupando, os lugares previstos para os concursados, o Deputado Estadual Junji Abe apresentou emenda ao Projeto de Lei Complementar n 567/88, para criar reserva de vagas, bem como outras duas, em prol de aproveitamento compulsório de aprovados, que tivessem, ou viessem a ter, ações judiciais em curso. Isto se deu em 16 de agosto de 1990, data do encerramento do prazo máximo de validade do concurso. Essa alteração acabou se concretizando graças à sanção do então Governador do Estado, Luiz Antônio Fleury Filho, passado o referido dispositivo a ter a seguinte redação: "Nas vagas existentes em 16 de agosto de 1990 e seguintes, decorrentes de demissões, exonerações, aposentadorias ou falecimentos, ocupadas ou nâo por técnicos administrativos tributários, transformados em agentes fiscais de renda, em virtude de sentenças Apelação Civel n /9 - SÃO PAULO - v

5 4 judiciais, serão obrigatoriamente aproveitados, nos cargos padrão inicial das classes de agente fiscal de rendas, os candidatos aprovados no último concurso público, para tal fim realizado, que se encontrem amparados por ações judiciais em curso". Fundamentando-se nesse dispositivo legal, a Impetrante pleiteia o aproveitamento de seus integrantes. 0 Impetrado arguiu preliminares de decadência do direito, ilegitimidade passiva, ilegitimidade ativa, ausência de requisitos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo e inexistência de direito liquido e certo. Rejeitam-se as preliminares. Inexistiu a decadência. A Lei previu o aproveitamento obrigatório dos candidatos, mas não previu a data para referido aproveitamento. A partir do momento em que outros candidatos começaram a ser nomeados, sem a observância da ordem ditada pela lei mencionada, começou a existir o direito dos candidatos, representados pela Impetrante, de se valerem da via mandamental. E, à medida que novas nomeações ocorriam, qualquer prazo existente se Apelação Cível n /9 - SÃO PAULO - v

6 renovava. Ademais, mandado de segurança é direito e garantia fundamental (art. 5 o, LXIX e LXX, da Constituição Federal). Assim, como bem estabelece o texto constitucional, as normas definidoras desses direitos têm aplicação imediata, ou seja, independem de lei para sua aplicação concreta. 0 art. 18, da Lei n 1.533/51, tem o escopo de limitar o exercício do direito constitucional, determinando prazo (120 dias), seguindo a tradição do Código de Processo Civil de 1939 (art. 331) e, antes dele, da Lei n 191/36 (art. 3 o ). Referida herança legislativa não foi recepcionada pela Constituição Federal de 198 8, vez que esta não limitou têmporalmente a possibilidade de exercício do mandado de segurança. Pelo contrário, embora tenha fixado uns tantos pressupostos e requisitos para sua impetração, quedou-se silente quanto a seu exercício vincular-se ou poder vincular-se a um prazo certo. Mais do que isso, deixou claro que a aplicabilidade das normas, que definem direitos e garantias, têm aplicação imediata, têm eficácia plena, e, portanto, independem de regulamentação infraconstitucional. decadência. Assim, não prevalece a arguição de A ilegitimidade passiva, também não prospera. A alegação em sentido contrário vem na i Apelação Cível n /9 - SÃO PAULO - v s. - A

7 6 indicação de que o ato é de "competência privativa" do Sr. Governador do Estado. A legitimidade passiva, em sede de mandado de segurança, deve ser interpretada em sentido amplo, a fim de que se viabilize o direito constitucional do impetrante. Explica-se: o impetrante já tendo seu direito liquido e certo violado pelo Poder Público, por questões meramente burocráticas de competência interna, não pode correr o risco de ver aquele direito que é seu, certo, reconhecido, simplesmente ser jogado fora. Não se pode coadunar com tal conduta. Se o impetrado entendesse não ser legitimado, deveria ter indicado a autoridade correta, chamando-a a litisconsórcio. Porém, é mais fácil deixar fluir o prazo, e, com mera tecnicidade, aviltar ainda mais o direito do cidadão, que já está sendo violado. Ademais, o Poder Executivo é uno e, assim, deve responder à questão, não podendo suas divisões administrativas afetar o direito do lesado. Por fim, em sede de contra-razões (f ls. 308/312), vê-se, claramente, que se trata de ilustres procuradores estatais defendendo o "direito" do governador, o que, desde já, afasta qualquer ofensa ao contraditório e à ampla defesa. Rejeita-se, pois, também, a arguição de ilegitimidade passiva. Apelação Civel n /9 - SÃC PAULO - v

8 7 TERCEIRA CÂMARA DL DIREITO PÚBLICO Quanto à arguição de ilegitimidade ativa, de acordo com o art, 5 o, LXX, da Constituição Federal: "O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido político com representação no Congresso Nacional; b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados". 0 Supremo Tribunal Federal (Recurso Extraordinário n , Rei, Min, Carlos Velloso) já teve a oportunidade de definir como deve ser entendida a expressão "em defesa dos interesses de seus membros ou associados". Lá se definiu que: "O que deve ser salientado é que o objeto do mandado de segurança coletivo poderá ser um direito dos associados, independentemente de guardar vínculo com os fins próprios da entidade. O que se exige é que esse direito esteja compreendido na titularidade dos associados e que exista ela em razão das Apelação Cível n /9 - SÃO PAULO - v

9 8 atividades exercidas pelos associados, não se exigindo, todavia, que esse direi to ou interesse seja particular, próprio da classe, ou exclusivo da classe ou categoria representada pela entidade sindical ou de classe". A questão é, portanto, clara não necessitando de maiores dilações. Rejeita-se, assim, igualmente, a preliminar de ilegitimidade ativa. Por fim, com relação aos requisitos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo e inexistência de direito liquido e certo, temos que este é aquele direito provado de plano, cujas delimitações são claras e precisas. Ora, este é o caso dos autos, bastando uma simples vista d'olhos no processado. A Lei é especifica na reserva dos cargos. Os associados da impetrante são concursados e se enquadram na previsão legal. 0 processo foi bem instruído com a documentação acostada. Nada mais há que se falar. Apelação Cível n /9 - SÃO PAULO - v

10 9 prejudicial. recurso. Rejeita-se, desta forma, também esta Quanto ao mérito, merece prosperar o A Lei, objeto da presente ação mandamental foi examinada pelo Supremo Tribunal Federal, na ADIN n , em 07 de fevereiro de 1996: ADI-QO 128 6/SP - SÃO PAULO QUESTÃO DE ORDEM NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO Julgamento: 07/02/1996 Órgão Julgador: Tribunal Pleno Publicação DJ PP EMENT VOL PP Parte(s) REQTE. : GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO REQDO. : GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO REQDO. : ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 15, 7 o, DA LEI COMPLEMENTAR N 567/88, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI COMPLEMENTAR N 790/94, DO ESTADO DE SÃO PAULO. Disposi tivo Apelação Cível n /9 - SÃO PAULO - v \

11 10 Insuscetível de ser examinado sem definição da situação jurídica dos candidatos concursados nele mencionados, por meio da análise do edi tal de convocação do respectivo certame e das decisões judiciais referidas em seu texto, inclusive no que concerne à coisa julgada. O Supremo Tribunal Federal tem orientação assentada no sentido da impossibilidade de controle abstrato da constitucionalidade de lei, guando, para o deslinde da quês tão, se mos tra indispensável o exame do conteúdo de outras normas jurídicas infraconstitucionais ou de matéria de fato (ADI n 842). Ação de que não se conhece. Decisão O Tribunal determinou a republicação da proclamação da decisão da ADIn n SP, constante da Ata da 2 a Sessão Ordinária, realizada em e publicada no Diário da Justiça de , para que conste a seguinte decião: "Por maioria de votos, o Tribunal não conheceu da ação, vencidos os Ministros Carlos Velloso e Presidente (Min. Sepúlveda Pertence)". Plenário, (grifos nossos) Vê-se, assim, que a questão já foi levada à apreciação do Supremo Tribunal Federal, que não se pronunciou, de nenhuma maneira, quanto ao mérito da constitucionalidade da Lei. \ Apelação Ci_vel n /9 - SÃO PAULO - v

12 II Assim, sem manifestação expressa da Suprema Corte a respeito, tal Lei encontra-se no ordenamento nuridico bandeirante, merecendo ser analisada profundamente. Levado isto em consideração, por vezes volta-se a discutir o chamado "mérito administrativo", os critérios de conveniência e oportunidade, que levam o administrador, em ato discricionário, a seguir esta ou aquela "opção", sem que o judiciai 10 a possa aferir, a não ser quanto à legalidade da "opção" adotada. 0 caso torna-se mais delicado ainda quando os assuntos são relacionados à politica, e concursos públicos, com especial relevo a partir dos anos 80 e 90, até porque se passa à Égide do Estado Democrático de Direito, onde as prerrogativas da Administração Pública devem seguir as diretrizes constitucionais, regradas de direitos e garantias fundamentais. In casuf à luz da Constituição Federal (art. 37, caput - legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência)e do art. 15, 7 o, da Lei Complementar n 567/88, com a redação dada pela Lei Complementar n 790/94, que - repitase - é vigente, o descumprimento efetuado pelo Poder j Apelação Cnvel n /9 - SÃO PAULO - v \\

13 12 Público, com a não nomeação dos associados da autora causa indignação. Ademais, a súmula 15, do Supremo Tribunal Federal é clara: "Dentro do prazo de validade do concurso, o cândida, to aprovado tem o direi to à nomeação, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação.'* Desse modo, de acordo com a Lei sancionada pelo Governador do Estado, existe preferência dos associados da impetrante de nomeação, o que foi flagrantemente desrespeitado pelo Poder Público. Assim, apesar da mencionada disposição legal fazer alusão, apenas aos concursados, com ação judicial em andamento, deve isto ser interpretado com amplitude, sob pena de se ferir ditames constitucionais, como a moralidade administrativa e a igualdade de condições. Dessa forma, os associados da impetrante devem ser nomeados, empossados e assumir Apelação Cível n /9 - SÃO PAULO - v. 13.4^3

14 13 as funções correspondentes nos cargos que disputaram e foram aprovados, em, no máximo, 30 dias, sob pena de multa diár La, nos termos do art. 4 61, 4 o, do CPC, de R$ 1.000,00 (hum mil reais), relativos a cada um dos associados. Em face do exposto rejeitam-se as preliminares e dá-se provimento ao recurso. ANTÔNIO CARLOS MALHEIROS Relator Apelação Cível n /9 - SÃO PAULO - v