Componentes produtivos em cabaça comestível

Transcrição

1 Componentes produtivos em cabaça comestível Arlete Marchi T Melo 1, Joaquim Adelino de Azevedo Filho 2 ; Silvia Moreira R Vega 3 1 IAC-APTA, Centro de Horticultura, Caixa Postal 28, , Campinas, SP, arlete@iac.sp.gov.br; 1 Pólo Regional Leste Paulista-APTA, Caixa Postal 01, Monte Alegre do Sul, SP; joaquimadelino@apta.sp.gov.br; 3 Unidade de Pesquisa de Desenvolvimento de Ubatuba, Caixa Postal: 59, Ubatuba, SP, silviamoreira@apta.sp.gov.br. RESUMO Objetivou-se avaliar componentes produtivos de acessos de cabaça comestível da coleção do Instituto Agronômico (IAC). Dois experimentos foram conduzidos no Pólo Regional Leste Paulista, em Monte Alegre do Sul, SP, nos anos agrícolas de e O delineamento experimental foi em blocos casualizados, com cinco tratamentos, três repetições e quatro plantas por parcela. Foram avaliados produção de frutos por planta, número de frutos por planta, massa do fruto, comprimento do fruto e diâmetro do bojo do fruto. Observaram-se diferenças estatísticas somente na avaliação de Para produção e número de frutos, destacou-se o acesso IAC 58, que diferiu significativamente de IAC 42. Em relação à massa do fruto, a média de IAC 47 foi superior a de IAC 27. Para os demais componentes produtivos, não houve diferenças estatísticas entre os acessos, tanto em quanto em Palavras-chave: Lagenaria siceraria, cachi, hortaliça, melhoramento, diversidade. ABSTRACT Yield components of edible bottle gourd. The study aimed to evaluate yield components of edible bottle gourd accessions from the Instituto Agronômico (IAC) collection. Two experiments were conducted at Pólo Regional Leste Paulista, in Monte Alegre do Sul, SP, in and A randomized complete block design was used with five treatments, three replications, and four plants per plot. Fruit yield per plant, fruit number per plant, average fruit weight, fruit length, and fruit large diameter were evaluated. Statistical differences were observed only in the evaluation. Regarding fruit yield and fruit number per plant access IAC 58 stood out, overcoming IAC 42. With regard to average fruit weight, IAC 47 was heavier than IAC 27. For the other traits, there were no statistical differences between the accessions for both years of and Keywords: Lagenaria siceraria, wardy gourd, vegetable, breeding, fruit diversity. A cabaça, Lagenaria siceraria (Molina) Standl, é uma cucurbitácea nativa da África, cujas sementes, protegidas dentro do fruto, foram disseminadas pelo mundo por meio das correntes oceânicas, criando enorme variabilidade de forma e tamanho dos frutos, gerada durante os milhares de anos de seleção humana em locais distintos. É a única cultura conhecida que foi cultivada na época pré-colombiana, tanto no Velho como no Novo Mundo, mas sempre teve pouco uso como fonte de alimento. Em contrapartida, aproveitando as características do fruto, como alta resistência, dureza da casca e capacidade de flutuar, tem enorme importância para utilização como vasilhas para Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 4493

2 armazenamento, confecção de instrumentos musicais e artesanato. No Brasil, atualmente é encontrada de norte a sul, em geral com desenvolvimento subespontâneo, à exceção do estado do Rio Grande do Sul, que é grande produtor de cabaça para a fabricação de cuias para chimarrão. Modernamente, L. siceraria vem sendo utilizada como porta-enxerto para outras cucurbitáceas, especialmente de melancia (Whitaker & Davis, 1962; Levin & Lange, 1991; Robinson & Decker-Walters, 1997; Miguel, 1997; Erickson et al., 2005). Em termos de melhoramento genético, diversas cucurbitáceas existentes no Brasil podem ser consideradas subutilizadas do ponto de vista de consumo, mas possuem grande potencial de inclusão ou ampliação para serem utilizadas como alimento pelo homem, destacando-se a cabaça. Para uso artesanal e industrial, são empregadas as cabaças amargas, também conhecidas como calabaça, porongo e porunga que, em geral, apresentam casca lisa. O principal componente do amargor é um triterpenóide chamado de cucurbitacina, que é tóxica quando ingerida em grandes concentrações. Para consumo humano, utiliza-se a cabaça não amarga, também conhecida como cachi ou cabaça doce devido ao leve sabor adocicado da polpa; possui epiderme rugosa e ocorre somente na África e no Novo Mundo, não tendo cucurbitacina. O nome cachi é de uso regional e parece ter origem na comunidade japonesa, visto que a palavra caxi não existe na língua tupi-guarani. É possível que sua pouca importância como alimento seja devida ao aroma almiscarado dos frutos e principalmente das folhas. Na Índia, variedades selecionadas são tão saborosas e nutritivas quanto a abobrinha (Erickson et al., 2005; Stephens, 2012). Melo & Azevedo Filho (2003) utilizaram 16 descritores para avaliar características morfológicas e agronômicas em oito acessos de cabaça e cinco genótipos foram selecionados como próprios para consumo devido à ausência de amargor e outros dois mostraram adequados para ornamentação. Não existem dados conhecidos de produção e produtividade de cabaça comestível no Brasil. As poucas informações disponíveis tratam de cabaças para uso artesanal e industrial. Em estudo com dez populações de cabaça, Bisognin & Marchesan (2008), obtiveram frutos por hectare, com apenas 61,7% de aproveitamento industrial. Segundo os autores, esse baixo valor foi devido ao fato das populações analisadas serem de polinização aberta, gerando grande variabilidade de frutos, aumentando o descarte de Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 4494

3 frutos indesejáveis para a confecção de cuia. De acordo com matéria veiculada no Globo Rural (2011), em 2011, a safra de cabaças para produção de cuias para chimarrão no Rio Grande do Sul, chegou a 11,2 milhões de frutos aproveitáveis, um crescimento de 40% em relação a Segundo Seedman (2012), nos Estados Unidos, a produtividade média de cabaça varia de 4,9 a 12,3 mil frutos por hectare. Para massa do fruto, Melo & Azevedo Filho (2003) selecionaram três acessos que se destacaram com maior massa do fruto e ausência de amargor. O trabalho teve o objetivo de avaliar componentes produtivos de acessos de cabaça comestível. MATERIAL E MÉTODOS Os ensaios foram conduzidos em condição de campo no Pólo Regional do Leste Paulista, em Monte Alegre do Sul, SP, situado entre 22º41 S e 46º40 W, a 750 m de altitude, nos períodos de fevereiro a julho de 2011 e de outubro de 2011 a março de O delineamento experimental foi em blocos casualizados com três repetições e quatro plantas por parcela. Os tratamentos constituíram-se de cinco acessos de cabaça comestível da coleção biológica do Instituto Agronômico (IAC). A semeadura foi feita em bandejas de poliestireno de 128 células e o plantio foi feito no estádio de três folhas definitivas. Utilizou-se espaçamento de três metros entre plantas e entre linhas e irrigação pelo sistema de aspersão. A adubação de plantio foi feita com esterco de galinha e adubo químico e as de cobertura foram feitas com adubo químico, conforme a recomendação da análise do solo. O controle de vaquinha (Diabrotica speciosa) foi feito com inseticida Decis (R) até o início da produção de frutos. Avaliaram-se as seguintes características produtivas: produção de frutos por planta, número de frutos por planta, massa média do fruto, produção total de frutos, comprimento do fruto e diâmetro do bojo do fruto. Para o ensaio , foram realizadas 14 colheitas, no período de 13 de maio a 21 de julho de Para o ensaio , foram realizada 16 colheitas no período de 24 de janeiro a 30 de março de Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 4495

4 Os dados experimentais foram submetidos à análise de variância utilizando-se o programa Sisvar, versão 4.2. Para a comparação das médias, utilizaram-se os testes F e de Tukey ao nível de 5%. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados da avaliação das características agronômicas nos anos agrícolas de e encontram-se na Tabela 1. Observaram-se diferenças estatísticas somente na avaliação de Para produção e número de frutos, destacou-se o acesso IAC 58, que produziu 8,65 kg planta -1 e 18,58 frutos por planta, diferindo significativamente de IAC 42, com apenas 4,75 kg e 11,17 frutos por planta. Em contrapartida, a massa do fruto de IAC 47, com média de 0,58 g diferiu da massa de IAC 27, com 0,42 g. Para os demais componentes produtivos, não houve diferenças estatísticas entre os acessos, para ambos os experimentos. A figura 1 mostra plantas, flores e frutos dos acessos avaliados. Observou-se, também, que todos os acessos mostraram-se suscetíveis a vírus, provavelmente, da espécie Papaya ringspot virus, que é a virose mais comum em cucurbitáceas na região e no Brasil. Em algumas plantas, o vírus foi bastante agressivo, mas não impediu a obtenção de frutos e sua caracterização. Em relação a pragas, houve incidência expressiva de mosca-da-fruta (Anastrepha sp.). e de D. speciosa. A moscada-fruta provocou danos internos, causando a podridão do fruto; por sua vez, a vaquinha causou danos externos por meio da raspagem das flores, brotos e frutos desenvolvidos. AGRADECIMENTO Ao CNPq, pela concessão de auxílio à pesquisa, Processo /2008-1, e bolsa de produtividade DT ao primeiro autor. REFERÊNCIAS BISOGNIN DA; MARCHESAN E Avaliação de algumas populações de porongo Lagenaria siceraria (Mol.) Standl. cultivadas na região de Santa Maria - RS. Rev. Centro de Ciências Rurais 18(3-4): ERICKSON DL; SMITH BD; CLARKE AC; SANDWEISS DH; TUROSS N An Asian origin for a 10,000-year-old domesticated plant in the Américas. PNAS 102(51): Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 4496

5 GLOBO RURAL Colheita do porongo termina com ótimos resultados no RS. 19 de maio. Disponível em LEVIN HG; LANGE E Verduras de todo el mundo. Madrid: Editorial Everest S.A. 256p. MELO AMT; AZEVEDO FILHO JA Caracterização agronômica e morfológica de genótipos de cabaça. Horticultura Brasileira 21(2): 350. MIGUEL A. Injerto de hortalizas. Valencia: Generalitat Valenciana, p. ROBINSON RW; DECKER-WALTERS DS Cucurbits. Cambridge: University Press-CAB International. 226p. SEEDMAN A little gourd info. 19 de maio. Disponível em STEPHENS JM Gourd, bottle - Lagenaria siceraria (Mol.) Standl. Florida Cooperative Extension Service, University of Florida. Document HS de maio. Disponível em WHITAKER TW; DAVIS GN Cucurbits. New York: Interscience Publishers Inc. 250p. Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 4497

6 Tabela 1. Médias de valores de componentes produtivos de cinco acessos de cabaça, Lagenaria siceraria, avaliadas em campo, em (Means values of yield components of bottle gourd, Lagenaria siceraria, accessions in field evaluation). Monte Alegre do Sul, SP. Trat. Produção de frutos (kg planta -1 ) Número de frutos por planta Massa do fruto (g) Comprimento do fruto (cm) Diâmetro do bojo do fruto (cm) (1) IAC 58 8,65 a 5,19 a 18,58 a 10,58 a 0,45 ab 0,49 a 15,06 a 14,11 a 7,78 a 8,43 a IAC 99 7,85 a 7,23 a 17,67 ab 14,42 a 0,45 ab 0,49 a 14,82 a 13,70 a 8,11 a 8,60 a IAC 47 7,40 ab 5,97 a 12,92 ab 9,58 a 0,58 a 0,62 a 14,77 a 13,59 a 7,79 a 8,86 a IAC 27 6,29 ab 5,46 a 13,75 ab 10,25 a 0,42 b 0,53 a 14,45 a 14,12 a 7,93 a 8,76 a IAC 42 4,75 b 4,02 a 11,17 b 7,67 a 0,43 ab 0,51 a 15,09 a 14,59 a 7,85 a 8,62 a CV % 14,35 15,98 16,87 12,62 11,66 2,76 3,94 1,88 3,36 1,44 Dados referentes a 2012 foram transformados em x + 0, 5. Médias seguidas da mesma letra na coluna não diferem significativamente entre si pelo teste de Tukey a 5 %. Figura 1. Plantas, flores masculina e feminina e frutos de acessos de cabaça, Lagenaria siceraria (Plants, male e female flowers and fruits of bottle gourd accessions, Lagenaria siceraria). Monte Alegre do Sul, Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 4498