CORRELATOS PSICOLÓGICOS EM PROFISSIONAIS QUE TRABALHAM COM PESSOAS COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL



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Transcrição:

CORRELATOS PSICOLÓGICOS EM PROFISSIONAIS QUE TRABALHAM COM PESSOAS COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL LUÍS CARLOS PEREIRA MARTINS Orientadora: Professora Doutora Mariana Marques Coimbra, 2012

PRESSUPOSTOS Exigência do trabalho diário com pessoas portadoras de deficiência intelectual é extremamente desgastante quer do ponto de vista físico quer psicológico. Stress Exaustão Emocional Despersonalização Satisfação Profissional (Devereux, Hastings, & Noone, 2009; Devereux, Hastings, Noone, Firth & Totsika, 2009, Gray-Stanley & Muramatsu, 2011, Hatton, Rivers, Mason, Mason, Kiernan, Emerson, Alborz & Reeves, 1999; Jenkins, & Elliott, 2004; White, Edwards, & Townsend-White, 2006).

OBJETIVOS Objetivo principal: caraterizar os profissionais de duas instituições que trabalham com pessoas com deficiência intelectual em diferentes correlatos psicológicos: stress, personalidade, burnout, estratégias de coping e sintomatologia psicopatológica. Para além disto, pretendemos explorar associações entre estes correlatos e diferentes variáveis sociodemográficas/profissionais (avaliadas através de um questionário administrado aos profissionais).

INSTRUMENTOS Questionário Sociodemográfica características pessoais (sexo, idade, escolaridade, etc.); 23QVS (Vaz Serra) Vulnerabilidade ao Stress; IPE-12 (Inventário Personalidade de Eysenck, versão reduzida) Traços da Personalidade; Burnout (Inventário de Burnout de Maslach - MBI) Dimensões de Burnout; Brief Cope (Pais Ribeiro e Rodrigues) Estilos e Estratégias de Coping; BSI (Canavarro) Sintomatologia Psicopatológica.

A amostra incluiu 68 sujeitos, com idades compreendidas entre os 19 e os 62 anos (M( = 36.3; DP = 11.65), sendo 57 do sexo feminino e 11 do sexo masculino. A recolha de dados foi realizada em duas instituições de forma voluntária por parte dos inquiridos. Metodologia

CONCLUSÕES De um modo geral os resultados deste estudo vão ao encontro do que está descrito na literatura no que se refere às consequências para a saúde Apresenta vulnerabilidade ao stress Níveis moderados de burnout Amostra de cuidadores Sintomatologia psicopatológica superior à da amostra da população geral apresentada por Canavarro (1995) Personalidade apresentam níveis moderados de neuroticismo e extroversão Estratégias de coping: o coping activo, o planear, a reinterpretação positiva, a aceitação, a utilização do suporte instrumental, a utilização do suporte emocional e a expressão de sentimentos

CONCLUSÕES Os fatores de stress identificados na literatura são: - O excesso de horas de trabalho; Stress laboral (elemento central/apresenta relações significativas com todas as variáveis) - A fraca participação nas decisões; - A baixa posição na hierarquia organizacional; - Falta de suporte dos supervisores e colegas de trabalho; - Conflito família-trabalho e ambiguidade de papéis laborais; (Gray-Stanley & Muramatsu, 2011; Hatton, Rivers, Mason, Mason, Kiernan, Emerson Reeves, 1999).

CONCLUSÕES A realização pessoal Vulnerabilidade ao stress Neuroticismo e com as dimensões exaustão emocional e despersonalização do burnout Também Gray-Stanley & Muramatsu (2011) obtiveram resultados similares, mas no seu caso a associação entre stress e burnout dependia do tipo e nível de stress. Estes autores descobriram que o excesso de trabalho (work overload) desempenhava um importante papel nesta relação.

CONCLUSÕES É positivo verificar que os profissionais com maiores níveis de extroversão apresentam menores níveis de exaustão emocional. Estes profissionais são aqueles que também usam mais o humor como estratégia de coping. Já os profissionais com valores superiores de neuroticismo recorrem mais ao uso de substâncias. Estes resultados vão ao encontro do descrito por Ruth Keil (2004) A relação entre o stress laboral e o burnout é recorrentemente motivo de investigação, sendo frequentemente referida na literatura (Gray-Stanley & Muramatsu, 2011; Innstrand, Espness & Mykletun, 2004; Jenkins & Elliott, 2004; White, Edwards & Townsend-White, 2006). Interessante é verificar que a níveis elevados de burnout associam-se também níveis significativos sintomatologia psicopatológica. Infelizmente, não encontramos referências diretas a esta relação na literatura, pelo que consideramos que este seria um tema interessante a tratar em futuras investigações.

CONCLUSÕES Aumenta também a utilização de determinadas estratégias de coping: O uso de suporte instrumental; À medida que a vulnerabilidade ao stress aumenta A autodistração; o desinvestimento comportamental. Por outro lado, o planear surge associado à dimensão perfeccionismo e intolerância à frustração da vulnerabilidade ao stress. Este resultado parece confirmar a hipótese de que esta relação entre o stress e as estratégias de coping é fortemente mediada pelas características de personalidade (Heth & Somer, 2002; McCrae & Costa, 1997). Todas as dimensões do BSI apresentam uma relação positiva com vulnerabilidade ao stress.

CONCLUSÕES Vulnerabilidade ao stress (carência de apoio social); O burnout ( menos realização pessoal); Idade influencia Estratégias de coping (suporte emocional e o desinvestimento comportamental); os mais velhos utilizam mais a negação A literatura é contraditória ria no que se refere à importância das qualificações académicas/profissionais

CONCLUSÕES Os profissionais com baixo grau de escolaridade (ensino básico) b apresentam: Maior vulnerabilidade ao stress ao nível n da subjugação; Utilizam estratégias de coping diferenciadas (negação e ao humor); Apresentam maior somatização; Os profissionais mais qualificados utilizam o planeamento, o suporte emocional e o desinvestimento comportamental. A formação sobre a deficiência mental revelou ser um importante fator de proteção da saúde mental dos profissionais. Os cuidadores que receberam formação apresentam menor depressão e psicoticismo. Este resultado sugere que a informação sobre a deficiência intelectual e a formação profissional são elementos a ter em conta em qualquer programa de intervenção junto dos profissionais de saúde mental (Innstrand, Espnes & Mykletun,2004).

ESTUDOS FUTUROS E LIMITAÇÕES Estudos futuros Estudos procurassem integrar, para além m do conhecimento dos próprios prios profissionais envolvidos, programas de intervenção (como jáj referidos de prevenção ou psicoterepêuticos) que permitissem minorar as consequências que as exigências profissionais têm sobre a saúde mental e física f dos cuidadores. Uma das limitações do estudo prende-se com a escassa literatura sobre esta temática tica em profissionais que trabalham com pessoas com deficiência intelectual em Portugal, o que impediu comparações mais aprofundadas dos resultados agora obtidos. O reduzido tamanho da amostra impede que ela seja representativa a da população de profissionais de saúde e a generalização destes resultados. No futuro seria interessante recolher uma amostra de maior dimensão e representativa da população portuguesa, explorando este tema, com elevada relevância.

DE UM MODO GERAL: - Maiores traços neuroticismo; - Exaustão emocional; Os profissionais com maior vulnerabilidade ao stress são aqueles que apresentam - Despersonalização; - Sintomatologia psicopatológica; - Revelam menor realização pessoal; - Os profissionais mais novos; - Grau de escolaridade; - O excesso de horas de trabalho está diretamente associado à vulnerabilidade ao stress e à sintomatologia psicopatológica.

DE UM MODO GERAL: O presente estudo confirma que os profissionais que trabalham com pessoas portadores de deficiência mental apresentam: Maior risco de sofrer deburnout, sintomatologia psicopatológica, recorrendo também m a estratégias menos adaptativas de coping. É urgente implementar medidas de intervenção (preventivas ou terapêuticas) no sentido de aliviar o stress destes profissionais, melhorando a sua saúde mental.