PODER JUDICIÁRIO FEDERAL JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 1ª REGIÃO

Transcrição

1 Acórdão 1a Turma AGRAVO DE PETIÇÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PENHORA SOBRE DIREITOS DO DEVEDOR FIDUCIANTE. POSSIBILIDADE. É possível a penhora recair sobre os direitos já incorporados ao patrimônio do devedor fiduciante, a teor do disposto no artigo 655 do CPC. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Agravo de Petição, onde figuram como agravante BANCO SOFISA S/A (terceiro) e, como agravado, I - CARLOS ALBERTO SIOVANNES e II - TV ÔMEGA LTDA (executada). Trata-se de agravo de petição interposto pelo terceiro às fls.82/93, objetivando a reforma da decisão de fls.79/80, proferida pelo Juízo da MM.26ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, da lavra do ilustre Juiz Marcelo Segal, que julgou improcedente seus embargos de terceiro. Sustenta, em síntese, que merece reforma a r.sentença que manteve a ilegal contrição sobre bens de sua propriedade. Destaca que a penhora recaiu sobre tais bens (veículos) alienados fiduciariamente, e não somente sobre os direitos e ações relativos às parcelas quitadas. Alega que os mencionados direitos só serão adquiridos após a extinção da dívida, quando o bem alienado fiduciariamente passará de fato a pertencer ao devedor fiduciante. Assevera que a empresa executada possui o domínio precário e resolúvel do bem, não sendo a proprietária, nos termos do artigo 66 da Lei nº4.728/65 e 1361 do Código Civil

2 Argumenta que mantida a decisão, serão levados à hasta pública bens que legalmente pertencem a terceiro estranho à lide. Afirma que os valores atingidos em hasta são inferiores ao real valor do bem, destinando-se tal medida à expropriação de bens do devedor, e que, no caso, o procedimento seria aplicado sobre quem não participa da lide principal. Pondera que não há falar em preferência do crédito trabalhista, com o fim de alcançar o bem envolvido, pois os bens alienados fiduciariamente não integram a esfera patrimonial do devedor, pois transferidos ao credor fiduciário, não podendo sofrer constrição judicial, sob pena de alcançar patrimônio de terceiro, em afronta ao inciso XXII, do artigo 5º, da CRFB/88. Menciona que a Seção Especializada do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região editou a Orientação Jurisprudencial nº34, de , no sentido da impossibilidade da penhora de bem gravado em alienação fiduciária, exceto a que se refere a direitos de créditos decorrentes. Requer, por fim, a desconstituição da penhora realizada sobre os bens de sua propriedade, determinando-se a liberação da restrição judicial, uma vez que provada a propriedade legítima, e condenando os agravados no pagamento das custas processuais, honorários advocatícios e demais cominações legais. Contraminuta pelo exequente às fls. 102/108, arguindo a preliminar de extinção do processo sem julgamento do mérito por ausência de pressuposto objetivo para conhecimento dos embargos de terceiro, com fulcro nos artigos 1046 e 267, inciso IV, ambos do CPC, e, no mérito, protestando pela manutenção da decisão. Contraminuta pelo empresa executada às fls.109/119, sem preliminares e, no mérito, protestando pela reforma da r.sentença e procedência dos embargos de terceiro. É o relatório. V O T O DA PRELIMINAR DE EXTINÇÃO DO PROCESSO POR AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO OBJETIVO ARGUIDA PELO EXEQUENTE Argui o exequente a preliminar de extinção do processo petição por

3 ausência de comprovação documental sumária de constrição dos créditos em mãos de terceiros, uma vez que não juntou aos autos qualquer documento probatório de que os totais ou parciais valores monetários estão apreendidos judicialmente, em relação à ora agravante. Razão não lhe assiste, uma vez que não há controvérsia a respeito do ato de constrição referente aos veículos mencionados na petição inicial, mencionada na sentença de fls.79/80, nem quanto ao fato de tais bens serem alienados fiduciariamente. Note-se que tais matérias sequer foram questionadas nas razões de contraminuta apresentada pelo exequente. A questão controvertida nos autos cinge-se à possibilidade da penhora sobre os automóveis alienados fiduciariamente ou sobre os direitos já incorporados ao patrimônio do devedor fiduciante, de modo que constam todos os elementos referentes e necessários ao ajuizamento da ação (CPC, artigos 282 e 283). Rejeito. DO CONHECIMENTO Conheço do agravo de petição por preenchidos os pressupostos objetivos de admissibilidade. MÉRITO Investe a agravante contra a r.sentença de fls.79/80 ao fundamento de que os bens constritos são alienados fiduciariamente. A r.sentença julgou improcedente seus embargos de terceiro ao seguinte fundamento: É voz corrente que o bem alienado fiduciariamente não pode ser penhorado, mas os direitos e ações do bem alienado fiduciariamente sim, considerando os direitos já incorporados ao patrimônio do devedor relativamente às parcelas quitadas. Com efeito, ao alienado fiduciariamente não é cabível a penhora, considerando que o domínio da Instituição credora seja de natureza resolúvel. Todavia, é possível a constrição judicial sobre direitos do devedor financiado,

4 possuidor direto e depositário do automóvel. Assim, de certo que os automóveis em questão não integram, ainda, o patrimônio do devedor, no entanto, nada impede que os seus direitos sobre tais bens sejam apanhados em garantia. Vale dizer, o exequente trabalhista sub-rogar-se nos direitos do devedor sobre o veículo alienado, resguardando-se a preferência da Instituição Fiduciária, até o limite de seu haver, como bem observou a r.sentença a fls.80. A respeito, vale mencionar a lição de Cândido Rangel Dinamarco, no sentido de que a "alienação fiduciária outorga ao credor a condição de dono, somente com a ressalva de que seu direito de propriedade é resolúvel pelo pagamento que regularmente vier a ser feito pelo alienante fiduciante (o devedor); a alienação fiduciária pode incidir sobre bens móveis ou imóveis (Leis 4.728, de 14/7/65, e 9.514, de 20/11/97). Daí a lógica conseqüente de que, enquanto persistir na situação de alienado fiduciariamente, o bem não responde pelas obrigações do alienante fiduciante (devedor ao banco), que não mais é seu proprietário, não podendo, pois, ser penhorado por essas obrigações; o bem alienado fiduciariamente não pode ser objeto de penhora nas ações ajuizadas contra o devedor fiduciário (Súmula nº 242 TFR); mas estão no patrimônio ativo desse devedor seus eventuais direitos perante o adquirente fiduciário (instituição financeira), os quais comportam penhora (CPC, art. 655, inc. X). A jurisprudência é pacífica quanto a esses pontos" (in Instituições de Direito Processual Civil, Execução Forçada, v. 4, São Paulo, ed. Malheiros, 2004, p. 334/335). Nesse sentido, os seguintes arestos: VEÍCULO ALIENADO FIDUCIARIAMENTE. PENHORA. É cabível a penhora sobre os direitos e ações da adquirente fiduciante, por aplicação do art. 655, XI, do CPC e do art. 11, VIII, da Lei nº 6.830/80. (AP ª Turma do TRT da 4ª Região; Relatora: CLEUSA REGINA HALFEN; Data: 05/11/2009) PENHORA. BEM OBJETO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. Pela alienação fiduciária, o devedor fiduciário é detentor da posse

5 direta do bem, na qualidade de depositário, e o credor fiduciário do domínio resolúvel e da posse indireta. Por isso, a penhora judicial não pode recair sobre bem que já é objeto de alienação fiduciária, quando se trata da execução de débito do devedor fiduciário, porque ele não integra o patrimônio deste, mas sim do credor fiduciário. É possível, contudo, fazer incidir a constrição judicial sobre os direitos do devedor decorrentes do contrato de alienação fiduciária, com fundamento no disposto no art.655, XI, do CPC. (AP: a Turma do TRT da 12ª Região; Relatora: Des. Mari Eleda Migliorini - Publicado no TRTSC/DOE em 03/12/2009) Assim, encontrando-se os automóveis alienados fiduciariamente é admissível a constrição judicial dos direitos do devedor, motivo porque mantém-se íntegra a r.sentença. Nego provimento. A C O R D A M os Desembargadores que compõem a Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar de extinção do processo sem julgamento do mérito, conhecer do agravo de petição e, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos da fundamentação. Rio de Janeiro, 14 de Setembro de Desembargadora Federal do Trabalho Mery Bucker Caminha Relatora cat/lmv