SUINOCULTURA DINÂMICA Ano I N o 4 Abril/1994 Periódico técnico-informativo elaborado pela EMBRAPA CNPSA Sistemas de cruzamento entre raças para produção de suínos para o abate Renato Irgang 1 Jerônimo A. Fávero 2 Na edição n o 3 de Suinocultura Dinâmica, são descritas as razões e as vantagens na utilização dos cruzamentos entre raças e algumas opções de combinações raciais para a produção de suínos para o abate. Objetivo desta edição é informar criadores e técnicos em suinocultura sobre os procedimentos necessários para se dispor de animais cruzados e fazer uso dos cruzamentos para produzir suínos para o abate. Sistemas fixos de cruzamentos de duas raças Figura 1: Macho Large White para produção de leitoas F1 LWLD ou para produção de suínos 3-cross LW(DRLD), ou para retrocruzamento LW (LDLW). A Cruzamento simples: Machos de uma raça por exemplo, Duroc (DR) são cruzados com fêmeas Landrace (LD) ou Large White (LW). Os animais produzidos são todos vendidos para o abate. Esse tipo de cruzamento é utilizado quando se dispõe de apenas duas raças de alta qualidade genética. Permite explorar 100% da heterose 1 Eng. Agro., Ph.D., Pesquisador da EMBRAPA CNPSA 2 Eng. Agro., M. Sc., Pesquisador da EMBRAPA CNPSA individual nos animais para abate, expressa em maior taxa de sobrevivência durante o aleitamento e menor idade de abate. Não permite explorar a heterose materna e requer a reposição contínua de reprodutores de raça pura para o plantel. Isso implica em adquirir animais de criadores de reprodutores ou manter um plantel separado para sua produção. Na tabela I, apresentamos alguns exemplos fixos de duas raças. Resultados de experimentos Suínos e Aves
Tabela 1: Heterose resultante do cruzamento de duas ou mais raças em sistemas fixos de cruzamentos Raça Raça Heterose esperada (%) Macho Fêmea Indiv. Materna Paterna Duas raças(*): DR LD 100 0 0 DR LW 100 0 0 Cruz simples LW LD 100 0 0 LD LW 100 0 0 Retrocru- LD LDLW 50 100 0 zamento LD DRLD 50 100 0 LW LDLW 50 100 0 Três raças DR LWLD 100 100 0 LW DRLD 100 100 0 Quatro raças DRLB LWLD 100 100 100 DRHS LWLD 100 100 100 * DR=Duroc; LD=Landrace; LW=Large White; LB=Landrace Belga; HS=Hampshire da Embrpa Suínos e Aves (Tabela II) indicam que o cruzamento de machos DR e fêmeas LD e LW são recomendados para aumentar o peso aos cinco meses de idade e para reduzir a idade e a espessura de toucinho dos animais de abate. Outra opção de cruzamento fixo de duas raças envolve machos e fêmeas Large White (LW) e LD. Apesar das vantagens de heterose dos animais de abate resultantes do cruzamento de duas raças, o sistema é recomendado principalmente para a produção de fêmeas ou matrizes F1 a serem utilizadas pelos criadores de suínos para o abate, tanto em retrocruzamento como no cruzamento de três ou quatro raças. A função de produzir fêmeas seria mais vanyajosa se ficasse a cargo de criadores de reprodutores, em plantéis de multiplicação, que devem utilizar machos e fêmeas de alto valor genético oriundos de Granjas Núcleo que selecionam com base no Teste de Granja. Resultados obtidos na EMBRAPA CNPSA indicam que criadores de reprodutores devem produzir fêmeas F1 LWLD, do cruzamento de machos LW e fêmeas LD; fêmeas F1 DRLD, de machos DR e fêmeas F1 LDLW, de machos LD e fêmeas LW; e fêmeas F1 DRLW, de machos DR e fêmeas LW nessa ordem de importância para a venda e utilização pelos criadores comerciais de suínos. Tabela 2: Peso aos cinco meses de idade, idade aos 100kg de peso vivo e espessura de toucinho em suínos de raças puras e mestiços do cruzamento de duas raças. Raça ou combinação Peso 5 meses Idade 100kg de ET* racial de idade (kg) peso vivo (dias) (mm) Landrace (L) 77,5 185 20,9 Large White (LW) 75,7 185 21,1 L x LW (F1) 81,2 179 21,4 LW x L (F1) 79,3 180 20,3 Duroc (DR) x L (F1) 81,1 178 20,4 DR x LW (F1) 82,5 174 21,4 * Média in vivo. ET=Espessura de toucinho Figura 2: Macho Landrace Belga para produção de machos híbridos ou sintéticos. B Retrocruzamento: Acasalamento de fêmeas F1 com machos de uma das raças da fêmea. Para isso, é necessário produzir as fêmeas F1 e adquirir os machos da raça ou produzi-los na granja. 2
O sistema é muito utilizado na Europa, onde predominam as raças LW e LD. Na Tabela I, indica-se cruzamento de machos LD e fêmeas F1 LWLD ou DRLD e de machos LW e fêmeasf1 LDLW. Verifica-se que permite explorar 100% da heterose materna e 50% da heterose individual. Isso requer o uso de sêmen de Centrais de Inseminação ou a compra de machos de plantel. Suínos resultantes do retrocruzamento são todos destinados para o abate. O retrocruzamento permite obter leitegadas de tamanho igual ou superior a qualquer outro sistema que explore 100% da heterose materna. Na EMBRAPA CNPSA, vereficou-se que fêmeas F1 em retrocruzamento podem produzir até três embriões a mais do que fêmeas de raças puras e número igual de embriões ao cruzamento de três raças. Criadores que pretendem explorar os retrocruzamentos podem produzir as fêmeas F1 e os machos de plantel em suas granjas, precisando para isso manter um grupo separado de reprodutores de raça pura. A compra de reprodutores de granjas e empresas que testam e selecionam animais continuamente permite manter a criação geneticamente atualizada. É um sistema que deve ser mais utilizado no Brasil. Sistema fixo de cruzamento de três raças ( 3-cross ) Tabela 3: Porcentagens máximas de heterose individual e materna esperada dos cruzamentos contínuos de duas e três raças. Cruzamento de 2 raças Cruzamento de 3 raças G R H(%) R H(%) M F I Mat M F I Mat 0 W L 100 0 W L 100 0 1 L WL 50 100 D WL 100 100 2 W LWL 75 50 L DWL 75 100 3 L WLWL 62 75 W LDWL 88 75 4 W LWLWL 69 62 D WLDWL 86 86 5 L WLWLWL 67 67 L DWLDWL 86 86 W=Large White; L=Landrace; D=Duroc. G=Geração; R=Raça; H=Heterose M=Macho; F=Fêmea; I=Individual; Mat=Materna o cruzamento de machos híbridos, com potencial genético para produção de carcaças com alto rendimento de carne magra e de boa qualidade, com fêmeas F1, com capacidade genética para produzir mais de 20 leitões por ano. Machos híbridos DRLB produzidos pelo cruzamento de machos DR e fêmeas Landrace Belga (LB); DRHS, do cruzamento de DR e Hampshire (HS); PIHS, do cruzamento de Pietrain (PI) e HS; e PILW, do cruzamento de PI e LW com características de linha macho devem ser utilizados no cruzamento de quatro raças, sempre que estejam disponíveis. Por se tratar de quatro raças, o sistema requer, na prática, a compra de fêmeas e machos híbridos de reposição de empresas e granjas especializadas em melhoramento genético. Cruzamento de fêmeas F1 com machos de uma terceira raça. No Brasil, um dos cruzamentos mais recomendados é o de machos DR com fêmeas F1 LWLD (Tabela I). Permite explorar 100% de heterose individual e 100% da heterose materna. outra opção é o cruzamento de fêmeas F1 DRLD e machos LW, recomendado tanto para sistemas confinados de criação como para sistemas intensivos de produção de leitões ao ar livre ( SISCAL ). Sistema fixo de cruzamento de quatro raças Permite explorar 100% da heterose individual, materna e paterna (Tabela I), mas sua aplicação apenas é viável quando se dispõe de quatro ou mais raças ou linhas de seleção de alta capacidade genética. Nesse caso, recomenda-se Sistema contínuo ou rotacional de cruzamento de duas ou três raças Enquanto os sistemas ficos de cruzamento requerem do criador comercial de suínos a manutenção de um plantel para produção e seleção de machos e fêmeas F1 ou a compra de machos e fêmeas de reposição de outros criadores, os cruzamentos contínuos ou rotacionais apresentam a vantagem de não ser necessário adquirir as fêmeas de reposição, mas apenas os machos. O método consiste em utilizar animais de duas ou três raças, em cruzamentos alternados. A cada nova geração, introduz-se machos da raça menos relacionada com as fêmeas (Tabela III) podendo-se, para isso, fazer uso da inseminação artificial. No caso de duas raças, tomando-se como exemplo LW e LD, rpoduz-se inicialmente animais 3
Figura 3: Fêmeas Landrace para produção de leitoas F1 DRLD ou LWLD. F1 LWLD. Selecionam-se fêmeas LWLD para o plantel e vendem-se os machos e as fêmeas restantes para o abate. Fêmeas LWLD são acasaladas com machos LD e suas filhas LD (LWLD) são acasaladas com machos LW na próxima geração, e assim alternadamente. A mesma sequência de cruzamentos deve ser seguida com DR e LD, ou com DR e LW. Com três raças DR, LD e LW produzemse primeiro animais F1 LWLD. Fêmeas F1, selecionadas, são acasaladas com machos DR. Fêmeas DR (LWLD) são selecionadas para o plantel e acasaladas com machos LD, e fêmeas resultantes deste cruzamento são selecionadas e acasaladas com machos LW. Na quarta geração, fêmeas LW[LD[DR(LWLD)]]voltam a ser acasaladas com machos DR. Fêmeas não selecionadas e machos são todos vendidos para o abate. No início, explora-se a heterose individual nos animais de abate e a heterose materna nas fêmeas F1. A heterose estabiliza-se na quarta e quinta gerações, em torno de 67% com duas raças e de 86% com três raças (Tabela III). Esse sistema exige muito controle por parte do criador, pois em determinado momento deverá ter fêmeas de diferentes combinações raciais no platel. E a escolha errada de machos para os acasalamentos pode determinar redução da heterozigosidade das progênies e resultar em menores ganhos de heterose. A reposição de porcas, após a terceira parição, por suas filhas evita a presença de animais de mais do que um grupo genético no plantel e facilita os acasalamentos, mas pode acarretar em perda de produtividade. A utilização de fêmeas de cruzamentos contínuos no plantel depende de sua produtividade e do nível de redução no seu desempenho, causada pela recombinação de seus gametas em relação às fêmeas F1. Na Tabela IV, são apresentados resultados comparativos de fêmeas LW, F1 e F2 e de fêmeas de cruzamentos contínuos de LW, LD e Wessex Saddleback. Os resultados indicam perda de somente 0,14 leitão por leitegada em fêmeas F2 [9,64 (9,36 + (.5 (10,20 9.36)))] devido à recombinação dos gametas, indicando que, a princípio, fêmeas F2 podem ser utilizadas como matrizes. Em relação aos cruzamentos contínuos, número e peso médios de leitões desmamados semelhantes entre fêmeas do cruzamento contínuo de três raças e as F1 sugerem que o sistema pode ser utilizado com sucesso por criadores comerciais de suínos. Número menor de leitões produzidos pode ser esperado de fêmeas de cruzamentos contínuos de duas raças. Outra vantagem importante do sistema de cruzamentos contínuos é de ordem sanitária, pois ao produzir as fêmeas de reprodução o suinocultor não corre o risco de introduzir doenças que não existem em sua criação. Produção de animais sintéticos É uma alternativa para os sistemas de cruzamento já descritos. Ao invés de se manter uma, duas ou três raças puras para produção de animais mestiços, produz-se um grupo de animais resultante do cruzamento de duas, três ou mais raças, observando-se o seguinte: A Nos primeiros cruzamentos, utilizar reprodutores de alto valor genético para as características de interesse; B Maximizar a variação genética no grupo de animais fundadores, utilizando-se número adequado de animais não-aparentados de cada uma das raças de origem. Ao se obter o grupo desejado de mestiços, parte-se para a seleção de indivíduos dentro desse grupo, podendo-se chegar eventualmente à formação de uma nova raça, com atributos genéticos de outras. A disponibilidade de linhas sintéticas de fêmeas hiperprolíficas e de machos capazes de imprimir maior capacidade genética para produção de carne magra, de boa qualidade, deverá crescer de importância à medida que a suinocultura for se modernizando. 4
efeitos aditivos dos genes pela complementaridade e efeitos não-aditivos pela heterose. A utilização de machos híbridos e de fêmeas F1, produzidos a partir de reprodutores de alto valor genético para características de importância econômica, é fundamental para a melhoria do desempenho e do retorno financeiro da criação de suínos. Revisores Técnicos Elsio A. P. Figueiredo, EMBRAPA CNPSA Gustavo J. M. Lima, EMBRAPA CNPSA Claudio Rocha De Miranda, EMBRAPA CNPSA Ricardo Martins, EMATER, RS. Figura 4: Fêmea Duroc para produção de machos híbridos ou sintéticos. Tabela 4: Tamanho e peso de leitegadas produzidas por fêmeas de diferentes sistemas de cruzamentos. Tipo de Número de NV Desm(*) Peso (kg) cruzamento leitegadas leitegada leitegada desmame Large White 90 9,36 7,48 13,6 Fêmeas F1 114 10,20 8,49 14,0 Fêmeas F2 76 9,64 8,35 13,6 Cruz. Contínuos 2 raças 80 9,33 8,01 14,1 3 raças 88 10,04 8,47 14,5 Fonte: Hill e Webb (1982). NV=Nascidos vivos; Desm=Desmamados Como tirar proveito máximo dos cruzamentos O cruzamento entre raças permite explorar efeitos aditivos e não-aditivos dos genes. A utilização de fêmeas F1 no plantel é a que normalmente apresenta as maiores vantagens de heterose. Não basta utilizar somente fêmeas F1 produzidas a partir de qualquer macho ou grupo de fêmeas. É muito importante utilizar os melhores machos disponíveis para acasalar fêmeas de boa qualidade genética, de outras raças, e assim produzir fêmeas F1, pois os ganhos obtidos por seleção são transmitidos à próxima geração de mestiços, que acumulará também ganhos de heterose. Isso significa que produtores de fêmeas F1 e de machos híbridos (Multiplicadores) devem se abastecer de machos e fêmeas de raças puras de Granjas Núcleo em que a seleção é feita a partir dos Testes de Granja. A seleção dentro de raças e o cruzamento de animais de raças diferentes permitem explorar 5