Variabilidade glicêmica no diabetes: a quais características o médico deve estar atento?

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Transcrição:

Variabilidade glicêmica no diabetes: a quais características o médico deve estar atento? Author : Dr. Thiago Santos Hirose Categories : Endocrinologia Date : 26 de julho de 2018 Compartilhe conhecimento! 2 Shares O controle da glicemia nos pacientes diabéticos tem grande importância para a prevenção de complicações agudas e crônicas da doença. Para isto, lança-se mão das seguintes ferramentas para o seguimento dos pacientes: Glicemia capilar: por meio do exame da gota de sangue em fita e aparelho apropriados, o paciente é capaz de aferir a glicemia capilar em determinado momento do dia; Hemoglobina glicada (HbA1c): porção proteica presente nos glóbulos vermelhos e que se liga à glicose presente no sangue. Quanto maior a glicemia, maior será a hemoglobina glicada. As hemácias têm uma meia-vida média de 90 a 120 dias; sendo assim, a hemoglobina glicada reflete uma média das glicemias do paciente neste período. De acordo com a hemoglobina glicada, pode-se estimar a glicemia média do paciente conforme a tabela abaixo: CORRESPONDÊNCIA ENTRE OS NÍVEIS DE A1C (%) E OS NÍVEIS MÉDIOS DE GLICEMIA DOS ÚLTIMOS 2 A 4 MESES (MG/DL) Nível de A1C (%) Estudos Originais Novos Estudos 1 / 8

4 65 70 5 100 98 6 135 126 7 - META SBD/ADA 170 154 8 205 182 9 240 211 10 275 239 11 310 267 12 345 295 Rotineiramente, usa-se a somatória da hemoglobina glicada mais uma tabela com as medidas das glicemias capilares para avaliar se o paciente diabético está bem controlado ou não. Porém, cada um dos métodos tem limitações para as quais devemos ficar atentos (2). Glicemia capilar vantagens e desvantagens Necessidade de várias picadas no dedo por dia; Medida instantânea da glicemia, sem avaliar previsões de subidas ou quedas futuras; Depende de um aparelho calibrado e de qualidade; Depende do paciente anotar os dados corretamente; Há dificuldade em avaliar hipoglicemias na madrugada e assintomáticas; Grande quantidade de materiais gastos por dia (fita, lanceta, algodão, álcool). CARACTERÍSTICAS AMGC SMCG FGM Número de testes Limitado Virtualmente sem limites Virtualmente sem limites Fluido utilizado Capilar Intersticial Intersticial Acurácia Boa Boa Boa Facilidade de interpretação Fácil Difícil Fácil Dependência do usuário Sim Sim Não Motivação requerida Sim Sim Mínima Habilidades necessárias Sim Sim Sim, mínima para o uso Disponibilidade imediata Sim Não Não dos resultados Ligação com bomba de Sim Sim Não 2 / 8

insulina Comparação das três possibilidades de medição da glicemia. Hemoglobina glicada vantagens e desvantagens Avalia as médias das glicemias nos últimos 3 meses, mas não verifica a variabilidade glicêmica neste período, podendo levar a resultados falsamente normais; Algumas doenças e condições limitam a leitura da hemoglobina glicada, como anemias e a gestação (diluição da hemoglobina); Não reflete, necessariamente, as mudanças realizadas durante o tratamento; Não detecta hipo e hiperglicemias neste período; Exame dependente da qualidade do laboratório que o realiza. Para aprimorar o controle das glicemias diárias do paciente diabético, criou-se o formato de monitoramento contínuo de glicemia (MCG), em que há a detecção da glicose do fluido intersticial de forma contínua por meio de um sensor acoplado ao corpo. Assim, diminui-se a quantidade de picadas de dedo e pode-se observar as tendências das variações glicêmicas ao longo do dia inteiro. O QUE É A VARIABILIDADE GLICÊMICA? SUA IMPORTÂNCIA NA PRÁTICA DIÁRIA DO CONTROLE DO DIABETES Variabilidade glicêmica é a avaliação das glicemias nos diferentes horários do dia. Esta análise inclui o estudo de amplitude, frequência e duração da flutuação glicêmica. Com isto, pode-se observar com maior precisão os riscos de hipo e hiperglicemia do paciente diabético, facilitando o tratamento. 3 / 8

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QUAIS CARACTERÍSTICAS PODEM SER AVALIADAS NA VARIABILIDADE GLICÊMICA? Na avaliação da variabilidade glicêmica de um paciente com diabetes sob MCG, algumas características podem ser analisadas: Tempo de glicemia no alvo: é o tempo em que se pretende manter a glicemia dentro de uma faixa-alvo estabelecida pelo médico para o paciente diabético. Na maioria dos pacientes, a faixa-alvo de glicemia é estabelecida entre 70 e 180 mg/dl (em alguns casos, de 70 a 140 mg/dl). Quanto maior o tempo na faixa-alvo, melhor o controle metabólico. Alguns trabalhos citam que, em pacientes com pelo menos 50% do tempo da glicemia na faixa-alvo, há correlação com hemoglobina glicada Com ou sem sintomas Alerta de risco para hipoglicemia clinicamente significativa Hipoglicemia Nível 2 < 54 mg/dl Com ou sem sintomas Hipoglicemia clinicamente significativa e requer atenção imediata Hipoglicemia Nível 3 Valor específico não definido Hipoglicemia severa Prejuízo cognitivo que requer assistência externa para recuperação Necessita de ajuda Tempo na Meta 70 a 180 mg/dl Tempo de permanência, em porcentagem, do indivíduo na meta glicêmica 5 / 8

Acima de 50% haverá correlação com HbA1c Acima da Meta Entre 180 e 250 mg/dl Condição acima da meta nível 1: Alto Severamente Alto > 250 mg/dl Condição acima da meta nível 2: Severamente alto Desvio Padrão < 50 mg/dl Avalia a variabilidade glicêmica Quanto maior o desvio padrão, mais instável é a glicemia Coeficiente de Variação Estável: Avalia variabilidade glicêmica Desvio padrão dividido pela média GLICOSE INTERSTICIAL Abaixo do alvo? ESTÁVEL? Ingerir CHO Bomba: alterar basal temporário e reavaliar em 15 minutos No alvo Ingerir CHO se?? ou sintomas Bomba: alterar basal temporário e reavaliar entre 30-60 minutos Acima do alvo Reavaliar entre 1-2h ou fazer bolus de correção (exceto?? ou último bolus Bolus de correção (exceto último bolus Bolus de correção (exceto Ingerir CHO se sintomas Bomba: alterar basal temporário e reavaliar entre 15 e 30 minutos Ingerir CHO se sintomas (e se comeu CHO pela última vez >15 minutos) Reavaliar Observar Reavaliar entre 30-60 minutos 6 / 8

último bolus 250 mg%) CONCLUSÕES A maioria dos pacientes ainda realiza o controle da glicemia pela ponta de dedo, seguindo também o acompanhamento da hemoglobina glicada. Porém, cada vez mais, o tema variabilidade glicêmica difunde-se na comunidade médica e entre os próprios pacientes, por conta das vantagens de uso dos sensores de glicemia no dia a dia dos diabéticos. Dentro em breve, haverá um maior leque de informações relacionadas ao tratamento do paciente na prática médica, e os profissionais terão de conhecê-los e saber como interpretá-los. A variabilidade glicêmica é uma dessas novidades nas quais precisamos prestar atenção. Até a próxima! REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS Automonitorização glicêmica e monitorização contínua da glicose Diabetes na prática clínica E-book 2.0 Sociedade Brasileira de Diabetes Módulo 3 Cap.1. Métodos para avaliação do controle glicêmico Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2017-18 pg 70-76. International consensus on use of continuous glucose monitoring Diabetes Care 2017; 40:1631-40. Practical implementation, education and interpretation guidelines for continuous glucose monitoring: a French position statement. Diabetes & metabolism 2018; 44:61-72. 7 / 8

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