Qual a melhor forma de se traçar o ângulo talocalcanear na radiografia em perfil do pé na criança?

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Artito Original Qual a melhor forma de se traçar o ângulo talocalcanear na radiografia em perfil do pé na criança? What is the best way to trace the talocalcaneal angle on the lateral radiographic view of the foot in children? Luiz Carlos Ribeiro Lara 1, Eduardo Junqueira Neves 2, Felipe Burjaili de Oliveira 2, Luiz Henrique Canaver Neto 2 Resumo Objetivo: Analisar o ângulo talo-calcanear (ATC), traçado de duas formas diferentes, na radiografia em perfil ortostático do pé. Métodos: Foram avaliados 162 pés, 90 pés normais e 72 pés tortos congênitos (PTCs) operados. As crianças foram divididas quanto à faixa etária, ao sexo e ao lado acometido. Medimos o ATC de duas maneiras, uma utilizando a intersecção das linhas que passam pelo longo eixo do tálus e do calcâneo (ATC1), e outra utilizando a intersecção da linha que passa pelo longo eixo do tálus com uma linha que une os pontos mais baixos da tuberosidade posterior do calcâneo e da articulação calcâneo-cuboide (ATC2). Realizamos a análise estatística pelo método de correlação linear de Pearson e método do qui-quadrado. Resultados: Houve diferença entre os valores angulares encontrados no ATC1 e ATC2 nos PTCs e nos pés normais, independente da faixa etária. Conclusões: O ATC diminuiu com o aumento da idade (correlação negativa) nos pés normais, por outro lado, nos PTCs operados do sexo masculino, este se elevou com aumento da idade (correlação positiva). Os valores médios dos ATC1 e ATC2 encontrados nos PTCs operados foram significativamente menores que nos pés normais. Não foi encontrada diferença estatística entre os valores dos ângulos ATC1 e do ATC2 na amostra em geral. As duas formas de se medir o ATC podem ser utilizadas. Descritores: Anormalidades congênitas; Pé/radiografia; Pé torto/cirurgia Abstract Objective: To analyze the talocalcaneous angle (TCA), traced in two different ways, in the orthostatic lateral radiographic of the feet. Methods: One hundred sixty-two feet were evaluated, 90 of normal children and 72 operated clubfeet. The children were divided according to age, sex, and laterality. The TCA was measured in two distinct ways, one using the the lines intersection of the long axis of the talus and calcaneous (TCA1), and another Correspondência Luiz Carlos Ribeiro Lara Avenida 9 de Julho, 453 CEP 12030-212 Taubaté (SP), Brasil Tel.: (12) 3621-2561/3653-3819 E-mail: luizrlara@hotmail.com Data de recebimento 22/10/2010 Data de aceite 30/03/2011 Trabalho realizado no Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Hospital Universitário de Taubaté da Universidade de Taubaté UNITAL Taubaté (SP), Brasil. 1 Professor Adjunto da Disciplina de Ortopedia e Traumatologia do Departamento de Medicina da Universidade de Taubaté UNITAU Taubaté (SP), Brasil. 2 Residentes do terceiro ano em Ortopedia e Traumatologia do Hospital Universitário de Taubaté da Universidade de Taubaté UNITAU Taubaté (SP), Brasil. Conflito de interesses: não há.

Qual a melhor forma de se traçar o ângulo talo-calcanear na radiografia em perfil do pé na criança? No período de 6 meses, em 2006, foram analisadas radiografias do pé, em perfil ortostático, de 92 crianças, divididas em 2 grupos. No primeiro grupo, 90 pés normais de 45 crianças, que foram medidos o ATC em ambos os pés e o segundo grupo de 72 PTC de 47 crianças, tratados cirurgicamente, nas quais apenas os pés acometidos foram medidos, de acordo com a lateralidade (uni ou bilateral). Foram considerados como pés normais, as crianças sem queixas clínicas, dor ou história de patologia pregressa em relação aos pés. Nos casos operados de PTC, duas técnicas de liberação das partes moles foram empregadas: liberação posteromedial e liberação posteromediolateral. Os exames foram realizados no Setor de Radiologia do Hospital Universitário. As radiografias dos pés foram realizadas com a criança de pé sobre uma banqueta na mesa de exame, protegidas com avental de chumbo. O filme foi colocado perpendicularmente à banqueta, com o raio incidindo em 90º, centrado na região do osso navicular (17). O ATC foi mensurado, na radiografia em perfil do pé, como descrito anteriormente (ATC1 e ATC2). As crianças foram agrupadas em três faixas etárias: dos 2 aos 4 anos, com 30 pés normais e 29 PTC; dos 5 aos 8 anos, 30 pés normais e 30 PTC; e dos 9 aos 12 anos, com 13 PTCs e 30 normais, totalizando assim, 72 PTC e 90 pés normais. Quanto ao sexo, 33 crianças com PTC eram do sexo masculino (70,2%) e 14 do feminino (29,8%). A deformidaof the long axis of the talus with the line that passes by the lowest point of the calcaneous posterior tuberosity and by the lowest point of the cuboid-calcaneous (TCA2). We have performed the statistical analysis by Pearson s linear correlation and the chi-square method. Results: There was a difference between the angular values found in the TCA1 and TCA2 in the clubfeet and in the normal feet, independent of age. Conclusions: The TCA decreased as age increased (negative correlation) in normal feet. On the other hand, in male clubfeet, it increased as age increased (positive correlation). The average values in the TCA1 and TCA2 found in the clubfeet were significantly lower than in normal feet. We did not find any statistical differences between the figures of the TCA1 and TCA2 angles in the samples, in general. The two manners to measure the TCA can be used. Keywords: Congenital abnormalities; Foot/radiography; Clubfoot/surgery INTRODUÇÃO O pé torto congênito (PTC) é uma das principais anomalias do aparelho locomotor. Na fase inicial de seu tratamento, a avaliação radiográfica, atualmente, tem pouca importância; entretanto, é utilizada para análise da evolução, resultados do tratamento e planejamento nas recidivas (1-5). É possível fazer a medição do ângulo talo-calcanear (ATC), também conhecido como ângulo de Kite (6), de duas formas na radiografia em perfil ortostático do pé. Alguns autores realizam a medição do ATC por meio da intersecção da linha que passa pelo longo eixo do tálus, com a linha que passa pelo longo eixo do calcâneo (ATC1) (3,5,7-10), como pode ser observado na Figura 1. Por outro lado, em outros estudos, a medição deste ângulo é realizada pela intersecção da linha, que passa pelo longo eixo do tálus, com a outra que une os pontos mais baixos da tuberosidade posterior do calcâneo e da articulação calcâneo-cuboide ATC2 (1,11-15) (Figura 1). ATC1: ângulo talo-calcaneano 1; ATC2: ângulo talo-calcaneano 2. Figura 1 - Demonstração das duas formas de medição do ângulo talo-calcaneano. No clássico livro Cirurgia Ortopédica de Campbell (16), as duas formas de medição são apresentadas, sem informar qual seria a mais adequada. O objetivo foi analisar o ATC, medido de duas formas distintas, nas radiografias dos pés em perfil ortostático e avaliar as possíveis diferenças entre eles confrontando os valores encontrados com dois grupos de pés. Analisamos comparativamente estes ângulos, medidos em crianças com faixas de idades variadas e relacioná-los com os sexos. MÉTODOS 16

Lara LCR, Neves EJ, Oliveira FB, Canaver Neto LH de estava presente bilateralmente em 25 crianças (59,5%) e unilateralmente, em 22. Em relação às crianças com pés normais, 20 eram do sexo masculino (44,4%) e 25 do feminino (55,6%). Os dois pés foram radiografados, totalizando 90 pés. Estatística As variáveis sexo, faixas etárias, ATC1 e ATC2 foram analisadas estatisticamente pelo método de correlação linear de Pearson. Utilizamos o método do qui-quadrado para avaliar se houve diferença significativa nas duas formas propostas para se traçar o ATC. Calculamos o valor do qui-quadrado e o grau de liberdade da amostra, correlacionando-os para um valor de p<0,05. RESULTADOS Com o aumento da idade, observamos tendência da diminuição do ATC, nas duas formas de medição e em ambos os sexos. Os valores médios do ATC2 foram maiores que o ATC1 em todos os grupos das faixas etárias e os sexos (Tabela 1). A diferença entre os valores de ATC1 e ATC2, relacionada com as várias faixas etárias, não mostrou significância, tanto nos PTC como nos pés normais (p>0,05). Nos pés normais, foi possível notar que os valores diminuiram ao se relacionar a idade com os ângulos ATC1 e ATC2, confirmando a tendência de diminuição do ângulo com o aumento da idade (Tabela 2). Na Tabela 3, observou-se que, ao se confrontar a idade com os ângulos ATC1 e ATC2 nos PTCs direito e esquerdo, os valores dos coeficientes de correlação linear foram positivos no sexo masculino. Entretanto, nos pés femininos, a maioria dos valores foi negativo, levando a acreditar que estes pés se comportariam como aos normais. Porém, a quantidade de pacientes femininos não permitiu uma análise significativa destes dados. DISCUSSÃO Quando o tema PTC é abordado, é possível se deparar com uma série de controvérsias, as quais vão desde sua etiopatogenia, classificação clínica, avaliação radiográficas, tratamento até a análise dos resultados. Talvez estas dúvidas expliquem o grande interesse dos ortopedistas por esta importante anomalia congênita. As análises radiográficas dos pés são utilizadas pela grande maioria dos autores que estudam esta patologia, mas parecem ser de pouca importância no início do tratamento (1-5), enquanto outros preconizam logo após o nascimento (11,14,15). O uso de métodos radiográficos para avaliação da evolução, resultados e análise das recidivas do PTC encontra Tabela 1 - Valores médios (em graus) dos ângulos talo-calcaneares (ATC1 E ATC2) dos pés normais, nos lados acometidos, sexos e grupos etários ATC 1 ATC 2 M F M F D E D E D E D E 2 a 4 anos 37,37 37,37 39 36,3 42,25 40,5 43,66 41,87 5 a 8 anos 31,83 33 33,7 34,8 37,5 46,6 40,2 48 9 a 12 anos 32 32,16 30,5 31 39,33 38,66 38,12 37,62 M: masculino; F: feminino; D: direito; E: esquerdo; ATC1: ângulo talo-calcaneano 1; ATC2: ângulo talo-calcaneano 2. Tabela 2- Valores médios (em graus) dos ângulos talo-calcaneares (ATC1 E ATC2) PTCs, nos lados acometidos, sexos e grupos etários ATC 1 ATC 2 M F M F D E D E D E D E 2 a 4 anos 21,91 22,2 21,2 30 27,7 11,18 27,8 33 5 a 8 anos 21 24,3 26 24 21,86 27,25 27,8 32,33 9 a 12 anos 24,6 16 32,5 18 41 30,25 30 22 M: masculino; F: feminino; D: direito; E: esquerdo; ATC1: ângulo talo-calcaneano 1; ATC2: ângulo talo-calcaneano 2. 17

Qual a melhor forma de se traçar o ângulo talo-calcanear na radiografia em perfil do pé na criança? Tabela 3 - Valores dos coeficientes de correlação linear (R), para ambos os sexos, obtidos ao confrontar a idade com os ângulos talocalcaneanos (ATC1 e ATC2), nos PTCs direito e esquerdo Masculino (R) ATC 1 Feminino (R) idade x ATC1 direito 0,17 0,34 idade x ATC1 esquerdo 0,02-0,78 idade x ATC2 direito 0,21-0,13 idade x ATC2 esquerdo 0,17-0,83 ATC1: ângulo talo-calcaneano 1; ATC2: ângulo talo-calcaneano 2; R: coeficiente de correlação linear. vários defensores na literatura (1,2,8,11,15), salientando a necessidade de uma técnica padronizada para execução do exame, a fim de se obter resultados confiáveis (11,17). Uma das medidas radiográficas mais utilizadas na avaliação dos resultados do tratamento do PTC é o ATC nas incidências anteroposterior e lateral do pé, com ênfase ao índice talo-calcâneas (11,13). No entanto, Carvalho Jr et al. (9) e Fridman (15) comentam que o ATC não parece ser um bom parâmetro para a análise dos resultados. Os autores deste artigo não pensam desta maneira e comparam duas formas de mensuração do ATC na radiografia lateral: ATC1, pelo longo eixo do calcâneo (3,5,7-10) ou ATC2, pela linha de inclinação do calcâneo (1,11-15). Simons, em estudo para avaliação radiológica no PTC (11), defende a medida do ATC2, comentando que devido ao grande invólucro cartilagíneo do calcâneo, o núcleo ósseo pode não representar o local exato do longo eixo, gerando alteração na medida deste ângulo (13,18). Notamos que o ATC2 mostrou valores maiores que o ATC1, porém sem significância estatística, evidenciando que ambas as medições podem ser utilizadas. O ATC1 e o ATC2 se correlacionaram positivamente em ambos os grupos de pés, quando o ATC1 aumentou, o mesmo ocorreu com o ATC2, o que permite o emprego indiscriminado de cada uma destas medidas como efetivas para análise do ATC. Prado Jr et al. (19) encontraram um valor médio do ATC2, em pés normais de crianças na faixa etária de 8 a 13 anos (43,9º para meninos e 41,1º para meninas). Diferentemente deste estudo, em que os valores foram menores, 38,9º para os meninos e 37,8º, para as meninas. Observamos que os ATC1 e ATC2, quando comparados com as faixas de idades das crianças com pés normais, apresentaram tendência de diminuição conforme o aumento da idade, fato este também relatado na literatura (16,19,20). Entretanto, nos meninos portadores de PTC, notamos aumento do ATC com o avançar da idade. Em relação aos pacientes com PTC operados, a média dos valores do ATC foi menor que as crianças com pés normais, como observado por Fridman (15). Na literatura, existem muitos trabalhos que analisam e valorizam o ATC na incidência em perfil (6,8,10,11,13,15). Entretanto, não foram encontrados estudos confrontando os valores destes ângulos com diferentes formas de medições diferentes. Desta maneira, não é possível comparar os resultados deste estudo com a literatura. Os resultados mensurados no ATC1 e ATC2 não foram semelhantes, mas mantiveram correlação positiva tanto nos pés normais como nos PTC tratados. O principal objetivo no tratamento do PTC é ter pés plantígrados, funcionais e flexíveis. Nem sempre as medidas radiográficas acompanham os resultados clínicos, talvez pela complexidade desta patologia, mas mesmo assim, acreditamos ser importante parâmetro na avaliação dos resultados do PTC. CONCLUSÕES O ATC diminuiu com o aumento da idade (correlação negativa) nos pés normais, por outro lado, nos PTC do sexo masculino, este aumenta com a idade (correlação positiva). Os valores médios dos ATC1 e ATC2 encontrados nos PTC foram significativamente menores que nos pés normais. Não encontramos diferença estatística entre os valores dos ângulos ATC1 e do ATC2 na amostra. Ambas as formas de medir o ATC no perfil podem ser utilizadas. Referências 1. Adames MK, Fialho HSA, Kuwajima SS. Protocolo clínico e radiográfico para avaliação de pacientes portadores de pé eqüino varo congênito após tratamento conservador. Rev Bras Ortop. 2001;36(6): 206-11. 2. Santin RAL, Hungria Filho JS. Pé torto congênito. Rev Bras Ortop. 2004;39(7):335-56. 3. Rab GT. Pediatric orthopaedic surgery. In: Skinner HB. Current diagnosis and treatment in orthopedics. New York: McGraw-Hill; 2003. p. 606-7. 4. Rab GT, Salamon PB. Congenital deformities of the foot. In: Chapman MW. Chapman s orthopaedic surgery. Philadelphia: Lippincott Willians & Wilkins; 2001. p. 4260. 18

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