PRIORIDADES COMPETITIVAS E RELAÇÃO COM FORNECEDORES: UMA SURVEY EXPLORATÓRIA NA INDÚSTRIA DE AUTOPEÇAS DO ESTADO DE SÃO PAULO

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Transcrição:

PRIORIDADES COMPETITIVAS E RELAÇÃO COM FORNECEDORES: UMA SURVEY EXPLORATÓRIA NA INDÚSTRIA DE AUTOPEÇAS DO ESTADO DE SÃO PAULO Alberto Magno Teodoro Filho (UFSCar) amagnotf@hotmail.com Marcia Regina Neves Guimaraes (UFSCar) mrng@ufscar.br Patricia Saltorato (UFSCar) patrisal@dep.ufscar.br O artigo apresenta e analisa alguns aspectos da relação com fornecedores e das prioridades competitivas de empresas de autopeças do Estado de São Paulo. Por meio da realização de uma survey exploratória, foi possível observar que as prioriddades competitivas mais citadas pelas empresas da amostra são qualidade e custo. Também, percebeu-se que critérios de seleção e de avaliação de fornecedores utilizados pelas empresas que responderam ao questionário, reforçam suas prioridades competitivas. Estudos futuros podem aprofundar as conclusões dessa pesquisa e considerar particularidades da relação das empresas de autopeças com as montadoras e com seus fornecedores. Palavras-chaves: estratégia de produção, prioridades competitivas, relação com fornecedores, indústria de autopeças

1. Introdução A indústria automobilística instalou-se no Brasil em 1956, motivada pelo baixo custo da mãode-obra local, que proporcionava alguma vantagem competitiva. A partir daí, o Brasil deixou de ter sua economia exclusivamente apoiada na agricultura e na produção de commodities primárias e passou a ocupar lugar no chamado mundo industrializado (SILVA et al., 2008). Desde então, o setor de autopeças, em particular, passou por muitas transformações. A década de 90 teve um papel importante nessa história. De acordo com Amato Neto (2007), o governo Collor, com o pretexto de provocar uma rápida modernização de todo o parque industrial brasileiro, provocou uma ampla e radical abertura de mercado para vários tipos de produtos importados. Esse fato culminou em profundas mudanças no setor. Entre elas, Amato Neto (2007) destaca a internacionalização desta indústria com a concentração do mercado produtor, principalmente por meio de aquisições de empresas de capital nacional por parte de grupos internacionais. Nesse contexto, começaram a ganhar força as práticas gerenciais inspiradas na qualidade total e intensificaram-se, por imposição das montadoras, os esforços pela certificação nas normas da série ISO 9.000 (AMATO NETO, 2000 apud AMATO NETO 2007). De acordo com o Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores - Sindipeças (2010), entre as suas 447 empresas associadas em 2008, 317 possuíam e 32 estavam em processo de obtenção da Norma ISO TS 16949:2002. Considerando a ISO 9001:2000; 267 empresas eram certificadas e 13 estavam em processo de certificação. Na ISO 14001:2004, 190 já estavam certificadas e 36 em processo de certificação. Além disso, segundo Castro (2000), as montadoras para atingir seus objetivos procuraram a partir da sua reestruturação, consolidar uma base de fornecedores de primeira camada, para que eles pudessem ser envolvidos no desenvolvimento de veículos e estabelecer unidades nos locais onde o veículo fosse produzido. Para Cerra, Maia e Alves Filho (2007), é possível afirmar que o conjunto das montadoras comanda as cadeias de fornecedores, mesmo considerando a existência de fornecedores de grande porte ou tecnologicamente autônomos. Segundo os mesmos autores, os fatores de desempenho competitivo priorizados pelas montadoras são de uma forma ou outra, importantes na tomada de decisão para as empresas fornecedoras. Nesse contexto, o presente trabalho, com foco no conteúdo da estratégia de produção, busca analisar as prioridades competitivas de empresas de autopeças do Estado de São Paulo, além de analisar aspectos da relação destas empresas com seus fornecedores. O artigo parte de algumas considerações sobre estratégia de produção, apresenta o método de pesquisa e então, mostra e analisa os resultados encontrados. 2

2. Estratégia de produção XXXI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Para Thompson Jr., Strickla III e Gamble (2008), estratégia é o plano de ação para dirigir as operações da empresa. A sua elaboração é um compromisso para aceitar um determinado conjunto de ações por parte dos gerentes para o crescimento da firma, atrair e satisfazer os clientes, competir com sucesso, administrar operações e aprimorar tanto o desempenho financeiro como o de mercado. Wheelwright (1984) afirma que em uma organização, as estratégias se apresentam em três níveis que seguem uma hierarquia: a estratégia corporativa, a estratégia de negócio e as estratégias funcionais. De acordo com Mintzberg et al. (2006), a estratégia corporativa engloba um padrão de decisões que determina e revela os objetivos de uma empresa, assim como propósitos ou metas. É a partir desse padrão que as principais políticas e planos para atingir as metas são formulados e o escopo de negócio é definido. No segundo nível da hierarquia, ligada à estratégia corporativa, está a estratégia de negócio ou estratégia competitiva. Na visão de Slack, Chambers e Johnston (2002), a estratégia de negócios tem por objetivo guiar a empresa em relação a seus consumidores, mercados e concorrentes, além de dar sustentação à estratégia do grupo corporativo que está contida. Porter (2004) apresenta uma lista composta de três estratégias competitivas genéricas: liderança no custo total, diferenciação e enfoque. O autor considera que a estratégia competitiva é necessária para se criar uma posição defensável por bastante tempo e superar os concorrentes. A liderança no custo total consiste em um conjunto de políticas funcionais orientadas para esse fim. A estratégia de diferenciação consiste em diferenciar o produto ou o serviço oferecido tornando-o único no âmbito de determinada indústria. A terceira estratégia competitiva genérica envolve enfocar um determinado grupo comprador, um segmento da linha de produtos, ou um mercado geográfico (PORTER, 2004). O terceiro nível hierárquico de estratégia citado por Wheelwright (1984) é representado pelas estratégias funcionais. É essa estratégia que define como cada área funcional irá contribuir para a estratégia de negócio. No caso específico da estratégia de produção, Slack e Lewis (2008) enumeram quatro perspectivas: a primeira diz que essa estratégia é um reflexo de cima para baixo (top-down) do que todo o grupo ou negócio pretende fazer; a segunda defende que é uma atividade de baixo para cima (botton-up) onde o aperfeiçoamento da produção cumulativamente constrói a estratégia; a terceira afirma que envolve a tradução de requerimentos do mercado em decisões operacionais; e a última relaciona a estratégia de produção com explorar as capacidades dos recursos operacionais em determinados mercados. Segundo Slack e Lewis (2008), nenhuma das quatro perspectivas isoladamente, fornece uma visão completa do que é estratégia de produção. Por outro lado, elas dão uma boa idéia das pressões que podem moldar o conteúdo desse tipo de estratégia. O presente artigo considera a estratégia de produção como uma estratégia funcional. Segue, portanto, a perspectiva topdown citada por Slack e Lewis (2008). Observa-se que o primeiro conceito de estratégia de produção é atribuído à Skinner (1969). Segundo ele, trata-se de um conjunto de planos e políticas por meio dos quais a companhia busca obter vantagens sobre seus competidores. Ela inclui planos para a produção e a venda de produtos para um conjunto particular de consumidores. 3

De acordo com Jabbour e Alves Filho (2009), o debate sobre estratégia de produção só fez sentido quando a função produção passou a ser tratada como estratégica, como meio para obter vantagem competitiva. Os autores ainda mencionam que o interesse por compreender a estratégia de produção se deu a partir da observação do comportamento das organizações quanto à forma que elas competem dentro de tipos de indústrias. Para Slack, Chambers e Johnston (2002), a estratégia de produção pode ser dividida em conteúdo e processo de formulação. As questões referentes ao conteúdo é que determinam as estratégias específicas que governam a tomada de decisões cotidianas na produção. Três fatores constituem o conteúdo da estratégia de produção: as prioridades competitivas, as decisões estratégicas que definem a estrutura da produção e as decisões estratégicas que determinam a infra-estrutura da produção. (SLACK, CHAMBERS e JOHNSTON, 2002) Hayes, Pisano, Upton e Wheelwright (2008) acreditam que a organização da produção deve atender as necessidades da estratégia competitiva. Isso inclui o foco em uma ou mais prioridades competitivas que irão proporcionar a vantagem competitiva com relação aos concorrentes. As prioridades competitivas representam um conjunto de metas que orientam as tomadas de decisão da produção em busca de vantagem competitiva. Jabbour (2010) considera que as prioridades competitivas são uma forma de traduzir as necessidades dos clientes em termos de metas de desempenho para a função produção. Como observa a autora, a função produção se organiza a partir da definição de suas prioridades competitivas e então modela suas operações por meio de decisões estruturais e infra-estruturais. Percebe-se que não existe consenso absoluto sobre a classificação das prioridades competitivas, há pequenas divergências na apresentação do conjunto, no entanto, as classificações se assemelham de autor para autor. Jabbour (2010) ressalta que assim como nas pesquisas nacionais, os periódicos internacionais destacam como prioridades competitivas, os atributos qualidade, custo, flexibilidade e entrega. De acordo com Garvin (1993 apud MAIA, CERRA e ALVES FILHO, 2005), as prioridades competitivas são custo, qualidade, entrega, flexibilidade e serviço, sendo que este último inclui apoio ao cliente, apoio às vendas, resolução de problemas e informações que serão utilizadas pelos clientes para melhorar suas operações e produtos. No caso deste trabalho, utiliza-se as cinco prioridades definidas por Garvin (1993 apud MAIA, CERRA e ALVES FILHO, 2005). Ainda no que diz respeito ao conteúdo da estratégia de produção, sabe-se que as prioridades competitivas são desenvolvidas e sustentadas pelas áreas de decisão estruturais e infraestruturais. As estruturais representam decisões que se referem aos atributos físicos da organização. Elas requerem um alto investimento e uma vez realizadas, são difíceis de alterar ou reverter. As decisões infra-estruturais se referem aos sistemas, políticas e práticas que definem como os aspectos estruturais serão gerenciados. Em geral, apesar de seu desenvolvimento e implementação envolverem anos de esforços e também serem difíceis de alterar, elas requerem menores investimentos (HAYES, PISANO, UPTON, WHEELWRIGHT, 2008). Para Hayes e Wheelwright (1984), alguns exemplos de decisões estruturais são: capacidade, integração vertical, tamanho e localização da planta, tecnologia de produto e de processo e relação com fornecedores. Já como exemplos de decisões infra-estruturais, segundo os autores, têm-se: planejamento e controle da produção, sistemas de recursos humanos, gestão 4

da qualidade, desenvolvimento de novos produtos, sistemas de medidas de desempenho e organização da produção. Como será visto no tópico posterior ao método (abaixo), este artigo analisa aspectos da relação com fornecedores (área de decisão estrutural) e das prioridades competitivas das empresas de autopeças da amostra. 3. Método O trabalho utiliza a survey como método de procedimento de pesquisa. De acordo com Rabaioli (2002), a pesquisa do tipo survey utiliza dados coletados em uma parcela ou amostra da população para então retirar informações sobre ela. O autor afirma que para que a população estudada seja bem representada pela amostra, é preciso durante a sua formação, assegurar a possibilidade de participação de todos os integrantes, grupos ou segmentos existentes na população. Como observam Miguel e Ho (2010), nos levantamentos tipo survey, o pesquisador, de maneira geral, avalia uma amostra significativa de um problema a ser investigado buscando extrair conclusão a partir desta amostra. Os mesmos autores apresentam três tipos de survey: a exploratória, a descritiva e a explanatória. Este projeto de pesquisa propõe a utilização de um levantamento tipo survey exploratória. De acordo com Miguel e Ho (2000), o tipo exploratório ocorre no estágio inicial de uma pesquisa, quando se busca um primeiro contato com o tema, para fornecer base para estudos mais aprofundados. Como técnica de coleta de dados utilizou-se um questionário, como é comum nas pesquisas do tipo survey. O trabalho foca a divisão de automóveis e veículos comerciais leves do setor de autopeças do Estado de São Paulo. Para isso foi utilizada uma lista do Sindicato Nacional de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) com as empresas que fazem parte do escopo da pesquisa. Primeiramente, foi tentado contato com todas as 328 empresas que faziam parte da lista. Dessas, foi possível o contato com 317, que foram informadas sobre a pesquisa e receberam o questionário através do e-mail contido na lista fornecida pelo Sindipeças. No mês seguinte, as que não se expressaram foram novamente consultadas pelo e-mail. Após a segunda tentativa, as empresas que não responderam o questionário e nem demonstraram que não tinham a intenção de participar da pesquisa foram então contatadas pelo telefone. No telefonema foi pedido ao setor de recursos humanos (RH) da empresa, após esse ser informado sobre detalhes da pesquisa, o e-mail da pessoa que julgava ser a mais indicada a receber o questionário. Por fim, o e-mail fornecido pelo RH recebeu o mesmo questionário e mais esclarecimentos sobre a pesquisa. Ressalta-se que os resultados apresentados neste artigo são parte de um estudo de maior abrangência no que se refere ao conteúdo da estratégia de produção nas empresas que compuseram a amostra. 4. Apresentação e análise dos resultados Das 19 empresas que responderam ao questionário, oito declararam ser nacionais, seis estrangeiras e cinco omitiram essa informação. De dezoito respondentes, quatro afirmaram ter até 100 funcionários, oito possuem entre 101 a 400, quatro possuem de 401 a 1000, duas 5

possuem mais de 1000 funcionários. Ressalta-se que especificidades relacionadas ao tamanho da empresa não foram o foco desse trabalho. No que se refere às prioridades competitivas, foi solicitado que as empresas assinalassem entre custo, qualidade, tempo de entrega e nível de serviço, qual ou quais eram consideradas prioridades competitivas. De treze empresas, oito mencionaram a qualidade, seis mencionaram o custo, cinco o tempo de entrega, três a flexibilidade e apenas uma disse que o nível de serviço é uma prioridade. É preciso destacar que foram descartadas a resposta de três empresas, pois essas assinaram todas as possibilidades como prioridades e 4 não responderam esse item. A figura 1 ilustra o que foi mencionado nesse parágrafo. Figura 1 - Prioridades Competitivas. Como observa Vanalle et al. (2009), as montadoras no Brasil predominantemente valorizam em primeiro lugar a dimensão custo, depois qualidade e flexibilidade. O que foi possível notar pelos resultados da pesquisa é que as prioridades competitivas mais valorizadas pelos respondentes foram qualidade e custo. Embora esteja em ordem invertida ao resultado do trabalho de Vanalle et al. (2009) (custo e, em seguida, qualidade), é possível afirmar que isso sinaliza alinhamento das prioridades competitivas das montadoras e de seus fornecedores. O fato de um número maior de empresas da amostra terem assinalado qualidade, pode ser explicado pela forte pressão exercida pelas montadoras no que se refere a essa dimensão competitiva. De treze respostas, onze afirmaram que os clientes influem muito na qualidade, duas que influem razoavelmente, sendo que nenhuma respondeu que não influem. De treze, sete disseram serem freqüentemente auditadas pelos clientes, cinco disseram que essa auditoria acontece raramente e apenas uma disse que não recebe auditoria (a menor firma da amostra). Sendo que todas as companhias que afirmaram serem auditadas disseram que essas auditorias têm sido úteis para a melhoria da qualidade. A entrega, no caso dos fornecedores, veio antes da flexibilidade citada por Vanalle et al. (2009) como a terceira prioridade das montadoras. Isso também se deve às exigências na 6

entrega feita pelas montadoras, como foi observado no trabalho de Guimarães e Teodoro Filho (2009). No que se refere à relação com fornecedores, de doze respostas obtidas, cinco afirmaram que o número de fornecedores cresceu nos últimos anos, seis afirmaram que esse número permaneceu constante e apenas uma afirmou que esse número diminuiu. Uma empresa respondeu que não tem esse controle, o que indica que ela não deve ter um relacionamento tão estreito com os fornecedores. A literatura (CASTRO, 2000) indica que as montadoras tiveram a preocupação de consolidar um pequeno número de fornecedores, mas nessa pesquisa, no que se refere aos fornecedores, isso não foi observado. Foi pedido para que as firmas enumerassem as prioridades no processo de seleção dos fornecedores, sendo atribuído 1 para a maior prioridade e 8 para a menor. A figura a seguir mostra a somatória desses valores para cada item para 18 empresas, assim a menor somatória indica o item mais priorizado. Figura 2 - Prioridade no processo de seleção dos fornecedores. Como mostra o gráfico, o custo é a maior prioridade seguida pela homologação de amostras (avaliação, por parte da empresa contratante, do produto da empresa que pretende se tornar uma fornecedora do mesmo), tempo de mercado é a menor. O que reforça a idéia que para os fornecedores não diretamente ligados às montadoras o custo tende a ser o critério ganhador de pedido. A figura 3 indica quantas firmas afirmaram usar cada indicador para a avaliação do desempenho de um fornecedor, lembrando que esse item foi respondido por 14 empresas. 7

Figura 3 - Indicadores de desempenho de fornecedores. Considerando o processo de avaliação dos fornecedores, de quatorze firmas, doze afirmaram utilizar indicadores da qualidade, doze cumprimento de prazo, oito conformidade nas auditorias, seis estabilidade de preço e três envolvimento na solução de problemas. Isso mostra que a preocupação com qualidade também é grande na relação das empresas de autopeças com seus fornecedores. Como se afirma no tópico abaixo, os dados mostram que as empresas de autopeças buscam nos seus fornecedores, o reforço para suas prioridades competitivas. 5. Considerações finais O artigo teve como objetivo principal mostrar aspectos relacionados à relação com fornecedores (considerada uma área de decisão estrutural) e às prioridades competitivas que compõem o conteúdo da estratégia de produção em empresas de autopeças. Trata-se de uma survey exploratória, cujo objetivo é permitir uma visão inicial do tema, para aprofundamentos futuros. Observou-se que as prioridades competitivas das empresas de autopeças que responderam ao questionário são qualidade e custo. Apesar de estar na ordem inversa ao que mostra os estudos de Vanalle et al. (2009), ou seja, nas montadoras as prioridades são custo e depois qualidade, acredita-se haver alinhamento entre prioridades das montadoras e de seus fornecedores. A ordem inversa se deve à grande pressão pela qualidade que as montadoras exercem. Também, notou-se que as empresas de autopeças buscam em seus fornecedores, o reforço para suas prioridades competitivas. O custo e a homologação de amostras ficaram entre os critérios mais citados, quando se trata da seleção de fornecedores. Os indicativos de qualidade aparecem em primeiro lugar no que se refere aos critérios utilizados na avaliação de fornecedores. Acredita-se que um panorama melhor da indústria de autopeças poderia ser obtido em estudos mais aprofundados. Apesar de mostrar aspectos importantes de uma amostra de empresas, esse trabalho não levou em consideração particularidades como, por exemplo, tamanho da empresa e se é fornecedor de primeira ou demais camadas com relação às montadoras. O presente trabalho deve servir de base para estudos que aprofundem questões relacionadas às prioridades competitivas e à relação com fornecedores nas empresas de autopeças. 8

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