Luis Nery Rodrigues 1, Aparecida Rodrigues Nery 2, Pedro Dantas Fernandes 3 e Napoleão Esberard de Macedo Beltrão 4

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1 MAMONEIRA IRRIGADA COM EFLUENTE DE ESGOTO DOMÉSTICO SOB DIFERENTES NÍVEIS DE REPOSIÇÃO DA EVAPOTRANSPIRAÇÃO * I Efeitos sobre os componentes do primeiro racemo Luis Nery Rodrigues, Aparecida Rodrigues Nery 2, Pedro Dantas Fernandes 3 e Napoleão Esberard de Macedo Beltrão 4 EAFC-PA / UFCG, luisnery@onwave.com.br; 2 UFPB, aparrone@bol.com.br. 3 UFCG, pdantas@deag.ufcg.edu.br; 4 Embrapa Algodão, nbeltrao@cnpa.embrapa.br. RESUMO - A mamoneira (Ricinus communis L.) é uma das culturas eleita para o fornecimento de matéria-prima para o programa de biodiesel. O presente trabalho foi conduzido considerando-se a escassez de estudos, a necessidade de reúso de água e a natureza de exploração industrial da mamoneira para produção de biodiesel, não implicando em problemas de ordem alimentar. O objetivo deste trabalho foi estudar os possíveis efeitos da aplicação de água de esgoto doméstico bruto sobre os componentes do primeiro racemo. O experimento foi conduzido em ambiente protegido, adotandose o delineamento blocos casualizados, em esquema fatorial 5x2, com 3 repetições. Foram testados 5 níveis de reposição da evapotranspiração da cultura - ETc (N = 60%, N 2 = 75%, N 3 = 90%, N 4 = 05% e, N 5 = 20%) e 2 cultivares, BRS-49 Nordestina e BRS-88 Paraguaçu. Foram estudadas as variáveis data da emissão, comprimento, número de frutos, data da colheita, densidade, fitomassa, fitomassa média do fruto e peso de 00 sementes. Com exceção da densidade (número de frutos/cm), os demais componentes sofreram efeito significativo com incremento do nível de reposição da ETc. As datas do florescimento e da colheita da cultivar BRS-49 Nordestina foram mais tardias. Não houve interação significativa entre os fatores. INTRODUÇÃO A aplicação de efluente de esgotos no solo é uma forma efetiva de controle da poluição e uma alternativa viável para aumentar a disponibilidade hídrica em regiões áridas e semi-áridas. Os maiores benefícios dessa forma de reúso são os associados aos aspectos econômicos, ambientais e de saúde pública. Durante as duas últimas décadas, o uso de água de esgotos para irrigação de culturas aumentou significativamente, em razão dos seguintes fatores: dificuldade crescente de identificar fontes alternativas de águas para irrigação; custo elevado de fertilizantes; a segurança de que os riscos de saúde pública e impactos sobre o solo são mínimos, se as precauções adequadas são efetivamente tomadas; os custos elevados dos sistemas de tratamentos, necessários para descarga de efluentes em corpos receptores; a aceitação sócio-cultural da prática do reúso agrícola e o reconhecimento, pelos órgãos gestores de recursos hídricos, do valor intrínseco da prática (HESPANHOL, 2003; SOUSA e LEITE, 2003). A distribuição irregular de água doce no mundo e sua conseqüente escassez natural em

2 certas regiões, agravada por poluição, crescimento demográfico e uso desordenado dos recursos naturais, faz dela um bem cada dia mais importante para a sobrevivência do homem na terra (HESPANHOL, 2003). Devido à demanda energética crescente em todo o mundo, as prioridades se voltam para fontes energéticas renováveis, destacando-se dentre elas a mamoneira como excelente alternativa, diminuindo os impactos negativos sobre o meio ambiente (AZEVEDO et al., 997a, 997b). O biodiesel não é corrosivo, não é poluente, não tem aditivos, não emite enxofre para a atmosfera e é renovável (PARENTE, 2003). O semi-árido do Nordeste tem mais de 5 milhões de hectares aptos para o cultivo desta euforbiácea e com a possibilidade de se usar o biodiesel, puro ou misturado com diesel do petróleo, as vantagens seriam imensas, com geração de milhões de empregos e matéria-prima para a indústria, melhor distribuição de renda regional e redução da poluição atmosférica (BELTRÃO, SILVA e MELO, 2002). A necessidade de irrigar a mamoneira, para obtenção de maiores produtividades, estimulou a presente pesquisa com o objetivo de estudar os efeitos de diferentes conteúdos de água no solo sobre o crescimento da mamoneira, cultivares BRS-49 Nordestina e BRS-88 Paraguaçu, mediante irrigação com efluente de esgoto doméstico bruto. MATERIAL E MÉTODOS O experimento foi conduzido entre novembro de 2005 e maio de 2006, em casa de vegetação pertencente ao Centro de Tecnologia e Recursos Naturais/CTRN/UFCG-PB, com as seguintes coordenadas geográficas: latitude 07º 3 S, longitude 35º 53 W e altitude média de 550 m. No interior da casa de vegetação, durante a condução do experimento, a temperatura mínima diária variou entre 20,00 e 24,50, a média entre 26,00 e 33,35 e a máxima entre 30,00 e 42,80 ºC. Utilizaram-se 60 vasos plásticos com capacidade de 00 L, onde foram colocados 00 kg de material de solo (argissolo, nãosalino, não-sódico, franco-arenoso, densidade do solo (Ds) =,52 kg dm -3 ), coletado numa profundidade de 0-30 cm (horizonte A), devidamente destorroado, adubado e corrigido, segundo resultados da análise química. A adubação de plantio foi feita seguindo as recomendações contidas em Novais; Neves & Barros (99), em que se aplicou todo o P (50 g superfosfato simples/00 kg de solo) e todo o K (25 g KCl/00 kg de solo). Na calagem foram aplicados 66 g de calcário dolomítico/00 kg de solo (correspondente a 2000 kg ha - x 0,20m). Por ocasião da semeadura (3 meses após calagem e adubação de plantio) o substrato apresentou as seguintes características químicas: ph = 6,33, CTC (cmol c kg - ) = 26,63, V (%) = 92,38, PST (%) = 5,52 e H+Al (cmol c kg - ) = 2,03. Não foram feitas adubações de cobertura. A água de irrigação (esgoto doméstico) apresentou como

3 características (média de seis repetições): ph = 7,90, CE =,40 ds m -, N-NH 3 = 3,46 mg L - ; P total = 4,9 mg L -, K = 25,6 mg L -, DQO = 06,80 mg L -, helmintos = 53 ovos L -, CF =,44 x 0 5 (00 ml) -. Em cada unidade experimental foram plantadas, 8 sementes na profundidade de 2 cm com o solo em capacidade de campo para possibilitar a eliminação das plantas menos vigorosas por ocasião dos desbastes, realizados aos 2 e 25 dias após a semeadura - DAS, deixando-se 2 e planta por vaso, respectivamente. Adotou-se o delineamento estatístico de blocos ao acaso, com 0 tratamentos e 3 repetições, no esquema fatorial 5x2, sendo 5 níveis de reposição de água-n (N =60%, N 2 =75%, N 3 =90%, N 4 =05% e, N 5 =20% da evapotranspiração da cultura-etc) e 2 cultivares-c (BRS-49 Nordestina e BRS-88 Paraguaçu). A parcela foi representada por uma planta/vaso. Os tratamentos foram aplicados por ocasião do primeiro desbaste (2 DAS). Entre os componentes do primeiro racemo, foram avaliados: data de emissão e da colheita (expressas em DAS), número de frutos, comprimento, densidade (relação entre número de frutos e comprimento do racemo), fitomassa, peso médio do fruto e peso de 00 sementes. Os dados foram analisados mediante aplicação da análise de variância, com análise de regressão para o fator níveis de reposição e teste de Tukey para o fator cultivares de acordo com Ferreira (2000). Para o manejo das irrigações adotou-se um turno de rega de dois dias; os volumes de irrigação (I) e de drenagem (D) foram medidos mediante o uso de provetas. O volume de água aplicado em cada tratamento foi determinado mediante balanço hídrico, tomando-se por base o nível N 4, 05% de reposição da evapotranspiração (D correspondia aproximadamente a 5% de I): ETc = I D, em que ETc = evapotranspiração da cultura (L), I = volume aplicado (L) e, D = volume drenado (L). RESULTADOS E DISCUSSÃO A partir dos resultados apresentados nas Tabela e 2, com exceção da densidade, observouse efeito linear significativo dos níveis de reposição de água sobre os componentes do primeiro racemo. Não se verificou efeito interativo. Pelas médias observadas, verificou-se um atraso de 0 dias no florescimento (data da emissão) do primeiro racemo; enquanto em N 5 (,20ETc) o florescimento ocorreu aos 73 DAS, em N (0,60ETc) ocorreu aos 83 DAS (Fig..A), mas para o ciclo (data da colheita) o atraso foi de apenas 4 dias (Fig..D). O comprimento (Fig..B) e o número de frutos (Fig..C) em N 5 foi 49,9 e 48,57% maior que em N, respectivamente. Observando-se a Figura 2, onde estão apresentadas as médias observadas, percebe-se que não houve efeito sobre a densidade do racemo (Fig. 2.A); Os acréscimos entre N e N 5, das variáveis fitomassa (Fig. 2.B), fitomassa média do fruto (Fig. 2.C) e peso de 00 sementes - P00 (Fig. 2.D), foram 64,64,,55 e 9,37%,

4 respectivamente. Fica evidenciado a sensibilidade dos componentes de produção à condição de déficit hídrico a que foram submetidas as cultivares. Observando-se as Tabelas e 2, verifica-se que a cultivar BRS-49 Nordestina superou a BRS-88 Paraguaçu em comprimento do racemo, fitomassa e P00, porém apresentou-se mais tardia e com menor densidade. Em número de frutos e peso médio do fruto, não houve diferença significativa entre as cultivares. CONCLUSÃO Os componentes do primeiro racemo da mamoneira são severamente prejudicados por baixos níveis de água no solo, ocorrendo reduções no comprimento, no número de frutos, na fitomassa, no peso médio dos frutos, no peso de 00 sementes, além de atrasar o florescimento e a colheita. A cultivar BRS-49 Nordestina apresentou-se mais produtiva, porém mais tardia. *Parte da tese de doutorado a ser apresentada pelo primeiro autor ao Programa de Pós- Graduação em Engenharia Agrícola da UFCG REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AZEVEDO, D. M. P.; BELTRÃO, N. E. M.; BATISTA, F. A. S.; LIMA, E. F. Arranjo de fileiras no consórcio mamona/milho. Campina Grande: Embrapa Algodão, 997a. 2p. (Embrapa Algodão. Boletim de Pesquisa, 34). AZEVEDO, D. M. P.; LIMA, E. F.; BATISTA, F. A. S.; BELTRÃO, N. E. M.; SOARES, J. J.; VIEIRA, R. M.; MOREIRA, J. A. N. Recomendações técnicas para o cultivo da mamoneira (Ricinus communis L.) no Nordeste do Brasil. Campina Grande: Embrapa Algodão, 997b. 52p. (Embrapa Algodão. Circular Técnica, 25). BELTRÃO, N. E. M.; SILVA, L. C.; MELO, E. B. Mamona consorciada com feijão visando produção de biodiesel, emprego e renda. Bahia Agrícola. v. 5, n. 2, p HESPANHOL, I. Potencial de reúso de água no Brasil - agricultura, indústria, municípios, recarga de aqüíferos. In: MANCUSO, C. S. A.; SANTOS, H. F. (Editores). Reúso de água. Barueri, SP: Manole, p FERREIRA, P.V. Estatística experimental aplicada à agronomia. 3.ed. Maceió:EDUFAL, p. NOVAIS, R. F.; NEVES, J. C. L.; BARROS, N. F. Ensaio em ambiente controlado. In: Métodos de pesquisa em fertilidade do solo. Brasília: Embrapa p. (EMBRAPA-SEA. Documentos, 03).

5 PARENTE, E. J. S. Biodiesel: uma aventura tecnológica num país engraçado. Fortaleza: Tecbio, p. SOUSA, J. T.; LEITE, V.D. Tratamento e utilização de esgotos domésticos na agricultura. 2.ed. Campina Grande, EDUEP:UEPB, p. Tabela. Resumo da análise de variância e teste de Tukey para os componentes do primeiro racemo, data da emissão, comprimento, número de frutos e data da colheita, em função dos fatores estudados. Quadrados Médios FV GL Data da Data da Comprimento Nº de Frutos Emissão Colheita Nível de reposição da ETc (N) 4 00,5333** 23,333** 555,9667** 35,6667 NS Blocos 2 6,6363 NS 5,6333 NS 24,000 NS 3,3333 NS Regr. Linear Regr. Quadrática Desvio da Regressão 2 380,067** 22,09 NS 0,0524 NS 459,2667** 2,0000* 6,333 NS 2053,3500** 07,4405 NS 3,538 NS 8,6667* 45,769 NS 7,690 NS Cultivar (C) 224,333** 403,3333 ** 24,0333 NS 270,0000** Interação (NxC) 4 0,4667 NS 7,3333 NS 74,7000 NS 3,6667 NS Resíduo CV(%) 8-7,6704 3,5906 3,0778 6, ,2 4,386 Médias 20,848 3,07 Cultivar (C) (D.A.S.) (cm) (--) (D.A.S.) BRS-88 Paraguaçu 74,4000 b 23,0667 b 57,9333 a 43,6667 b BRS-49 Nordestina 79,8667 a 30,4000 a 6,9333 a 49,6667 a DMS 2,238,3453 6,606 3,4986 ( NS ) (*) (**) Efeito não significativo, efeito significativo a 5 % e % de probabilidade, respectivamente, pelo teste F. Médias seguidas por letras diferentes, na vertical, diferem significativamente entre si ao nível de 5 % de probabilidade.

6 A B Emissão (D.A.S.) y = -6,778x + 92,233 R 2 = 0,9450 Comprimento (cm) y = 8,444x + 0,33 R 2 = 0, ,60 0,75 0,90,05, ,60 0,75 0,90,05,20 C D y = 39,000x + 24,800 y = -7,777x + 53,670 Nº de frutos R 2 = 0,9233 Colheita (D.A.S.) R 2 = 0, ,60 0,75 0,90,05, ,60 0,75 0,90,05,20 Figura. Data da emissão (A), comprimento (B), número de frutos (C) e data de colheita (D) do primeiro racemo, em função dos níveis de reposição da evapotranspiração da cultura ETc

7 Tabela 2. Resumo da análise de variância e teste de Tukey para os componentes do primeiro racemo, densidade, fitomassa, fitomassa média do fruto e peso de 00 sementes, em função dos fatores estudados. Quadrados Médios FV GL Fitomassa do Densidade Fitomassa fruto P00 Nível de reposição da ETc (N) 4 0,0249 NS 788,5348** 0,0827 NS 28,3363* Blocos 2 0,064 NS 739,7478 NS 0,053 NS 2,64 NS Regr. Linear Regr. Quadrática Desvio da Regressão 2 0,0232 NS 0,0000 NS 0,0382 NS 27273,8232** 096,0686 NS 92,237 NS 0,2870** 0,004 NS 0,098 NS 8,6667* 45,769 NS 7,690 NS Cultivar (C),7959** 2880,220* 0,347 NS 79,8375** Interação (NxC) 4 0,055 NS 624,244 NS 0,0094 NS 7,4629 NS Resíduo CV(%) 8-0,242 5, ,3495,498 0,0359 6,3023 9,533 4,932 Médias Cultivar (C) (frutos/cm) (g) (g) (g) BRS-88 Paraguaçu 2,5267 a 70,623 b 2,9393 a 60,9707 b BRS-49 Nordestina 2,0373 b 90,280 a 3,0733 a 64,2333 a DMS 0,2702 5,9082 0,433 2,3677 ( NS ) (*) (**) Efeito não significativo, efeito significativo a 5 % e % de probabilidade, respectivamente, pelo teste F. Médias seguidas por letras diferentes, na vertical, diferem significativamente entre si ao nível de 5 % de probabilidade. A B 2,4 220 Densidade (frutos/cm) 2,3 2,2 2, Fitomassa (g) y = 42,40x + 52,497 R 2 = 0,9485 2,0 0,60 0,75 0,90,05, ,60 0,75 0,90,05,20 C D Fitomassa do fruto (g) 4,0 3,5 3,0 2,5 y = 0,46x + 2,59 R 2 = 0,8676 P 00 (g) y = 8,68x + 54,846 R 2 = 0,8877 2,0 0,60 0,75 0,90,05, ,60 0,75 0,90,05,20 Figura 2. Densidade (A), fitomassa (B), fitomassa do fruto (C) e peso de 00 sementes-p00 (D) do primeiro racemo, em função dos níveis de reposição da evapotranspiração da cultura ETc