INFLUÊNCIA DO TEMPO DE MOLHAMENTO FOLIAR NA SEVERIDADE DA MANCHA-DE- MIROTÉCIO EM ALGODOEIRO

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1 INFLUÊNCIA DO TEMPO DE MOLHAMENTO FOLIAR NA SEVERIDADE DA MANCHA-DE- MIROTÉCIO EM ALGODOEIRO Wirton Macedo Coutinho (Embrapa Algodão Juliano César da Silva (SLC Agrícola), Nelson Dias Suassuna (Embrapa Algodão), Walter E. Pereira (UFPB). RESUMO - A influência do tempo de molhamento foliar na severidade da mancha-de-mirotécio em algodoeiro, causada Myrothecium roridum, foi avaliada por meio de estudos em ambiente controlado. Aos 30 DAE (dias após a emergência), plantas de algodoeiro da cv. Delta Pine Acala 90 foram artificialmente inoculadas com cinco isolados do fungo e mantidas em sala climatizada com temperatura de 27 C±2 C e períodos de molhamento foliar de 4, 8, 12, 16 e 24 horas diárias, durante sete dias consecutivos. Após esse período, estimou-se a porcentagem de área foliar lesionada nas folhas de algodoeiro. Não foram verificados efeitos significativos de isolados e da interação isolados x tempo de molhamento foliar; apenas a variável tempo de molhamento foliar foi significativa. A proporção de área foliar lesionada com a mancha-de-mirotécio em plantas de algodoeiro aumentou à medida que se aumentou o tempo de molhamento foliar diário. A doença foi mais severa em períodos de molhamento foliar superiores a 16 horas diários, durante sete dias consecutivos. Palavras-chave: Gossypium hirsutum, Myrothecium roridum, progresso da doença. INFLUENCE OF LEAF WETNESS ON SEVERITY OF MYROTHECIUM LEAF SPOT IN COTTON PLANTS ABSTRACT - The effect of leaf wetness on myrothecium leaf spot damage caused by Myrothecium roridum was evaluated in cotton plants under controlled environment. Thirty days after emergence, cotton plants, cv. Delta Pine Acala 90, were artificially inoculated with five Myrothecium roridum isolates and maintained on 27 C±2 C with leaf wetness periods of 4, 8, 12, 16 or 24 hours in a seven days period. After this, the percentage of leaf spot area affected by the disease was estimated. It was not detected statistical effects of isolates and interaction between isolates x leaf wetness period; only the leaf wetness period was significant. The proportion of myrothecium leaf spot area in cotton plants increased with the leaf wetness period. The myrothecium leaf spot was most severe in leaf wetness periods higher than 16 hours during seven days. Key words: Gossypium hirsutum, Myrothecium roridum, disease progress. INTRODUÇÃO A mancha-de-mirotécio foi relatada no Brasil na safra 2003/2004 em áreas de produção de algodão nos estados da Bahia, Mato Grosso e Maranhão, alcançando, neste último, níveis epidêmicos com perdas estimadas de até 60% na produção (CHITARRA e MEYER, 2004). O agente etiológico da doença, Myrothecium roridum Tode ex. Fr., é um fungo comum de solo que sobrevive em restos de culturas e pode ser transmitido por sementes (GAZZONI e YORINORI, 1995). Esse fungo é amplamente distribuído em regiões de clima temperado e tropical do mundo, afetando uma ampla gama de hospedeiros, inclusive solanáceas e cucurbitáceas (HILLOCKS, 1998). Em algodoeiro, a mancha-de-mirotécio é caracterizada por lesões circulares de coloração marrom com margens violeta amarronzada em folhas, brácteas, maçãs, pecíolos e caules. As lesões

2 podem estender-se até 3 cm de diâmetro e são contornadas por áreas translúcidas e concêntricas, que eventualmente suportam esporodóquios do fungo. Em condições ótimas para o desenvolvimento da doença, as lesões multiplicam-se em número e tamanho, coalecem e afetam grandes áreas do limbo foliar, resultando em desfolha da planta; o fungo também causa lesões na haste principal e dieback em pedúnculos e pecíolos (MIRANDA e SUASSUNA, 2004). As condições que favorecem o desenvolvimento do fungo e as variáveis climáticas ótimas para o desenvolvimento da doença são desconhecidas. As poucas informações que se tem a respeito é que fatores metereológicos têm uma influência muito grande sobre o desenvolvimento da mancha-demirotécio em algodoeiro, e que surtos epidêmicos da doença estão associados com temperaturas elevadas, alta umidade relativa do ar e alta precipitação pluviométrica (CHITARRA e MEYER, 2004). O conhecimento das condições que favorecem o desenvolvimento do fungo e das variáveis climáticas ótimas para infecção e desenvolvimento da doença é fundamental para se delimitar estratégias de controle. Dessa forma, objetivou-se, com este trabalho, avaliar a influência de períodos de molhamento foliar na severidade (porcentagem de área foliar lesionada) da mancha-de-mirotécio do algodoeiro, causada por Myrothecium roridum. MATERIAL E MÉTODOS O trabalho foi conduzido no laboratório de Fitopatologia da Embrapa Algodão, no município de Campina Grande, estado da Paraíba. A influência do tempo de molhamento foliar na severidade (porcentagem de área foliar lesionada) da mancha-de-mirotécio foi avaliada em plantas de algodoeiro, cultivar Deltapine Acala 90, inoculadas artificialmente com M. roridum. As plantas foram cultivadas em vasos plásticos contendo 4 kg de uma mistura de solo e esterco bovino na proporção de 3:1 (v/v) e, aos 30 DAE (dias após a emergência), inoculadas com as suspensões de conídios dos isolados de M. roridum (Tab. 1), utilizando-se um atomizador DeVilbiss n o. 14, até o ponto de escorrimento. A suspensão de conídios de cada isolado foi preparada adicionandose 10 ml de água destilada e esterilizada em placas de Petri, contendo meio BDA com os isolados fúngicos cultivados durante sete dias em câmara do tipo BOD com temperatura de 28 C ± 2 C e fotoperíodo de 12 horas. Os conídios foram liberados das colônias fúngicas cultivadas no meio de cultura com uma alça de Drigalski, e a suspensão resultante filtrada em uma camada dupla de gaze esterilizada e ajustada para 1 x 10 6 esporos.ml -1, utilizando-se hemacitômetro. Tabela 1. Descrição dos isolados de M. roridum Isolado Hospedeiro Cultivar Local de isolamento Procedência CNPA 0012 Soja BRS Sambaíba Folha Riachão, MA CNPA 0013 Algodoeiro Denta Pine Acala 90 Folha Riachão, MA CNPA 0014 Algodoeiro Sure Grow 821 Folha Tasso Fragoso, MA CNPA 0015 Algodoeiro Denta Pine Acala 90 Maçã Tasso Fragoso, MA CNPA 0016 Algodoeiro Fiber Max 966 Folha Rondonópolis, MT Após a inoculação do patógeno, as plantas foram acondicionadas em sala climatizada com temperatura de 27 C ±2 C e períodos de molhamento foliar de 4, 8, 12, 16 e 24 horas diárias, durante

3 sete dias; após esse período, estimou-se visualmente a porcentagem de área foliar lesionada nas folhas de algodoeiro. O delineamento experimental utilizado foi o de blocos ao acaso em esquema fatorial 5 x 5 (isolados x períodos de molhamento). A variável resposta refere-se à proporção de área foliar lesionada. Em razão dos dados não terem homocesdasticidade de variâncias, foi ajustado um modelo linear generalizado com a função ligadora canônica logit. A análise de deviance (testes de razão de verossimilhanças para as fontes de variação controladas no modelo) foi realizada de forma seqüencial (tipo I). A proporção foi estimada utilizando a fórmula: p=[exp(n ij )/1+exp(n ij )]. O ajuste foi realizado utilizando o procedimento GENMOD do software estatístico SAS system versão 8.0 (SAS Institute Inc. Cary, NC, USA). RESULTADOS E DISCUSSÃO Neste experimento não foram verificados efeitos significativos de isolados (p=0,1959) e da interação isolados x tempo de molhamento foliar diário (p=0,5020); apenas a variável tempo de molhamento foliar diário foi significativa (p>0,0001), sendo ajustada uma equação média para todos os isolados testados. A proporção de área foliar lesionada com a mancha-de-mirotécio em plantas de algodoeiro aumentou à medida que se aumentou o tempo de molhamento foliar diário, evidenciando a necessidade de períodos de molhamento superiores a 16 horas diários, durante sete dias consecutivos, para que a doença ocorra de forma mais severa (Fig. 1). Danos severos causados por Myrothecium roridum em algodoeiro são freqüentemente associados com chuvas intensas e temperaturas elevadas durante o período de cultivo (CHITARRA e MEYER, 2004). A presença de água no estado líquido sobre a superfície da folha (molhamento foliar) parece ser um fator imprescindível à infecção (germinação e penetração), assim como na colonização de M. roridum em plantas de algodoeiro. A água também pode se constituir em um fator importante na dispersão desse fungo. Respingos, resultantes de precipitações pluviométricas, desprendem os conídios do fungo da substância mucilaginosa que os mantêm agregados ao esporodóquio e favorecem a sua dispersão entre plantas no campo de cultivo, sendo importante no policiclo da doença, ou seja no progresso da doença em função de vários ciclos do patógeno. Outros fungos que atacam o algodoeiro utilizam essa via para se dispersar na área de cultivo e completar o seu ciclo secundário, como por exemplo Colletotrichum gossypii var. cephalosporioides, agente etiológico da ramulose.

4 0.6 Proporção de área foliar lesionada exp (-5, ,2296x) Y = 1 + exp (-5, ,2296x) Tempo de molhamento foliar (horas) Figura 1. Efeito de horas de molhamento foliar diário na severidade da mancha-de-mirotécio do algodoeiro. O requerimento hídrico necessário ao início do processo de infecção de diferentes espécies de fungos fitopatogênicos está distribuído dentro de uma ampla faixa, variando de 0,5 a 100 horas de molhamento foliar (HUBER e GILLESPSIE, 1992). Essa quantidade de horas de período de molhamento foliar não necessita ser contínua, uma vez que algumas espécies podem esporular ou causar infecção em plantas durante vários períodos curtos de molhamento, ao invés de um único período longo. Para muitos fungos, o filme de água sobre a folha tem sua importância limitada à germinação e penetração, não sendo mais necessário para continuar o processo de colonização do hospedeiro, uma vez que o fungo pode obter água do próprio hospedeiro (CARNEIRO e AMORIM, 1999). Pelos resultados obtidos neste estudo, verifica-se que, ao contrário desses, o agente etiológico da mancha-de-mirotécio em algodoeiro, Myrothecium roridum, é dependente de água livre na superfície da folha para colonizar o hospedeiro, uma vez que o desenvolvimento da doença ocorreu de forma mais severa em períodos de molhamento foliar superiores a 16 horas diárias durante sete dias consecutivos. Portanto, a dependência por longos períodos de molhamento foliar para o estabelecimento da doença no campo deve ser considerada no desenvolvimento de um modelo de previsão para a mancha-de-mirotécio em algodoeiro, causada por Myrothecium roridum. Para reduzir as perdas causadas por Myrothecium roridum é recomendável o uso de medidas preventivas, como rotação de culturas, tratamento de sementes, eliminação de soqueiras e controle químico.

5 CONCLUSÃO Myrothecium roridum, agente causal da mancha-de-mirotécio, é dependente de períodos de molhamento foliar superiores a 16 horas diárias por sete dias consecutivos para causar danos severos em plantas de algodoeiro. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARNEIRO, L. C.; Amorim, L. Influência da temperatura e molhamento foliar no monociclo do "mal-desete-voltas" da cebola. Fitopatologia Brasileira, v. 24, n. 3, p CHITARRA, L. G.; MEYER, M. C. Novo e sem controle. Cultivar, n.62, p.16-18, GAZZONI, D. L.; YORINORI, J. T. Manual de identificação de pragas e doenças de soja. Brasília: EMBRAPA-SPI, p. HILLOCKS, R. J. Fungal diseases of the leaf. In: HILLOCKS, R. J. Cotton diseases. Wallingford: CAB International, p HUBER, L.; GILLESPIE, T. J. Modeling leaf wetness in relation to plant disease epidemiology. Annual Review of Phytophatology, v. 30, p MIRANDA, J. E.; SUASSUNA, N. D. Guia de identificação e controle das principais pragas e doenças do algodoeiro. Campina Grande: Embrapa Algodão, p. (Circular Técnica, 76).