Consideremos a equação (42) da aula 11 para um líquido incompressível

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Transcrição:

Estática dos Fluidos (continuação) Aplicações Consideremos a equação (4) da aula 11 para um líquido incompressível p( z ) = p( z1) + ρgh, (1) onde z está a uma profundidade maior que z 1 e a densidade ρ do líquido é tomada como constante. Como ρ e g são constantes, esta equação implica que a diferença de pressão entre dois pontos do líquido depende apenas da diferença de altura entre esses dois pontos e não da forma do recipiente (veja a figura abaixo). Esta é lei de Stevin, enunciada na aula 11. 1

Imagine agora que o valor da pressão na superfície do líquido do desenho acima seja aumentado por um valor p, por exemplo, pela ação de um pistão acoplado de maneira justa à boca do recipiente. A equação (1) nos diz então que o novo valor da pressão no ponto 1 é p ( p + p) + gh = ( p + gh ) + p = p + p = novo 0 1 0 1 1velho 1 ρ ρ, () ou seja, quando a pressão na superfície do líquido aumenta por um valor p a pressão em qualquer ponto no interior do líquido também aumenta por p. A equação (1) também pode ser usada para calcular o aumento da pressão no ponto provocado pelo aumento de p na pressão no ponto 1: p ( p + p) + gh = ( p + gh ) + p = p + p = novo 1 1 velho ρ ρ. (3) Quando um ponto do líquido sofre uma variação de pressão p, todos os pontos do líquido sofrem a mesma variação de pressão. Este fenômeno foi observado experimentalmente por Pascal em 1653 e é chamado de princípio de Pascal. O princípio de Pascal pode ser enunciado como: Se produzirmos uma variação de pressão em um ponto qualquer de um líquido em equilíbrio, essa variação se transmite integralmente a todo o líquido e às paredes do recipiente.

Uma aplicação importante do princípio de Pascal é o elevador hidráulico, mostrado na figura abaixo. As duas aberturas do dispositivo estão equipadas com pistões que podem se mover verticalmente e o seu interior está cheio com um fluido, por exemplo, um óleo. Aplica-se uma força F 1 sobre o pistão da abertura pequena, que tem área A 1. A pressão gerada neste ponto é P = F 1 /A 1. Essa pressão é transmitida integralmente a todos os pontos no interior do fluido, chegando ao pistão da abertura grande que tem área A. A pressão sobre este pistão é igual à pressão sobre o outro, de maneira que: 3

F A 1 1 = F A F = A F1 A1. (4) Como A 1 < A, a força exercida sobre o pistão grande é maior do que a força aplicada sobre o pistão pequeno. O elevador hidráulico é um equipamento que multiplica o valor de uma força, assim como a alavanca. O fator de multiplicação, no caso do elevador hidráulico, é a razão entre as áreas A /A 1. Outra consequência do princípio de Pascal é o chamado princípio dos vasos comunicantes. Seja um recipiente como o da figura abaixo, formado por tubos com várias formas que se comunicam entre si. As extremidades superiores dos tubos estão abertas e em contato com o ar a pressão atmosférica p 0. Segundo a equação (1), a altura do líquido em cada tubo é 4

p p0 h = ρg, (5) onde p é a pressão no fundo do recipiente. Considerando que todos os pontos no fundo do recipiente estão à mesma pressão, a equação acima implica que a altura do líquido é a mesma em todos os tubos. A equação (1) também implica que a pressão tem o mesmo valor para todos os pontos do recipiente que estão à mesma altura z, p z = p ρgh. (6) O princípio de Pascal encontra muitas aplicações em instrumentação física e engenharia mecânica. Dois importantes instrumentos usados para medir pressão baseados neste princípio são o barômetro de mercúrio e o manômetro. O barômetro de mercúrio está ilustrado na figura abaixo. 5

Ele consiste de um tubo longo de vidro fechado em uma extremidade e contendo mercúrio. A extremidade aberta do tubo é tampada com o dedo e ele é invertido dentro de um recipiente que contém mercúrio. Quando o dedo é retirado, mercúrio escoa do tubo para o recipiente até que o peso da coluna de mercúrio dentro do tubo seja equilibrado pela pressão atmosférica p 0. A coluna de mercúrio baixa até uma altura h, deixando um bom vácuo na parte superior do tubo (p 0). A aplicação da equação (1) ao problema nos dá p p = ρgh 0, onde ρ é a densidade do mercúrio. Fazendo p = 0 temos. p0 = ρgh. (7) Portanto, o barômetro de mercúrio mede a pressão atmosférica diretamente a partir da altura da coluna de mercúrio. O tipo de manômetro mais simples é o chamado manômetro de tubo aberto. Ele está ilustrado na figura abaixo. O tubo em forma de U contém um líquido de densidade conhecida ρ (por exemplo, água ou mercúrio). Uma das extremidades do tubo está aberta para a atmosfera (pressão p 0 ) e a outra está em contato com um recipiente cuja pressão p queremos medir. 6

A pressão na base do tubo é a mesma em todos os seus pontos. Portanto, a equação (1) nos dá p0 + ρ gy = p + ρgy1 ( y y ) ρgh p p0 = ρ g =. (8) 1 O manômetro não mede a pressão p diretamente, mas sim a diferença entre p e a pressão atmosférica. Essa diferença é chamada de pressão manométrica: p p 0 = pressão manométrica. Note que a pressão manométrica pode ser negativa. Basta que a pressão p no recipiente seja menor que a pressão atmosférica, como no caso em que nela haja um vácuo parcial. 7

Empuxo 5910170 Física II Ondas, Fluidos e Termodinâmica USP Prof. Antônio Roque Outro fenômeno que ocorre em fluidos e é bem conhecido de vocês é o empuxo. O princípio de Arquimedes, descoberto pelo matemático e físico grego Arquimedes de Siracusa (87-1 a.c.), estabelece que quando um corpo está parcial ou totalmente imerso em um fluido, o fluido exerce sobre o corpo uma força de baixo para cima igual ao peso do volume do fluido deslocado pelo corpo (veja a figura a seguir). O que determina se um corpo flutua ou afunda num fluido é a relação entre a sua densidade e a do fluido. Se a densidade do corpo for maior que a do fluido, o corpo afunda até o fundo do recipiente que contém o fluido. Se a densidade do corpo for menor que a do fluido, o corpo flutua parcialmente submerso como o da figura acima. Se a densidade do corpo for igual à do fluido, ele flutua totalmente submerso no interior do fluido. 8

Para provar o princípio de Arquimedes, vamos usar a forma integral da condição de equilíbrio hidrostático (equação 9) da aula passada. Consideremos um corpo de volume V e área superficial S com qualquer forma e densidade ρ c. Vamos supor, para simplificar, que: 1. O corpo é incompressível, isto é, a sua forma e o seu volume não são alterados quando ele está imerso em um fluido. Isto é válido para a maioria dos corpos sólidos, como a coroa de ouro da história da descoberta do princípio de Arquimedes 1, mas não para corpos feitos de borracha ou certos plásticos, por exemplo.. O corpo não absorve parte do fluido no qual está imerso. Portanto, não consideraremos uma situação como, por exemplo, a de um pedaço de pão flutuando num prato de sopa. Essas simplificações não precisam ser feitas para que se possa demonstrar o princípio de Arquimedes, mas o tratamento físico ficaria mais complicado e esse não é o nosso objetivo aqui. Vamos supor que o corpo é colocado em um fluido de densidade ρ f e que atinge o equilíbrio quando está totalmente submerso no fluido. A condição de equilíbrio hidrostático é então 1 Leia a história no livro do Nussenzveig, por exemplo. 9

r r r Ftotal = fdv pds = 0, (9) V onde f r é a densidade da força gravitacional sobre o corpo e p é a pressão exercida pelo fluido sobre a superfície do corpo. Podemos escrever a equação acima como r r r Ftotal = Pc + E = 0, (10) S onde peso P r c é a força da gravidade atuando sobre o corpo, isto é, seu r P c = V r ρcgdv, (11) e E r é a força feita pelo fluido sobre o corpo, isto é, o empuxo r r E pds. (1) = S Note que se P r c > E r o corpo afunda e se P r c < E r o corpo sobe. Como o corpo está em equilíbrio dentro do fluido, do ponto de vista das moléculas do fluido não importa qual o material que constitui o volume submerso. A pressão feita pelas moléculas que colidem contra a superfície do volume é a mesma, independentemente do material do qual é feito o corpo, desde que haja equilíbrio. 10

Em particular, se todo o espaço ocupado pelo corpo fosse substituído por fluido idêntico ao fluido onde ele está imerso, o sistema continuaria em equilíbrio (veja a figura abaixo). Neste caso, a condição de equilíbrio (equação 9) nos dá r r r Ftotal = ρ f gdv pds = 0, (13) V onde a integral de volume é o peso do fluido que ocupa o mesmo volume do corpo r P f = V f S r ρ gdv, (14) e a integral de superfície é igual à da equação (9). Então, r r r r pds = ρ f gdv E = Pf. (15) S V O empuxo aponta para cima e seu valor é igual ao peso do fluido deslocado pelo corpo. Este é o princípio de Arquimedes. Substituindo (15) em (9), a condição de equilíbrio fica 11

r F = r r r ( ρ ρ ) gdv 0 total ρcgdv ρ f gdv = c f = V V V. (16) Para que o corpo fique em equilíbrio totalmente imerso no fluido é necessário que a sua densidade ρ c seja igual à densidade do fluido ρ f. Supondo que o campo gravitacional é constante, o que é uma aproximação muito boa para as vizinhanças da superfície da terra, a condição de equilíbrio acima torna-se r g V ρ dv c V r ρ f dv = g ( M M ) = 0 c f, (17) ou seja, o corpo só consegue ficar em equilíbrio totalmente imerso no fluido se a sua massa for igual à massa do fluido deslocado por ele. Animais marinhos, como peixes e moluscos, possuem ossos porosos ou bexigas nadadeiras cuja quantidade de ar em seu interior pode ser controlada para que a massa do animal seja variável e permita que ele mantenha a condição acima sempre válida. Submarinos, por outro lado, ajustam sua massa para se manter em equilíbrio quando submersos bombeando água para dentro ou para fora de tanques de lastro (ou de balastro). 1

Para provar o princípio de Arquimedes não é preciso supor que o corpo está totalmente submerso no fluido como fizemos acima. Podemos supor que ele está flutuando apenas com parte do seu volume submersa no fluido e que a outra parte está em contato com outro fluido, como o ar, por exemplo (veja a figura abaixo). Nesse caso, a condição de equilíbrio (equação 9) continua igual, só que agora a integral que dá a força superficial tem dois termos, r = r r total r F fdv pads p f ds = 0, (18) V S 1 S 13

onde S 1 é a área superficial do corpo em contato com o ar, S é a área superficial do corpo em contato com o fluido, p a é a pressão do ar e p f é a pressão do fluido. Assim como antes, a integral pela superfície do corpo imersa no fluido é o empuxo do fluido, r E = S de maneira que a equação (18) implica que r r r r E = fdv + pads = Pc + V S p f r ds, (19) 1 S 1 r pads. (0) Quando um corpo flutua em equilíbrio parcialmente submerso em um fluido, o empuxo feito pelo fluido é igual ao peso do corpo mais o peso extra resultante da pressão que o ar faz sobre a parte do corpo que está fora do fluido. Note que a pressão feita pelo ar sobre o corpo (o peso extra mencionado acima) é necessária para que haja equilíbrio. Como este caso em que o corpo flutua parcialmente submerso no fluido só ocorre quando a densidade do corpo é menor que a do fluído, se não houvesse a pressão do ar (como no vácuo, por exemplo) o empuxo feito pelo fluido empurraria o corpo totalmente para fora do fluido. 14

O mesmo raciocínio feito anteriormente, em que se imagina que o volume do corpo dentro do fluido é substituído por fluido, pode ser repetido agora para mostrar que, no equilíbrio, r r ρ f gdv p f ds = 0, (19) V S onde V é o volume do corpo encerrado por S, isto é, o volume do corpo dentro do fluido. Esta equação corresponde novamente ao princípio de Arquimedes: o empuxo feito pelo fluido é igual ao peso do fluido deslocado pelo corpo. Na prova do princípio de Arquimedes feita acima foi implicitamente assumido que a massa do corpo não é grande o suficiente para que o seu campo gravitacional altere a distribuição de massa do fluido. Em geral, para todas as aplicações de interesse prático na terra, o efeito da força gravitacional do corpo sobre as moléculas do fluido é desprezível. Porém, se quisermos estudar o que acontece quando um corpo com a massa da Terra cai sobre a atmosfera de Júpiter temos que considerar este efeito. Podemos imaginar o que acontece: o fluido nas vizinhanças do corpo é puxado em direção a ele e isso resulta num aumento da força de empuxo feita pelo fluido sobre o corpo. 15

Tensão superficial Outro fenômeno típico de fluidos é a tensão superficial. Embora a interface entre dois materiais possa ser considerada, macroscopicamente, como uma superfície matemática bidimensional, ela é feita por moléculas com propriedades físicas. O número de moléculas numa camada, por mais fina que ela seja, é muito grande. Por causa disso, as propriedades físicas dessas moléculas geram propriedades físicas detectáveis macroscopicamente, como energia e força superficial. Daí a necessidade de considerar efeitos devidos às moléculas da superfície de um fluido mesmo quando se adota um tratamento macroscópico contínuo como estamos fazendo. O tratamento adequado dos fenômenos de superfície requer o uso de modelos microscópicos para a matéria e este não é o nosso propósito neste curso. O que vamos fazer aqui, procurando entender a origem da tensão superficial, é usar um modelo tri-dimensional bastante elementar de um fluido em que as moléculas estão colocadas nos vértices de uma rede cúbica de lado L (veja a figura a seguir). Para simplificar ainda mais o modelo, vamos supor que a superfície do fluido faz interface com o vácuo. 16

Cada molécula no interior do fluido possui seis ligações com suas moléculas vizinhas (a figura mostra um exemplo em vermelho), mas as moléculas da superfície possuem apenas cinco ligações (a figura mostra um exemplo em laranja). Vamos supor que a energia de ligação total de uma molécula no interior do fluido, devido às suas seis ligações, é ε. Para saber por que o valor é negativo, olhe para o gráfico da energia potencial da interação intermolecular da página da aula 11. Como uma molécula na superfície tem uma ligação a menos do que as seis de uma molécula no interior, a sua energia de ligação total é (5/6)ε. 17

Este valor pode ser escrito como ε + ε/6, ou seja, a falta de uma ligação em uma molécula da superfície é equivalente à adição de uma energia positiva igual a ε/6 à energia de ligação total de uma molécula no interior. Em outras palavras, para cada molécula da superfície deve-se acrescentar uma quantia ε/6 à energia total da superfície em relação à energia de uma camada interna de moléculas. Como a densidade de moléculas na superfície bi-dimensional do nosso modelo simples é n = 4/L, a superfície possui uma densidade de energia extra em relação à densidade de energia de uma camada interna dada por 4 ε 6 L α =, (18) que é chamada de densidade de energia superficial. A unidade de α é J/m ou N/m, isto é, unidade de força por comprimento. Para se aumentar a área da superfície por uma quantidade infinitesimal da é necessário realizar um trabalho igual à quantidade de energia contida nessa área extra, dw = αda. (19) 18

Como este trabalho é positivo, a superfície opõe uma resistência à sua extensão. É como se a superfície tivesse uma tensão interna. Esta é a tensão superficial. Formalmente, a tensão superficial γ é definida como a força por unidade de comprimento que atua ortogonalmente sobre qualquer linha imaginária da superfície. Dada uma linha imaginária de comprimento L da superfície de um fluido (veja a figura abaixo), a existência da tensão superficial γ faz com que as moléculas dessa linha estejam submetidas a uma força total dada por F = γl. (0) Imagine que uma força F atuando ortogonalmente sobre uma linha de comprimento L da superfície estica a superfície por uma quantia ds uniforme por todo o comprimento L. O resultado disso é que a área da superfície aumenta por da = LdS (veja a figura a seguir). 19

Segundo a equação (19), o trabalho necessário para provocar esse aumento de área é dw = α da = αlds. (0) Também podemos expressar o trabalho acima como o produto da força F pelo deslocamento da linha, dw = FdS = γlds. (1) Igualando as duas expressões, γ = α. () A tensão superficial é idêntica à densidade de energia superficial. Isso também se reflete no fato de que as unidades das duas são iguais a N/m. O fato de que a densidade de energia superficial α é positiva implica que as áreas das interfaces entre fluidos tendem a assumir os menores valores possíveis (para minimizar a energia superficial) consistentes com as demais forças atuando sobre os fluidos, como pressões e a força da gravidade. 0

É por isso que gotículas de orvalho e bolhas de sabão são aproximadamente esféricas. A pressão no interior de uma gota de água ou de uma bolha de sabão é maior que a pressão fora, caso contrário ela murcharia e desapareceria. Podemos calcular a diferença entre a pressão no interior de uma gota e a pressão exterior da seguinte maneira: Imaginemos um corte passando pelo centro da gota (veja a figura abaixo). A fronteira circular da uma das metades da gota tem comprimento πr, onde r é o raio da gota. Portanto, a força total devida à tensão superficial na gota é 1

F = πrγ. (3) Por outro lado, existe uma força exercida de dentro para fora da gota devida à diferença entre a pressão no interior e a pressão no exterior. Em cada ponto da superfície da gota, a força devida a essa diferença de pressão é perpendicular à superfície e dirigida para fora (veja a figura anterior). Quando essas forças são somadas vetorialmente, as componentes verticais se cancelam e só resta a soma das componentes horizontais, que aponta para a direita na figura anterior. O valor dessa força é igual ao produto da diferença de pressão pela área da seção reta da esfera, πr : F = PA = π r P, (4) onde P é a pressão dentro da gota menos a pressão fora dela. Como a gota está em equilíbrio, a força devida à diferença de pressão deve ser igual à força devida à tensão superficial. Então: πr P = πrγ γ P =. (5) r Este resultado mostra que a diferença de pressão é inversamente proporcional ao raio da gota esférica.

Notem que o resultado acima vale tanto para uma gota de água no ar (uma gotícula de chuva, por exemplo) como para uma bolha de ar na água (uma bolha de ar em uma garrafa de água com gás, por exemplo). No caso de uma bolha de sabão a situação é um pouco mais complicada, pois existem duas interfaces: (i) entre o ar no interior da bolha e a superfície interna feita de água misturada a sabão; e (ii) entre a superfície externa, também feita de água e sabão, e o ar externo à bolha. Como essas duas interfaces são esféricas, de mesmo raio e entre os mesmos materiais (ar e água ensaboada), podemos considerar que cada uma gera uma diferença de pressão igual a (5), de maneira que a diferença de pressão total entre o interior da bolha de sabão e o exterior é 4γ P =. (6) r O valor experimental de γ para a interface entre o ar e a água é de 0,07 N/m (a 5 o C e com o ar a 1 atm). Logo, para uma gota de água de 1 mm de diâmetro no ar a diferença de pressão entre o interior da gota e o ar no exterior é: 3

( 0,07 N/m) P = = 88 Pa 3 0,5 10 m. Este é um excesso de pressão muito pequeno em comparação com a pressão atmosférica (~ 10 5 Pa). Quando um líquido está contido em um recipiente, as moléculas da sua superfície próximas à parede do recipiente são atraídas para a parede. Esta força atrativa é chamada de adesão. Ao mesmo tempo, essas moléculas também estão sujeitas à força atrativa de coesão exercida pelas demais moléculas do líquido, que as puxam na direção oposta (para o interior do líquido). Se a força adesiva for maior que a força coesiva, a superfície do líquido se curva para cima em contato com a parede do recipiente (veja a figura (a) abaixo). No caso contrário, a superfície do líquido se curva para baixo (veja a figura (b) abaixo). 4

O ângulo de contato θ na figura acima é o ângulo entre a parede e a tangente à interface entre o ar e o líquido no ponto de contato da interface com a parede. Por convenção, ele é medido a partir do interior do líquido. Note que se θ < 90 o (ângulo agudo) teremos um caso em que a adesão é maior que a coesão, como o da figura (a) acima, e a superfície do líquido se curva para cima; já se θ > 90 o (ângulo obtuso) teremos um caso em que a coesão é maior que a adesão, como o da figura (b) acima, e a superfície do líquido se curva para baixo. O ângulo de contato θ é uma constante que depende das propriedades dos três materiais envolvidos: o fluido no interior do recipiente (indicado por líquido na figura), o fluido onde o recipiente e o líquido estão (indicado por ar na figura) e o material do qual é feito o recipiente. Por exemplo, o ângulo de contato entre a interface água-ar e o vidro é de aproximadamente 10 o (este é um ângulo muito difícil de ser medido e vocês vão encontrar diferentes valores em diferentes livros, indo desde 0 o até ~80 o ) e o ângulo de contato entre a interface mercúrio-ar e o vidro é de aproximadamente 140 o. 5

Se a adesão for maior que a coesão, um líquido em um tubo estreito mergulhado em um recipiente com o mesmo líquido irá se levantar até uma altura h em relação ao nível do líquido no recipiente (veja a figura (a) abaixo). Caso contrário, o liquido irá se abaixar (veja a figura (b) abaixo). A altura h pode ser calculada da seguinte maneira. O peso P da coluna de líquido de altura h é: P = πr hρg, (7) onde r é o raio do tubo cilíndrico e ρ é a densidade do líquido. A força devida à tensão superficial que atua ao longo da periferia do líquido (circulo de comprimento L = πr) é: F = πrγ. (8) Essa força forma um ângulo com a parede igual a θ. No equilíbrio, a componente vertical da força F é igual ao peso da coluna de líquido: 6

F cosθ = P πrγ cosθ = πr hρg. Isolando h nesta expressão: γ cosθ h =. rρg (9) Quando θ < 90 o (adesão maior que coesão), a equação acima dá uma altura h positiva. Este é o caso mostrado na figura (a) acima. Quando θ > 90 o (coesão maior que adesão), a equação acima dá uma altura h negativa. Este é o caso mostrado na figura (b) acima. Esses efeitos são chamados de capilaridade. 7