Maria de Fátima de Souza Pires MUSICALIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL



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Transcrição:

Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Ciências da Educação Núcleo de Desenvolvimento Infantil Curso de Especialização em Educação Infantil Campus Universitário Trindade Caixa Postal 476 e-mail : especializacao.ufsc.ndi@gmail.com - Fone 3721-8921 Maria de Fátima de Souza Pires MUSICALIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL Florianópolis 2012

Maria de Fátima de Souza Pires MUSICALIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL Artigo submetido ao Curso de Especialização em Educação Infantil para a obtenção do Grau de Especialista em Educação Infantil. Orientadora: Prof.ª Dalânea Cristina Flor Florianópolis 2012

Maria de Fátima de Souza Pires MUSICALIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL Este artigo foi julgado aprovado para a obtenção do Título de Especialista em Educação Infantil e aprovado em sua forma final pelo Curso de Especialização em Educação Infantil. Florianópolis, 19 de março de 2012. Prof. Dra. Marilene Dandolini Raupp Coordenadora Geral do CEEI Banca Examinadora: Prof. Dalânea Cristina Flor Orientador Prof. Jucilaine Zucco Primeiro membro Prof. Andressa J. da Silva Segundo membro

4 MUSICALIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL Maria de Fátima de Souza Pires 1 Resumo O presente artigo apresenta uma breve reflexão sobre a importância da musicalização na educação infantil, especificamente, para crianças na faixa etária de dois anos. Tal reflexão teve como base um projeto de intervenção pedagógica articulada com estudos proporcionados por um curso de especialização em educação infantil. O artigo apresenta uma prática pedagógica organizada em um espaço lúdico, com atividades e recursos diversificados e que proporcionaram o desenvolvimento das múltiplas linguagens no processo de musicalização. Palavras-chaves: educação infantil; musicalização; práticas pedagógicas. 1 Pedagoga: acadêmica do curso de Especialização em Educação Infantil

5 1 INTRODUÇÃO No contexto educacional da infância, fica cada vez mais clara a relevância de se trabalhar com a música, pois ela é uma das linguagens que contribui para o desenvolvimento físico, emocional, afetivo, linguístico e sociocultural da criança. Entende-se que a musicalização na educação infantil é um processo contínuo de construção do conhecimento musical, realizado por meio de atividades lúdicas. Porém, nessa etapa da educação básica, verifica-se que a prática pedagógica musical nem sempre vem sendo realizada de maneira adequada nas instituições. É comum vermos o trabalho com música perder sua essência para servir ao utilitarismo. Foi a partir desta compreensão, aliada às reflexões proporcionadas pelo Curso de Especialização em Educação Infantil, promovido pelo Núcleo de Desenvolvimento Infantil do Centro de Ciências da Educação da Universidade Federal de Santa Catarina, com apoio do Ministério da Educação, e também do interesse demonstrado pelas crianças de dois anos, matriculadas na creche Celso Pamplona, da Rede Municipal de Florianópolis, Santa Catarina, que elaborei um projeto de intervenção pedagógica sobre o qual este artigo tratará. Tal projeto tomou como ponto de partida o encantamento pela música e pelas vivências proporcionadas por ela, como movimentos corporais, produção de diversos sons, cantar, dançar, interagir com o outro, entre outras. O artigo apresenta uma reflexão sobre a importância da musicalização na educação infantil, especialmente na faixa etária de dois anos; algumas possibilidades de atividades com a música; a socialização das vivências realizadas com o grupo; e para finalizar, algumas breves conclusões. 2 REFLEXÕES SOBRE A IMPORTÂNCIA DA MUSICALIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL A música é uma linguagem universal que faz parte da história da humanidade. Ela está associada ao contexto cultural de cada povo e a determinadas épocas. Com ela, a criança se envolve, desde muito cedo, nas mais diversas experiências sonoras, como mostra Jeandot: [...] quando a criança nasce, entra imediatamente em contato com o universo sonoro que a cerca. [...] Mesmo antes de nascer, ainda no útero materno, a criança já toma contato com um dos

6 elementos fundamentais da música _ ritmo, através da pulsação do coração de sua mãe (1993, p. 18). Essas experiências iniciais têm como fontes o próprio corpo, a voz, os sons da natureza, o barulho de objetos, o som de instrumentos musicais, entre outras, e devem ser aos poucos ampliadas. De acordo com Brito (2003, p.23), A música é linguagem que organiza, intencionalmente, os signos sonoros e o silêncio no continuum espaço-tempo. Bréscia afirma que a música contribui para o desenvolvimento da criança no contexto escolar. Diz ela: Ao trabalhar com som, a criança aguça sua audição, ao acompanhar gestos, ou dançar ela está trabalhando a coordenação motora e a atenção, ao cantar ou imitar sons, ela está estabelecendo relações com o ambiente em que vive. O aprendizado de música, além de favorecer o desenvolvimento afetivo da criança, amplia a atividade cerebral, melhora o desempenho escolar dos alunos e contribui para integrar socialmente o indivíduo. (2003, p.82) Dentro dessa linguagem, existe uma diversidade de estilos musicais que podem fazer parte da vida da criança, desde músicas populares brasileiras (MPB), músicas clássicas eruditas, músicas folclóricas e outros. Por isso, a música precisa ser tomada como conteúdo relevante pelos professores. Percebe-se que, no contexto da educação infantil, muitas vezes, a música é utilizada de maneira equivocada, ficando restrita aos momentos do lanche, da higiene, para disciplinar as crianças ou organizar materiais e espaços; ou ainda, para referenciar datas comemorativas, restringindo a capacidade formativa da criança. Para rever esta prática, é necessário que o professor volte seu olhar para os modos de como a criança aprende e se desenvolve. No contexto da educação infantil, o espaço lúdico pensado, planejado e organizado contribui para a participação e vivência da criança nas brincadeiras. Pois, ao brincar, ela faz uso de diferentes meios, como os gestos, sons, palavras e objetos, que proporcionam a aprendizagem e o desenvolvimento dela. A música deve estar voltada para este universo. Vigotsky destaca que: [...] a aprendizagem não é, em si mesma, desenvolvimento, mas uma correta organização da aprendizagem da criança conduz ao desenvolvimento mental, ativa todo um grupo de processos de desenvolvimento, e esta ativação não poderia produzir-se sem aprendizagem. Por isso, a aprendizagem é um momento intrinsecamente necessário e universal, para que se desenvolvam na criança essas características humanas não naturais, mas formadas historicamente. (1998, p. 115)

7 A aprendizagem é um processo que ocorre a partir do nascimento da criança, nas diversas interações dela dentro do contexto histórico e social, principalmente na instituição de educação infantil, já que esta tem como responsabilidade o desenvolvimento integral da criança. Entende-se que a música pode contribuir para este processo, no entanto, para que isso ocorra, é preciso que os professores tenham formação adequada e atuação intencional efetiva. Segundo Pires, a musicalização é um processo contínuo de inserção da criança no mundo da música, nas vivências e na compreensão da linguagem musical. A criança, ao ouvir uma música, produzir uma canção, manusear instrumentos musicais, brincar de roda, utilizar brincadeira rítmica e a livre expressão musical, experimenta diversas sensações, vivencia emoções e amplia sua cultura. Isto tudo pode ocorrer por meio da atividade lúdica que, segundo Lukesi,... é aquela que dá plenitude e, por isso, prazer ao ser humano, seja como exercício, seja como simbólico, seja como jogo de regras. Os jogos apresentam múltiplas possibilidades de interação consigo mesmo e com os outros. (1998, p.29) Sendo assim, no contexto da educação infantil, o processo de musicalização deve ser propiciado por meio de atividades lúdicas, como brincadeiras, jogos, cantigas de roda; visando ao desenvolvimento da percepção auditiva, da imaginação, da coordenação motora, da memorização, da socialização, da expressividade e da percepção espacial da criança. Conforme afirma Vigotsky, [...] a brincadeira, que deve ser sempre entendida como uma realização imaginária e ilusória de desejos irrealizáveis, diante da pergunta por que a criança brinca. A imaginação é o novo que está ausente na consciência da criança na primeira infância, absolutamente ausente nos animais e representa uma forma especificamente humana de atividade da consciência e de todas as funções da consciência, forma-se originalmente na ação. (2008, p. 25) É, portanto uma atividade fundamental para a criança. Entre as variadas formas de possibilitar que a criança estabeleça diferentes relações, vivencie o imaginário, invente, converse e crie cenários, experimentando situações diversificadas que proporcionem aprendizagens a ela, podemos destacar ainda as histórias, as dramatizações, a organização do espaço e os momentos de artes visuais. Neste sentido, é importante ressaltar que as crianças passam por etapas diferentes de

8 aprendizagem e desenvolvimento, de acordo com a idade. Por isso, é necessário que o professor conheça tais etapas para conseguir planejar atividades adequadas ao grupo. Facci destaca que, [...] na primeira infância, a atividade principal passa a ser objetalinstrumental, na qual tem lugar a assimilação dos procedimentos elaborados socialmente de ação com os objetos e, para que ocorra essa assimilação, é necessário que os adultos mostrem essas ações às crianças. A comunicação emocional dá lugar a uma colaboração prática. Por meio da linguagem, a criança mantém contato com o adulto e aprende a manipular os objetos criados pelos homens, organizando a comunicação e a colaboração com os adultos. (2004, p.68) Assim podemos dizer que a atividade principal da criança na primeira infância é o manuseio e a exploração de brinquedos ou objetos, propiciado pelo adulto, viabilizando a compreensão do mundo em volta dela por meio da comunicação. Manuseio e exploração de brinquedo A mesma autora enfatiza que: A primeira função da linguagem é a comunicação, um meio de expressão entre os homens, que permite o intercâmbio social. Até mais ou menos os 18 meses, a criança ainda não consegue descobrir as funções simbólicas da linguagem, que é uma operação intelectual consciente e altamente complexa. Por volta dos dois anos, a criança apresenta grande evolução da linguagem, dando início a uma forma totalmente nova de comportamento, exclusivamente humana. (2004, p. 68) É importante que o professor observe a maneira como as crianças falam. Se cantarem, como cantam, como brincam e como interagem para perceber o que conhecem; o que dão conta, o que ainda pode ser explorado por elas, de modo a ampliar o aprendizado e proporcionar o desenvolvimento delas. No trabalho especificamente com a musicalização, Silva também relata que cada criança tem sua capacidade conforme a idade. Segundo ela,

9 A criança com dois anos imita sons de instrumentos e vários sons do cotidiano. Reage abundantemente com reações rítmico-corporais, assim como adora o ritmo, pois a estimula a cantar e reconhecer algumas melodias. Tem desempenhos significativos em termos de execução de instrumentos rítmicos. (2006, p. 2-6) Portanto, planejar atividades voltadas à música, que abordem as múltiplas linguagens, sem dúvida, contribuirá para a formação da criança. 3 INSTRUMENTOS MUSICAIS No processo de musicalização, o instrumento musical é um recurso muito importante no trabalho com as crianças, pois lhes proporciona a aprendizagem em momentos prazerosos e significativos. Os instrumentos são objetos que produzem sons e podem ser representados por brinquedos sonoros, instrumentos convencionais industrializados, instrumentos construídos junto às crianças. Até a voz, como fonte sonora, pode ser considerada como primeiro instrumento musical natural da criança e de muita importância no desenvolvimento da linguagem oral. Na educação infantil, esses instrumentos contribuem para aprendizagem da linguagem musical. Entre os instrumentos musicais mais comumente utilizados nas instituições de educação infantil, destacam-se tambor, chocalho, reco-reco, triângulo, pandeiro e flauta. Porém, é fundamental que o professor ou a escola, que tenha o objetivo de trabalhar a musicalização, busque ampliar o repertório das crianças apresentando-lhes instrumentos musicais variados que elas ainda não conhecem, permitindo que os vejam, toquem, ouçam e sintam. Disponibilizar instrumentos musicais e espaço organizado adequado possibilita à criança manusear e experimentar situações diversificadas no processo da musicalização. Porém, não basta colocá-los à disposição das crianças, é necessário explorar os instrumentos musicais trabalhando a qualidade do som quanto à altura, à duração, à intensidade, ao timbre e à densidade. Brito descreve a qualidade do som da seguinte forma: Altura - Um som pode ser grave ou agudo, dependendo da freqüência de suas vibrações por segundo. Quanto menor for o número de vibrações, ou seja, quanto menor a freqüência sonora, mais grave será o som e vice-versa. Duração - Um som pode ser medido pelo tempo de sua classificação como curto e longo. Exemplos: a madeira produz sons curtos, ao passo que metais produzem sons que vibram durante um lapso maior. Intensidade - Um som pode ser medido pela amplitude de sua onda e classificado como forte ou fraco.

10 Timbre - É a característica que diferencia, ou personaliza cada som. Também se costuma dizer que o timbre é a cor do som; depende dos materiais e do modo de produção do som. Densidade - É um parâmetro que se refere a um grupo de sons, caracterizando-se pelo menor ou maior agrupamento de sons num lapso, ou seja, pela rarefação ou adensamento. (2003, p. 18-19) No processo de musicalização, a criança produz diversos sons ao manusear diversos instrumentos, chocalhar, bater e mexer. Este manuseio também possibilita que ela perceba a diversidade de sons que podem ser produzidos. Por isso, a construção de instrumentos musicais junto com as crianças é um momento rico que, além de ser significativo devido à experiência de construir seu próprio instrumento, pode desenvolver a coordenação motora, o interesse, a curiosidade, por intermédio do manuseio e da exploração de materiais reciclados e didáticos. 4 PRÁTICAS PEDAGÓGICAS A instituição educativa é um lugar propício e privilegiado para o desenvolvimento das múltiplas linguagens, portanto o professor deve ter intencionalidade pedagógica voltada para o desenvolvimento da criança, planejar as atividades e providenciar recursos para prática pedagógica. A atividade lúdica é de extrema relevância para a efetivação do trabalho com a música na educação infantil. Porém, o professor deve planejar suas atividades fundamentadas nas necessidades e nos interesses das crianças, sempre pensando na ampliação dos conhecimentos, das vivências e experiências delas; com o objetivo de ir além do que a criança pode aprender em casa, na comunidade, ou por meio das diferentes mídias. Pois esta é a função principal da educação infantil. Para que a musicalização se concretize nas instituições de educação infantil, é necessário que o professor amplie seus conhecimentos referentes à música, como também reflita sobre sua prática pedagógica. Nesta perspectiva, as atividades com a musicalização devem ser diárias, em diversos momentos e espaços da rotina escolar, como ao contar histórias, dramatizar, durante o momento de higiene, ao fazer atividades que envolvam movimento corporal, ao construir instrumentos musicais, manusear os instrumentos, ao dançar e cantar, no parque, nas refeições. Foi assim que aconteceu com as crianças de dois anos, do grupo GIII-1, da creche Celso Pamplona.

11 A partir dos primeiros contatos com o grupo de crianças e com as primeiras atividades planejadas, fui observando o encantamento pela música e o fascínio delas específico pela brincadeira do boi de mamão. Com isso fui pensando alternativas de aproveitar este interesse a favor da ampliação dos conhecimentos das crianças. Considerando a especificidade do trabalho na educação infantil, especialmente com crianças tão pequenas, procurei pensar formas de organizar o espaço, para deixá-lo aconchegante e instigante. Foi com esse objetivo que confeccionamos um tapete quadriculado, em várias cores, intitulado tapete mágico que se tornou um espaço para vivenciar variados momentos especiais. Entre eles, destaco alguns, abaixo. Tapete mágico Organizando o espaço O tapete se transforma em bernunça 4.1 BOI DE MAMÃO Para a brincadeira do boi de mamão, folguedo do folclore catarinense, foi providenciado um CD com as músicas e a história dessa manifestação cultural, para ouvir, cantar e dançar. Durante a atividade, as crianças demonstravam muito interesse,

12 prestando atenção na história, cantarolando as músicas, fazendo gestos e dançando. Destacamos que algumas crianças utilizaram bonecos e objetos para representar a brincadeira. A título de complementação da atividade, planejamos a construção do fantoche dos personagens do boi de mamão, para as crianças os manusearem e brincarem com eles. Na construção dos fantoches, as crianças rasgaram papel e, com técnica de papietagem, cobriram os moldes de papelão preparados pelas professoras. Papietando a armação do boi As crianças ficaram fascinadas com os fantoches, com os quais brincavam quase todos os dias. Suas brincadeiras estendiam-se para além da sala de aula, envolvendo outros grupos da instituição, proporcionando momentos de interação. A brincadeira contagiou tanto que se estendeu para a casa das crianças. Segundo os próprios pais, frequentemente observaram seus filhos cantarolando e dançando a música do boi de mamão em casa. Para ampliar mais as vivências das crianças, articulou-se uma visita a uma escola estadual para assistirem à apresentação do boi de mamão em tamanho natural. Além de a saída representar um momento interessante para o grupo de crianças pequenas, a visita ainda lhes proporcionou a emoção de estarem em outro ambiente, ver personagens grandes, interagir com crianças maiores; portanto foi um momento muito especial. As crianças ficaram tão à vontade naquele espaço que, ao serem questionadas se alguém queria cantar alguma música, uma espontaneamente se manifestou, e cantou para todos.

13 Utilizando diferentes objetos para brincar de boi de mamão Brincando com os personagens confeccionados pelo grupo, com ajuda da professora Fascínio pelo fantoche do boi de mamão A música e a brincadeira 4.2 AS HISTÓRIAS E OS SONS Uma das ideias do trabalho com a musicalização era a de instigar a atenção, a sensibilização auditiva, a imaginação e a linguagem verbal das crianças. Para isso, privilegiamos as histórias e as brincadeiras com diferentes sons. A partir deste trabalho, no sentido de desenvolver a atenção auditiva, estimulando as crianças a ouvirem os diferentes sons dos ambientes em que estávamos, é possível fazer alguns destaques. Percebemos que nos dias de chuva, ao ouvirem o barulho da água caindo, rapidamente as crianças falavam: _ a chuva. Ao ouvirem um avião passando, logo apontavam para o céu dizendo: _ tchau avião. E estes são apenas alguns exemplos das diversas situações nas quais se constatou a contribuição das atividades desenvolvidas para o aprendizado das crianças.

14 Contação de história Observando as ilustrações 4.3 A MÚSICA E O MOVIMENTO CORPORAL Esta atividade foi realizada com várias músicas que citam as partes do corpo e permitem às crianças identificarem pernas, pés, braços e mãos. Por meio dessas músicas e brincadeiras, as crianças experimentaram e aprenderam os sons que produzem ao bater palmas, ao bater os pés e ao pular de diferentes maneiras e em diferentes ritmos. Pode-se observar que, após a realização destas atividades, algumas crianças brincavam de roda, cantavam, dançavam e pulavam reproduzindo o que aprenderam em diversos momentos e lugares, como na sala, no corredor da creche e no refeitório. Nos momentos do parque, foi muito interessante observar que as crianças, enquanto se movimentavam e brincavam, cantavam varias músicas. Cantando no parque Movimento corporal-dança 4.4 OFICINA DE INSTRUMENTOS MUSICAIS

15 A oficina de instrumentos musicais instigou a curiosidade das crianças ao manusearem vários materiais recicláveis e didáticos, e as estimulou a perceberem a textura e a utilização destes objetos. Nela, construímos vários instrumentos como: chocalhos de garrafas pet, recheadas com pedras de cores variadas e pintadas com cola colorida, utilizando-se o dedo; pauzinhos de cabos de vassouras também pintados com o dedo; reco-recos de bambu e tambores de latas com acabamento em papel, pintados com pincel e guache. Na construção dos instrumentos, tivemos a participação de um funcionário da creche para serrar o bambu que foi utilizado depois na confecção do reco-reco. Naquele momento, as crianças ficaram muito curiosas, observando o som que a serra produzia, como também com o pó que restou no fim da atividade. Além disso, puderam interagir com um adulto a mais, ampliando suas relações. Participação do funcionário da creche na construção do instrumento Produzindo som com reco-reco Instrumentos musicais construídos na oficina: tambor e chocalho

16 Assim, pode-se afirmar que a criança nesta faixa etária de dois anos se envolve nas atividades a elas propostas, demonstrando interesse e curiosidade pelo novo, participando do que lhe é propiciado. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O objetivo do PIP analisado foi o de realizar atividades que viabilizassem situações significativas, promovendo vivências e aprendizados em um espaço lúdico que possibilitasse o desenvolvimento das múltiplas linguagens por meio da musicalização. As atividades de musicalização foram realizadas com intencionalidades pedagógicas direcionadas para o desenvolvimento integral da criança por meio de histórias, músicas, dança, confecção de fantoches e de oficinas de instrumentos musicais. Diante das reflexões referentes à musicalização e à prática pedagógica, observou-se que as crianças desenvolveram a linguagem oral, a coordenação motora, a percepção auditiva, a imaginação e a expressão musical. A partir deste trabalho, ficou ainda mais evidente que o processo de musicalização precisa ser mais trabalhado na prática pedagógica da educação infantil, por intermédio da escolha das músicas a serem apresentadas às crianças; pelo planejamento de variadas brincadeiras, envolvendo música e dança; pela exploração de instrumentos musicais; pela estimulação da percepção auditiva. Ficou claro também nesta experiência, que a formação continuada do professor é fundamental para que ele exerça um trabalho comprometido com o aprendizado e o desenvolvimento da criança, e neste caso, com a musicalização para infância. Com base nessas vivências e experiências, pode-se afirmar que é possível se realizar um trabalho significativo com crianças pequenas, envolvendo a musicalização. Entretanto, para alcançar este objetivo, o profissional precisa refletir sobre sua postura pedagógica e ampliar seus próprios conhecimentos, buscando subsídios para a qualificação do trabalho no contexto da educação infantil.

17 REFERÊNCIAS BRÉSCIA, Vera Lucia Pessagno. Educação Musical: bases psicológicas e ação preventiva. São Paulo: Átomo, 2003, p. 18-9, 82. BRITO, Teca Alencar de. Música na Educação Infantil: proposta para a formação integral da criança. São Paulo: Fundação Peirópolis, 2003, p18-19. FACCI, Marilda Gonçalves Dias. A Periodização do desenvolvimento psicológico individual na perspectiva de Leontiev, Elkonin e Vigotski. CAD Cedes, Campinas, vol. 24, n. 62, p. 64-81, abril 2004. [Disponível em: http://www.cedes.unicamp.br JEANDOT, Nicole. Explorando o universo da música. São Paulo: Scipione, 1993. SILVA, L. L. F. da. Música na Infância. Revista da Música culta: FILO MÚSICA, Lisboa, n. 78, p. 18, nov. 2006. LUCKESI, Cipriano Carlos. Desenvolvimento dos Estados de Consciência e Ludicidade. Cadernos de Pesquisa do Núcleo de FACED/ UFBA, vol.2, n. 21, p. 19-30, 1998. PIRES, Gisele Brandelo Camargo. Lúdico e Musicalização na Educação Infantil. Centro Universitário Leonardo da Vinci. Indaial: Ed. Grupo Uniasselvi, p. 29, 2008. VGOTSKY, Lev Seminotch. A brincadeira e o Papel no Desenvolvimento Psíquico da Criança.Tradução: Zóia Prestes. Revista virtual de gestão e iniciativas sociais, Laboratório de Tecnologia e Desenvolvimento Social (Programa de Produção da COPPE UFRJ), p. 23-36 e 82, jul. 2008.