UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E TECNOLOGIAS CAMPUS XIX CURSO DE BACHARELADO EM CIÊNCIAS CONTÁBEIS

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Transcrição:

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E TECNOLOGIAS CAMPUS XIX CURSO DE BACHARELADO EM CIÊNCIAS CONTÁBEIS RESUMO: A conceituação de governabilidade e governança, da sua relação entre si e com o conjunto da reforma do Estado e do seu aparelho. LUCAS OLIVEIRA ALMEIDA CAMAÇARI 2016

ARAÚJO, Vinícius de Carvalho. A conceituação de governabilidade e governança, da sua relação entre si e com o conjunto da reforma do Estado e do seu aparelho. Brasília: ENAP, 2002. Lista de Abreviaturas utilizadas no resumo: MARE Ministério da Administração e Reforma do Estado. OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. PDRAE Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Introdução geral O artigo ora em resumo tem dois objetivos principais: (1) introduzir o leitor às principais abordagens feitas aos conceitos de governabilidade e governança disponíveis nas literaturas nacional e internacional contemporâneas e (2) buscar compreender o vínculo dinâmico destas categorias entre si e a sua articulação com a temática maior da reforma do Estado e do seu aparelho no Brasil. O artigo apresenta quatro tópicos principais: (1) Introdução, (2) Governabilidade/governança sob uma perspectiva teórica, (3) Tipologias (este subdividindo-se em 3.1 Tipologia de Bresser Pereira, 3.2 Tipologia de Eli Diniz, 3.3 Tipologia de Caio Marini e 3.4 Comparação entre as tipologias) e (4) Considerações Finais. Contando, também, com três tópicos extras como o de (1) Notas, composto por dezessete notas feitas pelo autor relacionadas ao conteúdo do texto; o de (2) Anexo, apresentando um Quadro comparativo das tipologias de governabilidade /governança através de quatro variáveis, quais sejam, Autores/Itens, Governabilidade, Governança e Traço/Distintivo; e o de (3) Referências bibliográficas. Para cumprir com os objetivos propostos, objetivos estes já mencionados inicialmente no presente resumo, Araújo expôs três tipologias teórico-conceituais diferentes extraídas de obras de três importantes autores nacionais da área, criando a partir disto um quadro referencialcomparativo claro que torne possível avaliar qual é a relação entre governabilidade e governança, e entre estes dois conceitos com o restante da reforma do Estado e de seu aparelho no Brasil. Introdução às tipologias A primeira tipologia é a de Luiz Carlos Bresser Pereira, autor do PDRAE, ex-ministro da Fazenda (1987-88) e da Administração e Reforma do Estado (1995-98), sendo, portanto, uma das principais referências hoje na área, não só no Brasil como também em toda a América Latina. Sua obra é considerada por muitos outros autores como uma verdadeira síntese das principais tendências mundiais sobre a reforma do Estado, em especial das reformas administrativas realizadas nos países-membros da OCDE. A segunda tipologia é a de Eli Diniz, professora titular de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e pesquisadora do Instituto Universitário de Pesquisas do Estado do

Rio de Janeiro. Diniz apresenta uma tipologia própria de governabilidade/governança, vinculada sobretudo com a institucionalização e consolidação do regime democrático no Brasil e com o processamento das demandas provenientes da sociedade civil ao longo do recente período de democratização. A terceira tipologia é a de Caio Márcio Marini Ferreira, ex-diretor da Secretaria da Reforma do Estado vinculada ao antigo MARE e diretor do Serviço Federal de Processamento de Dados. Marini apresenta uma tipologia curiosa de governabilidade/governança, envolvendo-as com a experiência internacional de algumas reformas administrativas e fazendo uma análise direta do PDRAE. Revisão teórica governabilidade/governança Os conceitos de governabilidade e governança existiram de forma embrionária no surgimento dos Estados modernos do século XIX (democracia liberal-burguesa), contudo apenas em um período mais recente é que começaram a integrar o debate nos meios acadêmico e político. A primeira citação dos conceitos de governabilidade e governança atribui-se, via de regra, a Samuel Huntington, um cientista político norte-americano contemporâneo, com referência aos anos 60. Somente após a crise do Estado nos anos 70 e o aprofundamento do processo de internacionalização das economias (globalização) estes termos passaram a constar com maior frequência nos papers da área. Como a maior parte dos conceitos em ciência política, a governabilidade/governança não possuem uma definição muito clara e precisa, variando de autor para autor segundo determinadas variáveis como, por exemplo, nacionalidade e orientação ideológica. Em uma definição genérica, pode-se dizer que a governabilidade refere-se às próprias condições materiais de exercício do poder e de legitimidade do Estado e do seu governo derivadas da sua postura diante da sociedade civil e do mercado. A fonte principal da governabilidade são os cidadãos e a cidadania organizada, a partir da capacidade de articulação em partidos, associações e demais instituições representativas. A governança, por sua vez, em geral é entendida como a capacidade financeira, gerencial e técnica que um determinado governo tem para formular e implementar as suas políticas. A fonte principal da governança são os próprios agentes públicos ou servidores do Estado que possibilitam a formulação/implementação correta das políticas públicas. Por esta distinção, de que a governabilidade possui um caráter material, e a governança caráter instrumental, esta relaciona-se de forma mais direta com a reforma do aparelho (financeira, administrativa e técnica), e aquela relaciona-se mais diretamente com a reforma do Estado (relações Estado-sociedade, Estado-mercado e entre os poderes ou funções do estado). Tipologias Bresser Pereira. O texto da PDRAE (1995) afirma que o Estado brasileiro e o seu governo de então não careciam de problemas de governabilidade, mas sim de governança. Isto significa que o governo, apesar de considerado legítimo e contando com apoio partidário-parlamentar, possuía pouca capacidade de formular/implementar as políticas públicas devido à rigidez e ineficiência do aparelho burocrático do Estado.

Para Bresser Pereira (1998, p.33) 1, a governabilidade e a governança são conceitos maldefinidos, frequentemente confundidos. A governabilidade é uma capacidade política de governar derivada da relação de legitimidade do Estado e do seu governo com a sociedade; governança é a capacidade financeira e administrativa, em sentido amplo, de um governo implementar políticas. Quanto à ligação com a reforma do Estado e de seu aparelho, esta tipologia destaca a relação governança-aparelho e governabilidade-estado. Eli Diniz. Esta autora adota como principal objeto de análise a reforma do Estado no Brasil, destacando a transição de um regime autoritário para o democrático, sendo esta transição considerada parte de todo um processo maior de fortalecimento da governabilidade por meio da consolidação/institucionalização da democracia em si e da incorporação de setores da sociedade civil no interior do aparelho do Estado. A concepção de governabilidade para Diniz possui como principais características: a) a forma de governo (parlamentarista, presidencialista ou misto); b) a relação Executivo-Legislativo; c) a composição, formação e dinâmica do sistema partidário; d) o sistema de intermediação de interesses vigente na sociedade (corporativista, institucional pluralista, dispersos, ONGs, etc.); e e) todo o conjunto das relações Estado-sociedade. Já a governança (chamada pela autora de governance), envolve a capacidade do governo de ação na implementação das políticas e consecução das metas coletivas. Destaca-se, neste contexto, como componentes fundamentais da governança, as capacidades de comando, coordenação, intervenção e implementação, além do reforço dos mecanismos formais de prestação de contas e a institucionalização da cobrança por parte dos usuários dos serviços do Estado (accountability). Diferentemente da tipologia anterior, esta não apresenta uma distinção nítida entre governabilidade e governança, representando uma fusão das dimensões técnica e política no interior do aparelho do Estado. Caio Marini. Nesta tipologia, os conceitos de governabilidade e governança relacionam-se mais profundamente tanto com a crise do Estado quanto com a sua superação. Marini define a governabilidade como as condições de legitimidade de um determinado governo para empreender as transformações necessárias; e a governança como a capacidade de implementar as reformas nos seus aspectos técnicos, financeiros e gerenciais. Este autor destaca que a literatura nacional tem apontado para uma crise de governança no caso brasileiro, sobretudo no período de transição de um regime para outro. Portanto, esta tipologia sugere que a governança é uma variável central para a compreensão da crise. Segundo Marini, a governabilidade não é suficiente para produzir mudança. Há a necessidade de ampliar a governança, como ingrediente determinante da estratégia de enfrentamento da crise, a partir de suas manifestações centrais: a crise financeira e a crise de desempenho. 1 BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos; SPINK, Peter. Reforma do Estado e Administração Pública Gerencial. São Paulo: Editora FGV, 1998.

A crise financeira caracteriza-se, sobretudo, pelo processo de endividamento interno/externo gerado pelo Estado após os choques do petróleo nos anos 70 e a mudança das condições internacionais de crédito/liquidez. Esta situação gerou o chamado déficit público, que pesa sobre as finanças do Estado, onerando a sociedade civil e o mercado. É o que se chama de poupança pública negativa ou despoupança, que retira recursos poupados pelas empresas e indivíduos para financiar a ineficiência do Estado, reduzindo de forma drástica a capacidade financeira deste último e da economia como um todo. A crise de desempenho, por sua vez, pode ser entendida pela redução radical da capacidade de prestação de serviços pelo Estado à população. Para a sua superação, é necessário: a) buscar sempre o aumento da eficiência do aparelho do Estado, por meio da racionalização e incremento da produtividade (fazer mais com menos); b) melhorar continuamente a prestação dos serviços para contemplar as exigências sociais pelo atendimento das suas demandas; e c) resgatar (ou construir) a esfera pública como fórum de expressão da cidadania e aprendizado social. Para Marini, o desafio de reformar o Estado e o seu aparelho está inserido no contexto de mudança socioeconômica e política. A tarefa de transformação exige que o Estado redefina os seus papeis, funções e mecanismos de funcionamento interno e impõe novas exigências à sociedade como um todo. Comparação entre as tipologias e considerações finais Percebe-se que os conceitos de governabilidade e governança são muito convergentes. Para os três autores, a governabilidade consiste na própria autoridade política ou legitimidade possuída pelo Estado para apresentar à sociedade civil e ao mercado um amplo projeto para aquela determinada nação; e a governança constitui-se como uma variável auxiliar da governabilidade. Bresser Pereira dá maior destaque à governança, entendendo que a governabilidade já garantiu as suas condições mínimas necessárias, dada a relativa estabilidade político-institucional atravessada pelo Brasil nos últimos anos. Eli Diniz destaca mais o aspecto democrático da governabilidade. Caio Marini enfatiza o papel da governabilidade vista como uma premissa para a implementação das reformas. As tipologias apresentadas são muito convergentes, distinguindo-se entre si apenas pelo(a): a) visão da governabilidade/governança como um postulado ou axioma garantido pelo processo de redemocratização recente, na contribuição de Bresser Pereira. b) ênfase dada à conexão da governabilidade/governança com a reforma do Estado como um todo, a institucionalização da democracia e, em especial, com o incremento da participação dos cidadãos, na contribuição de Eli Diniz; e c) destaque conferido à ligação da governabilidade/governança com a superação das desigualdades estruturais da sociedade brasileira, por meio da reforma do Estado e de seu aparelho proposta pelo PDRAE, na contribuição de Caio Marini. Sobre o autor Vinícius de Carvalho Araújo é graduado em administração, pós-graduado em políticas estratégicas para o setor público e gestor governamental do Estado do Mato Grosso.