Alterações na CFEM Ponderações Preliminares Minério de Ferro 14 de setembro de 2017 Andrew J. Bishop
Alteração Relevantes majoração da CFEM e Multas e criação da ANM Em 25/07/2017 foram editadas pelo Presidente da República três Medidas Provisórias (MP), quais sejam MP s nº 789/2017, 790/2017 e 791/2017, com alterações substanciais para o setor minerário brasileiro. MP nº 789/17 alterou a Lei nº 7.990/89 e a Lei nº 8.001/90, para dispor sobre: I. Alíquota; II. III. Alargamento da base de cálculo; hipóteses de incidência da (CFEM), devida aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios, e aos órgãos da administração da União, a título de royalties pela exploração econômica dos recursos minerais em seus respectivos territórios. MP nº 790/17 alterou o Código de Mineração (Decreto-Lei nº 227/67) e Lei nº 6.567/78. I. regime especial para exploração e aproveitamento de substâncias minerais, trazendo novas regras para a concessão para exploração mineral. II. ampliação do valor das multas, aplicadas pelo descumprimento das normas do Código de Mineração, que passam a variar de R$ 2.000,00 a R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais). MP nº 790/17 I. Cria a Agência Nacional de Mineração (ANM)
Natureza Jurídica CFEM Embora o STF não o tenha dito expressamente, enquanto receita patrimonial, o art. 20, 1º da Constituição prevê uma receita que tem origem no patrimônio estatal. Afinal, o recurso mineral in situ é bem de propriedade da União Federal (art. 20, IX da Constituiçao). Sendo assim, cabe à União, ao possibilitar ao particular explorar seu patrimônio, estabelecer uma participação no resultado dessa exploração ou determinar que o particular compense o Estado pelas consequências dessa exploração (v.g. degradação ambiental inerente à essa atividade). Trata-se, portanto, de receita pública originária, que é aquela que tem origem no próprio patrimônio estatal, que é distinta das receitas públicas derivadas, compreendidas como aquelas que derivam do patrimônio dos particulares, a exemplo dos tributos, caracterizados por serem uma prestação pecuniária compulsória (art. 3º do CTN). Como mencionado anteriormente, a base constitucional da CFEM é o art. 20, 1º da Constituição, da qual o STF extraiu sua natureza de receita pública patrimonial originária. Para além de embasar sua natureza jurídica, cumpre analisar o dispositivo no sentido de verificar qual o alcance por ele permitido à lei instituidora da CFEM. Eis sua redação:
Natureza Jurídica CFEM Esse entendimento já basta para trazermos para o âmbito da CFEM todo o regime próprio do Direito Público, consistente não apenas nas prerrogativas dos entes públicos (no caso, a ANM com a vigência da MP nº 791/17) na sua exigência, mas também todos os direitos e garantias do particular contra os mesmos, notadamente a legalidade (CF; art. 5, II e art. 37, caput); a segurança jurídica (CF; art. 1 e art. 5, caput); o direito fundamental à propriedade privada (CF; art. 5, caput e inciso XXII) e o devido processo legal (CF; art. 5, LIV e LV). Podemos concluir que, tratando-se de uma imposição unilateral do Poder Público que diminui o patrimônio do particular com a exigência coercitiva de uma soma em dinheiro, a CFEM só poderá ser validamente exigida se o particular se encontrar exatamente naquela situação colhida pela norma legal como ensejadora do dever de cumprir a prestação pecuniária. Trata-se da dinâmica da incidência da norma jurídica consistente no binômio hipótese-consequência, pois a norma é composta de um antecedente, ou seja, a descrição hipotética de uma situação, à qual é atribuída uma consequência jurídica
Natureza Jurídica CFEM A base constitucional da CFEM é o art. 20, 1º da Constituição, da qual o STF extraiu sua natureza de receita pública patrimonial originária. Para além de embasar sua natureza jurídica, cumpre analisar o dispositivo no sentido de verificar qual o alcance por ele permitido à lei instituidora da CFEM. Eis sua redação: Art. 20 (...) 1º É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração. O STF RE 228.800/DF entendeu que não se trata de compensação financeira, pois esta opção teria por pressuposto uma cobrança mensurada pelos recursos despendidos com os efeitos da exploração, consistentes nas perdas ambientais, sociais, econômicas e produtivas decorrentes da exploração. Sendo assim, apesar de ter sido chamada de compensação financeira pela Lei 7.990, na prática a exigência seria verdadeira participação nos resultados da exploração
Natureza Jurídica CFEM O que podemos extrair do RE 228.800/DF sobre o ponto é que: a) a Lei 7.990/89 não instituiu uma compensação financeira pela exploração dos recursos minerais, mas sim a participação dos entes federativos no resultado dessa exploração; b) o faturamento eleito pela Lei 7.990/89 como base de cálculo da obrigação é expressão válida do resultado da exploração sobre o qual recai a participação dos entes federativos. O que podemos concluir da análise da jurisprudência do STF? Por fundamentos diversos e até mesmo contraditórios, sempre negou qualquer tentativa dos sujeitos passivos da CFEM de invalidar a cobrança sob a alegação de que o faturamento líquido previsto na redação anterior da Lei 7.990/89 não era índice válido diante das alternativas constitucionais de compensação financeira ou participação nos resultados da exploração. Ao nosso ver a questão encontra-se sem definição ainda mais sobre à luz da nova legislação.
Natureza Jurídica CFEM sob vigência da MP 789/2017 Questionamentos Possíveis Sendo assim, entendemos viável questionar a nova base de cálculo, ao fundamento de que receita bruta com a venda do bem mineral com a dedução dos tributos incidentes não representa uma indenização ou compensação pelas consequências ambientais, sociais e produtivas da exploração mineral, na linha do que afirmado no RE 228.800/DF. A alegação de que essa base de cálculo não é apta a representar o resultado da exploração, mas apenas um de seus componentes, pois diversos outros gastos são necessários para que a exploração seja realizada e apresente resultado. Ainda que seja adotada uma linha mais complacente com o legislador, no sentido de que ele teria margem para definir o que é resultado da exploração de forma distinta do lucro bruto ou lucro líquido, fato é que essa discricionariedade não pode chegar ao ponto de subverter um significado mínimo da expressão resultado da exploração, que pressupõem algum índice positivo de retorno econômico com a atividade. Ao determinar unicamente a dedução dos tributos incidentes sobre a comercialização, a MP 789/2017 ignorou a maior parte desses gastos necessários para se apurar algum resultado, limitando-se a evitar o bis in idem com outras prestações pecuniárias compulsórias (tributos) incidentes sobre a comercialização.
Natureza Jurídica CFEM sob vigência da MP 789/2017 Questionamentos Possíveis Teria que se enfrentar os atuais julgados do STF, mas isso é possível, tendo em vista que a tese se apresenta com uma formulação diversa, não requerendo um constrangimento absoluto do legislador a adotar a fórmula do lucro bruto ou líquido, mas sim de censurar sua decisão de prever uma base de cálculo (receita bruta deduzida dos tributos incidentes) que se distancia de um sentido minimamente aceitável de resultado. O movimento observado é que, ao deixar de prever a dedução de frete e seguros, a MP 789/2017 se afastou ainda mais daquilo que poderia ser concebido como resultado da exploração, o que pode reforçar a alegação de inconstitucionalidade.
Base de Cálculo na Pelotização
Natureza Jurídica CFEM sob vigência da MP 789/2017 Questionamentos Possíveis Produto NCM Descrição 2601.1 Minérios de ferro e seus concentrados, exceto as piritas de ferro ustuladas (cinzas de piritas): Pellet Feed e Pellet Screening 2601.11 Não aglomerados Pellet 2601.12 Aglomerados
Natureza Jurídica CFEM sob vigência da MP 789/2017 Questionamentos Possíveis Alíquota Percentual de Variação da Alíquota Cotação Internacional em US$/Tonelada (segundo o Índice Platts Iron Ore Index - Iodex) Percentual de Variação da Cotação 2,00% Preço < 60,00 2,50% 25% 60,00 Preço < 70,00 17% 3,00% 20% 70,00 Preço < 80,00 14% 3,50% 17% 80,00 Preço < 100,00 25% 4,00% 14% Preço 100,00 NA A alíquota anterior da CFEM, para a venda de minério de ferro, era de 2%; agora, 2% passa a ser a alíquota mínima, que pode variar para até 4%, a depender do valor do minério de ferro segundo cotação internacional (Índice Platts Iron Ore Index Iodex).
Natureza Jurídica CFEM sob vigência da MP 789/2017 Questionamentos Possíveis Nesse contexto, a vigência da Medida Provisória nº 789/17 se dará da seguinte maneira: A PARTIR DE ALTERAÇÕES 26 de setembro de 2017 Modificações na base de cálculo e novos fatos geradores 1º de novembro de 2017 Novas alíquotas aplicáveis ao minério de ferro, de 2% a 4%. 1º de janeiro de 2018 Base de cálculo com base no preço corrente ou de referência para os casos de consumo, utilização, doação ou bonificação do bem mineral.
Principais Impactos a Em razão das alterações no cálculo da CFEM, tem-se que os impactos para pelotizadores serão, quanto à composição da base de cálculo: I) Utilização da receita bruta de venda, incluindo todos os custos de beneficiamento havidos em todas as etapas, inclusive nos outros estabelecimentos e coligadas; II) Não exclusão da aquisição do minério obtido de terceiros; III) Inclusão dos custos de transporte e seguro; IV) Utilização de preço parâmetro, definido pela RFB, ou de preço de referência, definido pela ANM, nos casos de exportação para pessoa jurídica vinculada ou domiciliada em país com tributação favorecida. Havendo uma restrição maior na composição da base de cálculo, mediante a utilização de preços parâmetros em alguns casos, e supressão do espaço para deduções de custos, pode-se dizer que, qualitativamente, a nova base de CFEM impõe oneração econômico excessiva às mineradoras.
Principais Impactos da nova abase Alargada Em razão das alterações no cálculo da CFEM, tem-se que os impactos para pelotizadores serão, quanto à composição da base de cálculo: I) Utilização da receita bruta de venda, incluindo todos os custos de beneficiamento havidos em todas as etapas, inclusive nos outros estabelecimentos e coligadas; II) Não exclusão da aquisição do minério obtido de terceiros; III) Inclusão dos custos de transporte e seguro; IV) Utilização de preço parâmetro, definido pela RFB, ou de preço de referência, definido pela ANM, nos casos de exportação para pessoa jurídica vinculada ou domiciliada em país com tributação favorecida. Havendo uma restrição maior na composição da base de cálculo, mediante a utilização de preços parâmetros em alguns casos, e supressão do espaço para deduções de custos, pode-se dizer que, qualitativamente, a nova base de CFEM impõe oneração econômico excessiva às mineradoras.
Principais Impactos da nova Base Alargada Realizada uma simulação preliminar utilizando como base de cálculo seja a receita de venda (pellet feed e pellet screening), seja o custo de produção (pelotas), critérios anteriores vis a vis as modificações na CFEM representam expressivo impacto financeiro, apto a onerar em, aproximadamente, em 46,66%, num caso, e em 84,07%, no outro, os valores recolhidos. Não obstante, neste momento inicial de sua vigência, vê-se disposições na Medida Provisória que criam maior complexidade para o cálculo, controvérsias e aumento desproporcional da arrecadação da CFEM, e que, consequentemente, possuem potencial parar onerar o setor minerário e aumentar a dificuldade de se efetivar o próprio pagamento da CFEM. Entre eles destacamos os seguintes pontos que entendemos ser obscuros e inconsistentes: a) Alíquota Progressiva com base em cotação do minério de ferro pelo índice Iodex. b) Base de cálculo custo x preço de venda. c) Determinação do preço de referência como base para incidência da CFEM.
Principais Impactos da nova Base Alargada Conforme visto anteriormente, a alíquota da CFEM para o minério de ferro será estabelecida com base na cotação internacional em US$/Tonelada do ferro, segundo o Índice Platts Iron Ore Index Iodex, nos termos do Anexo da Medida Provisória nº 789/17. Assim, a depender do valor IODEX divulgado, a alíquota poderá variar de 2% a 4%. Um dos problemas desta mudança é vinculação do valor da CFEM a fatores mercadológicos externos à exploração do bem mineral, ao invés dos custos ou resultados efetivamente auferido pela mineradora. Isto porque, por exemplo, caso o pellet seja comercializado a valor inferior a US$ 60/tonelada, se o índice IODEX para o ferro estiver entre US$ 60 e US$ 70/tonelada, a alíquota da CFEM seria 2,5% e não 2%, alíquota correspondente a US$ 60/tonelada. Esta possível diferença entre o valor do produto negociado e a cotação internacional do ferro pode gerar distorções econômicas nos contratos fechados e no próprio fluxo das operações das mineradoras. A potencialidade das distorções fica evidenciadas quando se verifica qual o produto cotado pelo Índice IODEX, conforme abaixo
Principais Impactos da nova Base Alargada Assim, o IODEX* se reporta ao minério de ferro na concentração de 62% ferro, 2% alumínio e 4,5% sílica. Não obstante, o produto comercializado pela Mineradora (pellets), em razão do processo de beneficiamento realizado e da sua variabilidade, a depender da encomenda, pode não corresponder às especificações padrões do mineiro de ferro cotadas pela IODEX. Esta diferença entre produto cotado e produto vendido pela Samarco é também mais um indício de distorção econômica existente na eleição da nova alíquota da CFEM. Some-se o fato de que se antes as mineradoras possuíam segurança para calcular o valor da CFEM com base no total de operações mensais, agora o cálculo da CFEM deverá ser feito de forma fragmentada, ao sabor da variação do índice IODEX o qual possui pouca estabilidade, conforme o gráfico abaixo:
Principais Impactos da nova Base Alargada Além do ponto anterior, também é previsível embate entre mineradoras e União em relação à definição da base de cálculo nos casos dos incisos II, III, art. 2º, da Lei nº 8.001/9011, conforme a nova redação dada pela MP. No caso do consumo interno do minério (referido inciso II), não havendo seu aproveitamento econômico direto por operação de venda, é possível que se questione a adequação de se utilizar, como base de cálculo da CFEM, um valor outro que não o custo de extração do minério como o preço corrente do bem mineral ou similar, ou o preço de referência. A eventual incongruência entre a natureza e valor do bem mineral consumido pela mineradora com aquele bem mineral utilizado como referência que fora definido pela ANM para servir de base de cálculo da CFEM poderá ser um foco de questionamento da pertinência do inciso II, art. 2º, da Lei nº 8.001/90. O mesmo ocorre no caso de exportação para pessoas jurídicas vinculadas ou domiciliadas em países com tributação favorecida, para os casos de inexistência de preços parâmetros que são definidos pela RFB, uma vez que não se tem, ainda, precisão da adequação dos preços de referência que serão definidos pela ANM nas vendas do minério de ferro beneficiado. Nesse contexto, é perceptível que, também quanto às disposições sobre a base de cálculo da CFEM, a Medida Provisória nº 789/17 suscitará questionamento por parte dos interessado.
Insegurança Jurídica e Judicialização temas adicionais Diante desse contexto, é possível antever que a discussão sobre a composição da base de cálculo da CFEM, para o caso das pelotas (aglomerados), não deve cessar com as alterações da Medidas Provisória nº 789/17. Isto porque, em que pese o processo de pelotização ter sido expressamente conceituado como beneficiamento pelo inciso II, 4º, art. 6º, da Lei nº 7.990/89, ainda é possível que se argumente, como entendem algumas mineradoras que este processo é uma industrialização que implica em consumo e transformação do minério de ferro, impondo a utilização da base de cálculo da CFEM corresponde ao consumo do bem mineral, não à sua venda. Ressalva-se, contudo, o entendimento manifestado pelo Superior Tribunal de Justiça no já citado Recurso Especial nº 1.275.910, julgado em 04 de agosto de 2015, sob a relatoria do Min. Mauro Campbell, no sentido de que o conceito de beneficiamento, no caso da CFEM, é mais amplo do que aquele adotado para o IPI. Assim, em que pese a pelotização não ensejar a tributação do pelo IPI, sua oneração pela CFEM poderia ser possível, na medida em que, à luz da legislação competente, consistiria em processo de beneficiamento do minério de ferro. Além disso, em que pese a Medida Provisória nº 789/17 tenha suprimido a possibilidade de dedução dos custos com transporte e seguro da base de cálculo da CFEM, é possível que as mineradoras argumentem que tais custos não representam verdadeiro resultado da exploração do minério de ferro, razão pela qual a cobrança da CFEM sobre esses valores representaria infringência ao art. 20, 1º, da Constituição.
Insegurança Jurídica e Judicialização temas adicionais O mesmo argumento de infringência ao art. 20, 1º, da Constituição, poderia ser levantado para o caso da aplicação da tabela de alíquotas progressivas constante no anexo da Medida Provisória nº 789/17, na medida em que a variação de alíquotas em função de fatores externos à exploração do minério pelas mineradoras cotação internacional do minério pelo Índice Iodex representaria uma distorção indevida no valor CFEM. Isto porque a exação deveria refletir a participação no efetivo resultado da exploração do minério, o que pode não ocorrer efetivamente visto que o referido índice não representa o preço efetivamente praticado para todos os produtos (existe uma série de minérios de ferro com cotações e utilidades diversas). Também, seria passível de questionamento judicial por parte das mineradoras a insegurança jurídica e econômica causada pela volatilidade da cotação diária do minério de ferro pelo Índice Iodex. Essa insegurança jurídica seria em razão da necessidade de se estabelecer, diariamente, a alíquota da CFEM aplicável com base no Iodex alíquota esta que poderia, em momento posterior, enfrentar discordância da União, em eventual fiscalização pela dificuldade de acompanhamento e cálculo tanto por parte do fisco quanto das empresas. A insegurança econômica, de outro lado, ocorreria quando do fechamento dos contratos entre mineradoras e seus clientes, que necessitariam de se pautar por uma previsão incerta da variação futura da cotação do minério de ferro com base nesse índice. Por fim, o estabelecimento de preços de referência para o minério de ferro exportado ou consumido, para fins de estabelecimento da base de cálculo da CFEM, pode ser outro foco de questionamento judicial por parte das mineradoras, na medida em que podem ser estabelecidos em valores incompatíveis com aqueles praticados no mercado.