AÇÕES DE SAÚDE VOCAL O QUE O PROFESSOR UTILIZA NA ROTINA Autora: Maria Lúcia Suzigan Dragone PROFISSIONAL EM LONGO PRAZO? Instituição: Centro Universitário de Araraquara, UNIARA. Programa de Pós-Graduação Mestrado Profissional em Educação: Processos de Ensino, Gestão e Inovação. RESUMO EXPANDIDO INTRODUÇÃO Em 2010, um estudo epidemiológico revelou que 30,3% dos professores sentem limitações das atividades profissionais por causa de problemas de voz contra 5,5% de não professores; majoritariamente os professores referiram já terem vivenciado problemas de voz (63%), e 16,6% deles previram mudança de profissão no futuro relacionada a dificuldades vocais 1. Esses dados reforçaram os achados de outros pesquisadores internacionais 2,3, e a necessidade de ações efetivas de promoção de saúde vocal para esta classe profissional. A comunidade científica fonoaudiologica parece sensível a esta necessidade visto a ocorrência crescente de estudos na área 4 ; mas, há poucas descrições de ações formativas e de promoção/prevenção de saúde vocal abordando seus efeitos. Algumas publicações descrevem programas de promoção e prevenção de saúde vocal entre professores atuantes ou em formação de diversos níveis de ensino 5-8, outros estudos apontam os efeitos desses programas como o aumento da percepção da própria alteração vocal entre professores do ensino infantil 9, a diminuição da quantidade de uso vocal e de variações de tonalidade desnecessárias ao contexto de comunicação após 5 encontros abordando o assunto 10, e modificações de atitudes comunicativas em sala de aula com a participação o de professores em curso de extensão em comunicação oral e voz 11. Existe, assim, a preocupação em investigar o quanto o conhecimento oferecido pode ser realmente utilizado. Os próprios professores sugerem interesse em serem expostos a atividades de voz relacionadas diretamente ao trabalho docente, provavelmente para efetivar a aplicabilidade dos conhecimentos adquiridos em 12 encontros de um programa de saúde vocal na sala de aula 12, esse foco ampliado é apoiado por autores da área da educação visando a competência em utilizar a voz e a comunicação oral como recurso do trabalho docente 13. Sob essas perspectivas pode-se questionar o quanto professores
conseguem assimilar conceitos dessa natureza e utilizá-los em favor da saúde vocal e de sua comunicação. OBJETIVO: Investigar quais conceitos os educadores lembram e aplicam na prática profissional, entre aqueles trabalhados em ações de promoção saúde vocal e capacitação em comunicação oral. MÉTODO Estudo exploratório longitudinal, com projeto aprovado em Comitê de Ética em Pesquisa UNIARA sob nº 1211/10, realizado com 134 educadores participantes do Programa de Saúde Vocal e Comunicação Oral em parceria com a Secretaria de Educação Municipal e a Instituição do pesquisador, entre 2012 e 2013, que poderiam ou não ter realizado algumas das ações deste mesmo programa em anos anteriores. Esse programa ocorre desde o ano 2000, com ações diversificadas, a saber: palestra informativas, oficinas de voz em dois encontros de duas horas grupos de até 50 educadores abordando cuidados vocais e promoção de saúde vocal; vivências em voz com uma hora e meia de duração locadas nas escolas durante horário de reuniões pedagógicas com atividades práticas, troca de informações sobre a voz no trabalho e construção de estratégias de economia vocal em grupo. Utilizou-se um questionário para marcar a recordação de ter participado de alguma ação anterior, para apontar o(s) conceito(s) aprendidos, com espaço livre para referir utilização dos conceitos na prática profissional. Utilizou-se o banco de dados do programa confirmação das participações. Os dados foram analisados quantitativamente e qualitativamente com categorização dos conceitos referidos. RESULTADOS Entre os 134 educadores participantes do estudo, somente 44 haviam participado de ações do programa entre 2000 e 2011, e, a maioria destes recordou-se das participações (Tabela 1), 80,6% havia participado de ações entre 2001 e 2005 (Tabela 2). Não foi possível relacionar os resultados com os tipos diferentes de ações, visto terem ocorrido em momentos distintos (oficinas 2001 a 2005; vivências 2005 a 2010.
TABELA 1 Educadores que haviam participado de ações entre 2000 e 2011 (N:44) Verificação de Participação N % Não lembraram e haviam participado 13 29,55 Lembraram e realmente participaram 31 70,45 TABELA 2 Educadores recordaram de participar em ações anteriores (N:31) Período em que participaram da ação N % Entre 2001 a 2005 25 80,60 Entre 2009 a 2011 8 25,80 Ano de ocorrência / tipo de ação N % 2001 (oficina) 1 2,23 2002 (oficina) 6 19,35 2003 (oficina) 9 29,00 2005 (oficina) 5 16,12 2005 (vivência) 4 12,90 2009 (vivência) 1 2,23 2010 (vivência) 4 12,90 2011 (vivência) 1 2,23 Analisando os tópicos mais referidos percebe-se três categorias de conhecimentos trabalhados nas ações: as noções sobre cuidados com a voz (cuidados básicos, percepção de sintomas vocais, hábitos interferentes, estratégias de economia de voz), a prática de exercícios básicos de manutenção da qualidade da voz, e a compreensão de como a voz é produzida (Tabela 3). Com significância estatística foram menos lembradas as questões sobre fatores ambientais, uso da voz nas interações em sala de aula e em diferentes situações. TABELA 3: Tópicos de conhecimento relembrados pelos educadores (N 31) nº de educadores % Cuidados básicos de saúde/voz 25 80,6
Exercícios básicos 24 77,4 Como a voz é produzida 22 71,0 Sintomas vocais 21 67,7 Estratégias de economia de voz 19 61,3 Hábitos interferentes 15 48,4 Fatorem ambientais 12 38,7* Uso da voz nas interações em sala de aula 11 35,5* Uso da voz em diferentes situações 10 32,3* *Teste de igualdade de duas proporções P-valor <0,001 O uso desses conhecimentos na prática profissional parece não ser uma prática constante (Tabela 4), os educadores dividem-se entre usar e não usar, sem que haja diferença significante deste parâmetro. Isso pode estar relacionado a pouca relação das estratégias utilizadas na ação educativa com a prática em sala de aula, assim como sinalizado em estudo no qual os professores sugeriram que as ações fossem integradas à prática educativa 12. Entre hábitos positivos referidos como utilizados na prática encontram-se intensidade adequada de voz para o ambiente, evitar gritos, cuidados com postura corporal, hidratação e a prática de exercícios básicos para manutenção da qualidade vocal (Tabela 5). TABELA 4: Uso do conhecimento relembrado na prática profissional (N 31) N % Não 14 45,2 Raramente 1 3,2* Sim 16 51,6 *Teste de igualdade de duas proporções P-valor <0,001 TABELA 5: Conhecimento utilizado na prática profissional (N: 17) N % Hábitos positivos 12 70,5 Não soube relatar o que usa 3 17,6 Exercícios de voz 2 11,8
Esses resultados apontam a permanência em longo tempo de conceitos apresentados aos educadores em ações educativas de curta duração, incluindo o uso deles na rotina dos educadores, o que provavelmente já esteja refletindo na saúde vocal desses professores, como os efeitos encontrados em curto espaço de tempo relatados em alguns estudos que expuseram resultados obtidos em ações com professores 9-11. CONCLUSÃO Ações educativas de curta duração para educadores para promoção de saúde vocal e para compreensão da relevância da comunicação oral, trouxeram resultados positivos em longo prazo. Professores recordaram-se dos principais conceitos trabalhados há pelo menos seis anos, chegando até há dez anos da participação em capacitações de voz e comunicação oral, e referiram a utilização das estratégias de cuidados vocais para preservar a voz e para melhorar a comunicação oral na rotina profissional. Tais conceitos, apresentados em capacitação de curta duração configuraram-se, desta forma, em saberes básicos perenes no decorrer do tempo. REFERÊNCIAS 1) ZAMBON F; BEHLAU M. A voz do professor: aspectos do sofrimento vocal profissional. São Paulo:Sindicato dos professores de São Paulo-SINPRO; 2010. 2) ROY N, MERRILL RM, THIBEAULTS S, GRAY S.D, SMITH E.M. Voice disorders in teachers and the general population: effects on work performance, attendance, and future career choices. J Speech Lang Hear Res; 2004a;47:542-52. 3) ROY N, MERRILL RM, THIBEAULTS S, PARSA R, GRAY SD, SMITH EM. Prevalence of voice disorders in teachers in the general Population. J Speech Lang Hear Res. 2004b;47:281-93.
4) DRAGONE MLS; FERREIRA LP, GIANNINI PP, SIMÕES-ZENARI M, VIEIRA VP, BEHLAU M. Voz do professor: uma revisão de 15 anos de contribuição Fonoaudiológica. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(2):289-96. 5) GRILLO MHMM, LIMA E.F, FERREIRA LP. A questão ensino-aprendizagem num trabalho profilático de aperfeiçoamento vocal com professores. Pró-Fono; 2000;12(2):73-80. 6) SILVÉRIO KCA, GONÇALVES CGO, PENTEADO RZ; VIEIRA TPG, LIBBARDI A, ROSSI D. Ações em saúde vocal: proposta de melhora do perfil vocal de professores. Pró-Fono Revista de Atualização Científica; 2008;20(3):177-82. 7) DRAGONE MLS. Programa de saúde vocal para educadores: ações e resultados. Rev. CEFAC. 2011;13(6):1133-1143. 8) XAVIER, I.A.L.N; SANTOS, A.C.O; SILVA, D.M. Saúde vocal do professor: intervenção fonoaudiológica na atenção primária à saúde. Rev. CEFAC: São Paulo, v.15,n.4, p.976-85, 2013. 9) SIMÕES-ZENARI M, LATORRE MRDO. Mudanças em comportamentos relacionados com o uso da voz após intervenção fonoaudiológica junto a educadoras de creche. Pró-Fono; 2008;20(1):61-6. 10) MASSON MLV. Fatores de Risco, Aquecimento e Desaquecimento Vocal em Professores de uma Escola Pública de Ensino Médio de Salvador-BA. [tese] Marília: Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho Faculdade de Filosofia e Ciências. Doutorado Educação. 2009. 11) DRAGONE MLS. O despertar da relação consciente com a voz na formação inicial do professor: efeitos na prática docente. [tese]. Araraquara: Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências e Letras. Doutorado Educação Escolar; 2007. 12) LUCHESI K F, MOURÃO LF, KITAMURA S. Ações de promoção e prevenção à saúde vocal de professores: uma questão de saúde coletiva. Rev. CEFAC; 2010;12(6):945-53.
13) DRAGONE M.LS, GIOVANNI LM. O professor iniciante e a comunicação oral em sala de aula: algumas reflexões em direção a políticas públicas de inserção professional docente. In: MARIN AM, GIOVANNI L. Professores iniciantes: diferentes necessidades em diferentes contextos. Araraquara: Junqueira & Marin Editores; 2014. p 71-8.