Sociedade Brasileira de Educação Matemática Regional Espírito Santo X Encontro Capixaba de Educação Matemática Metodologias para o ensino de Matemática na Educação Básica: debates para compreender e intervir O USO DO MATERIAL DOURADO E DO QUADRO VALOR DE LUGAR (QVL) NO ENSINO DE MATEMÁTICA: UM ESTUDO COM PROFESSORES DAS SÉRIES INICIAS Renan Oliveira Altoé¹, Thamires Belo de Jesus², Maria Laucinéia Carari³ ¹Instituto Federal do Espírito Santo, renan_altoe@hotmail.com 2 Instituto Federal do Espírito Santo, thamiresbelo@yahoo.com.br 3 Instituto Federal do Espírito Santo, maria.carari@ifes.edu.br Resumo: O objetivo deste trabalho é apresentar a importância do Material Dourado e do Quadro Valor de Lugar (QVL) como ferramentas pedagógicas no ensino e na aprendizagem de matemática, bem como verificar se são utilizados por professores das Séries Inicias da Educação Básica da Rede Pública. Concluímos, em nossos estudos, que esses recursos possibilitam diversificar o ensino das Operações Básicas (Adição, Subtração, Multiplicação e Divisão), a prática docente e o ambiente escolar, despertando e estimulando também outras capacidades e habilidades motoras, visuais e intelectuais. Os dados coletados por meio de questionário semiaberto indicaram que os professores pedagogos com especialização tinham conhecimento dos recursos didáticos, entretanto, nem todos faziam uso em sala de aula. Os professores de Curso de Normal Superior ou Magistério também especialistas não conheceram os instrumentos em seus cursos, entretanto, passaram a conhece-los no ambiente escolar através de trocas de experiências com demais profissionais da área, onde passaram a utilizá-los. Nesse sentido, percebemos que não é somente a Formação Inicial que define os conhecimentos de um profissional, mas sim, a procura por Curso de Aperfeiçoamento e trocas de experiências em formação continuada. Palavras-chave: Material Dourado. Quadro Valor de Lugar (QVL). Ensino e Aprendizagem. Séries Iniciais. INTRODUÇÃO Na Formação Inicial de Professores são contínuas as discussões a respeito de diferentes recursos didáticos e metodologias que possibilitem enriquecer a prática docente, e, consequentemente, o ensino e a aprendizagem de matemática. As ferramentas inseridas em sala de aula possuem papeis diferenciados, oportunizando a construção de diferentes pensamentos e processos de aprendizagem. Mesmo com uma diversidade de materiais concretos presentes no âmbito escolar, alguns professores ainda desconhecem a importância de certos recursos didáticos. Nesse sentido, este trabalho objetiva discutir a importância do Material Dourado e do Quadro Valor de Lugar (QVL) como ferramentas pedagógicas no Ensino e na Aprendizagem de Matemática. Buscamos também verificar se alguns docentes atuantes nas Séries Iniciais da Educação Básica da Rede Pública conhecem tais recursos e se os utilizam em suas aulas de matemática. MATERIAIS MANIPULATIVOS NO ENSINO E NA APRENDIZAGEM DE MATEMÁTICA Para Berman (1982) os materiais manipulativos são objetos concretos que quando manipulados ou utilizados pelos discentes e pelo professor, ajudam a atingir certos objetivos na aprendizagem.
2 Tendo em vista que o pensamento matemático deve começar a ser construído nas primeiras séries do Ensino Fundamental, para Santos, Oliveira, C. e Oliveira, G. (2013, p. 2) A matemática está entre as principais matérias para a formação do aluno e da sociedade, pois estabelece uma relação entre o cotidiano e a vida social, no entanto, é fundamental que os alunos tenham contato com a matéria a partir das séries iniciais. Entretanto, Santos, Oliveira, C. e Oliveira, G. (2013, p. 3) destacam os seguintes aspectos sobre a atual situação do ensino de matemática: A matemática tem sido trabalhada de forma bastante empobrecedora, onde fórmulas e regras são mecanicamente aplicadas, bem como exercícios com base em modelos prédefinidos, repetidos e treineiros. Raramente são utilizadas linguagens e metodologias diferenciadas e eficazes para o ensino de matemática. É importante que as crianças compreendam os conceitos básicos da matemática, sejam através de registros de representação ou materiais manipulativos. Os conceitos matemáticos precisam de significados. Para Santos, Oliveira, C. e Oliveira, G. (2013) as crianças, em certo estágio de aprendizagem, necessitam manipular objetos concretos para descobrir e entender conceitos matemáticos que estão sendo ensinados. Segundo Lorenzato (2006) o professor deve saber utilizar corretamente os materiais didáticos, pois estes exigem conhecimentos específicos de quem os utiliza. Não se pode deixar que o material se tornasse apenas um brinquedo para o aluno (p. 56). Alguns educadores que atuam nas Séries Iniciais, ao fazerem uso de algum material concreto, coloca-o na frente da criança, sem mesmo explicar o que será feito com ele ou para que servirá. Assim, preocupada, Berman (1982) alerta que os materiais manipulativos por si só não garantirão o desenvolvimento do conceito. São instrumentos importantes que auxiliam as crianças a entenderem certos conceitos da matemática. O entendimento depende de ações e de atividades que auxiliem essa compreensão. Ainda para a autora, aprender a usar os materiais manipulativos não é a mesma coisa que aprender matemática. Os materiais manipulativos precisam ser usados de maneira correta e no tempo certo. Existem, porém, riscos quanto ao uso dos materiais concretos. Ao planejar uma determina aula de matemática, auxiliada por um material concreto, o professor deve entender que normalmente sua utilização é de forma livre. O educador deve ter bastante ciência dos rumos que podem levar a má utilização dos materiais, correndo o risco da atividade atingir dimensões não imaginadas, perdendo o sentido da sua utilização (FREITAS, 2004). Existem diversos materiais manipulativos, onde podemos destar: o Ábaco, O Material Cuisenaire, o Quadro Valor de Lugar (QVL) ou Cartaz
3 Valor de Lugar (CAVALU), o Geoplano, o Tangram e o Material Dourado. Será discutido neste trabalho somente a utilização do Material Dourado e do QVL. Além disso, a maioria dos materiais concretos adaptam-se a vários conteúdos, objetivos e a turmas de diferentes idades. Eles despertam a curiosidade, estimulam o aluno a fazer questionamentos, a descobrir diferenças e semelhanças, a criar hipóteses e a chegar às próprias soluções, enfim a se aventurar pelo mundo da matemática de maneira leve e divertida (SANTOS, OLIVEIRA, C. e OLIVEIRA, G., 2013, p. 11). Assim, vemos que os materiais concretos podem possibilitar a significação dos conceitos a serem aprendidos, além de poder tornar o processo de ensino e de aprendizagem em momentos de construção, elaboração, sistematização, apropriação dos saberes matemáticos, tudo de maneira divertida e dinâmica. CONHECENDO O QUADRO VALOR DE LUGAR (QVL) O Cartaz Valor Lugar (CAVALU), comumente conhecido como Quadro Valor de Lugar (QVL), é um instrumento de ensino e de aprendizagem de matemática, e quando utilizado pelos professores, auxilia na introdução dos conceitos de unidade, dezenas e centenas, facilitando a compreensão dos processos de contagem, formação dos números e operações matemáticas. Sua utilização nas aulas de matemática se deve à alguns fatores, dentre eles o baixo custo; facilidade em sua criação e montagem; fácil utilização e manuseio e contribuição para um bom desenvolvimento das operações aritméticas. Para sua construção utiliza-se geralmente 1(uma) unidade de papel cenário, efetuando-se no próprio, dobras (separações verticais) com o intuito de obter espaços que comportarão objetos, como palitos de picolé, canudos, dentre outros. A idealização dessa ferramenta pode ser vista na Figura 1 apresentada abaixo. Figura 1: Quadro Valor de Lugar (QVL)
4 Fonte: Arquivo do pesquisador Por ser um material de fácil confecção, cada aluno pode confeccionar o seu próprio QVL e ainda exercitar a autonomia na construção dos diversos conceitos da aritmética. Dessa maneira, para representar qualquer número no QVL, basta utilizar palitos de picolé, canudinhos, varetas, dentre outros materiais, que representarão as quantidades a serem simbolizadas no QVL. A Figura 2 ilustra o número 124 no QVL, representado por 1 centena + 2 dezenas + 4 unidades. Figura 2: A representação do número 124 no QVL. Fonte: Arquivo do pesquisador CONHECENDO O MATERIAL DOURADO Com o auxílio do Material Dourado, as relações numéricas abstratas passam a adquirir uma imagem concreta, que tende a possibilitar a compreensão do que se faz implicitamente no processo de resolução das Operações Básicas. Além disso, o uso destes materiais torna a aprendizagem mais agradável e dinâmica. Ao iniciar as investigações acerca das Operações Básicas nas Séries Inicias e com o uso do Material Dourado como ferramenta metodológica, deve-se destinar um tempo para que as crianças possam explorar livremente tais materiais. Este importante momento pode possibilitar a compreensão da forma e os tipos de peças que serão exploradas. Por meio da investigação, professor e alunos podem constatar que o Material Dourado é constituído por Cubinhos, Barras, Placas e o Cubão, conforme mostra a Figura 3. Figura 3: Material Dourado e suas peças Fonte: Arquivo do pesquisador
5 Fazendo uma análise da figura acima, o cubão é formado por 10 placas, a placa é formada por 10 barras e a barra por 10 cubinhos. A Figura 4 traz a representação do número 236 através do Material Dourado. Figura 4: Representação do número 236 com o Material Dourado Fonte: Arquivo do pesquisador Utilizando o Material Dourado em sala de aula, Freitas (2004) afirma que em pouco tempo, os professores poderão enriquecer sua prática docente, criando novas atividades adequadas aos seus alunos, nas quais se poderá explorar as inúmeras possibilidades desse recurso didático. Ressalta ainda que os próprios educandos ao brincarem com o Material Dourado poderão aprender conceitos primitivos da matemática. A PESQUISA... Trata-se de um estudo em uma abordagem qualitativa com caráter exploratório. A pesquisa foi realizada com professores que ensinam matemática em escolas da Rede Pública de Ensino. Na busca por respostas referente a inserção do Material Dourado e do Quadro Valor de Lugar (QVL) nas aulas de matemática, analisamos os questionários respondidos por 15(quinze) professores das Séries Iniciais da Educação Básica da Rede Pública. Para manter a identidade dos participantes, os mesmos foram identificados por P1, P2, P3, P4,... P15. Os professores foram selecionados com base nos seguintes critérios: ser professor das Séries Iniciais e ser professor da Rede Pública. Além disso, a participação dos professores ao responderem os questionários se deu de forma voluntária. Quando indagados a respeito da Formação Acadêmica atual, exatamente 80% dos professores responderam serem Pedagogos e Pós-graduados a nível Lato Sensu. Os demais docentes eram Magistrados ou possuíam o Curso de Normal Superior, acrescidos, também, de Pós-graduação.
6 A Formação Inicial é o pilar da prática docente. É na Graduação que o professor aprende as primeiras concepções do fazer docente, do ser professor e de como promover a aprendizagem. Assim, do total de 12(doze) professores pedagogos especialistas, a metade afirmou ter vivenciado o Material Dourado e o QVL no Ensino Superior por meio de disciplinas de Laboratório, e, os outros 6(seis) presenciaram na Pós-graduação. Os 3(três) docentes especialistas e que frequentaram Cursos de Normal Superior ou Magistério afirmaram não terem ouvido falar enquanto frequentavam o curso. O professor pode conhecer o Material Dourado e o QVL mas pode também não saber utilizá-los. Assim, do total de 80% dos pedagogos especialistas, precisamente 5(cinco) docentes afirmaram saber manuseá-los e os usam em sala de aula e os 7(sete) restantes, mesmo já tendo contato com tais materiais na Graduação ou na Especialização, afirmaram não saber utilizá-los ou nunca se interessaram. Os professores com formação de Curso de Normal Superior ou Magistério afirmaram já terem ouvido mencionar a respeito desses recursos didáticos, porém não em cursos, mas, enquanto trocavam experiências com demais profissionais da área nos ambientes escolares e com o tempo passaram a utilizá-los. A respeito da utilização em sala de aula e de que forma os profissionais ensinam as Operações Básicas, apresentaremos algumas das respostas que explicam passo a passo o processo utilizado pelos docentes. O professor P1 afirma que Primeiramente, ensino as crianças a separar as peças de objetos conforme a quantidade. Por exemplo: 1 tampinha, representa 1 unidade. 10 tampinhas, representam 1 dezenas e 100 tampinhas, representam 1 centena. Depois de aprendido essa separação, mostro a criança o que é um QVL e ensino a colocar as tampinhas em seus determinados lugares (Professor P1, em setembro/2011). Acerca dos procedimentos utilizados pela professora P1, Piaget (1998) afirma que a criança começa a realizar as operações aritméticas valendo-se da manipulação de objetos (contas, pedrinhas, sementes, etc.). Essa experiência com materiais concretos é o que permite compreender os primeiros significados dos números e formas. Já para P5 Introduzo-as sempre com materiais concretos (pedaços e EVA, tampinhas, etc.). Depois ensino as seguintes noções: Adição = juntar, ganhar, adquirir mais... Subtração = perder, ficar com menos, quebrar... Multiplicação = juntar 2, 3, 4... vezes o que tem... Divisão = repartir em partes iguais a quantidade que se tem (Professor P5, em setembro/2011). A respeito dos aspectos apresentados pela professor P5 ao ensinar as operações básicas, Santos, Oliveira, C. e Oliveira, G. (2013) afirmam que os materiais concretos permitem que as crianças
7 realizem as contas internamente, raciocinando de forma abstrata e produzindo certo conhecimento matemático. Outros docentes como P6 e P10 relatam que Faço uma aula expositiva, apresentando os cubos, unidade, dezena e centena, e com material concreto: palitos de picolé, posiciono cada valor em sua casa no QVL, mostrando quando um número é unidade e se torna dezena ou centena (Professor P6, em setembro/2011). Desenho no quadro o QVL. Após escrevo um número dentro do QVL, separando-o por casas e unidades. Em seguida desenho outro QVL e exemplifico o mesmo número com as peças do Material Dourado, assim, mostra que cada cubinho representa 1 unidade, 1 barra representa 10 unidades e 1 placa representa 100 unidades. Quando acontece a transformação de unidades durante a soma ou subtração, ensino a criança a transformar e agrupar as casas e não a vai um ou pegar emprestado (Professor P10, em setembro/2011). Por fim, os relatos das professoras P6 e P10 vão ao encontro das palavras proferidas por Santos, Oliveira, C. e Oliveira, G. (2013) a medida que os autores afirmam que a importância do uso de materiais manipulativos não significa que basta colocar na frente de uma criança diversos objetos de contagem para que ela passe a compreender um determinado conteúdo. O entendimento depende de ações pedagógicas com os materiais concretas propostas pelo professor que auxiliem essa compreensão. Nesse sentido, as intervenções realizada pelos professores P6 e P10 dão um sentido mais completo as investigações realizadas com o auxílio dos recursos didáticos. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao longo deste trabalho, procuramos apresentar de maneira suscita, algumas concepções a respeito da importância e da inserção dos materiais manipuláveis em sala de aula, bem como o pensamento de autores a respeito desses recursos no ensino e na aprendizagem de matemática. A respeito da importância desses instrumentos pedagógicos em sala de aula, foi possível concluir que os mesmos possuem um papel importante na concretização dos conhecimentos matemáticos, conduzem ao raciocínio lógico, despertam a curiosidade, incentiva o aluno a fazer questionamentos, a descobrir diferenças e semelhanças, a criar hipóteses e a chegar às próprias soluções. As análises dos questionários indicaram que alguns professores conheceram esses recursos na Graduação e outros na Especialização. Entretanto, mesmo conhecendo-os, alguns fazem uso
8 desses instrumentos em sala de aula, já outros não. Uma pequena parte nunca ouviu falar enquanto cursaram o Normal Superior ou o Magistério, mas afirmaram terem conhecimento dos recursos dentro do ambiente escolar, através de troca de experiências com demais professores, onde passaram a utilizá-los em suas aulas. Nesse sentido, percebemos que não é somente a Formação Inicial que define os conhecimentos de um profissional, mas sim, a procura por Curso de Aperfeiçoamento e trocas de experiências. Cabe ressaltar que todos os professores entrevistados de alguma forma utilizam materiais concretos para ensinar as Operações Básicas, seja o Material Dourado ou outros instrumentos. No entanto, os professores P6 e P10 apresentaram e seus relatos caminhos e procedimentos de ensino mais investigativos que os demais professores, demonstrando maior domínio em utilizar corretamente o Material Dourado e o QVL ao ensinar as Quatro Operações Básicas. REFERÊNCIAS BERMAN, B. Como as crianças aprendem Matemática: redescobrindo os materiais manipulativos. Tradução do artigo: How children learn math: manipulatives publicado na Curriculum Review, volume 21, nº 2, de maio de 1982. DALTOÉ, Karen; STRELOW, Sueli. Trabalhando com Material Dourado e Blocos Lógicos nas Séries Iniciais. Disponível em: http://www.cp.utfpr.edu.br/armando/adm/arquivos/pos/material_dourado.pdf. Acesso em: 12 Jun 2012. FREITAS, R. C. de O. Um ambiente para operações virtuais com o material dourado. Dissertação de Mestrado. Brasil: Vitoria, 2004. GÉRARD, F. M, ROEGIERS, X. (1993) - Concevoir et évaluer des manuels scolaires. Bruxelas. De Boeck - Wesmail (tradução Portuguesa de Júlia Ferreira e de Helena Peralta, Porto: 1998) LORENZATO, Sérgio. Laboratório de Ensino de Matemática na Formação de Professores. Campinas: Autores Associados, 2006. (Coleção Formação de Professores). MIRANDA, A. C.; SOLINO, A. S. Educação continuada e mercado de trabalho: um estudo sobre os bibliotecários do Estado Rio Grande do Norte. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=s141399362006000300007&lng=pt&nr m=iso>. Acesso em: 04 Julh 2012. PIAGET, Jean. A psicologia da criança. Ed. Rio de Janeiro: Bertrand, 1998 SANTOS, A. O.; OLIVEIRA, C. R.; OLIVEIRA, G. S. de. O uso do material concreto na construção do conhecimento matemático nas séries iniciais do ensino fundamental. Anais do II Seminário de Escrita e Leitura em Educação Matemática. São Paulo, 2013. p. 1-14.