Pontos de descontinuidade no comportamento climático de séries de dados do estado do Paraná

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1 Pontos de descontinuidade no comportamento climático de séries de dados do estado do Paraná Rosandro B. Minuzzi¹; Paulo H. Caramori² ¹ Meteorologista, Prof. Adjunto UFSC/CCA/Dep. Eng. Rural. ² Engenheiro Agrônomo, Pesquisador, PhD, IAPAR. RESUMO: O Teste de Homogeneidade Normal Padrão foi utilizado para identificar pontos de descontinuidade em séries sazonal e anual da chuva, temperatura máxima e temperatura mínima no estado do Paraná. Os resultados indicam que no Litoral do Paraná, houve mudança no comportamento da quantidade de chuva durante a primavera, no início da década de 1990 e da temperatura máxima anual e no outono, predominantemente no início da década de 000. Palavras-chave: Teste de Homogeneidade Normal Padrão, chuva, temperatura do ar ABSTRACT: The Standard Normal Homogeneity Test was used to identify points of discontinuity in series of sazonal and annual of rainfall, and maximum and minimum temperature in the State of Paraná, Brazil. The results indicated that in the Paraná Coast, there were changes in the behavior of rainfall during the spring in the early 1990 s and of maximum temperature for annual scale and in the autumn, predominantly in the early 000 s. Keywords: Standard Normal Homogeneity Test, rainfall, air temperature 1. INTRODUÇÃO Na escala regional as mudanças no comportamento climático são muito divergentes e nem sempre acompanham a tendência global. Feng e Hu (004) citam o estudo de Jones e Moberg (003) que mostram que a temperatura média do ar aumentou 0,7 C no século XX e que, de acordo com Jones et al. (001), este aquecimento ocorreu em dois períodos. O primeiro de 1910 a 1945, e o outro, no final da década de 1970 até o final do século XX, com um aumento abrupto em relação a qualquer outra situação semelhante a observada no último milênio. Minuzzi et al. (009) utilizando dados meteorológicos de 1961 a 004 de dez estações localizadas em Minas Gerais, indicam que a tendência de aumento encontrada para a temperatura máxima e temperatura mínima nem sempre foi gradual, com mudanças no comportamento das séries, ocorridas em sua maioria na década de Considerando a importância no conhecimento do clima passado em escala regional, como na melhora da eficácia dos modelos de previsão à longo prazo, neste estudo objetiva-se identificar pontos de descontinuidade no comportamento climático da chuva, temperatura máxima e temperatura mínima do ar nas escalas sazonal e anual no estado do Paraná.. MATERIAL E MÉTODOS Foram utilizados dados diários de chuva até o ano de 006, de estações hidrológicas pertencentes à Agência Nacional de Águas (ANA), e de temperatura máxima e temperatura mínima do ar até o ano de 009, de estações meteorológicas pertencentes ao Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR), localizadas no estado do Paraná (Figura 1).

2 Figura 1. Localização geográfica das estações hidrológicas e meteorológicas utilizadas no estudo e localizadas no Paraná. Para a identificação do ponto de descontinuidade das séries temporais foi utilizado o Teste de Homogeneidade Normal Padrão (THNP). Proposto por Alexandersson (1986), o THNP testa um desvio na média ( Y ) e estabelece como hipótese nula que a variável mensal Y i (i é o ano de 1 a n) a ser testada é independente e identicamente distribuída. Assim, o teste T(k) compara a média dos primeiros k anos de registros mensais com os últimos n-k anos: T(k) kz1 (n k)z k 1,...,n (1) onde: k n 1 (Yi Y) 1 (Yi Y) z1 e z k i 1 s n k i k 1 s Se o ponto de mudança esta localizado no ano K, então T(k) atinge um máximo próximo ao ano k = K. O teste estatístico T 0 é definido como: T max T(k) 0 1 k n A hipótese nula será rejeitada se T 0 estiver acima de um determinado nível, que é dependente do tamanho da amostra. Os valores críticos a 5% para o teste estatístico de T 0 adotados neste estudo foram definidos por Alexandersson e Moberg (1997). 3. RESULTADOS E DISCUSSÕES As informações da Tabela 1 mostram que houve poucas ocorrências significativas de pontos de descontinuidade nas séries sazonais e anual de chuva. Na análise sazonal, esta significância estatística (5% ou 1%) foi observada apenas uma vez no verão e no inverno, e em duas situações na primavera, sendo estas, encontrada no Litoral do estado e no início da década de Apesar dos resultados predominantemente não significativos, chama a atenção o elevado número de pontos de descontinuidade concentrados entre 199 e 1996 durante o verão (8 casos) e a primavera (14 casos), e entre 198 e 1984 durante o outono (1 casos). Isto defronta com os resultados encontrados por Obregón e Nobre (003) que verificaram mudança no comportamento da precipitação no Brasil (exceto no Nordeste do Brasil) em meados da década de Destacam que este comportamento esteve relacionado principalmente, com a temperatura da superfície do oceano Pacífico. Desta forma, os resultados de pontos de descontinuidade não sugerem que as quantidades de chuva sazonal ou anual no Paraná estejam sendo influenciadas significativamente por algum ciclo climático perceptível ao período analisado (entre 50 e 60 anos em sua maioria). Neste contexto, os dados pluviométricos das estações hidrológicas de Curitiba e Rio Negro que abrange um período de 117 e 81 anos, tiveram cada um, três pontos de descontinuidade localizados em meados da década de 1990 e da década de 1970, respectivamente.

3 Tabela 1. Pontos de descontinuidade no comportamento pluviométrico sazonal e anual de séries de dados do estado do Paraná, com o ano inicial da análise. Pontos de descontinuidade chuva Município Início da análise Verão Outono Inverno Primavera Anual Adrianópolis Andira Antonina * 199 Cândido de Abreu * Curitiba Foz do Iguaçú Guarapuava Ivaiporã Morretes ** 1991* Pato Branco Ponta Grossa Porto Vitória Prudentópolis * * Quedas do Iguaçu Quintandinha Rio Negro * Santa Isabel do Ivaí Tibaji Londrina Palmas Mariluz ** Significativo a 1% * Significativo a 5% A Tabela indica que a temperatura máxima no Paraná teve mudanças no seu comportamento, predominantemente no início da década de 000, principalmente no outono e na escala anual, apesar dos poucos pontos estatisticamente significativos. As séries de Ponta Grossa, Umuarama, Morretes, Fernandes Pinheiro e Clevelândia são bons exemplos deste comportamento. A temperatura mínima também apresentou identificação de períodos com pontos de descontinuidade predominantes, sendo mais notável na primavera, onde o ponto de descontinuidade ficou centrado quase em sua totalidade no ano de 1989, mas em apenas dois municípios (Morretes e Ponta Grossa) de forma significativa. Mesmo número de significância para cada um dos dois períodos de pontos de descontinuidade que concentraram o maior número no outono, a saber, no final das décadas de 1960 e de A extensão da série temporal utilizada nos estudos é fundamental na identificação de ciclos através dos pontos de descontinuidade. O número de pontos identificados próximos do início da série temporal estudada, como foi o caso do outono no final da década de 1960 (no Norte do Paraná), pode ser uma premissa de que a temperatura mínima não esteja sendo influenciada significativamente por variabilidades climáticas de escalas temporais perceptíveis a um período inferior de 45 anos, apesar de dois pontos estatisticamente significativos. Na análise anual, houve cinco pontos de descontinuidade encontrados durante a década de 1990, mas somente um significativo e quatro pontos entre meados da década de 1970 e início da década de 1980, sendo três significativos. No contexto geral, estes resultados são coerentes aos obtidos por outros estudos, que apontam o final da década de 1970 ao final da década de 1990 como de mudanças no comportamento da temperatura do ar. Na análise mensal, em quatro municípios localizados em diferentes regiões climáticas de Santa Catarina, Minuzzi (009) identificou pontos de descontinuidade entre 1995 e 001 para a temperatura máxima, e entre 1988 e 1993 para a temperatura mínima. Chmielewski et al. (004) encontraram tendência de aumento linear na temperatura média anual de 0,36 C por década na Alemanha, e também chamam a atenção

4 para a forte mudança no comportamento desta variável a partir do final dos anos 1980, através do estudo de Houghton et al. (001). Obasi (003), citado por Alexandrov et al. (004) encontrou que 11 dos 13 anos mais quentes do século XX, ocorreram a partir da década de Desde 1976, a temperatura média global tem aumentado numa taxa três vezes maior do que em relação a tendência observada em todo o século. Molion (005) lembra que parte do aquecimento observado nas recentes décadas, pode ter tido grande contribuição devido a mudança das anomalias de negativas para positivas do oceano Pacífico em meados da década de 1970, sugerindo a influência de fenômenos de escala planetária como o El Niño Oscilação Sul (ENOS) e a Oscilação Decadal do Pacífico (Pacific Decadal Oscillation - PDO). O pesquisador ressalta que a freqüência de eventos El Niño de forte intensidade foi maior entre 1977 e 1998, o que pode ter contribuído, em parte, para o maior aquecimento nos períodos recentes, já que, o El Niño aquece a baixa troposfera, como o de 1997/98, que elevou em 0,8 C a temperatura média global. Porém, estas afirmações diferem em parte as obtidas por Collins et al. (009). Usando dados de temperatura sobre a América do Sul de 1948 a 007, os resultados sugerem que provavelmente a mudança climática encontrada sobre o continente não é predominantemente uma resposta as variações do ENOS, mas sim, em resposta a outro tipo de variabilidade climática e/ou como resultado de atividades humanas. Tabela. Pontos de descontinuidade no comportamento sazonal e anual da temperatura máxima e mínima para alguns municípios do Paraná, com o ano inicial da análise Ponto de descontinuidade temperatura máxima Municípios Início análise Verão Outono Inverno Primavera Anual Bela Vista do Paraíso Joaquim Tavora Cambará Apucarana * Ibiporã Umuarama * 001** ** Palotina Morretes Ponta Grossa ** * 001** Ferdandes Pinheiro * ** Clevelândia Ponto de descontinuidade temperatura mínima Municípios Início análise Verão Outono Inverno Primavera Anual Bela Vista do Paraíso ** Joaquim Tavora * Cambará * * Apucarana Ibiporã Umuarama Palotina Morretes ** 000* 1989* 1994 Ponta Grossa * * 198** Ferdandes Pinheiro * Clevelândia ** Significativo a 1% * Significativo a 5% A Figura ilustra, de forma mais compreensiva, a variabilidade da temperatura do ar em alguns municípios e períodos. Mesmo com pontos de descontinuidade significativamente diferentes entre si, a análise anual da temperatura máxima e mínima em Fernandes Pinheiro, mostra que após o ponto de descontinuidade, as médias anuais sempre estiveram acima da normal climatológica (média de ) com os recordes registrados durante a década de 000 e sem tendência climática (Fig. a). Estas características foram semelhantes às apresentadas pela temperatura mínima anual em Cambará (Fig. b). Em Ponta Grossa

5 destaca-se a temperatura máxima no outono, com uma sequência de elevados registros obtidos na década de 000 (Fig. b). a b Figura. Comportamento temporal da temperatura máxima e mínima anual, em Fernandes Pinheiro (a) e da temperatura máxima de outono em Ponta Grossa e mínima anual em Cambará (b), com respectivas tendências separadas pelos pontos de descontinuidade. 4. CONCLUSÕES 1- No Litoral do Paraná, houve mudança no comportamento da quantidade de chuva durante a primavera, no início da década de Foram identificadas mudanças no comportamento climático da temperatura máxima anual e no outono, predominantemente no início da década de 000. Na temperatura mínima, as mudanças foram encontradas em sua maioria, no outono e na primavera, respectivamente em 1979 e 1989, mas estatisticamente não foram significativas. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALEXANDERSSON, H.; MOBERG, A. Homogenization of Swedish temperature data. Part 1: homogenity test for linear trends. International Journal of Climatology, 17:5-34, ALEXANDERSSON, H. A homogeneity test applied to precipitation data. Journal of Climatology, 6: , ALEXANDROV, V.; SCHNEIDER, M; KOLEVA, E.; MOISSELIN, J.M. Climate variability and change in Bulgaria during the 0th century. Theoretical and Applied Climatology, 79: , 004. CHMIELEWSKI, F.M.; MULLER, A.; BRUNS, E. Climate changes and trends in phenology of fruit trees and field crop in Germany, Agricultural and Forest Meteorology, 11:69-78, 004. COLLINS, J.M.; CHAVES, R.R.; MARQUES, V.S. Temperature variability over South America. Journal of Climate, : , 009. FENG, S. HU, Q. Changes in agro-meteorological indicator in the contiguous United States: Theoretical and Applied Climatology, 78: OBREGÓN, G.; NOBRE, C.A. Rainfall trends in Brazil. Bulletin American Meteorological Society, 84: MINUZZI, R.B.; VIANELLO, R.L.; SEDIYAMA, G.C. Oscilações climáticas em Minas Gerais. Revista Brasileira de Meteorologia. 009 (aceito para publicação) MINUZZI, R.B. Tendências climáticas em Santa Catarina e suas influências nos cultivos da macieira e da videira. Trabalho para o concurso público nº34/ddpp/009. UFSC, 33p., 009. MOLION, L.C.B. Aquecimento global, El Niños, machas solares, vulcões e Oscilação Decadal do Pacífico. Climanálise, 8, agosto de 005. Disponível em: