PARQUE TECNOLÓGICO DE RIBEIRÃO PRETO



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Transcrição:

1 PARQUE TECNOLÓGICO DE RIBEIRÃO PRETO RELATÓRIO SETORIAL SOBRE INOVAÇÃO TECNOLÓGICA NA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA BRASILEIRA: Uma análise a partir dos indicadores de inovação. Beatriz Selan Sergio Kannebley Jr. Geciane Silveira Porto Secretaria de Desenvolvimento Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto Ribeirão Preto Outubro - 2007

2 Selan, B.; Kannebley Júnior, S.; Porto, G. S. Relatório setorial sobre inovação tecnológica na indústria farmacêutica brasileira: uma análise a partir dos indicadores de inovação, 2007. 79 p. : il. ; 31 cm Relatório Técnico. 1.Inovação Tecnologica. 2. Industria Farmacêutica

3 ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1 - Vendas do setor farmacêutico global de 1999 2006 8 Tabela 2 Ranking dos principais países importadores mundiais entre 2003 e 2005 (US$ bilhões) _ 10 Tabela 3 Principais companhias farmacêuticas mundiais e seus países de origem em 2006 11 Tabela 4 Comparação entre setor de Fármacos, a indústria de transformação e a indústria brasileira em 2005 16 Tabela 5 Divisão do setor farmacêutico das empresas com mais de 30 pessoas ocupadas 17 Tabela 6 Distribuição Espacial da Indústria Farmacêutica em número de unidades locais em 2005 18 Tabela 7 Distribuição percentual do volume de emprego por região (1998-2001) 19 Tabela 8 - Distribuição do Mercado Farmacêutico Brasileiro em 2003. 20 Tabela 9 Principais países importadores do setor para o Capítulo 30 da NCM 23 Tabela 10 Comparação entre as proporções dos tipos de inovação tecnológica das indústrias brasileiras 26 Tabela 11 Regime de dedicação do pessoal ocupado em atividades internas de Pesquisa e Desenvolvimentos 26 Tabela 12 Formas de Financiamento da indústria farmacêutica 28 Tabela 13 Evolução do número de empresas, valor gasto em insumos da atividade inovativa e sua participação na receita líquida de vendas para as três indústrias no período 2001-2003 e 2003-2005 30 Tabela 14 Grau de importância atribuído à parceria pelas empresas que implementaram inovações com relações de cooperação com outras organizações % * 32 Tabela 15 Comparação entre as formas de proteção entre 2003 e 2005 (%) 33 Tabela 16 Percentual de empresas que implementaram inovações segundo o impacto causado e grau de importância entre as indústrias em 2003 e 2005 34 Tabela 17 Razões para que as empresas não implementassem inovações e sem projetos 35 Tabela 18 Qualificação do mercado de trabalho e do setor de fármacos 41 Tabela 19 Origem do capital e atividade exportadora das empresas do setor de fármacos 42 Tabela 20 Valores médios exportados pelo setor em US$ 42 Tabela 21 Distribuição espacial da indústria farmacêutica no Brasil em 2003 43 Tabela 22 Inovação em produto do setor de fármacos 44 Tabela 23 Empresas multinacionais segundo a inovação tecnológica em produto 44 Tabela 24 Alcance da inovação no setor de fármacos 45 Tabela 25 Qualificação da mão-de-obra de acordo com as categorias de empresas inovadoras em produto 46 Tabela 26 Atividade exportadora do setor segundo o tipo de inovação 47 Tabela 27 Valor médio exportado segundo o tipo de inovação em US$ 47 Tabela 28 Localização das empresas inovadoras em produto segundo a atividade exportadora 48 Tabela 29 Características das firmas que inovaram em produto quanto à exportação e a origem do capital 49 Tabela 30 Dispêndio com P&D interno e externo valores médios (em reais) 49 Tabela 31 Cooperação entre empresas e institutos de pesquisa 50 Tabela 32 Cooperação entre empresas e institutos de pesquisa segundo o tipo de inovação 51 Tabela 33 Solicitação de Patentes na indústria farmacêutica 52 Tabela 33 - Percentuais médios de importância das fontes de informação 55 Tabela 34 Atividades inovativas realizadas pelas empresas na PINTEC 57 Tabela 35 - Pessoal alocado em P&D médias e medianas 58 Tabela 36 Impactos da atividade inovativa segundo a PINTEC 59 Tabela A1 - Produção e vendas dos produtos industriais farmacêuticos, segundo classe de atividades e descrição dos produtos em 2005 66 Tabela A2 Cinqüenta maiores companhias farmacêuticas mundiais, seu país de origem, receitas em 2006 70 Tabela A3 Exportações brasileiras dos setores industriais por intensidade tecnológica entre jan/jul 2007/2006 US$ milhões FOB 72

Tabela A4 Importações brasileiras dos setores industriais segundo a intensidade tecnológica para jan/jul de 2007/20006 em US$ milhões FOB 73 Tabela I Principais mercados das exportações brasileiras de produtos farmacêuticos US$ milhões 75 Tabela II Evolução ranking das empresas exportadoras do setor de produtos farmacêuticos US$ milhares 77 4

5 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 6 2. A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA NO MUNDO 7 2.1. INDICADORES DE TECNOLOGIA DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA MUNDIAL 12 3. A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA NO BRASIL 13 3.1 Produção 15 3.2 Comércio exterior brasileiro 21 3.3 Indicadores Tecnológicos 24 4. BASE DE DADOS E METODOLOGIA 36 5. CARACTERÍSTICAS DAS EMPRESAS INOVADORAS 41 5.1 Características gerais deste setor 41 5.2 Características das empresas segundo as árvores de classificação e regressão 52 5.3 Esforço inovador das empresas farmacêuticas inovadoras 54 5.4 Resultados das empresas farmacêuticas inovadoras 59 CONSIDERAÇÕES FINAIS E LIMITAÇÕES DO ESTUDO 61 REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO 63 APÊNDICE A LISTA DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS PRODUZIDOS EM 2005 66 APÊNDICE B DINÂMICA DO COMÉRCIO EXTERIOR 75

6 INTRODUÇÃO Muitos autores evidenciam que uma das principais características da indústria farmacêutica é o seu elevado dinamismo e sua capacidade de ser uma das mais globalizadas indústrias do mundo, crescendo a taxas superiores àquelas vivenciadas pela economia mundial e apresentando uma crescente importância no comércio internacional intra-firmas, em decorrência da existência de uma estratégia de distribuição internacional das atividades produtivas por parte das multinacionais. Essas características estimulam a entrada de novos ofertantes no mercado farmacêutico mundial, mas há muita resistência já que essa indústria está associada à necessidade de altos gastos em P&D e em marketing, bem como no sistema de proteção às patentes, do controle de fornecimento de princípios ativos e da reputação das marcas de laboratórios líderes. Caracteriza-se, então, por um mercado estruturalmente concentrado e oligopolista, tendo um número relativamente pequeno de grandes empresas multinacionais e um elevado número de pequenas e médias firmas atuando de maneira complementar aos grandes laboratórios. (BERTOLAI, 2006; PALMERIA FILHO; PAN, 2003; GADELHA, 2002; FRENKEL, 2002; TICKELL, 2004; SANTOS, 2001) Assim, aproveitando-se das oportunidades abertas pelo avanço do conhecimento em síntese química e sua aplicação em fins medicinais, a indústria farmacêutica cresceu e se apoiou no forte investimento em P&D de novas moléculas; na forte atuação na promoção das qualidades terapêuticas dos novos medicamentos e no estabelecimento de plantas produtivas para a etapa farmacêutica perto dos mercados de consumo, utilizando os fármacos produzidos em instalações próprias e de forma centralizada (PALMEIRA; PAN, 2003). No entanto, esse cenário se alterou, pelo menos no mercado brasileiro, com a entrada dos medicamentos genéricos e da expiração de patentes, além da maior regulação de preços e da ampliação do período destinado à pesquisa para o lançamento de novos medicamentos. Dessa forma, algumas modificações nas estratégias das empresas se fizeram necessárias, principalmente, a ocorrência de fusões a fim de aumentar o porte e reduzir os riscos associados ao investimento maciço em P&D, a integração vertical, a focalização em determinadas classes terapêuticas e a aquisição de pequenas empresas de biotecnologia intensivas em conhecimento. Assim, para melhor entender as características dessa indústria tão dinâmica, esse estudo se propõe a apresentar um panorama não exaustivo da indústria farmacêutica no Brasil a partir de indicadores extraídos das bases de dados da PINTEC Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica, RAIS Relação Anual de Informações Sociais, PIA Pesquisa

7 Industrial Anula, SECEX Secretaria de Comércio Exterior, de forma a apresentar a dinâmica desse setor. Para tanto apresentar-se inicialmente o contexto internacional, que no caso desse setor é determinante para compreendermos as fragilidades das empresas instaladas no país, as dificuldades frente a competição internacional. Em seguida desenvolve-se a discussão a partir dos indicadores de inovação, com a apresentação de um exercício de identificação das características empresariais das empresas que inovam em produtos para o mercado, utilizando-se para isso de arvores de classificação e regressão. O presente relatório está estruturado nas seis seções, a primeira, esta introdução, a segunda que apresenta o setor farmacêutico no mundo e discute a dinâmica da inovação no mesmo, a terceira apresenta o setor farmacêutico no Brasil, a quarta traz a metodologia utilizada para o estudo. A quinta seção caracteriza as empresas inovadoras do setor, bem como distingue os diferentes tipos de esforço inovador e seus resultados, enquanto a última seção apresenta algumas considerações finais e conclusões que possam ser inferidas baseando-se nas informações aqui apresentadas e a última lista as referências bibliográficas utilizadas para construir o presente documento. 2. A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA NO MUNDO O mercado farmacêutico mundial cresceu 7% no ano de 2006, a taxas de câmbio constantes, o que representou aproximadamente US$643 bilhões, segundo dados do IMS Health (2007). Tal crescimento ainda se pauta na manutenção do crescimento da longevidade das populações, economias fortes e do surgimento de produtos inovadores. No ano de 2006, foram lançadas 31 novas moléculas nos principais mercados e a contribuição dos mesmos de 2001 a 2005 alcançou US$ 13,5 bilhões em 2006. Os produtos com maior potencial que foram lançados em 2006 incluem Gardasil, a primeira vacina preventiva de câncer cervical; Januvia, o primeiro de uma nova classe oral para diabetes do tipo II; e Sutent para câncer renal. Assim, as vendas do setor mundial estiveram em média, para o período de 1999-2006, na ordem de US$ 476,38 bilhões com uma taxa de crescimento médio para o período de aproximadamente 10% ao ano. Para o primeiro quadrimestre de 2007, a receita do setor foi de cerca de US$ 510,3 milhões, cerca de 11% superior ao mesmo período em 2006 US$ 96,7 milhões no primeiro quadrimestre de 2006. Além disso, sendo um setor significativamente dinâmico comparativamente aos demais, ele apresenta taxas de crescimento superiores às da economia mundial e brasileira. Uma comparação, realizada por Bertolai (2006), entre as

8 médias das taxas de crescimento do PIB mundial, brasileiro e das vendas mundiais da indústria farmacêutica evidencia este fato, no triênio 2000-2003. Ou seja, o crescimento médio das vendas mundiais da indústria farmacêutica de 10,8% supera em muito as taxas de crescimento do PIB mundial e brasileiro, 2,6% e 1,8% respectivamente, usando informações do IMS Health e das Nações Unidas. Tabela 1 - Vendas do setor farmacêutico global de 1999 2006 Vendas Mundiais (US$ bi) 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 Mercado Mundial Total (US$ corrente) $334 $362 $387 $427 $498 $559 $601 $643 Crescimento sobre o ano anterior (% Constant US$ 14.5% 11.7% 11.8% 10.6% 10.4% 8.0% 6.8% 7.0% Growth) Fonte: IMS Health Market Prognosis (2007) Bertolai (2006) mostra que os países desenvolvidos concentram mais de 80% das vendas mundiais, apesar de haver uma elevação na participação dos países em desenvolvimento, o que leva a perceber que eles têm sido os principais promotores das ainda elevadas taxas de crescimento da indústria farmacêutica mundial. Em 2004, o fluxo de comércio exterior da indústria farmacêutica totalizou aproximadamente US$ 225 bilhões de vendas de medicamentos e US$ 307 bilhões de fármacos, o que representa respectivamente, 2,58% e 3,51% do total do comércio mundial (BERTOLAI, 2006, p. 70). O crescimento em P&D permanece forte, principalmente em produtos estão nas fases de desenvolvimento clínico Fase I e Fase II. Ao final de 2006, 2.075 moléculas foram desenvolvidas, cerca de 7% a mais do que o nível de 2005 e mais de 35% comparativamente ao final de 2003. Quanto ao desenvolvimento de Fase III de drogas em estágio de teste ou de pré-aprovação, os principais produtos foram os oncológicos, voltados para infecções virais e HIV e outros para dores e artrites, representando um total de 162 produtos. Desse total, 27% são encontrados biologicamente na natureza. Bertolai (2006) conclui acerca do desenvolvimento de atividades de P&D do setor que ela provém das empresas multinacionais, e concentra-se nos países desenvolvidos, fato interessante de se notar dada a desaceleração nas taxas de crescimento do PIB desses países. Em 2006, os EUA, que respondem por 45% das vendas globais do setor, cresceram 8,3% para US$ 290,1 bilhões, um crescimento de 5,4% maior comparativamente a 2005. Esse crescimento foi responsável pelo impacto do primeiro ano do benefício do Medicare Part D nos EUA e pelo aumento no volume de prescrições, bem como um crescimento de 7,6% no

9 Canadá. São os EUA os maiores importadores globais de produtos farmacêuticos. Haag e Starosta (2006) mostram que os principais fornecedores desse gigante comprador são os países europeus, Canadá, Japão e Israel. Fica evidente, então, a existência de uma dinâmica de complementação industrial entre EUA, que também são os fornecedores dessa indústria, e seus principais clientes. Os cinco principais mercados europeus França, Alemanha, Itália, Espanha e Reino Unido tiveram um crescimento de 4,4% em 2006, com US$ 123,2 bilhões em vendas, sendo um valor 4,8% menor do que em 2005. Já as vendas na América Latina cresceram 12,7% para US$ 33,6 bilhões, enquanto a Ásia, excetuando o Japão, e a África cresceram 10,5%, alcançando US$ 66 bilhões. O caso do Japão é interessante de se analisar, uma vez que houve um declínio de 0,4% comparativamente a 2005, cerca de US$ 64 bilhões, resultado dos cortes de preços do governo no biênio. A China também apresentou uma queda no crescimento das vendas desse setor, uma vez que cresceu apenas 12,3%, alcançando US$ 13,4 bilhões em 2006, comparativamente ao pico de 20,5% de 2005. Essa diminuição do crescimento pode ser vista como um fator da introdução da campanha governamental de limitação da promoção de farmacêuticos a médicos. A Índia foi um mercado de vasto crescimento no ano de 2006, com um aumento de vendas de 17,5% ou de US$ 7,3 bilhões. Tal crescimento se deve às grandes empresas multinacionais farmacêuticas que entraram nesse enorme mercado potencial, somado a outros fatores como as leis de propriedade intelectual, uma economia robusta e as necessidades de cuidados com a saúde, têm contribuído para a aceleração do crescimento da Índia 1.(IMS HEALTH, 2007) O governo indiano (2007) evidencia que as grandes multinacionais como a Pfizer, Merck, GSK, Sanofi Aventis, Novartis, Teva, dentre outras, são grandes dependentes das companhias indianas em muitos ingredientes farmacêuticos ativos e seus intermediários. Nesse contexto, percebe-se que o grupo de países cuja produção e consumo são centrados na América do Norte e na União Européia caracteriza-se por desenvolver produtos farmacêuticos com elevado valor agregado, não raramente frutos de recentes descobertas 1 A indústria farmacêutica indiana, avaliada em US$ 12 bilhões, teve um grande progresso com o desenvolvimento da infra-estrutura, a base de criação tecnológica e a vasta produção. É a quarta maior do mundo com 8% da produção mundial em termos de volume e a 13ª em termos de valor, tendo exportado entre medicamentos e farmoquímicos cerca de US$ 4,5 bilhões em 2006, incluindo EUA, Europa, Japão e Austrália. A capacidade de associar a manutenção da sua vantagem de custos com padrões de qualidade ocidentais e um ambiente regulatório favorável asseguram o sucesso das empresas farmacêuticas indianas. (GOVERNO INDIANO, 2007)

10 científicas, conforme afirmam Haag e Starosta (2006) 2. Nesse universo, o Brasil é pouco participativo como fica evidenciado na tabela 2 referente aos principais importadores mundiais, cuja posição brasileira era apenas a 23ª maior com US$ 2 bilhões importados em 2005. No entanto, Barbosa, Mendes e Sennes (2007, p.78) indicam que possivelmente as decisões das multinacionais privilegiaram o Brasil como plataforma de exportações dentro de um contexto de especialização geográfica de algumas linhas de produtos. Tabela 2 Ranking dos principais países importadores mundiais entre 2003 e 2005 (US$ bilhões) Posição 2003 2004 2005 1 EUA 27,8 31,5 35,6 2 Bélgica 24,4 30,9 34,3 3 Alemanha 18,7 25,1 28,1 4 Reino Unido - 13 15,1 5 França 10,6 13 14,3 6 Itália 9,2 11,1 11,6 7 Suíça 8,2 10,6 11,7 8 Holanda 6,1 8,9-9 Espanha 6,8 7,9-10 Canadá 5,7 6,6 7,4 23 Brasil 1,5 1,8 2,0 26 China 1,4 1,6 1,9 52 Índia 0,24 0,27 - Fonte: Adaptado de Barbosa, Mendes e Sennes (2007). Assim, estudos mostram que a indústria farmacêutica mundial apresenta elevadas taxas de crescimento e inovação tecnológica, muito acima da média da indústria como um todo, sendo estruturada como altamente concentrada em grandes laboratórios multinacionais de países desenvolvidos. (BERTOLAI, 2006; TICKELL, 2004). Os estágios de produção de fármacos e especialmente de Pesquisa e Desenvolvimento concentram-se nos países desenvolvidos, ao passo que os países em desenvolvimento operam nos estágios de produção de especialidades farmacêuticas, na realização dos testes clínicos, em especial nas fases 3 e 4, e no de marketing e comercialização desses medicamentos. Outro fator que deve ser analisado é a distribuição das principais empresas farmacêuticas no mundo. Isso pode ser percebido na tabela 3 que compreende as vinte 2 Esses autores evidenciam que o Brasil é pouco expressivo como fornecedor desses mercados, possivelmente por não ser caracterizado como um país em que sua indústria farmacêutica tenha um elevado valor agregado em termos mundiais.

11 maiores companhias farmacêuticas mundiais, suas receitas em 2006 e o país de origem 3. Os dados indicam que a maioria das empresas origina-se em países desenvolvidos europeus e dos EUA. É importante notar que as dez maiores empresas concentraram uma receita de USD 342,7 milhões em 2006, sendo cinco delas originadas nos EUA. As duas maiores companhias, Johnson & Johnson e a Pfizer, são norte-americanas e concentram aproximadamente 30% da receita obtida pelas dez maiores empresas, ou USD 101,7 milhões em 2006. Vale ressaltar que as dez maiores companhias farmacêuticas concentraram aproximadamente 60% da receita obtida em 2006 pelas cinqüenta maiores empresas mundiais desse ramo. Tabela 3 Principais companhias farmacêuticas mundiais e seus países de origem em 2006 Rank Companhia País Receita (USD milhões) Gastos com P&D (USD milhões) Nº de empregados 1 Johnson & Johnson EUA 53,324 7,125 138 2 Pfizer EUA 48,371 7,599 122,2 3 GlaxoSmithKline Reino Unido 42,813 6,373 106 4 Novartis Suíça 37,02 5,349 102,695 5 Sanofi-Aventis França 35,645 5,565 100,735 6 Hoffmann La Roche Suíça 33,547 5,258 100,289 7 AstraZeneca Reino Unido 26,475 3,902 98 8 Merck & Co. EUA 22,636 4,783 74,372 9 Abbott Laboratories EUA 22,476 2,255 66,8 10 Wyeth EUA 20,351 3,109 66,663 Total Top 10 342,658 51,318 975,754 11 Bayer Alemanha 18,216 1,791 61,88 12 Bristol-Myers Squibb EUA 17,914 3,067 60 13 Eli Lilly and Co. EUA 15,691 3,129 50,06 14 Amgen EUA 14,268 3,366 48 15 Boehringer Ingelheim Alemanha 13,284 1,977 43 16 Schering-Plough EUA 10,594 2,188 41,5 17 Baxter International EUA 10,378 614 38,428 18 Takeda Pharmaceutical Co. Japão 10,284 1,62 35 19 Genentech EUA 9,284 1,773 33,5 20 Procter & Gamble EUA 8,964-29,258 Total Top 20 471,535 684,229 1416,38 Fonte: Adaptado do Wikipedia (2007). Top 50 pharmaceutical companies, MedAdNews, September 2007 O caso da Alemanha é interessante de se notar, já que há 20 anos empresas como a Hoeschst e a Bayer eram as principais líderes das empresas farmacêuticas mundiais, tornando a Alemanha conhecida por ser a farmácia do mundo. No entanto, desde o início dos anos 3 O ranking completo das 50 maiores empresas mundiais é apresentado na tabela A2 do apêndice A.

12 1990, a competição com outras grandes companhias dos EUA e do Reino Unido modificou essa posição privilegiada, tornando-se mais fraca. Tal fato fica evidente no ano de 2001, quando apenas a empresa franco-alemã Aventis estava entre as dez maiores companhias farmacêuticas mundiais. (MCKINSEY, COMPANY, 2003; HINZE et alii, 2001) Assim, em 2006, a Bayer era a 11ª maior companhia no ranking, com uma receita de USD 18,216 milhões, tornando clara a perda da primeira posição do ranking em decorrência da concorrência com as empresas norte-americanas. Deste modo, o mercado farmacêutico mundial mostra sinais de manutenção do crescimento nos próximos anos, visto que as principais nações apresentam uma forte tendência de expansão das compras internacionais (HAAG; STAROSTA, 2006, p.16). Mesmo assim, a indústria farmacêutica apresenta sérios desafios a serem enfrentados ao longo dos próximos anos como a onda de expiração de patentes, as mudanças demográficas, as pressões para a redução dos gastos com saúde, as pressões corporativas para a redução do seguro saúde, as medidas de redução de preços, as leis de propriedade intelectual, e a queda na taxa de descobrimento de moléculas realmente inéditas, o que devera ser explorado na seção sobre rotas tecnológicas que este setor vem trilhando e os potencias caminhos que poderá vir a seguir dentre outros. Além disso, percebe-se a clara relação existente entre o valor dessa indústria e a necessidade crescente de novas terapias pelas novas ciências, o que pode fazer com que a tal indústria se associe um maior risco, dado a incerteza quanto ao descobrimento de novas terapias. 2.1. INDICADORES DE TECNOLOGIA DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA MUNDIAL É sabido que o sucesso da indústria farmacêutica está pautado em Pesquisa e desenvolvimento, já que P&D é o início da cadeia de valor dessa indústria e o valor de criação mais importante desse setor. No entanto, apesar da contínua expansão do mercado farmacêutico, em 2006, o IMS Health (2007) mostra que os produtos que tiveram vendas superiores a US$ 18 bilhões perderam suas patentes em sete mercados-chave, incluindo os EUA que representam mais de 77,8% desse total. Além desse problema, há cerca de três décadas, criar uma nova droga custava em média US$ 54 milhões. Hoje, segundo o Tufts Centre for the Study of Drug Development, dos Estados Unidos, são necessários cerca US$ 900 milhões e 15 anos de pesquisas para o desenvolvimento de um medicamento inovador. A base para se chegar até ele é a descoberta de uma molécula ativa. Em média, de cada 10 mil

13 moléculas analisadas, apenas uma se torna medicamento após as três fases de uma pesquisa: a inicial, a pré-clínica e a clínica. A primeira, na qual se tenta identificar um princípio ativo, é aquela em que se investe mais tempo e dinheiro. Com as terapias de baixo custo substituindo os produtos de marca em classes como os antidepressivos e os agentes respiratórios, dentre outros, os genéricos assumirão, cada vez mais, um papel central como fatores restritivos do crescimento dos gastos com saúde. Outro fator importante que está influenciando o mercado é o ativo aumento do papel dos pacientes já que eles são responsáveis pela sua saúde e demandam um maior acesso às terapias que melhorem e/ou prolonguem suas vidas. (IMS HEALTH, 2007) Para o caso indiano, por exemplo, dados do Governo Indiano (2007) mostram que existe uma necessidade de acelerar os esforços em P&D desse setor, uma vez que os gastos com P&D foram de apenas 5%, enquanto a maioria dos países desenvolvidos gasta entre 15% e 20% em P&D. Assim, além de ser essencial prover incentivos a essa indústria a fim de encorajar os dispêndios em pesquisa e desenvolvimento, é necessário que os incentivos sejam voltados para aquelas unidades que verdadeiramente estão engajadas em P&D. 3. A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA NO BRASIL A década de 1930 é considerada o marco inicial da consolidação da indústria farmacêutica no Brasil, configurando a formação das primeiras empresas desse tipo com características industriais conhecidas por boticas. Nessa primeira parte, a liderança do capital nacional respondia por apenas 14% da produção brasileira de medicamentos. Em contrapartida, com o aumento da atratividade das empresas multinacionais a partir de 1940, e mais intensamente na década de 1950, houve um salto na participação das empresas com capital de origem estrangeira na produção doméstica, chegando a 35% em 1940 e 73% em 1960. Por outro lado, uma vez que as empresas multinacionais internalizaram a produção, houve uma certa redução das importações de medicamentos a um nível residual, enquanto que os fármacos necessários para a produção interna continuaram a ser importados em quantidades crescentes. (PALMEIRA FILHO; PAN, 2003) Algumas legislações, como a promulgação do Código de Propriedade Industrial em 1971 e a criação da Central de Medicamentos, fizeram com que houvesse um incentivo a produção doméstica de medicamentos similares 4, apesar da permanência da importação de 4 A Lei 9.787 define medicamento similar como sendo aquele que contém o (s) mesmo (s) princípio (s) ativo (s), apresenta a mesma concentração, forma farmacêutica, via de administração, posologia e indicação terapêutica,

14 fármacos. Essa dependência de importados só reduziu a partir de 1984 com a elevação das tarifas de importação, bem como a proibição de importação de certos fármacos. Tal fato incentivou o crescimento da produção interna dos mesmos, proporcionando maior integração vertical entre os estágios produtivos da cadeia farmacêutica brasileira. O início da década de 1990 trouxe grandes mudanças institucionais que modificaram vários aspectos da indústria farmacêutica brasileira, como, por exemplo, o comportamento das empresas nacionais e multinacionais e a estrutura de mercado. Assim, o início dessa década caracterizou-se pela redução das tarifas de importação de fármacos e medicamentos juntamente à eliminação das restrições e proibições à importação de insumos farmacêuticos, seguindo a lógica de liberalização comercial. Por fim, a política de controle de preços de medicamentos foi abandonada, possibilitando a capitalização das empresas bem como grandes investimentos para a ampliação da capacidade farmacêutica. Em 1999, porém, retomou-se o controle de preços e instituiu-se a criação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), voltada para a criação de bases para uma elevação dos padrões sanitários da produção nacional e as pré-condições para eventuais incrementos das exportações (OLIVEIRA et alii, 2006; PALMEIRA FILHO; PAN, 2003). Um fato importante a ser destacado foi a promulgação da Lei dos Genéricos 5, incentivando a competição dentro da indústria e, conseqüentemente, reduzindo os preços dos medicamentos internamente, bem como a promulgação da atual Lei de Propriedade Intelectual nº 9.279 de 1996. Essa política de controle de preços implementada no Brasil não seguiu exatamente a regra de precificação do custo marginal, mas sim a de aproximação do custo médio de produção, desconsiderando o componente da taxa de lucro. Assim, entre 2000 e 2002, essa política acabou por generalizar o custo médio para todos os produtos, sem fazer distinção utilizando uma ponderação por meio dos custos referentes aos diferentes processos produtivos. Tal cenário resultou no barateamento relativo dos medicamentos que, juntamente com a queda do nível de atividade econômica brasileira e, conseqüentemente, do poder de preventiva ou diagnóstica, do medicamento de referência registrado no órgão federal responsável pela vigilância sanitária, podendo diferir somente em características ao tamanho e forma do produto, prazo de validade, embalagem, rotulagem, excipientes e veículos, devendo sempre ser identificado por nome comercial ou marca. Assim, os similares são cópias de medicamentos inovadores, mas, diferentemente dos medicamentos genéricos, não têm que apresentar testes para comprovar sua equivalência. 5 A ANVISA define medicamento genérico quando um medicamento é medicamento similar a um produto de referência ou inovador, que pretende ser com este intercambiável, geralmente produzido após a expiração ou renúncia da proteção patenteária ou de outros direitos de exclusividade, comprovada sua eficácia, segurança e qualidade, e designado pela DCB Denominação Comum Brasileira ou, na sua ausência, pela DCI (Denominação Comum Internacional), diferenciando-se do medicamento similar por ter teste de bioequivalência. (ANVISA, 2007)

15 compra das famílias, implicou uma significativa redução nas margens de lucro do setor (FRIDMAN; ROCHA, 2004). Esses fatores podem ser usados para compreender a atual organização e inserção internacional da indústria farmacêutica brasileira, mesmo que os efeitos das transformações mais recentes ainda não tenham sido clara, detalhada e suficientemente estudadas. No decorrer da evolução histórica, consolidou-se no Brasil uma indústria farmacêutica altamente internacionalizada e integrada a indústria farmacêutica mundial, cuja estrutura de mercado concentra grandes laboratórios, especialmente os multinacionais, e a baixa integração vertical da cadeia produtiva, evidenciada pela grande dependência com relação a insumos importados. Por outro lado, o recente e significativo crescimento do mercado de genéricos e o baixo investimento em P&D, comparativamente aos indicadores dessa indústria em outros países, se fizeram presentes na evolução da estrutura produtiva desta indústria. Vale ressaltar, também, a grande relevância do comércio exterior intra-firma, decorrente da grande presença de multinacionais e da dependência de farmoquímicos importados, o que ocasionou os sucessivos déficits na balança comercial da indústria farmacêutica. Ademais, algumas características são usuais de tal indústria como o percentual de valor adicionado acima da média da indústria, a baixa intensidade do fator trabalho, grandes barreiras à entrada, derivadas especialmente dos altos dispêndios com P&D e com marketing etc. Adicionalmente, dados da SECEX Secretaria de Comércio Exterior mostram que a indústria farmacêutica brasileira enquadra-se nos setores altamente intensivos em tecnologia tanto na exportação como na importação, segundo a classificação da OECD. Isso é comprovado pelo crescimento expressivo das exportações dessa indústria entre janeiro e julho de 2006 e de 2007, já que o valor exportado nesse período de 2006 totalizou US$ 500 milhões e esse mesmo valor foi de US$ 621 milhões para 2007, representando um crescimento de 24,2%. No caso das importações de produtos altamente intensivos em tecnologia, pode-se dizer que esse crescimento foi mais expressivo, alcançando 42,7% de crescimento entre 2006 e 2007. Isto indica a grande dependência brasileira de produtos importados a fim de suprir as necessidades internas, já que em 2006 o valor importado não chegava a US$ 2 bilhões, e superou essa barreira em 2007, chegando a US$ 2,751 bilhões 6. 3.1 Produção 6 Esse valor representa 5,3% das importações de produtos industriais pelo Brasil em 2007. Essas informações encontram-se nas tabelas A3 e A4 no apêndice A.

16 No que concerne à produção da indústria farmacêutica brasileira, alguns dados da Febrafarma (2004) mostram o Brasil como o 11º mercado farmacêutico mundial no ano de 2003, tendo vendido mais de um bilhão de unidades, que geraram um faturamento de aproximadamente US$ 5,6 bilhões e a geração de 47,1 mil empregos diretos. Para o ano de 2005, a PIA-2005 (Pesquisa Industrial Anual, realizada pelo IBGE) mostra que o setor de fármacos é composto por 823 empresas industriais, o que correspondia a apenas 0,56% do total de empresas industriais brasileiras. Apesar desse número reduzido, tais empresas responderam por 1,24% do total de investimentos da indústria geral, o que corresponde a R$ 1,116 milhão, e 1,36% do total de investimentos da indústria de transformação. Foi a indústria de transformação que respondeu por 91,2% do investimento realizado no ano de 2005 7. Algumas variáveis foram selecionadas a fim de caracterizar o setor de fármacos, comparativamente a indústria brasileira e, mais especificamente, à indústria de transformação. Para tanto, a tabela 4 relaciona o tamanho médio das empresas, o salário médio recebido por cada trabalhador, a rentabilidade da empresa, o valor adicionado na produção, e a receita total que cada firma para o ano de 2005. Tabela 4 Comparação entre setor de Fármacos, a indústria de transformação e a indústria brasileira em 2005 8 Indústria Brasileira Indústrias de Transformação Indústria Farmacêutica Número de empresas 147.358 144.339 823 Tamanho médio 42,18 42,21 109,4 Salário médio mensal 1.368,66 1.360,70 3.095,74 Rentabilidade 75,04% 73,24% 163,09% Produtividade do trabalho 79,30 77,41 149,25 Receita Média 8.522,81 8.435,62 30.439,75 Produtividade da empresa 3.469.889,47 3.390.751,61 16.415.499,39 Receita Total por empresa 9.254.798,40 9.106.395,68 32.269.855,41 Fonte: PIA (2005) Receita média = Receita líquida de vendas / Total de empresas. Produtividade do Trabalho = Valor da transformação industrial / Pessoal ocupado médio. Salário médio mensal = (Total salários / Total assalariados) / 13. De modo geral, os números médios de todos os indicadores apontados na tabela 4 são maiores para indústria farmacêutica vis-à-vis a indústria geral e à indústria de transformação. 7 Os produtos produzidos por este setor industrial são apresentados no apêndice A ao final do estudo. 8 Mediu-se a rentabilidade da empresa pela razão entre o Valor Bruto da Produção Industrial (VBPI) e os Custos das Operações Industriais (COI). A PIA define o COI como sendo o valor dos custos diretamente envolvidos na produção, incorridos no ano, à exceção dos salários e encargos, enquanto o VBPI é o valor obtido pela soma da receita líquida industrial com a variação dos estoques de produtos acabados e em elaboração, mais a produção própria incorporada ao ativo imobilizado. A PIA também define VTI (Valor da Transformação Industrial) como o valor obtido pela diferença entre o valor bruto da produção industrial e o custo das operações industriais.

17 Constata-se que, para o ano de 2005, a indústria farmacêutica apresentava valores médios superiores tanto para a indústria nacional como para a indústria de transformação em todas as variáveis consideradas. Dessa forma, essa indústria compreende, em média, empresas de médio porte, cujos trabalhadores recebem um salário mensal levemente superior a R$ 3 mil, enquanto que a média nacional corresponde a empresas de pequeno porte com trabalhadores com salários médios de R$ 1.370. Além disso, a produtividade do trabalho da indústria farmacêutica é 92% maior do que a média da indústria de transformação 9. Por isso, seus trabalhadores recebem um salário mensal médio superior à média salarial da indústria geral e de transformação. Adicionalmente, é um setor com elevada rentabilidade, uma vez que a razão média entre o valor bruto da produção industrial e os custos operacionais industriais é muito superior à média da indústria brasileira e mesmo a da indústria de transformação. Percebe-se que a receita total de vendas que cada empresa do setor farmacêutico está em torno de R$ 32 milhões, representando um lucro total em torno de R$ 3 milhões. Por outro lado, a média nacional foi levemente superior a R$ 9 milhões para a receita total e com um lucro total de R$ 886 mil, o que comprova a eficiência associada à indústria farmacêutica. Além disso, é importante ressaltar que a indústria farmacêutica está subdividida em produtos farmoquímicos e medicamentos. Os primeiros consistem na matéria-prima para o desenvolvimento dos produtos farmacêuticos, enquanto que os segundos são aqueles que os consumidores encontram na prateleira das farmácias. Assim, as empresas produtoras de medicamentos para uso humano concentram 64% das empresas da indústria farmacêutica brasileira e apresenta indicadores médios de receita líquida de vendas, valor bruto da produção industrial e custos das operações industriais maiores do que a média da indústria farmacêutica. Assim, pode-se dizer que os principais resultados obtidos pela indústria farmacêutica são ocasionados pelas firmas fabricantes de medicamentos para uso humano ou para uso veterinário. Tabela 5 Divisão do setor farmacêutico das empresas com mais de 30 pessoas ocupadas Classe de atividades Número de empresas Receita líquida de vendas por empresa Valor bruto da produção industrial 1 000 R$ (por empresa) Custos das operações industriais 9 Marone e Macedo (2007) afirmam que as empresas nacionais farmacêuticas adicionam muito pouco valor à produção, proporcionalmente ao número de funcionários empregados, em comparação com empresas de mesmo tamanho no mercado norte-americano. Ou seja, agrega-se, em média, apenas 9,49% do valor que um funcionário da indústria norte-americana agrega, caracterizando-se como um resultado bastante ruim.

18 Indústria Geral 34.018 35.176.521,02 33.379.678,46 19.111.982,72 Indústrias de transformação 33.358 34.761,86 33.025,83 19.111,87 Indústria Farmacêutica 341 72.583,90 63.040,68 23.933,30 Fabricação de produtos Farmoquímicos 16 8.307,69 7.598,63 4.336,31 Fabricação de medicamentos para uso humano 217 102.414,49 89.718,19 33.631,06 Fabricação de medicamentos para uso veterinário 44 26.591,30 25.322,14 11.668,48 Fabricação de materiais para usos médicos, hospitalares e odontológicos 63 19.432,14 12.575,76 4.452,76 Fonte: PIA (2005) No que tange a distribuição espacial, a indústria farmacêutica segue a tendência da indústria como um todo, concentrando-se principalmente na região sudeste. Tanto a distribuição avaliada em termos de número de unidades locais 10 quanto a realizada mediante volume de emprego, apontam a região sudeste, e mais especificamente os estados de São Paulo e Rio de Janeiro, como as áreas em que o setor se faz mais presente. Tabela 6 Distribuição Espacial da Indústria Farmacêutica em número de unidades locais em 2005 Indústria Indústria de Indústria Farmacêutica Transformação Brasileira Brasil 2.434 563.062 6.076.940 Norte 2,67 3,21 3,54 PA 1,03 1,19 1,27 AM 0,58 0,60 0,69 RO 0,41 0,67 0,61 TO 0,37 0,37 0,47 AC 0,16 0,17 0,20 RR 0,04 0,11 0,17 AP 0,08 0,10 0,15 Nordeste 10,19 12,41 15,68 PE 3,29 2,41 2,50 BA 2,42 3,17 4,79 CE 1,56 2,98 2,99 MA 0,66 0,75 1,19 PB 0,58 0,84 1,09 PI 0,78 0,57 0,86 SE 0,45 0,42 0,51 10 Por unidade local entende-se o espaço físico, geralmente uma área contínua, no qual uma ou mais atividades econômicas são desenvolvidas, correspondendo a um endereço de atuação da empresa ou a um sufixo de CNPJ (PIA-2005).

19 RN 0,25 0,83 1,04 AL 0,21 0,44 0,71 Sudeste 60,81 47,89 50,31 SP 38,70 28,77 29,92 RJ 10,97 5,01 7,18 MG 9,94 12,23 11,33 ES 1,19 1,88 1,89 Sul 18,32 29,81 23,31 PR 7,40 8,87 7,84 RS 7,31 12,89 10,19 SC 3,62 8,05 5,29 Centro-Oeste 8,01 6,69 7,16 GO 5,38 3,24 2,89 MT 1,31 1,84 1,64 DF 0,82 0,70 1,47 MS 0,49 0,91 1,16 Fonte: Estatísticas do Cadastro Central de Empresas SIDRA (2005) * Em termos percentuais CNAE 24.5: Fabricação de produtos farmacêuticos Observa-se na primeira coluna da tabela 6 que a indústria farmacêutica concentra-se espacialmente nas regiões sul e sudeste, respondendo por, respectivamente, 18,32% e 60,81% do número de unidades locais classificadas segundo o código 24.5 da Classificação Nacional de Atividades Econômicas CNAE. Destaca-se o estado de São Paulo, com 38,7% da indústria, ou seja, participação maior do que quaisquer das demais regiões, se considerada individualmente. Tal concentração é consideravelmente maior do que da indústria de transformação e da indústria brasileira, enquanto que para as demais regiões, o mesmo não se repete, com a concentração da indústria farmacêutica ficando abaixo do observado para os demais níveis de agregação. Essa importância da região sudeste, principalmente do estado de São Paulo, pode estar relacionada à concentração do setor de saúde no estado paulista, seja como mercado consumidor seja como sede das principais universidades brasileiras, o que facilita a disponibilidade de mão-de-obra especializada, concentrando-se principalmente na região sudeste do país. Tabela 7 Distribuição percentual do volume de emprego por região (1998-2001) Regiões Segmento 1998 1999 2000 2001 Norte Medicamentos 0,1 0,6 0,7 0,3 Farmoquímicos 0,6 0,6 0,6 0,7 Nordeste Medicamentos 6,5 6,1 5,4 5,2 Farmoquímicos 5,4 5 4,1 4 Sudeste Medicamentos 84,1 81,3 79,9 79,9 Farmoquímicos 80,8 82,2 83,5 83,1

20 São Paulo Rio de Janeiro Sul Centro-Oeste Fonte: adaptado de Pinto (2004) Medicamentos 59,7 57,3 60,3 58,8 Farmoquímicos 53,2 55,7 60,6 59,8 Medicamentos 19,1 18,8 13,2 13,4 Farmoquímicos 10 10,7 7,3 6,6 Medicamentos 4,8 4,8 5,1 4,8 Farmoquímicos 9,5 8,3 8 8,9 Medicamentos 4,5 7,3 8,9 9,8 Farmoquímicos 3,8 4 3,7 3,2 Já a avaliação da distribuição do volume de emprego mostra uma concentração ainda mais alta do que aquela aferida pelo número de unidades locais. Tal constatação sugere que além de concentrar o maior número de unidades locais, a região sudeste tem as maiores empresas, quando avaliadas em número de empregados. Quanto à distribuição do mercado farmacêutico brasileiro em 2003, uma composição de doze grandes laboratórios concentrava 45% dos R$16,9 milhões em vendas nominais com apenas um laboratório com capital nacional, de acordo com os dados da FEBRAFARMA (2004 apud BERTOLAI, 2006). A tabela 8 abaixo mostra a distribuição segundo a origem do capital da empresa no ano de 2003 11. Tabela 8 - Distribuição do Mercado Farmacêutico Brasileiro em 2003. Empresa Market Origem Share (%) do Capital Roche 6,0 Suíça Aventis 5,6 Alemanha e França Pfizer 4,7 EUA Novartis 4,5 Suíça Abbott 4,3 EUA Schering 3,1 Alemanha Bristol 3,0 EUA AstraZeneca 2,9 Inglaterra Merck 2,8 EUA Janssen 2,8 EUA Ache 2,8 Brasil Boehringer 2,7 Alemanha Outros 54,9 - Fonte: Adaptado de Bertolai (2006). Barbosa, Mendes e Sennes (2007) mostram que as cinco maiores empresas de capital nacional, em 2003, representavam 42% do faturamento das cinco maiores empresas de capital 11 O site da ANVISA oferece o ranking das principais empresas em novembro de 2002 que mais vendiam produtos naquele momento. No entanto, preferiu-se a tabela 8 mostrando a distribuição do mercado farmacêutico em 2003.